OLIVEIRA, Margarida Maria Dias de. O Direito ao Passado – Uma Discussão Necessária à Formação do Profissional de História. Aracaju: Editora UFS, 2011. 302p. Resenha de: SILVA, Karla Karine de Jesus. “O Direito ao Passado”: Considerações de Margarida de Oliveira Sobre o Ensino de História. Cadernos do Tempo Presente, São Cristóvão, n. 10 – 10 de dezembro de 2012.
Margarida Maria Dias de Oliveira é professora Associada do Departamento de História da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Foi representante de História na Comissão Técnica do Programa Nacional do Livro Didático – PNLD 2007, 2008, 2010, 2011e 2013. É coordenadora da Coleção Ensino de História da EDUFRN que conta, atualmente, com seis volumes.
Publicado em 2011, o livro O direito ao passado – uma discussão necessária à formação do profissional de História discute o ensino de história como objeto da pesquisa histórica. Em 302 páginas, analisa a formação do pesquisador e do professor de história e a educação brasileira, tomando como referência alguns estudiosos da temática, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), a LDB, o livro didático, além de artigos publicados na Revista Brasileira de História e a posição da ANPUH neste sentido.
O livro é composto de três capítulos. O primeiro, intitulado O ensino de história como objeto de pesquisa no Brasil (p.37-116) apresenta como o ensino de historia foi ganhando espaço nas academias como objeto de pesquisa. Embora a proporção seja pequena em relação a outras temáticas, estudos importantes já foram desenvolvidos nesta área e gradativamente o interesse por investigações sobre história e educação vem ganhando espaço. Oliveira fez um levantamento dos artigos publicados na Revista Brasileira de História entre 1981 e 2002, traçando um demonstrativo em que compara a proporção dos textos que tem o ensino de história como objeto de investigação, e os textos que contemplam outras temáticas.
No capítulo dois, Matrizes teóricas francesas e cópias brasileiras no ensino de história (p.117-161), a autora realiza pertinentes considerações sobre a estrutura e composição dos Parâmetros Curriculares Nacionais de História, seus embates políticos e acadêmicos com a ANPUH, e as ideias trazidas pelos PCN para o ensino de História. O terceiro capítulo, A construção de referenciais para o ensino de História: limites e avanços (p.163-232) discorre sobre as contribuições e limites apresentados pela ANPUH quanto às definições sobre o ensino de História, o conteúdo prescrito pelos PCN e os usos do passado.
Oliveira explica que a iniciativa em desenvolver uma pesquisa sobre o ensino de História partiu primeiramente de questionamentos sobre a formação do profissional de história. O professor e o pesquisador muitas vezes são tratados de forma desconectada. Durante sua atuação como professora do ensino fundamental e do ensino médio, a autora percebeu que as necessidades dos alunos, suas inquietudes e desinformação histórica – quando e onde aconteceu, quais personagens vivenciaram o fato que se pretende interpretar etc. – e a dificuldade destes compreenderem a importância em se aprender história, advém principalmente de problemas internos ao conhecimento histórico e seu ensino (o que e como ensinar). Conforme a obra, a graduação em história enfatiza a pesquisa e acaba formando professores despreparados para a sala de aula. Essa discussão, durante muito tempo esteve a cargo dos cursos de pós-graduação em educação e poucos profissionais de história debruçaram-se sobre isso.
O ensino de história como objeto de pesquisa é recente. O interesse da academia e da ANPUH por pesquisas neste campo começaram especialmente a partir dos anos 1970. Passam então a fazer parte das reflexões, análises e pesquisa, de forma mais profunda, entre os licenciados e bacharéis de História, preocupações com a formação do professor, do ensino de História e seus correlatos. Em 1977, a ANPUH promove discussões sobre a inserção no seu quadro de sócios de professores de história de outros níveis do ensino, além dos professores universitários que eram os que fundamentalmente compunham a Associação (p.48).
