A temática do Patrimônio vem ganhando cada vez mais espaço dentro das discussões do campo da História. Um esforço realizado não apenas por historiadores, mas por diversos pesquisadores de diversas áreas acadêmicas. Dentre as diversas possibilidades de compreensão dessa temática, temos as que se dedicam às estruturas provenientes da industrialização, que atualmente ganha destaque nas pesquisas nacionais.
De modo geral, as primeiras iniciativas que destacaram os vestígios industriais e sua importância, ocorreram na Inglaterra, por volta dos anos de 1950. Passado mais de uma década de discussões, em 1965, seria promovido um inventário do patrimônio industrial britânico e, a partir dai, a discussão ganharia mais espaço em diferentes países, surgindo nos anos seguintes, espaços de preservação de estruturas e vestígios industriais. Congressos e Convenções para discutir a temática, também se tornaram mais frequentes. Já em finais dos anos de 1970 e início de 1980, após a criação do Comitê Internacional para Conservação do Patrimônio Industrial – TICCHI, durante o Terceiro Congresso Internacional para a Conservação dos Monumentos Industriais, na Suécia (1978), a temática do patrimônio industrial é reconhecida institucionalmente e ganha destaque e força nas discussões acadêmicas em diversos países.
No Brasil, o tema e preocupação com estruturas e vestígios da industrialização ganhou destaque na academia a partir de finais dos anos de 1980 e início de 1990. Contudo, a preservação de bens, que hoje são caracterizados como patrimônios industriais, remetem os anos de 1950, quando foi considerado e preservado como patrimônio nacional o trecho da ferrovia Mauá-Fragoso e a locomotiva a vapor “Baronesa” (1954), e as estruturas remanescentes da Real Fábrica de Ferro São João de Ipanema, em Iperó (1964). Dentre os diferentes tipos de Patrimônio Industrial, o Ferroviário se destaca, principalmente, a partir da promulgação da lei 11.483 de 31 de maio de 2007, em que as estruturas e complexos ferroviários foram reconhecidos como patrimônio e necessários à preservação da memória e história nacional, devendo ser preservadas pelo IPHAN.
Assim, o dossiê que se segue é pautado pelo objetivo de apresentar resultados de pesquisas que tenham em foco a análise do Patrimônio Industrial e de seus conteúdos, buscando demonstrar seu caráter amplo e, dentro do possível, multidisciplinar, e suas relações com o universo social, político e cultural.
Nossa proposta foi sistematizada e composta por uma entrevista e 7 artigos, de especialistas de diferentes áreas acadêmicas, o que engrandece ainda mais a temática, trazendo diferentes perspectivas e olhares que contribuem para o enriquecimento da História. A entrevista foi feita com o historiador português José Lopes Cordeiro, pesquisador de grande importância mundial para a temática do Patrimônio e um dos responsáveis por chamar a atenção para a importância do Patrimônio Industrial e suas possibilidades.
Na seção de artigos, o primeiro texto é Reflexões acerca do Conceito de Patrimônio Cultural sob a Ótica do Patrimônio Industrial e da Arqueologia Industrial, de autoria de Ronaldo André Rodrigues da Silva e José Manuel Lopes Cordeiro. Os autores dissertam sobre a evolução histórica da ideia de patrimônio, problematizando o surgimento do conceito / ideia de Patrimônio Industrial, demonstrando sua importância para a compreensão socioeconômica e cultural da sociedade brasileira.
Por sua vez, o texto de Daniela Pistorello, Uma usina hidrelétrica ao sul do Brasil: tombar para preservar?, problematiza a ideia de preservação de estruturas industriais no país. Ao contextualizar o processo de tombamento e inscrição de seu objeto, a Usina Hidrelétrica Gustavo Richard (Santa Catarina), demonstra que a preservação gera diversos conflitos de interesses entre órgãos e secretarias, o que, por sua vez, acabou deixando a estrutura em questão sem qualquer uso, ou melhorias, sendo então o tombamento ineficaz ao propósito do Patrimônio.
