Desde seu passado colonial, o Caribe tem sido ponto de encontro entre o Velho e o Novo Mundo. Sua importante localização geográfica fez deste local espaço de grandes transformações e cruzamentos entre diferentes culturas, populações e mercadorias ao longo do tempo. Formaram-se sociedades diversas, plurais, mas que tiveram uma experiência histórica comum, já que passaram pela conquista e colonização dos europeus e foram palco de intercâmbios comerciais, migrações de populações livres e escravas, com a exploração da mão de obra indígena e africana.
O Caribe também é muito conhecido por seus territórios insulares, as Antilhas, que concentraram ao longo dos séculos trocas entre diferentes etnias, indígenas, europeus e escravos africanos. Segundo Fernando Ortiz, desenvolveram-se processos de transculturação e mestiçagem, que marcaram definitivamente estas sociedades.
Neste número publicamos a primeira parte do dossiê sobre a História do Caribe. Iniciaremos com a trajetória e obra de Fernando Ortiz, e sua relação com a Espanha, para posteriormente mostrarmos cronologicamente diferentes abordagens e aspectos da História do Caribe, desde o século XIX até meados do século XX, em Cuba, Trinidad e Haiti. Pesquisas sobre escravidão, revoltas, guerra de independência, movimentos sociais (o das mulheres cubanas) e o papel de importantes intelectuais, como José Martí e Carlos Baliño, fazem parte desta publicação. Ao todo, oito artigos da 20ª edição da Revista Eletrônica da Anphlac são dedicados à História do Caribe, além de dois artigos livres e uma resenha.
Renomado intelectual que se debruçou sobre a História de Cuba e dos afrocubanos em especial, Fernando Ortiz tornou-se uma importante referência, ao elaborar o conceito de transculturação, chave para a compreensão das transformações culturais e sociais vivenciadas na ilha. O artigo “Fernando Ortiz e o lugar da Espanha na sua trajetória política e intelectual”, de José Luis Bendicho Beired analisa o percurso e aspectos da obra de Ortiz, em que se destaca a sua relação com a metrópole.
A escravidão em Havana nas primeiras décadas do século XIX é abordada por Ynaê Lopes dos Santos, em “A Havana de Vives: escravidão e vadiagens na dinâmica urbana da capital cubana (1823-1832)”. Pesquisou o governo do Capitão General Francisco Dionisio Vives e suas determinações administrativas para controlar a enorme e crescente população escrava que vivia na cidade durante sua gestão.
A revolta Canboulay, ocorrida em 1881 durante o Carnaval em Trinidad, na época uma colônia britânica no Caribe, é objeto de pesquisa de Eric Brasil, em “Carnaval como direito: A Revolta Canboulay de 1881, em Port-of-Spain, Trinidad”. O autor mostra como a classe trabalhadora negra de Port-of-Spain rebelou-se contra a polícia e as autoridades locais, para defender seu costume de praticar o Carnaval Canbolay, a importante festividade negra que se espalhava com tochas pelas ruas da cidade e que foi objeto de proibição.
Dirigente dos movimentos pela independência de Cuba e destacado intelectual, José Martí é lembrado em artigo de Fabio Muruci dos Santos, “José Martí: tecnologia e modernização”. Apresenta uma faceta pouco explorada de sua obra: sua preocupação em refletir sobre a modernização e o desenvolvimento tecnológico de sua época.
A última guerra de independência cubana, entre 1895 e 1898, processo liderado por Martí, que morre precocemente no início das batalhas, é analisada por meio das páginas de O Estado de São Paulo. Na investigação “Impressões de uma guerra: o discurso de O Estado de S. Paulo sobre a guerra de independência cubana (1895-1898)”, Renato Cesar Santejo Saiani explica como a intervenção norte-americana na guerra leva ao fracasso da autonomia cubana e à tutela norte-americana na ilha, e como estes desdobramentos são retratados nas lentes do periódico paulista.
O engajamento político e a trajetória de Carlos Baliño são apresentados no texto “Carlos Baliño, pioneiro do marxismo na América Latina” de Luiz Bernardo Pericás. Importante líder sindical tabaqueiro foi contemporâneo de José Martí e Julio Antonio Mella. Com este último, foi responsável pela fundação do Partido Comunista Cubano, e Baliño tornou-se fundamental para a difusão das ideias marxistas em Cuba.
A participação política das mulheres no período conhecido como República cubana (1902-1959) derivou tanto de movimentos feministas e sufragistas, como também se fez por meio de associações que congregavam e estimulavam a participação de mulheres afro-cubanas. Manuel Ramírez Chicharro estuda em “El activismo social y político de las mujeres durante la República de Cuba (1902-1959)”, como estes movimentos converteram-se após o golpe de Estado de 1952 em oposição à ditadura militar de Fulgencio Batista.
A primeira ocupação militar norte-americana no Haiti, entre 1915 e 1934, é acompanhada de diversos movimentos haitianos de resistência nacional, que se contrapõem à política imperialista dos Estados Unidos. Em sua pesquisa “A primeira ocupação militar dos EUA no Haiti e as origens do totalitarismo haitiano”, Everaldo de Oliveira Andrade aborda a guerrilha armada dos Cacos, os movimentos indigenistas e de negritude que se opuseram e lutaram contra a dominação imperial do país pelo vizinho do Norte.
Quanto aos artigos de temas livres, Bruno Pinheiro Rodrigues estuda em ““El fuego de la libertad”: A conspiração sufocada de negros livres, cativos fugidos da América portuguesa e indígenas em Santa Cruz de La Sierra (1809)”, uma revolta de negros livres, escravos e indígenas fugidos da América portuguesa, pela conquista e manutenção de sua liberdade, em território da atual Bolívia.
O contexto do pós Guerra do Paraguai e a ocupação aliada entre 1869 e 1870 são estudados por Bruno Félix Segatto, em “Imprensa, debates públicos e poder político no Paraguai durante os primeiros anos de ocupação aliada (1869-1870)”. Por meio da leitura de periódicos paraguaios, sua pesquisa busca compreender o debate público de grupos locais em pleno governo de ocupação.
A resenha de Adalto Vieira Ferreira Junior apresenta a obra A cosmologia construída de fora: a relação com o outro como forma de produção social entre os grupos chaquenhos no século XVIII, uma tese premiada de doutorado de Guilhermo Galhegos Felippe, que se debruçou sobre a colonização do Chaco e o importante papel dos povos indígenas na resistência à colonização espanhola daquela região.
Finalizamos com o agradecimento a todos aqueles que contribuíram para a edição destes números. Acreditamos que com a publicação deste dossiê, poderemos incentivar as pesquisas e estudos sobre o Caribe, desenvolvidos tanto no Brasil como em outros países. Convidamos a todos os leitores a mergulharem nas diferentes abordagens e nas diversas histórias do Caribe e da América Latina. Desejamos a todos uma boa leitura!
Organizadores
Sílvia Cezar Miskulin – Doutorado e Pós-Doutorado em História na USP. Professora da Universidade de Mogi das Cruzes, campus Villa-Lobos, São Paulo. Email: silmiskulin@uol.com.br
Iuri Cavlak – Doutorado pela Unesp (Assis) e Pós-Doutorado em História na New York University. Professor da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP). Email: iuricavlak@yahoo.com.br
Referências desta apresentação
MISKULIN, Sílvia Cezar; CAVLAK, Iuri . Apresentação. Revista Eletrônica da ANPHLAC, n. 20, p. 1-4, jan./jun. 2016. Acessar publicação original [DR]
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