Volta ao mundo em 13 escolas: sinais do futuro no presente | André Gravatá
Volta ao mundo em 13 escolas é um projeto do coletivo Educ-Ação que vai mostrar o sonho de Eduardo Shimahara (Shima), juntamente com André Gravatá, Camila Piza e Carla Mayumi, em compreender a educação contemporânea ao redor do mundo. Ao todo, foram visitadas 13 escolas distribuídas por nove países sendo eles por sua vez em Cinco continentes diferentes.
A ideia surge com Shima, que se pergunta se é possível existir um método de ensino além do conhecido tradicional. Essa ideia é incorporada por seus amigos que se juntam nessa empreitada de visitar várias escolas espalhadas pelo mundo a fim de compreender o método educacional vigente. Para isso o critério utilizado para seleção das escolas foi a diversidade. Passam cinco dias em cada escola para entender seu funcionamento e ações sejam de professores, estudantes ou até mesmo dos pais.
Quanto aos questionamentos propostos, percebe-se uma necessidade de inserção de um novo método prático-pedagógico na educação tradicional. “E se a educação formal e informal andassem de mãos dadas? […] E se as relações entre professores e alunos não fossem tão hierárquicas? […] E se você pensasse nos seus próprios ‘e se…’? (p. 14)”. Esses e outros questionamentos presentes no livro possuem uma nota de educação construtiva em seu tom.
O livro é composto por 12 capítulos, sendo cada um relacionado a uma escola visitada com exceção do capítulo 2 que trata-se de duas escolas. Os países visitados são: Estados Unidos, Inglaterra, Espanha, Suécia, Argentina, Índia, África do Sul, Indonésia e o Brasil, país de origem. Interessante notar como o livro está distribuído, “a ordem dos capítulos segue a distribuição geográfica das escolas, de continente em continente” (p. 16). Cada autor cria seu próprio roteiro, dando sua contribuição pessoal ao livro. Além dos roteiros já citados, o leitor ainda tem a opção de seguir a leitura por temas. Isso torna o texto agradável a todos os gostos, não sendo necessário começar da primeira página e seguir capítulo a capítulo.
As escolas visitadas foram as seguintes: Centro Integrado de Educação de Jovens e Adultos (CIEJA), Campo Limpo, Capão Redondo, em São Paulo; Amorim Lima e Politeia, São Paulo; Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento (CPCD) Belo Horizonte, Minas Gerais; Escuelas Experimentales, Província da Terra do Fogo, Argentina; Quest to Learn, Nova York, Estados Unidos; North Star Massachusetts, Estados Unidos; Youth Initiative Program (YIP), Järna, Suécia; Team Academy, País Basco, Espanha; Schumacher College, Devon, Inglaterra; Sustainability Institute, Stellenbosch, África do Sul; Riverside School, Gujarat, Índia; Green School, Bali, Indonésia.
Cada escola visitada, independente do país apresenta uma característica ímpar que merecia ser compartilhada. No caso do CIEJA (SP) é preciso destacar o carinho com os estudantes que desejaram retornar aos estudos depois de ter abandonado, ou interrompido por algum motivo sua vida escolar. “Sua vida se transformou […] Hoje, ele está aprendendo a ler, em um ambiente que o acolheu. Esse local reconheceu nele a capacidade de desenvolver autonomia (p. 33)”.
A escola acaba se tornando mais do que um local de ensino, passa a ser um lugar (e aqui se emprega o conceito geográfico da palavra) de recolhimento, de afeto, quase um lar. Na North Star vemos isso com uma frase de Isabel, aluna da escola: “Amo o fato de este lugar parecer uma casa, e não uma escola. Hoje é meu primeiro dia aqui, e já me sinto bem-vinda” (p. 117). São pontos comuns entre escolas que se diferem em países, mas que possuem esse mesmo modo de acolhimento, e não de um depósito de pessoas.
Vários outros pontos podem ser destacados no CIEJA, como a autonomia dos estudantes em organizar propostas em prol de seu bairro, a quantidade de estudantes com deficiências ou limitações físicas bem como são atendidos e a organização das matérias aplicadas utilizando a multidisciplinaridade e o cotidiano dos próprios estudantes para exemplificar o enunciado, fazendo com que esses encontrem utilidade para aquilo que estão aprendendo.
Além do espaço escolar e seu cotidiano, é preciso entender os estudantes. Para isso deve-se dar liberdade para que o discente escolha o caminho que quer seguir, além do básico alcançado em sala de aula. Exemplo disso são as escolas Amorim e Politeia, “consideradas escolas democráticas, pois ambas valorizam a capacidade de escolha do aluno, seja para construir o caminho curricular das aulas, seja para elaborar e repensar as diretrizes da escola”. (p. 46).
