RESISTÊNCIA: A construção de saberes históricos em tempo de pandemia | Das Amazônias | 2021
Iniciamos esta edição com sinceras condolências em respeito a todos os brasileiros e brasileiras que partiram devido à crise sanitária ocasionada pelo novo coronavírus, mas sobretudo pesarosos do contexto ideológico em que o Brasil está inserido. A Revista Discente das Amazônias se irmana no sentimento de tristeza de cada ente querido que sente a dor da saudade, palavra encontrada apenas no português do Brasil (e que faz muito sentido face a falta do avô, da mãe, do irmão, do pai, da tia, do primo, do próximo ou do distante), na ausência da vida. Externamos nossa solidariedade aos que permanecem e lastimamos por aquelas pessoas que se tornaram montante numérico superior a 470.000 mil mortos, vítimas de um genocídio resultante da ignorância, do negacionismo e da pseudociência.
Mas, nos apeguemos aos respingos de esperanças. Paulo Freire, fugindo da norma, já nos convidava a conjugar o substantivo “esperança” – esperançar é preciso. É nesses embalos de incerteza de um viver marcado por lutas, que devemos acreditar na ciência, na educação pública e gratuita e sua fundamental importância e contribuição para à sociedade. Assim, caros(as) leitores e leitoras, lhes convidamos a lerem os trabalhos submetidos à Das Amazônias, Revista Discente de História da Ufac (em seu volume 4, número 1), que compõe o conjunto de periódicos da área de História do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH), da Universidade Federal do Acre (Ufac).
Iniciando esta edição, as letras ecoam nos escritos de Ana Paula Oliveira do Nascimento com a produção “Disputas entre medicinas: prática e ensino médico e as artes de curar no Brasil e nas Amazônias no século XIX”. Tecendo estudos sobre a constituição da classe médica no Brasil e na Amazônia e as resistências, as repressões e restrições de governos autoritários destinadas às populações destes recantos. Em sequência, Cyndy Souza, Elcio Araújo e Uizenairian Rocha nos trazem “A música como forma de expressão e manifestação contra a Ditadura Civil-Militar no Brasil”, analisando as formas de expressão da musicalidade, seus códigos e metáforas a partir do repertório de renomados cantores brasileiros daquele período.
Danilo Rodrigues do Nascimento e Poliana de Melo Nogueira suscitam uma pesquisa bibliográfica interseccionando suas experiências em disciplinas na graduação de Licenciatura em História da UFAC, refletindo e problematizando fontes históricas, bem como suas abordagens, pelo qual intitulou “Entre memórias e fontes históricas: diálogos, problemáticas e historiografias em sala de aula no Ensino de História”
Darlen Priscila Santana Rodrigues escreveu “Do Casarão à Casa da Memória: um lugar de Memória na Rua 20”, investigando documentações relevantes para compreensão de aspectos de identidade e memória, chegando a considerar a importante contribuição da universidade pública para a preservação de patrimônios históricos.
Déborah Santos em “O Discurso colonizador camuflado de ciência na Amazônia do século 19”, possibilita a visualização da ciência como ferramenta colonizante. Seu texto de muita valia aos estudos amazônicos, desabrocha levantamentos a respeito das linhas discursivas imperialistas e racistas, cujas influências incidiram na formação da identidade nacional.
Diego Manoel Medeiros de Albuquerque traz um riquíssimo, “Racismo: conceito historicamente construído na legislação brasileira”, acerca do racismo à brasileira, levantando reflexões a partir de um projeto vinculado ao Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Neabi/Ufac) para investigar o racismo no Brasil, tendo como eixo norteador o judiciário acreano.
Edson Gabriel dos Santos Dias nos presenteia com a proposta de estudo das implantações de políticas públicas na Amazônia na vertente alimentar, com o trabalho “História e alimentação: políticas de assistência alimentar na Amazônia (1940-1950)”. Certamente corroborando com uma investigação de muita valia nos estudos em história.
