Mídias, leituras e viagens / Varia História / 2001
A revista do Programa, Varia Historia, redefiniu, a partir de 1999, os critérios para seu novo perfil, e iniciou sua reformulação editorial a partir do número 20, publicado no primeiro semestre daquele ano. Entre outros objetivos, pretendeu-se ampliar a participação de pesquisadores nacionais e internacionais refletindo o intercâmbio acadêmico que o Programa de Pós-graduação em História da UFMG vem solidificando. O número 25 apresenta mais uma inovação em seu projeto editorial: a organização de um dossiê temático. A opção pela confecção de dossiês se liga à estratégia de maior vinculação da revista às linhas de pesquisa que compõem o referido Programa, a saber: História e Culturas Políticas, História Social da Cultura, e Ciência e Cultura na História.
A Varia Historia vem se firmando como espaço privilegiado do debate histórico e a organização de Dossiês permitirá que as diferentes linhas explorem temas de pesquisa dentro do universo teórico de cada uma delas, envolvendo seus pesquisadores na preparação dos mesmos, em constante intercâmbio com os estudiosos de outras instituições. Os Dossiês também pretendem refletir os seminários e os debates promovidos pelas linhas no decorrer do ano acadêmico, envolvendo o corpo docente e discente e pesquisadores convidados.
O Dossiê Mídias, leituras e viagens foi uma iniciativa da linha de História Social da Cultura e reflete alguns dos temas que têm instigado os estudos no campo da cultura: a produção e a circulação dos livros, as práticas de leituras, os mecanismos de difusão e mídia, as teorias de recepção, tendo como pano de fundo o fenômeno e o movimento das viagens como espaços privilegiados para a produção de conhecimento. As viagens que nos interessam aqui são aquelas que significaram renovação do conhecimento, fruto da observação de todos aqueles, que “por meio das viagens, querem conhecer utilmente o mundo”.
O primeiro texto foi gentilmente cedido pelo Prof. Robert Darnton e discute os processos de formação e de difusão de notícias na França do Antigo Regime, tecendo instigantes questões a respeito da formação e do conceito de mídia para a época. Outra novidade que o autor apresenta é que a leitura do artigo não se esgota em si mesmo. O leitor é convidado a visitar a versão eletrônica do paper e acompanhar os caminhos e os instrumentos de investigação disponibilizados paralelamente on-line em janelas que podem ser acessadas enriquecendo a leitura e explorando as possibilidades que estes novos suportes apresentam à investigação histórica.
O texto do Prof. Miguel Benitez foi apresentado numa palestra promovida no referido programa no ano de 2001. Analisa a intersecção dos movimentos das viagens e da circulação de idéias heréticas, libertinas, muitas vezes na forma de livros ou textos proibidos, no espaço ibérico durante o período moderno.
Guiomar de Grammont no artigo “Catarse e teoria da leitura” explora as questões teóricas com que a história da literatura se debate hoje em torno das teorias da recepção, esta última reconstituída sempre como fragmento, como espaço imaginário que se caracteriza pela pluralidade e diversidade.
O tema da produção de conhecimento em relação aos fenômenos das viagens na esteira da constituição da identidade brasileira e da modernização da nação, no alvorecer do período republicano, foi o tema de estudo da Prof. Thais Velloso Cougo Pimentel. Num movimento inverso, são agora os brasileiros que se transformam em viajantes, buscando uma Europa mítica, berço de civilização, o exemplo a ser seguido, que permitirá a entrada do Brasil na modernidade.
A revista mantém sua prática de também receber contribuições espontâneas agregadas na seção Artigos. Mantendo-se como espaço referencial para os pesquisadores de diversas regiões e instituições que investigam a história de Minas Gerais, o presente número apresenta quatro artigos sobre a região entre os séculos XVIII e XIX.
Marco Antônio Silveira aborda a questão das práticas políticas utilizadas pelos diversos agentes na conformação do espaço minerador no início do século XVIII, quais sejam a conquista e a soberania. Ângelo Alves Carrara contribui para o entendimento do desenvolvimento urbano da sociedade mineira oitocentista em consonância com a pujança do setor agrário normalmente mais bem estudado. Dois artigos contribuem para desvendar o universo dos escravos que constituíram a maioria da população mineira no século XIX, tendo sido uma sociedade escravista voltada para a produção interna de produtos. Antônio Henrique Duarte Lacerda aborda o fluxo e as variáveis das alforrias concedidas em Juiz de Fora no declínio da sociedade escravocrata e Eliane Silva Guimarães analisa os crimes passionais ocorridos entre a comunidade escrava no mesmo município ao longo do século XIX.
A Varia Historia tem sido também, ao longo dos anos, espaço plural de debates sobre a história e tem recebido contribuições sobre as mais diversas temáticas. Johnni Langer e Sérgio Ferreira dos Santos apresentam um estudo sobre a criação da imagem oitocentista dos povos escandinavos, desnudando a constituições de mitos equivocados sobre a cultura e a sociedade dos povos nórdicos. Também explorando a questão da produção de mitos, Adriana Barreto de Sousa examina o processo de constituição da imagem do General Osório e do Duque de Caxias como heróis necessários à legitimação do regime republicano em seus diversos projetos, incorporando e justificando a participação dos militares na vida política brasileira.
Por fim, Jeffrey Needlle faz uma instigante resenha do livro de Kirsten Schultz, intitulado Tropical Versalles, enfatizando o aspecto inovador da abordagem que deixa de lado os lugares comuns que marcam as análises sobre a transferência da Corte portuguesa para o Brasil, salientando a forma como a monarquia redefiniu e mudou a sociedade e como estas mudanças foram percebidas pelos próprios brasileiros.
Júnia Ferreira Furtado – Organizadora.
FURTADO, Júnia Ferreira. Apresentação. Varia História, Belo Horizonte, v.17, n.25, jul., 2001. Acessar publicação original [DR]