Política, Arte e Cultura no Brasil (Anos 1940–1970) | ArtCultura | 2007
Expressivos profissionais das áreas de conhecimento histórico e afins aderiram, de forma renovadora, às mudanças de paradigmas metodológicos e temáticos, que ganharam maior consistência nos últimos tempos. Nesse sentido, ocorreu um afastamento das histórias estruturais e da escrita sintética ou holística. Por outro lado, têm proliferado estudos monográficos, muitas vezes inspirados pela abordagem da micro-história e por forte enfoque culturalista, não poucas vezes desprendidos das movimentações sociais e políticas mais amplas da própria história.
O dossiê que o leitor tem em mãos reúne diferentes textos, amalgamados pela temática Política, Arte e Cultura no Brasil (Anos 1940–1970). Seu título define, por si mesmo, que nossa compreensão sobre História Cultural agrega os novos aportes teóricos e as novas abordagens que alargaram o campo de conhecimento abrangido pela História. Mas que também, a par da perspectiva interdisciplinar que os caracteriza, considera que os macromovimentos da história estão relacionados aos micromovimentos e vice-versa.
Inseridos em um tempo do multiculturalismo e de declínio das explicações históricas totalizadoras, buscamos organizar um conjunto de artigos que levasse em conta a multiplicidade cultural e social de uma formação histórica complexa como a brasileira, sem deixar de incorporar análises sobre as relações que fazem da trajetória histórica um entrelaçamento de variáveis sociais, econômicas, políticas e culturais.
Dessa forma, os autores que compõem este dossiê abordam desde questões econômicas, administrativas e artísticas relevantes, como, por exemplo, Marcelo Cedro — que analisa a administração de Juscelino Kubitschek na década de 1940, em Belo Horizonte — até temas com um enfoque predominantemente artístico. Este é o caso da contribuição de Marília Andrés, que, ao interpretar a relação entre arte e política, no âmbito do modernismo brasileiro, colore com tons mais acentuados análises que dialogam especialmente com as artes plásticas.
A mesma abordagem dialogal é encontrada em artigo de minha autoria, que busca, interpretar, através de texto literário, especificamente Encontro marcado, de Fernando Sabino, as relações que podem ser estabelecidas entre história, literatura, memória e cidades. E por falar em memória, em representações sociais e em narrativas, o entendimento da memória como ingrediente inerente à trajetória histórica de grupos sociais não-hegemônicos é conteúdo central do texto de Heloísa Pacheco, que versa sobre o governo JK e os anos dourados, envolvendo a relação entre a memória social dos trabalhadores que construíram Brasília e a memória hegemônica da elite política nacional brasileira.
Brasília como modelo de modernidade está no centro da interpretação desenvolvida por Ana Queiroz, que reflete sobre como a concepção do Plano Piloto da nova capital brasileira contribuiu para estimular a idéia de que a sede do governo federal, inaugurada em 1960, trazia em si uma projeção do futuro, bem como elementos que construíram um forte imaginário de que começava, a partir daí, um novo tempo de progresso para o Brasil.
Finalmente, em um artigo atento para as especificidades das conjunturas históricas, Marcelo Ridenti, analisa o ambiente cultural, artístico e intelectual das décadas de 1950 a 1970 e mostra como, naquele tempo efervescente, artistas e intelectuais foram acometidos pelo dilema de ficarem exilados em suas atividades específicas ou de participarem de mobilizações políticas, espremidos entre aquilo que “parecia anunciar a revolução” e a perspectiva de democracia para o Brasil.
Penso que, mais do que um dossiê sobre arte, cultura e política, este conjunto de textos traduz em si a diversidade de possibilidades, métodos, temas e abordagens relativos à construção do conhecimento histórico. São, com certeza, artigos reveladores da riqueza da interconexão criativa entre a História e heterogêneas áreas de conhecimento.
Organizadora
Lucilia de Almeida Neves Delgado – Doutora em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP). Professora do Departamento de História e do Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas). Autora, entre outros livros, de História oral: memória, tempo, identidades . Belo Horizonte: Autêntica, 2006. E-mail: lucilianeves@terra.com.br
Referências desta apresentação
DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. Alargando as fronteiras da História. ArtCultura. Uberlândia, v. 9, n. 14, jan./jun. 2007. Acessar publicação original [DR]