Opinião pública e instituições políticas nos períodos moderno e contemporâneo | Dimensões | 2020
O dossiê que o leitor tem em mãos, intitulado “Opinião pública e instituições políticas nos períodos moderno e contemporâneo”, tem o propósito de refletir acerca do surgimento da opinião pública, de sua transformação e do seu papel na transmissão de demandas e posicionamentos dos cidadãos para a elite política, em sistemas políticos complexos.
Trata-se, portanto, de trazer à luz as diversas temáticas vinculadas à participação política nos espaços institucionais (das mais diferentes matizes), nos períodos moderno e contemporâneo. Procura-se, nessa direção, examinar o papel da Imprensa, dos movimentos sociais, dos intelectuais, dos partidos políticos e demais organizações congêneres, que, no curso da história, estiveram apoiados no estoque de ideias, percepções da realidade, justificativas, bem como em visões de mundo, e que contribuíram para conformar uma determinada ordem institucional.
Diante desse ponto de partida, o dossiê é inaugurado pelo artigo assinado por Josemar Machado de Oliveira e Ueber José de Oliveira, no qual procuram analisar a opinião pública desde a origem da expressão, na Europa Ocidental, entre os séculos XVI e XVIII, passando pelo século XIX, quando do surgimento das modernas democracias de massas, até a sua materialização tardia na realidade política brasileira, processo este que se dá de modo extremamente acidentado e errático. Procura demonstrar que essa tardia e retardatária formação ocorreu graças à tradição autoritária do país.
Em seguida, no segundo item, Júlia Leite Gregory trata do processo de construção dos Estados Nacionais ocorrido na América Espanhola, durante o século XIX. No texto, afirma que tal processo foi pautado por ideais europeus, que concebiam a América Latina como um lugar de barbárie, e que, com o intuito de transformar essa visão, os nascentes Estados nacionais latino-americanos procuraram atrair imigrantes europeus que pudessem promover um incremento populacional, buscando um outro patamar de civilidade. Procura demonstrar que tal processo redundou em tensões e crises sociais diversas, provocadas pela exclusão dos indígenas e dos segmentos menos abastados.
O terceiro texto, assinado por Higor Codarin, trata da constituição de um ethos revolucionário pelos militantes da esquerda armada brasileira. Faz opção por analisar a trajetória do Movimento Revolucionário 8 de Outubro, buscando compreender como os militantes da esquerda armada, partícipes da geração de 1968, construíram uma perspectiva revolucionária coletiva e individual, consolidando uma maneira específica de agir, baseada em certos valores éticos.
Em seguida, Dulce Portilho Maciel, Lígia Maria de Carvalho e Fernando Lemes, tratam da implantação de grandes estradas de rodagem na região da Amazônia, no norte do Brasil, durante a década de 1970. Enfatizam como a estratégia do regime autoritário em basear suas ações em grandes edificações, levou ao incremento de um espaço nacional integrado, embora eminentemente desigual.
No quinto tópico, David Anderson Zanoni trata da cobertura realizada pela Revista Veja a um escândalo político internacional ocorrido no ano de 1986. Trata-se da negociação de armas com membros do governo do Irã e o desvio de dinheiro durante o Governo Reagan, com a finalidade de promover ações do grupo paramilitar da Nicarágua, os então denominados “contras”. O autor se propõe a analisar como o periódico brasileiro tratou desse tenso momento político dos EUA.
Por fim, nem por isso menos importante, no último artigo que compõe o dossiê, Raphael Coelho Neto analisa a noção de intelectual presente na revista cultural Araucaria de Chile (1978-1990), periódico criado por intelectuais daquele país, os quais encontravam-se exilados pelo Governo de Augusto Pinochet (1973-1990), momento também marcado por ditaduras em quase todos os países do Cone-sul. Trata do caráter de resistência adquirido pela Revista, focando na maneira pela qual concebiam, naquelas condições adversas, a função do intelectual latino americano.
Para finalizar a presente apresentação, devemos destacar que a edição conta ainda com uma seção de artigos livres, que aborda diferentes temáticas do campo historiográfico. Ademais, vale frisar que o conjunto de textos reunidos neste dossiê, não tem a intenção de propor conclusões definitivas acerca da ideia e da prática da opinião pública.
Pelo fato de compreender um campo extremamente fecundo de investigações, até pelas diversas variáveis de análise e objetos que enseja, a finalidade desta edição é de, modestamente, abrir novos flancos de pesquisa, novas abordagens, bem como atrair novos pesquisadores interessados na temática. Isso é mais que necessário, sobretudo se levarmos em consideração o atual momento político brasileiro e mundial, quando presenciamos profundas transformações no formato moderno de opinião pública, com desdobramentos ainda totalmente imprevisíveis.
Uma excelente leitura!
Organizadores
Ueber José de Oliveira
Josemar Machado de Oliveira
Referências desta apresentação
OLIVEIRA, Ueber José de; OLIVEIRA, Josemar Machado de. Apresentação. Dimensões. Vitória, n.44, p. 7-9, Jan./jun. 2020. Acessar publicação original [DR]