Os lugares de formação de professores de história em questão: dilemas, impasses e desafios para o século XXI / História & Ensino / 2015
A responsabilidade do professor, de que às vezes não nos damos
conta, é sempre grande. A natureza mesma de sua prática
eminentemente formadora sublinha a maneira como a realiza. Sua
presença na sala é de tal maneira exemplar que nenhum professor
ou professora escapa ao juízo que dele ou dela fazem os alunos, e
o pior talvez dos juízos é o que se expressa na “falta” de juízo. O
pior juízo é o que considera o professor uma ausência na sala.
Paulo Freire
A formação de professores de História para Educação Básica tem sido objeto de estudo ao longo das últimas décadas no Brasil. As pesquisas neste sentido têm participado, ativamente, da reflexão em torno da História Ensinada, posto sua relação necessária com as questões de ensino. Não há como pensar a formação sem ter a prática em perspectiva e, da mesma forma, as análises acerca da prática docente e, sobretudo, em relação aos diversos aspectos que permeiam as questões do ensino (a História do Ensino de História; o livro didático, sua produção e usos, entre outras tantas temáticas) informam as pesquisas sobre a formação do professor.
Pensar, então, a formação do professor é ter a prática em perspectiva e pensar a prática docente e os seus objetos implica, necessariamente, a reflexão sobre a formação. Deste ponto de partida, esse dossiê temático tem como objetivo contribuir com o debate sobre História e Ensino de História no país, por meio de reflexões relacionadas à formação do professor de história, em suas diversas dimensões – tanto aquelas ocupadas com os percursos de formação acadêmica quanto às relativas à formação adquirida no espaço escolar, por meio da experiência profissional. Nesse sentido, incorporam-se as pesquisas sobre currículos, habilitações, aportes teóricos, espaços de formação e, também, aquelas que dão conta das experiências docentes no âmbito da Educação Básica.
O dossiê entende, portanto, a formação não apenas como o processo de qualificação desenvolvido na universidade, mas também assume a experiência em sala de aula na Educação Básica como um processo formativo de igual importância. Assim, discutir a formação implica o enfrentamento do debate sobre o lugar da docência na construção da identidade profissional do historiador no século XXI, evidenciando os impasses forjados a partir dos binômios ensino versus pesquisa, produção versus reprodução, licenciatura versus bacharelado.
Da mesma forma, significa a problematização dos significados associados ao ensino de história e ao saber histórico escolar presentes na formação docente, seja aquela desenvolvida no percurso acadêmico, seja aquela construída ao longo do percurso profissional.
Diante do exposto, é como imenso prazer que apresentamos os artigos que compõem o presente dossiê, congregando uma rede de professores pesquisadores da área de Ensino de História de diferentes regiões e instituições de ensino do país. Ao longo desses textos, o leitor poderá perceber como cada autor(a) procurou responder ao desafio lançado de se pensar o lugar do professor de História no contexto da formação inicial e continuada, bem como da sua prática, tendo por referência os dilemas e impasses da construção da sua identidade profissional e das questões postas pela reformas em curso na Educação Básica, no Ensino Superior e na regulamentação do ofício de historiador.
O artigo “Ensino, História e Educação com / sem convergências”, de Carlos Augusto Lima Ferreira (UEFS) e Marcella Albaine Farias da Costa (UFRJ), que abre o presente dossiê, traz reflexões acerca da história do ensino de História ao problematizar questões relativas ao fazer docente nos processos de formação inicial no Brasil.
Em seguida, Nilton Mullet Pereira, Carla Beatriz Meinerz e Caroline Pacievitch (UFRGS), no ensaio “Viver e pensar a docência em História diante das demandas sociais e identitárias do século XXI”, abordam os desafios enfrentados pelo professor de História, diante das questões sociais e identitárias contemporâneas, em especial em relação ao diálogo intercultural, ao patrimônio cultural e aos passados imaginados nas mídias.
No artigo “A formação docente em História como profissional do magistério da Educação Básica”, Crislane Azevedo (UFRN) discorre acerca dos desafios da formação dos professores de História à luz das novas diretrizes curriculares nacionais para a formação inicial e continuada dos profissionais do magistério da Educação Básica e discute os possíveis encaminhamentos de propostas, levandose em consideração o repensar da organização e prática curricular dos cursos de formação docente inicial em História.