A Revista Brasileira de História, uma “vitrine nacional desse crescimento”, como afirma Oliveira, contribuiu para um olhar mais aguçado sobre o ensino de história e a pesquisa sobre ele. Significativos artigos e estudos foram publicados a partir de 1980. Porém, este número foi consideravelmente menor em relação a outros temas em história. Dos cinquenta e sete textos publicados entre 1981 a 2002, trinta e sete foram de instituições paulistas (p.65). Isso evidencia a defasagem nos estudos em outras instituições no Brasil neste período.
A inserção dos professores de história dos demais níveis de educação no quadro de sócios da ANPUH contribuiu para um olhar mais significativo das pesquisas sobre história e educação. Na assembleia geral, ocorrida no XIII Simpósio da ANPUH em Curitiba, ficou estabelecido que “todos os Simpósios deveriam ter cursos com o tema escolhido para o evento e seu tratamento nos ensinos fundamental e médio” (p.71). Oliveira lembra que pela primeira vez os artigos relacionados ao ensino de História não foram relegados a uma seção separada do periódico, mas apresentados com o mesmo peso que os demais.
Em “O direito ao passado…” o livro didático e os PCN receberam atenção particular nesta obra. Sobre o primeiro, a autora afirma que deve haver pesquisas mais profundas sobre ele. O mesmo funciona como um expositor da história ensinada ao aluno e, portanto, precisa considerar tanto os conteúdos, quanto a faixa etária e a forma como o conhecimento é transmitido em suas páginas. O passado construído e transmitido deve ser questionado: “qual o passado a que todo cidadão tem direito?” (p.87). Apesar de o livro didático conter inúmeras falhas, muitas delas decorrentes inclusive da própria forma como o ensino de história deve ser ministrado, conforme orientado no PCN para o ensino de História, e devido a isso ser alvo de muitas críticas dos profissionais de ensino e pesquisa, a maioria delas bem fundamentadas, Kazumi Monaka lembra que “estão olhando restritivamente o produto quando se deveria questionar a sociedade que está demandando este produto” (p.114).
Esta demanda vem principalmente do que é normatizado nos Parâmetros Curriculares de Ensino de História. Oliveira observa que a base teórica dos PCNH é francesa, mas que pouco se detém nas sugestões dos autores no qual se norteiam. Marc Ferro, Jaques Le Goff, Michel de Certeau, apenas para se mencionar alguns listados em sua bibliografia, defendem uma história narrativa e cronológica para ensinar história a crianças e adolescentes. A história temática, a história nova, só seria introduzida a partir do ensino médio. Segundo estes, não há maturidade suficiente para se compreender uma história temática quando se é ainda muito jovem. Crianças e adolescentes da primeira fase precisam localizar-se no tempo e espaço, possibilitado pela narrativa histórica. Um dos problemas é que os PCNH têm estes autores como norteadores, mas propõem uma história temática, que é refletida no livro didático, nos projetos político pedagógicos das escolas e nas aulas dos professores (p.139-160).
Nesta obra Margarida Oliveira convida os leitores a reflexão. Sua pesquisa lança um debate sobre a Revista Brasileira de História (RBH), a ANPUH, os PCN, o livro didático, a formação do professor e do pesquisador de história e o papel destes elementos na educação. A análise desse material mostrou que há neles uma ausência de debates profundos sobre a formação do cidadão brasileiro.
Apesar do “progresso” que a ANPUH e a RBH fizeram ao conceder espaço ao ensino de história, ainda há muito que avançar. O ensino ainda é visto por muitos profissionais de pesquisa em história, como questão menor ou pensado como prerrogativa exclusiva das áreas de pedagogia e psicologia educacional. Os PCN e o livro didático devem contribuir para a formação de um cidadão capaz de compreender, interpretar e atuar em seu mundo. Em suma, é urgente se “estabelecer parâmetros para um roteiro e dimensioná-lo” no que se refere ao o ensino de história, que nos “oferece” um passado a que todos temos direito.
Referências
OLIVEIRA, Margarida Maria Dias de. O Direito ao Passado – Uma Discussão Necessária à Formação do Profissional de História. Aracaju: Editora UFS, 2011. 302p.
Karla Karine de Jesus Silva – Formada em História pela Universidade Federal de Sergipe. Mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em História da UFS.
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