José Manuel Ribeiro Meireles, em sequência, aborda a temática indígena com a produção “A Escola nunca vai entender a comunidade e será que a comunidade entende o significado da escola?”, propiciando debates a partir da análise da educação escolar para o povo indígena Krahô e as suas implicações, refletindo acerca dos conhecimentos tradicionais e universais, e como a comunidade enxerga a instituição escolar, investigando as alterações e interferências culturais.
Neila Braga Monteiro, na proposição dos estudos de gênero, assegura investigações precisas: “Nas entrelinhas da História: representações sobre mulheres no romance de Francisco Galvão”. Sua análise do romance social “Terra de ninguém” fortalece os estudos de mulheres amazônicas, principalmente quanto às presenças nos seringais.
Roberto Biluczyk levanta aspectos históricos relativos à tecnologia e seu avanço no Brasil, tendo como objeto de estudo a “Revista Manchete Rural” e suas publicações veiculadas entre os anos de 1987 e 1998. Assim, assegura em “A Revista Manchete Rural e a antena parabólica: tecnologia, integração e novos hábitos” a leitura para visualizar a interação da sociedade com o avanço tecnológico daquele período.
Rosa Thaís Neves Hydall, na continuidade exitosa, traz “A história da Madeira-Mamoré: medos, desafios e enfrentamentos na construção da EFMM”, discorrendo sobre os impactos econômicos e sociais da estrada de ferro. E ainda no segmento destes valiosos trabalhos, a pesquisadora Sura Souza Carmo traz “Os Intelectuais na construção de uma Bahia imaginada entre as décadas de 1910 e 1950”. Seu exposto já está bem enfatizado no título, sua abordagem também se aterá aos pensadores que buscavam valorizar os aspectos coloniais em comparativo ao segmento notabilizador da cultura afro-baiana, a exemplo de Jorge Amado membro inaugural da Academia dos Rebeldes (não obstante as críticas às suas obras como reprodutoras do “racismo à brasileira” como afirmou Abdias do Nascimento).
Por encerrar os artigos, Victor Hugo de Almeida França contempla, a partir da metodologia de História Oral, o processo de migração nordestina, tendo desenvolvido sua pesquisa de maneira a respeitar o isolamento social através de entrevistas em plataformas digitais, resultando na obra “Do interior baiano à selva de pedra paulistana: desafios frente a migração nordestina em São Paulo”. Seu intuito de resgate das vozes subalternizadas é oportuno.
Quanto às resenhas, materiais ricos para pesquisadores e demais leitores, Ezir Moura Júnior nos oferece “O desdizer e o desexplicar de Francisco Bento da Silva, na obra ‘Acre, formas de olhar e de narrar: natureza e história nas ausências”. Jardel Silva França, na continuidade, de forma contundente nos encaminha a homenagem póstuma ao professor Carlos Alberto Alves de Souza “Aquirianas: mulheres da floresta na história do Acre”, posto o grande contributo para os estudos históricos amazônicos. O pesquisador sintetiza a obra fincando o título “Aquirianas: o protagonismo feminino na floresta acriana”.
Por derradeiro, Karolaine da Silva Oliveira, seguindo a proposta de gênero, também resenha a obra “Caça às bruxas: a contribuição do capitalismo para o aumento da violência contra às mulheres”. Nos possibilitando visualizar, de forma sintetizada, a taxação às mulheres e a cultura histórica subalternizante imposta a elas.
Neste compêndio de trabalhos cientificamente pensados, investigados e desenvolvidos, o convite à leitura é fortalecido a você que compreende a importância do fazer ciência no Brasil, sobretudo nas Amazônias, nas instituições públicas e de qualidade. Ademais, o chamado fica a todos e todas com pesquisas em História e sua interdisciplinaridade. Prazerosa leitura!
Andrisson Ferreira da Silva – Membro do corpo editorial da Revista Das Amazônia.
SILVA, Andrisson Ferreira da. Editorial. Das Amazônias. Rio Branco, v.4, n.1, Jan./jul. 2021. Acessar publicação original [DR]