No próximo texto, intitulado “Aula de história: evento, ideia e escrita”, Helenice Rocha (UERJ) traz contribuições para o tratamento da aula e de seu planejamento como conteúdos na formação de professores de História a partir do diálogo com bibliografia historiográfica e pedagógica sobre o tema, considerando a especificidade dos conteúdos e objetivos da aula de História no ensino básico.
Na esteira desse debate, em “O que precisa saber um professor de História?”, Flávia Eloisa Caimi (UPF) dialoga com os autores do campo da História, do Ensino da História e da Educação, com a finalidade de problematizar algumas das principais demandas que se apresentam ao fazer do professor de História, diante da diversidade e complexidade das práticas sociais e culturais que adentram o universo da escola na contemporaneidade.
Tendo por foco os anos iniciais de trabalho docente, Osvaldo Mariotto Cerezer (UNMAT) e Selva Guimarães (UFU) apresentam o artigo “Professores de História iniciantes: entre saberes e práticas”. Neste texto os autores analisam alguns aspectos importantes relacionados à fase inicial da carreira profissional e suas implicações com a formação da identidade profissional docente, tomando como ponto de partida a análise de narrativas orais de professores de História iniciantes no Estado de Mato Grosso.
Em “Entre textos e práticas: ensino de História, instituição escolar e formação docente”, Renilson Rosa Ribeiro (UFMT) debate a tensa relação entre história ensinada, escola e formação de professores a partir da historiografia do Ensino de História no Brasil produzida nas últimas quatro décadas, evidenciando dilemas, problemas e perspectivas da prática docente na construção da identidade do profissional da História.
No ensaio “Lugar de formação: a produção intelectual discente sobre Ensino de História na pós-graduação strictu sensu na região Norte”, Mauro Cezar Coelho e Wilma de Nazaré Baía Coelho (UFPA) analisam como a temática do Ensino de História, com ênfase para os estudos sobre a formação continuada dos professores de História, tem se apresentado nas pesquisas de estudantes de pós-graduação strictu sensu na região Norte do Brasil.
O artigo “A produção de lugares na formação docente: experiências no Laboratório de Ensino de História da UFDG”, de autoria de Nauk Maria de Jesus e Fernando Perli (UFGD), tem como objetivo demonstrar como o curso de História da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), uma universidade nova, localizada numa espacialidade fronteiriça no Estado de Mato Grosso do Sul, marcada pela diversidade cultural, por desigualdades e conflitos sociais, tem atuado na formação de professores de História, tendo como foco de análise o Laboratório de Ensino de História (LABhis).
Fechando o dossiê com o texto “Entre expectativas e experiências: a gênese do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Didática da História (LEPEDIH) da UNESP / Assis”, Ronaldo Cardoso Alves (UNESP / Assis) historia os elementos que deram origem ao LEPEDIH na Universidade Estadual Paulista (UNESP), Campus de Assis, a fim de mostrar diferentes possibilidades de pesquisa em Ensino de História, por meio do repertório epistemológico da teoria da consciência histórica, oriunda da Didática da História, tendo em vista a discussão necessária a respeito da função pública da História.
A diversidade das abordagens e temáticas apresentadas aqui traduz o universo amplo e rico de estudos em desenvolvimento nas territorialidades do Ensino de História no Brasil, sempre expandindo e ressignificando suas fronteiras, construindo novas formas de pensar, sentir, ensinar e pesquisar o nosso fazer na interface entre a História e a Educação. Sem o envolvimento e a dedicação de nossos colegas convidados para a construção desse dossiê tal empreitada não seria possível e tão instigante.
Aqui registramos nossos agradecimentos aos autores pelo aceite de compor narrativas sobre a formação dos professores de História, o que na verdade significa falar também de nós mesmos, professores formadores das licenciaturas. Somos gratos ao Conselho Editorial da Revista História & Ensino, da Universidade Estadual de Londrina (UEL), por acolher de forma entusiástica e propositiva a ideia desse dossiê.
Aos possíveis leitores, esperamos que possam encontrar aqui possibilidades para pensar sobre o Ensino de História, tendo os professores da Educação Básica como personagens que merecem reflexão, diálogo e respeito. Boa leitura!
Wilma de Nazaré Baía Coelho – UFPA.
Renilson Rosa Ribeiro – UFMT.
COELHO, Wilma de Nazaré; RIBEIRO, Renilson Rosa. Os lugares de formação de professores de história em questão: dilemas, impasses e desafios para o século XXI. História & Ensino, Londrina,v.21, n.2, 2015. Acessar publicação original [DR].