História do tempo presente | Gilson Pôrto Júnior
A obra História do tempo presente, organizada por Pôrto Jr.1 contempla dezessete capítulos cujo tema central perpassa as considerações da História do Tempo Presente (HTP) na educação brasileira e na escrita da História por historiadores. Os demais autores são também professores nacionais e internacionais. Esta obra a ser resenhada apresenta como tema central o ensino da História no e do Tempo Presente. Ela é introduzida pela apresentação da HTP, seguida de contribuições teóricas, passando para a terceira parte na qual se expõe considerações sobre o professor pesquisado, levando a seguinte referente à pesquisa e ensino de História do Tempo Presente e fechando o trabalho com uma parte dedicada a História e Historiografia e seus debates em torno do presente.
O professor de História precisa despertar no aluno o interesse de desenvolver pesquisas que envolvem a HTP. Esta recente abordagem no campo da História, iniciada nos anos 70, portanto situada na História Contemporânea, despertou o interesse da Escola do Annales para as lições de uma história do presente. A partir daí os estudos, seja social ou político tomaram a história de um passado recente como base para suas interpretações.
As reflexões essenciais sobre o presente remetem ao tempo como matéria-prima e como ofício do historiador ou do educador, assim como o exercício constante de sua transformação. A obra como um todo quer ampliar a aprendizagem daquilo que o autor organizador, posicionou entre o historiador e o profissional da educação.
Helena Muller comenta que já E. P. Thompson afirmava que “ao historiador, cabia trabalhar o passado; o presente seria pertinente aos estudos da sociologia.” Porém, atualmente o estudo da HTP vem ganhando espaço. Sendo assim, a crise do século XX fez com que a sociedade desenvolvesse uma consciência coletiva, avaliando os acontecimentos do presente com mais empenho em analisar suas causas, pois a conseqüência ela esta presenciando, na História política de cada país.
Os historiadores, sem saberem ao certo, discutem o início desse período. Pode ser que ele comece com a Queda do Muro de Berlim, talvez com a Segunda Guerra Mundial ou então, as guerras coloniais, o que se sabe ao certo é que a HTP é escrita pela testemunha dos acontecimentos. Podemos considerar que o “tempo presente começa com uma catástrofe, ou pelo menos a cada grande ruptura”, assinalando uma compreensão do presente.
Pietre Lagrou em sua exposição comenta, talvez exagerando um pouco, que a HTP tem aproximadamente dez anos, e que a época moderna é algo muito antigo e o período contemporâneo terminou com a Segunda Guerra. Gilson Jr. e Aubers Neves apresentam as possibilidades de interpretação do fato histórico no pensamento educacional. Primeiramente considerando a teorização para o conceito fato, advindo do positivismo, bem como seu conceito. Para estes autores que utilizam Lalande (1999) a palavra fato é sinônima de fenômeno.
Dessa forma a história pode ser entendida como uma variada bateria de fatos igual a fenômenos humanos. Portanto, a história começa a pensar o passado agindo inevitavelmente sobre os acontecimentos atuais. Nela as demarcações do tempo presente é só um caminho e o passado é apenas confirmação que aparecerá no julgamento final, na qual as atitudes de cada serão lembradas e determinarão o futuro, pois não podemos inventar nossos fatos, os rumos dos acontecimentos que determinam a evolução e as transformações da HTP.
A contribuição de Ricardo Müller nesta obra aborda a temática da História e narrativa. Segundo este as linhas de discussão sobre a narrativa histórica tendem a desordenar os modos tradicionais de interpretação, além de a narrativa estar vivendo uma fase de “Renascimento” com novas perspectivas. Seja como for, a narrativa não é o que realmente aconteceu, mas um ponto de vista, do objeto pesquisado.
No que tange a Historiografia, Biografia e Ética, Fernando Martins complementa o debate da análise histórica na qual o historiador fica, muitas vezes, se perguntando se deve julgar ou compreender a história. Assim a leitura do livro expõe o dilema dos professores da disciplina de História como sendo a falta de interesse dos alunos e as exigências curriculares. Este tema é principalmente desenvolvido pelo professor Dr. André Joanilho. A indagação dos estudantes de história remete a uma questão norteadora: para que serve a história? Os educadores torcem para que novos materiais mais interessantes e que atenda às suas necessidades sejam formulados e disponibilizados para o ensino da disciplina de história. Contudo os profissionais precisam de objetividade e imaginação a fim de responder a pergunta acima apresentando a pé de igualmente a História a outras disciplinas, “servindo para nos deixar mais inteligentes, para alargar os nossos horizontes, para pensar a nossa sociedade a partir das diferenças”.
A formação de professores de História é abordada por Ana Heloísa Molina, no capítulo sete ela esboça as mudanças quanto à formação de professores até a década de 80. Conforme esta autora é preciso repensar a licenciatura e recuperar seus compromissos com a Educação, ela apresenta a organização, a nível de Brasil, do sistema de formação de professores primários. Nele o professor será entendido “como ator dentro de um meio social e autor do ato de ensinar.
Sobretudo Gonzalo de Amézola discute o caso país vizinho, a Argentina, indicando um possível e necessário ensino de HTP na escola. Parece que neste país a discussão se assemelha a nossa onde que a HTP é um campo relativamente novo, mas em rápida evolução. Nos devidos termos, a HTP contempla os antecedentes imediatos do presente, marcados por traumas na sociedade contemporânea.
