Passado a limpo: o estado capixaba e o seu mito fundador é o mais novo livro do historiador capixaba José Pontes Schayder. Lançado em edição própria, o livro chega para os historiadores locais, intelectuais diletantes e demais interessados na história do Espírito Santo no ano de 2017. A densa obra é resultado de longos anos de pesquisa do autor sobre a história capixaba e revela um pesquisador amadurecido em comparação aos seus livros anteriores. Em formato de ensaio, o livro é um esforço de síntese monumental que se estende por 516 páginas apoiadas em vasta bibliografia documental e também numa erudição historiográfica formidável sobre o que se considera atualmente a história do Espírito Santo.
O objeto principal do livro é refletir e propor como problema o mito fundador da história (e também da historiografia) capixaba. Nesse sentido, o leitor é convidado a conhecer o personagem histórico Vasco Fernandes Coutinho para além de sua tradicional roupagem historiográfica e assim fazer a sua devida crítica. Orbitando a figura do capitão donatário, o leitor é apresentado ao que se sabe de concreto sobre o personagem histórico e como foi a historicidade de sua construção no seio da historiografia capixaba. Schayder nos apresenta uma nova forma de interpretar a história capixaba a partir da chave do mito fundador, que para ele é resultante de um constante e secular esforço de criação narrativa de historiadores em aliança com as tradicionais elites que forjaram o estado capixaba.
O livro está dividido em cinco grandes partes. Em sua introdução, Schayder pede desculpas à comunidade de historiadores capixabas pela sua tentativa de romper com a estrutura narrativa clássica que fora construída ao longo de décadas. Nestas primeiras páginas o autor pede para não ser tratado como um traidor pelos eventuais leitores e explica que sua pesquisa é apenas um esforço para abrir novos horizontes possíveis de compreensão do lugar e do significado da história capixaba.
No primeiro capítulo, intitulado de Faça-se o mito!, Schayder recupera de maneira profunda a narrativa histórica sobre Vasco Fernandes Coutinho, sempre se apoiando fartamente, em documentos e bibliografia sobre o tema. Sua tese é que desde muito, historiadores capixabas encarnaram uma leitura de um capitão donatário perseguido e alvo de conspiração e que teria, por isso, fracassado em seu empreendimento colonial. A mácula original estaria então selada para sempre. A capitania, depois a província e o estado estariam condenados ao esquecimento e à perseguição, seja da Coroa, da elite imperial ou dos chefes executivos da vindoura república. O mito então se fez trauma e chegou aos dias atuais.
Em A história vos libertará (segundo capítulo), o pesquisador propõe que, apenas diante de uma percepção clara da atuação do mito no decorrer da história recente do Espírito Santo é que será possível se libertar de uma narrativa uníssona. Neste, que é o mais curto capítulo, Schayder propõe fazer uma arqueologia do mito e anuncia sua vontade de percorrer a história política do estado em busca de seus rastros.
No capítulo Conhecereis a história é exposta ao leitor uma pormenorizada atuação do mito, desde os momentos finais da fase imperial brasileira até o século XXI. Cada fase política do Estado brasileiro é apresentada em sua forma de lidar com o trauma da perseguição aos capixabas. A política de atuação dos governadores – sempre pedindo e implorando privilégios e ajuda ao governo federal – também é mostrada. Em determinados momentos, o poder central se inclina a aceitar as reclamações, mas na maioria do tempo o que se percebe é uma indiferença aos reclames capixabas. Destaca-se também aqui, a atuação dos grandes personagens da história estadual. Desde os principais governadores até suas contribuições para consolidar a identidade mítica em elementos simbólicos como o hino e a bandeira estaduais, que são símbolos que para o autor absorvem e encarnam o mito capixaba.
Por fim, em seu último capítulo, Qual progresso?, Schayder amarra sua derradeira crítica. Fica então patente o grande incômodo do autor. Esse incômodo se dá pela busca incessante pelo progresso. O historiador conclui propondo que o mito/trauma se consolida e se fortalece pela incessante apologia ao progresso praticada pela grande imprensa capixaba. Num ritual permanente orquestrado pelo poder constituído e a mídia local, incensa-se o mito da perseguição e a necessidade de superar a eterna conspiração contra os capixabas. O progresso se aproxima (mas nunca chega), pois o suposto atraso está umbilicalmente ligado ao desastre original e mítico herdado do donatário. Dessa forma, o ensaio é concluído e deixa como marca indelével o qualificado esforço de pesquisa para abrir novas chaves de compreensão sobre a história do Espírito Santo.
Thiago Vieira de Brito – Doutorando em História – UFES.
SCHAYDER, José Pontes. Passado a limpo: o estado capixaba e o seu mito fundador. Cachoeiro de Itapemirim: Edição do autor, 2017. Resenha de: BRITO, Thiago Vieira de. Revista do Arquivo Público do Estado do Espirito Santo, Vitória, v.1, n.2, 2017. Acessar publicação original [DR]
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