História e cinema: representações do feminino e o jogo das alteridades/Cadernos de Pesquisa do CDHIS/2017

As discussões em torno da questão de gênero e suas representações se tornam especialmente importantes quando confrontadas com os dados cada vez mais alarmantes em relação ao aumento dos chamados crimes de ódio em nossa sociedade, que incluem o feminicídio e toda sorte de violência contra aqueles(as) não inscritos(as) na heteronormatividade.

Esse dossiê foi pensado a partir desse cenário e reunimos artigos que discutem, não só as performances do feminino e do masculino no cinema, mas principalmente, problematizam essa visão binária e evidenciam as tensões presentes nas relações de gênero e na construção das memórias, das subjetividades, dos discursos normativos e das formas de resistência historicamente conformadas por diferentes panoramas político-sociais.

Dessa forma, busca-se contribuir para o alargamento da discussão sobre a generificação da representação no cinema, apontando para aspectos da problemática que acompanha o debate atual em torno do gênero, dos modos de enunciação, objetivação e subjetivação – limites e transcendências.

O dossiê é composto por seis artigos. Em “Assista outra vez: estratégias revisionistas feministas no cinema”, as autoras Flávia Cesarino Costa e Amanda Rosasco Mazzini propõem analisar a relação da obra cinematográfica Malévola (Maleficent, Robert Stromberg, 2014) com o clássico A bela adormecida (Sleeping beauty, Clyde Geronimi, 1959),assim como as diferentes maneiras pelas quais um filme pode revisitar outro(s) com o objetivo de dar voz às representações da mulher até então adormecidas ou silenciadas, buscando elucidar as estratégias audiovisuais feministas elaboradas na nova produção cinematográfica.

A cineasta Lucia Murat e seu filme Que bom te ver viva (1989) é objeto de análise dos artigos de Marina Cavalcanti Tedesco e Ana Carolina Monay. No primeiro, a autora faz um retrospecto da segunda onda do feminismo brasileiro e suas principais questões, explicitando suas (des)articulações na luta contra a ditadura civil-militar, e pensando sobre como elas aparecem na obra de Murat. No segundo, a partir do enredo do filme, a autora reflete sobre o uso da tortura pelo Estado ditatorialcomo dupla punição às mulheres pela transgressão de duas ordens– a do regime militar e a do regime patriarcal.

O período do regime civil-militar no Brasil e sua relação com as questões de gênero étematizado também no artigo de Vinícius Alexandre Rocha Piassi, “O signo da ausência no jogo de alteridades do filme Hoje (2011).”Com base nas lembranças de Vera, personagem de Denise Fraga no filme de Tata Amaral, tecem-se relações entre memória, conflitos íntimos e sentimentos contraditórios, a partir dos quais o autor reflete sobre a temporalidade do luto e a construção, a partir da noção de gênero, da dimensão das subjetividades.

Suelen Caldas de Sousa Simião, em “Masculinidades plurais e representações do feminino: arquitetura moderna e design em El hombre de al lado (2009)”, analisa o longa-metragem argentino, buscando problematizar de que maneira arquitetura, design e cultura material se relacionam a uma primazia do poder masculino e evidenciam relações de gênero, ao mesmo tempo em que constrói e expressa diversos perfis de masculinidade.

Em “Gênero e travestilidade nas telas de cinema: a trajetória de Claudia Wonder em filme documentário”, as autoras Stella Maris Scatena Franco, Natania Neres da Silva e Júlia Glaciela Silva Oliveira analisam o documentário Meu amigo Cláudia (2009), sobre a artista e travesti Cláudia Wonder, entre os anos de 1970 e 2000, com destaque ao caráter biográfico e aos contextos cultural, político e social do país, sobretudo no que concerne à esfera artística e às questões de gênero e sexualidade.

A seção “Artigo livre” traz contribuições com temáticas diversas. Em “Ceuta e Alfarrobeira: informação e diplomacia no século XV”, Douglas Mota Xavier de Lima discute a prática da obtenção de vantagens políticas através da coleta e do uso da informação, entre o final da Idade Média e a constituição do mundo moderno, e analisa a campanha militar para a conquista de Ceuta e as repercussões da batalha de Alfarrobeira, no intuito de compreender o desenvolvimento das políticas de informação e sua crescente importância para a diplomacia ibérica.

Em “O corpo é a extensão da alma: um olhar foucaultiano sobre a disciplina moral da Igreja Apostólica (da Santa Vó Rosa) 1954-1970”, Pablo Henrique Costa Santos, a partir da perspectiva histórica crítica foucaultiana sobre a composição disciplinar apresentada pela instituição religiosa, identifica, nos discursos doutrinários da igreja Apostólica (da Santa Vó Rosa), aspectos que induzem à normatização exercida por meio de suas regras morais, na busca do controle do corpo frente às tentações que o mundo oferece. Para finalizar a seção, Caio Vinicius de Carvalho Ferreira, em seu artigo “Deposições políticas no Pontal do Triângulo Mineiro (1964)”, analisa os desdobramentos do golpe civil-militar no Pontal do Triângulo Mineiro, buscando compreender, no processo histórico, fatores e ações relacionados a esse acontecimento, bem como as maneiras como foi sentido, vivenciado e executado na conjuntura local.

Por fim, a Revista traz ainda a resenha do livro de Paulo Miceli, História moderna. São Paulo: Contexto, 2013, escrita por Cleber Vinicius do Amaral Felipe.

Boa leitura.


Organizadores

Carla Miucci Ferraresi de Barros – INHIS/UFU.

Mônica Brincalepe Campo – INHIS/UFU.


Referências desta apresentação

BARROS, Carla Miucci Ferraresi de; CAMPO, Mônica Brincalepe. Apresentação. Cadernos de Pesquisa do CDHIS. Uberlândia, v. 30, n. 1, jan./jun. 2017. Acessar publicação original [DR/JF]

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