Além das considerações propostas pelo ensino de uma História presente podemos considerar a cultura do tempo na escola salientada pela Doutora em Educação Sonia Regina Miranda, para ela o tempo é uma das experiências humana mais comum e mais abstrata. O tempo é um fator que regula as ações nas instituições de ensino, estabelecendo limites e determinando parâmetros das relações humanas e de aprendizagem, entre outras características temporais.
Segundo Eliane Colussi que se dedica em seu texto a explicar algumas idéias em torno da Maçonaria e a Educação. Lembrando ser maçonaria uma sociedade parcialmente secreta cujo objetivo consiste em desenvolver o principio da fraternidade e filantropia. A autora comenta que a maçonaria brasileira e internacional durante o período da HTP, preocupou-se com o campo educacional, sendo ela fundamental para o desenvolvimento e a modernização nacional. Entretanto este ensaio também faz menção às fontes, bibliográficas, documentais, utilizáveis para o estudo da temática do envolvimento da maçonaria com a educação e o confronto entre projetos conflitantes, em especial o a Igreja Católica.
Outro caso de um espaço específico, tratado por Luiz Falcão, refere-se à identidade Cultural Italiana na educação no Estado de Santa Catarina, no final do século XX. Os elementos da cultura italiana como a língua, festejos de cunho étnico estão, em Nova Trento (SC), caracterizando um cenário para muitas explorações e descobertas de como é possível valorizar uma cultura particular através da educação.
Além das fontes já enunciadas, Mirtes de Oliveira nos fala das (im)possibilidades de usar a Fotografia como fonte primária em história da educação. Para Mirtes a imagem visual ainda encontra objeção por “não ter o mesmo estatuto do texto escrito”, porém esta fonte pode levantar várias explicações históricas. As questões levantadas neste ensaio sobre a fotografia não são muito profundas em relação trabalhar a fotografia no ensino de História.
Contemplando um acontecimento do presente Ana Mauad aborda os atentados do dia 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos. Levantando algumas considerações da HTP ela explica: “Pouco afeitos a uma análise critica de um tempo muito próximo, os historiadores, somente a partir dos anos 1980, passaram a consolidar o debate em torno da definição dos pressupostos teórico-metodológicos para o trabalho com o tempo presente.”
Conforme Ana, o Historiador do presente persegue significações no processo contínuo de produção em massa de acontecimentos pela mídia, percebendo assim a formação de opinião que se estabelece entre a mídia e o receptador dela. Ao realizar isto, opera no presente com a multiplicidade do tempo histórico.
Com a entrada da fotografia nos jornais diários em 1904, as notícias a partir daí divulgadas em imagem, ou seja, ilustradas na fotojornalismo, proporcionaram a imprensa ter um grande salto de tiragem, bem como sua valorização na qualidade. Tais imagens colaboram para a construção de identidades sociais raciais, políticas, étnicas, nacionais.
O capítulo intitulado No tempo da protoglobalização: a reescrita e um passado comum de Maria de Deus Manso não amplia muito nosso tema central, composto pela HTP, apenas no que diz respeito à Globalização como característica do tempo presente. Neste entremeio Henry Rousso abre a última parte do livro que propõe discutir as questões à volta da História e Historiografia e seus debates em torno do presente. Rousso analisa a HTP durante vinte anos depois de início, organizando o contexto histórico na qual foi concebida. O debate contemporâneo entre história e memória poderia se resumir em uma fórmula: o importante não é mais o que passou, mas o que é preciso reter e aquilo sobre o qual podemos agir.
A construção de novas tendências teóricas bem como um debate valioso sobre História e Historiografia é levantada no penúltimo capítulo por Johnny Puentes e J.L. Mozart Gavídia, eles reportem à idéia concluída por Geertz de que “Tudo é interpretação e que toda ciência é interpretativa quando tem por objetivo de estudo o fato cultural ou social.” Igualmente a releitura do passado que cada geração experimenta para entendê-lo é realizada a partir do presente.
No entanto, muitos historiadores denigrem a história imediata por considerá-la mero material sociológico/ jornalístico. Essa visão estrutural-funcionalista acha que todo intento de interpretar a realidade imediata é pura especulação, indigna de ser levada em conta, quando a História contada de vários ângulos.
Finalmente, numa perspectiva italiana, Franco Cambi completa a obra destacando a pesquisa histórico-educativa em seu país. De acordo com Cambi o panorama italiano da pesquisa histórico-educativa atualmente está em transformação e a caminho da sedimentação. Que sirva de exemplo para o sistema educativo do Brasil. Sendo assim, no livro História do Tempo Presente o professor de história encontra respaldo para pensar sua função, ajudando na construção do conhecimento histórico a partir do tempo presente e propondo a transformação da sociedade na qual o sistema educacional se encontra.
Nota
1 Graduado em Pedagogia, Especialista em Ensino de Filosofia e Mestre em Educação pela UnB.
Resenhista
Gabriele Daiana Thiecker – Especialista em História Contemporânea.
Referências desta Resenha
PÔRTO JUNIOR, Gilson (Org). História do tempo presente. Bauru, SP: EDUSC, 2007. Resenha de: THIECKER, Gabriele Daiana. Revista Eletrônica História em Reflexão. Dourados, v. 2, n. 3, jan./jun. 2008. Acessar publicação original [DR]