Na presente obra, Maria Helena Rolim Capelato, apresenta uma análise comparada entre a propaganda política varguista no Estado Novo (1937-1945) e o peronismo (1945-1955). O objetivo é mostrar como o conteúdo e a forma das mensagens propagandísticas circularam da Europa para o Brasil e a Argentina, onde foram reproduzidas com sentido novo, relacionado às conjunturas históricas particulares.
Utilizando-se de vasta documentação e conceitos como representação e imaginário social, Capelato procurou resgatar o significado da propaganda política idealizada e posta em prática por Getúlio Vargas e Juan Domingo Perón na configuração de governos autoritários em momentos históricos distintos de Brasil e Argentina. Destaca-se, contudo, que a propaganda política torna-se estratégia em qualquer regime, porém, adquire força maior naqueles em que o Estado detém o monopólio dos meios de comunicação, caso exemplar do Estado Novo e do peronismo.
A obra indica as diferenças históricas de Brasil e Argentina, e o momento de ascensão tanto de Vargas quanto de Perón ao poder. No caso brasileiro deixa claro que Getúlio Vargas sobe ao poder por um golpe, realidade diferente da Argentina de Perón que assume o Governo em 1946, através do voto popular. Neste sentido, a propaganda política se estabeleceu de forma mais intensa na Argentina, uma vez que Perón dependia do vínculo com os trabalhadores. Já no Brasil, por força de um golpe e de uma constituição outorgada, aliada ao apoio dos militares e das elites dominantes, tornou-se menos acentuada à intensidade de divulgação das propagandas pró-regime.
Enquanto Getúlio implantou sua política num contexto pós-primeira guerra, com o temor constante da Revolução Bolchevique, o fracasso do Liberalismo e a consequente crise de 1929, Perón assumiu o poder após o término da Segunda Guerra Mundial, com a vitória dos aliados contra o totalitarismo. Nesta perspectiva, a autora acabou inovando ao comparar dois governos, vistos por muitos com enorme semelhança, tratando de diferenciá-los mais do que aproximá-los, embora, em nenhum momento negue as características compartilhadas por ambos os regimes.
Por meio do controle social Vargas e Perón buscavam harmonizar, unir, homogeneizar a nação, negando assim, a possibilidade de conflitos e manifestações. Tratavam o governo como extensão de suas famílias. A propaganda política, portanto, tornou-se instrumento de coerção simbólica, tendo o governo seu monopólio. Para a autora as ditaduras modernas lançaram mão da violência simbólica com vistas a seduzir as massas, e isto se deu através da relação entre um passado simbólico interiorizado e os símbolos do presente. Corroborando, então, na promoção da identidade nacional nos regimes autoritários. Tinham assim, os dois regimes, objetivos comuns em relação à propaganda política, ou seja, conquistar o apoio da sociedade.
Perón e Vargas eram tidos como protetores da nação. Eles trabalhavam para todos. Enquanto o lema do varguismo era o trabalhismo, no caso argentino era o justicialismo. A política trabalhista tinha como meta eliminar a miséria e garantir os direitos dos trabalhadores, atendendo a suas reivindicações, além de combater o analfabetismo e integrar o Brasil. Para isso, era necessário organizar as massas, controlá-las. Já o justicialismo concorre para o bem-estar social. A realização da justiça social no Brasil dependeria da reforma do Estado, na Argentina esta reforma já havia ocorrido. Assim, a justiça social de Perón implantou-se com êxito se comparado ao varguismo.
Outro ponto a ser destacado é a preocupação dos regimes em formar um sentimento de identidade nacional. Para isso, era importante à questão da raça. A miscigenação, vista até os anos 30 no Brasil como fator de atraso econômico, a partir do Estado Novo, passou a ser concebida como benéfica ao progresso da nação, já que a intenção era formar a raça brasileira. Na argentina o problema para Perón era afastar o inimigo estrangeiro, recuperar o sentimento e o orgulho do novo homem argentino. Em síntese, no Brasil deveria “fazer-se” e na Argentina “dar vida ao já feito”.
O controle e manipulação não se restringiram apenas aos meios de comunicação. Cartilhas escolares, artes plásticas, literatura, cinema, teatro, arquitetura, etc., serviram aos interesses do Estado. O resultado da manipulação deveria ser controlar e dirigir as massas.
Varguismo e peronismo apropriaram-se de um novo sentido a democracia. No Brasil democracia autoritária, na Argentina democracia justicialista. Liberdade disciplinada, tudo em nome do nós-coletivo em detrimento do eu-individual. Esta democracia autoritária seria capaz de promover o progresso econômico, estando à justiça social subordinada a esta etapa. Por isso, fica claro ao comparamos o Estado Novo com o peronismo, a pouca mudança nas condições de vida dos trabalhadores brasileiros. Enquanto a reforma do Estado era prioridade do governo varguista, no peronismo a justiça social dava sentido à nova democracia.
Inevitável nesta obra são as comparações entre o nazi-fascismo e os regimes varguista e peronista. No entanto, a autora faz questão de não defini-los com estes fenômenos europeus. Insiste também em separar os conceitos de regimes totalitários e autoritários, afirmando categoricamente que na América não houve nenhum regime que se enquadrasse no sistema político característico do nazi-fascismo. Segundo ela “a repressão foi intensa e as liberdades foram anuladas nesse período, mas não ocorreu o monopólio absoluto do Estado no plano físico, jurídico ou econômico” (CAPELATO, 1998, p.32).
As imagens no varguismo e peronismo exaltavam a figura do líder. Buscava-se com isso formar o Estado/Nação, através da unidade nacional. O cidadão em contrapartida deveria amar o chefe político e a pátria, respectivamente. O controle do Estado sobre os meios de comunicação e a produção cultural sob a tutela do governo coadunavam para estabelecer os princípios da política populista. Contudo, como já explicitado, existiam finalidades diferentes. Frisamos justamente, neste sentido, uma das grandiosidades desta obra. Preferiu, a autora, privilegiar particularidades e recortes específicos, fugindo de expressões generalizantes como o próprio termo populismo.
Acreditamos, por fim, ser esta obra leitura obrigatória para quem se propõe a estudar este período, ou mesmo, quem trabalha com fontes periódicas ou representações políticas. Haja vista, a profundidade teórica e o rigor metodológico dado à extensa documentação analisada pela autora.
Maurilio Dantielly Calonga – Mestrando em História (UFGD).
CAPELATO, Maria H. R. Multidões em cena. Propaganda política no varguismo e no peronismo. Campinas: Papirus, 1998. Resenha de: CALONGA, Maurilio Dantielly. Revista Trilhas da História. Três Lagoas, v.2, n.3, p. 187-189, jul./dez. 2012. Acessar publicação original [DR]
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