Outras autoras também se debruçaram sobre um objeto em Santa Catariana, Michele Gonçalves Cardoso e Elaine Rodrigues, em Indústria Carbonífera em Siderópolis: Reflexões e disputas em torno dos patrimônios da Companhia de Siderurgia Nacional. Não obstante à Daniela Pistorello, relatam as disputas em torno do uso e preservação das estruturas da CSN, após o término de suas atividades no município em questão. Por meio de fontes orais, as pesquisadoras demonstram as diferentes tentativas de preservação e memória dos diferentes grupos e agentes, problematizando seus interesses e o processo de tombamento e preservação pelo poder público.
Em Biscoitos históricos: a musealização da Fábrica Leal Santos – Rio Grande / RS, Oliva Silva Nery discute a ideia de Patrimônio, com foco no Industrial, buscando compreender as possibilidades na reutilização de bens patrimoniais para compreender a história local. Em seu estudo, dedica-se às propostas de musealização de objetos de uma fábrica de biscoitos, parte do acervo de um museu local, a fim de problematizar a real abrangência e eficiência desse modelo de preservação patrimonial e se realmente contribui para preservação da história e memória.
Por fim, contamos com três manuscritos que se dedicam à compreensão de estruturas industriais similares e que, atualmente, é a mais discutida: as estruturas e complexos ferroviários. O primeiro texto a tratar dessa temática é o de Taís Schiavon, Patrimônio da Mobilidade no Brasil e o processo de identificação e valorização do território. Ferrovias e as paisagens industriais da região Oeste do Estado de São Paulo. Partindo da compreensão das estruturas ferroviárias enquanto estruturas da industrialização, essa autora faz um retrospecto histórico das ferrovias paulistas e sua função estruturante, como impulsionadora do surgimento de centros urbanos. Problematiza a relação das ferrovias com o crescimento e desenvolvimento, não apenas de cidades, mas de espaços industriais. Para atingir esses objetivos, faz uso de algo ainda pouco trabalhado pelos historiadores, ferramentas de georreferenciamento, resultando em diversos e importantes mapas. Por fim, ressalta a importância da preservação dessas estruturas e complexos industriais para a compreensão da memória e história de todo território paulista.
Já com objetivo de compreender como estão sendo realizados os processos de preservação do patrimônio ferroviário, Alice Bemvenuti, em Aspectos Históricos da musealização do Patrimônio Ferroviário brasileiro, busca problematizar a ação dos grupos que atuam em prol da conservação das estruturas das ferrovias no Brasil, mais especificamente da PRESERVE / PRESERFE. Essa pesquisadora, valendo-se de fontes orais, demonstra os conflitos e as memórias que esses grupos buscam preservar sobre as estradas de ferro no país.
Como último texto do dossiê, A História e o Patrimônio Industrial a partir de outro olhar: o que dizem os pisos do Complexo FEPASA (Jundiaí / SP, Brasil)?, de autoria de Juan Manuel Cano Sanchiz, procura agregar ao campo dos historiadores, a visão e compreensão da temática do Patrimônio Industrial Ferroviário brasileiro, a partir da ótica da Arqueologia Industrial, que ainda é pouco estudada. Valendo-se das metodologias da Arqueologia esse pesquisador demonstra como a arqueologia de vestígios materiais recentes, contribui de modo significativo para o campo da História. Dedicando-se ao estudo dos diferentes pisos do Complexo de Oficinas FEPASA, na cidade de Jundiaí, Sanchiz disserta que as estruturas industriais ferroviárias, principalmente as Oficinas, são locais de trocas de tecnologias e técnicas do Brasil, com outros países, demonstrando que o que era utilizado naquele espaço, era aplicado após o estudo e visitas em espaços industriais de outros países, como Inglaterra e Estados Unidos. Por fim, demonstra a importância da multidisciplinaridade e cruzamento de diversas fontes (orais, escritas, materiais), para compreender e preservar esses importantes espaços.
Por fim, esperamos cumprir com nosso objetivo de propor essa temática e que, com a leitura dos artigos e entrevista, possamos contribuir com a discussão e promoção da importância do Patrimônio Industrial, enriquecendo ainda mais suas relações com as pesquisas da área da História.
Eduardo Romero de Oliveira
Lucas Mariani Corrêa
OLIVEIRA, Eduardo Romero de; CORRÊA, Lucas Mariani. Apresentação. Faces da História, Assis, v.4, n.1, jan / jun, 2017. Acessar publicação original [DR]
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