História do Rio Grande do Sul dos dois primeiros séculos | Carls Teschauer
A reedição da historiografia colonial há muito esgotada é um dos desafios do presente para o setor editorial acadêmico brasileiro, pois a maioria das bibliotecas não possui acervos completos. Esse é um dos fatores que influenciam no desequilíbrio entre as pesquisas realizadas sobre cada um dos períodos em que tradicionalmente é dividida a História do Brasil (colônia, império e república), na qual os estudos coloniais detêm um percentual médio de 14% nas últimas duas décadas. Certamente, com bibliotecas bem abastecidas, existiria mais incentivo para atrair novos talentos e aumentar a produção da historiografia colonial, cuja renovação e construção são muito necessárias.
Contribuindo para superar os limites da escassez de obras antigas, a Editora da Unisinos presta mais um grande serviço ao publicar a segunda edição da obra magna de Carlos Teschauer, considerado o pai da história gaúcha pela historiografia tradicional. Publicada originalmente no intervalo de 5 anos, veio ao lume em 1918 (406 p.), 1921 (446 p.) e 1922 (509 p.), sendo um marco editorial no Rio Grande do Sul e mesmo no Brasil, onde poucas obras dessa envergadura haviam sido publicadas. Sua importância, além do conteúdo, foi a criação de uma narrativa baseada em vasta quantidade de documentos inéditos, muitos publicados ali pela primeira vez, levantados em diversos arquivos do Brasil, Argentina e Uruguai. Também pelo uso das principais obras sobre o tema, as quais foram tratadas com uma perspectiva bastante crítica e rara para a época, conforme declara Teschauer na introdução da obra: “Grande parte dos nossos historiadores ainda está – o que parece incrível e não tem razão de ser – sob a influência e pressão da historiografia do século XVIII. Esta levantou, no correr dos tempos, uma espécie de muralha de inverdades, inexatidões e prevenções e criou uma tradição falseada quase insuperável, que se alteia entre o nosso tempo e a verdade histórica”.
Essa posição, sustentada por uma rigorosa metodologia, levou Teschauer a inserir ao longo do texto várias notas bibliográficas e de crítica polemista dirigidas a autores da historiografia sobre as missões dos jesuítas na antiga província do Paraguai. Como bem declarou Bartomeu Melià, em uma análise acertada da obra de Teschauer, “as excessivas preocupações polêmicas do autor não deveriam ser motivo de rechaço por parte do leitor moderno”.
O trabalho cuidadoso dessa reedição, feito com grande perícia, foi realizado por um especialista renomado, o padre Arthur Rabuske, historiador das missões jesuíticas do Rio Grande do Sul. Ele realizou a transcrição, a atualização gramatical e a correção de erros tipográficos de mais de mil e quatrocentas páginas, além da ótima tradução dos documentos anexos do volume 3, com 600 páginas. O cotejo com a primeira edição revela o fino labor de Rabuske, fato que realça a qualidade da edição e a torna uma fonte indispensável para os estudiosos contemporâneos das missões dos jesuítas entre os Guarani e para os estudiosos da história colonial do Sul do Brasil. Também deverá servir àqueles que pesquisam sobre as relações entre esses dois temas no âmbito da região platina, especialmente no Uruguai e na Argentina.
Resenhista
Francisco Silva Noelli – Universidade Estadual de Maringá.
Referências desta Resenha
TESCHAUER, Carlos. História do Rio Grande do Sul dos dois primeiros séculos. 2ª ed. São Leopoldo: Editora Unisinos, 2002. Resenha de: NOELLI, Francisco Silva. Fronteira: Revista de História. Dourados, v.6, n.12, p.155-156, jul./dez. 2002. Acessar publicação original [DR]