Nota-se como elementos que vão desde o espaço físico (da cor da parede até grades nos muros) – que merece atenção para um melhor desempenho dos estudantes – até as diferenças que não são compreendidas pela comunidade são aglutinadores para o conhecimento a ser construído. Assim como a disparidade entre chefe e líder, notamos a comparação entre “professor” e “educador” vinda da comunidade: “Tião exercitava um dos seus aprendizados mais preciosos: a diferença entre professor e educador. ‘Professor é aquele que ensina, educador é aquele que aprende’. […] Que aprende com a comunidade local. Que aprende com o aluno”. (p. 68).
Nessas escolas observa-se a paciência e a atenção com os saberes populares, sobretudo no dos estudantes. Os dons artísticos, que são tratados normalmente por má conduta pelas escolas tradicionais, também são notados e aprimorados.
O livro trás em meio aos capítulos um fato, uma atividade, algo que seja como uma marca registrada de cada escola, em uma página destacada. Por exemplo, o “Biscoito Escrevido” do CPCD ou as Intervenções Coletivas no CIEJA.
Métodos diferenciados são utilizados para o aprendizado dos estudantes. É preciso criatividade para elaborar atividades que auxiliem os estudantes a estudar sem que isso se torne algo desagradável. Exemplo disso, e que por sinal se faz fascinante pela sua criatividade e simplicidade, ocorre na escola Green School, em uma atividade de inglês
que continha as opções A, B, C, D e E, sendo que a opção E era seguida não por uma frase assertiva, mas por um desafio: pense em uma solução diferente. – Ninguém escolhia a opção E. Agora […] os alunos se sentem mais livres para sugerir uma […] avaliação que funciona do ponto de vista deles. (p. 220)
Algo tão notável deveria estar presente em todos os meios de avaliação pelo mundo todo, pois oferece a oportunidade do estudante dizer seu ponto de vista em relação ao assunto.
Percebe-se sempre que o rompimento com a escola tradicional parte de uma pessoa ou um grupo que questiona se aquele modo de ensino é eficiente. “[…] Josh e Ken despediram-se da escola na qual lecionavam e deram forma a um sonho: a criação de um programa que oferece suporte a estudantes que desejam uma opção ao ensino tradicional. (p. 120)”. Isso, de certa forma mostra a força que cada indivíduo possui ao embarcar nessa empreitada que é o rompimento com o tradicional. Outro modo de fazer isso é quebrando alguns tabus em relação a funções exercidas, rompendo com hierarquias, como é o caso do homem que varria a calçada no Schumacher College. “O homem com a vassoura […] é conhecido como Jon. Seu cargo: diretor da faculdade. Independentemente da função, todos participam da limpeza. Enquanto limpam, aprendem a importância de cuidar do espaço”. (p. 170).
Atitudes como essa trás dois sentimentos opostos quando observada: O primeiro é a da decepção na surpresa com uma atitude assim, uma vez que não é de costume estar presente a esse tipo de conduta, seja pelo diretor da escola, seja pelos próprios professores. A segunda é a de perceber que se pode fazer algo a mais do que lecionar, ser mais humano com as outras pessoas. Isso também é romper com o tradicional que já está praticamente impregnado em nosso modo de vida.
Os capítulos finais são separados em duas partes. O primeiro traz seis convidados a refletirem sobre como é a educação que temos e qual é a educação que devemos alcançar. Cada um dos integrantes faz uma análise de experiências vividas e objetivos a alcançar. Como no relato de José Pacheco, que questiona instigadoramente os estudantes, forçando-os a buscar respostas e, portanto a estudarem, porém, de forma prazerosa.
Nas conclusões, os autores trazem o relato de experiência do que foi essa viagem e essa aprendizagem para cada um deles. Para um professor de Geografia, mais do que nunca, é preciso ter a clareza de que o relato de uma viagem vai trazer o mínimo do que realmente se passou nessa empreitada. Nenhum texto, nenhuma imagem, nenhum relato, pode ser comparado à percepção dos sentidos e à prática daqueles que realmente foram a campo e puderam vivenciar aquilo.
Essa obra, elaborada como um registro de viagem, faz pensar naquilo que é realmente importante de se ensinar nas escolas. Não do conteúdo programado, verticalizado, imposto a repassar aos estudantes, mas sim aquilo que lhes é importante para a vida. E o que é importante deve ser reforçado, de modo que os estudantes aprendam a lidar com esses assuntos quando chegar o momento.
Resenhista
Rafael Aparecido Gonçalves Xavier – Licenciado em Geografia e Especialista em Ensino de Geografia pela Uni Londrina (UEL). E-mail: rafaelgx.nutri@gmail.com
Referências desta Resenha
GRAVATÁ, André et al. Volta ao mundo em 13 escolas: sinais do futuro no presente. São Paulo: Fundação Telefônica, 2013. Resenha de: XAVIER, Rafael Aparecido Gonçalves. Ensino de Geografia. Uberlândia, v. 10, n. 19, p. 229-233, jul./dez. 2019.