História e Natureza / Tempos históricos / 2011

Em boa hora vem à tona este número de “Tempos Históricos”, tratando de história ambiental. Enchentes, deslizamentos, secas, furacões, entre outros fenômenos, tem se verificado com maior freqüência e intensidade, causando grandes prejuízos e ceifando vidas. Catástrofes naturais (seriam de fato naturais ou conseqüência de um tipo de ação humana sobre o meio?) de toda ordem tem levantado perguntas, também de toda ordem. Verifica-se um interesse público crescente e a temática ambiental vem ganhando consideráveis espaços na imprensa. Também na esfera política o tema se faz presente com discursos inflamados, mesmo que o foco não esteja muito claro. Recentemente assistimos o debate político em torno do Código Florestal Brasileiro e a polarização que este debate gerou, colocando de um lado, os “ecologicamente corretos” e do outro, os ruralistas, cujo objetivo é produzir comodities agrícolas. O fato é que conceitos como sustentabilidade e recursos naturais se fazem presente nos embates gerados por grandes projetos tais como a transposição das águas do São Francisco, a questão da matriz energética através da construção de grandes usinas hidrelétricas, ou termoelétricas / termonucleares. Pergunta-se (talvez não com a intensidade necessária) pelos modelos mais corretos a serem adotados.

A questão ambiental, portanto, vai gradativamente se impondo na agenda acadêmica, também dos profissionais das ciências humanas e, no nosso caso, dos historiadores. Temos que estar atentos e buscar compreender melhor a forma como os humanos interferem no meio ambiente e como este interfere na vida humana. É um campo de conhecimento ainda em estágio inicial como especialidade da história, no entanto, despontando como uma área de pesquisa que demonstra bastante vigor. Vários são os textos produzidos tais como, teses, dissertações, TCCs, bem como Simpósios, Congressos, entre outros, o que aponta para o interesse crescente para a compreensão desta temática na perspectiva da história e com as ferramentas teóricas e conceituais da história. O fato é que a realidade exige que também a história se ocupe com a temática ambiental e este labor historiográfico exige a interdisciplinaridade. O constante diálogo com outras ciências é uma marca constitutiva da história ambiental, a qual exige, como propõe Donald Worster, que o historiador se aprofunde mais, até encontrar a própria terra, entendida como um agente e uma presença na história.

É interessante perceber que o debate em torno da questão ambiental já se fazia presente entre nós no período colonial, como demonstra José Augusto Pádua em sua obra Um sopro de destruição. Pensamento político e crítica ambiental no Brasil escravista (1786-1888). Sim, estava presente, bem articulado, no entanto, ignorado pelo staff historiográfico. Afinal, como seria possível uma contribuição intelectual vir da periferia? Esta possibilidade não estava presente entre intelectuais especialmente da Europa.

Oriundos da Europa, os imigrantes que ocuparam as várias colônias do sul do Brasil tiveram que lidar com a questão ambiental e com um agravante: a natureza que passavam a ocupar lhes era desconhecida. Aqueles que se ocupam com o estudo dos processos de colonização percebem que a natureza tem forte carga negativa. O binômio barbárie x civilização se fazia presente de forma muito intensa e a natureza representava a barbárie. É freqüente a documentação na qual o imigrante avalia a sua chegada ao Brasil com expressões tais como: “Quando aqui chegamos, não tinha nada. Era só mato!” O ambiente, a natureza, era a inimiga a ser vencida, cedendo lugar à civilização e ao progresso. Era o vazio, o “nada” que incomodava. Hoje, vive-se a positivação da natureza e as questões ambientais ganham conotação às vezes romantizada, na qual a natureza é o lugar onde o homem é um visitante que não permanece (Wilderness Act – 1964). Aí estamos diante de um problema que é a retirada do ser humano como se este não fosse mais integrante da natureza. A militância apaixonada também se coloca como um entrave ao avanço da história ambiental como uma área de investigação do historiador.

Com o presente número de Tempos Históricos, pretendemos contribuir para este importante debate. Considerando as diferentes origens, formações e enfoques dos vários autores da presente coletânea de textos, entendemos que as temáticas aqui abordadas trazem uma importante contribuição para a história ambiental.

João Klug – Professor Doutor do Departamento de História da UFSC.


KLUG, João. Introdução. Tempos Históricos, Paraná, v.15, n.2, 2011. Acessar publicação original [DR]

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