História, arte e patrimônio cultural: interlocuções na construção do conhecimento histórico | História em Revista | 2021

Trouxas ensanguentadas Artur Barrio Patrimônio cultural
Trouxas ensanguentadas, de Artur Barrio | Foto: Bolsa de Arte

Arte, Patrimônio Cultural e História. Diálogos interdisciplinares que são a base do presente dossiê da História em Revista. Diferentes campos da História têm trabalhado em consonância com as mais diversas expressões artísticas, assim como com diferentes abordagens do patrimônio cultural. Nesse sentido, foi de interesse da publicação, pesquisas que se estruturam a partir do patrimônio cultural e das artes, sejam aquelas que compreendem as manifestações dessas áreas enquanto fontes históricas, sejam aquelas que problematizam os processos de criação ou de reconhecimento patrimonial.

O patrimônio cultural, para além de fonte de pesquisa histórica em suas acepções tangíveis e intangíveis, é também um aparelho político e ideológico que engendra relações de poder, conflitos e interesses de grupos sociais e dos Estados. Portanto a análise dos processos de patrimonialização, da criação e aplicação das políticas públicas para o patrimônio e dos embates em torno dos contextos de governança nacional e internacional da cultura também são elementos que interessam à História.

O mesmo ocorre com o campo das Artes. Problematizar um objeto artístico, seja ele uma pintura, uma escultura ou uma estrutura arquitetônica por exemplo, vai muito além de sua análise formal. Pensar suas potencialidades e especificidades como fonte de pesquisa a partir das inquietações que causam, dos problemas que levantam e dos elementos que silenciam é, também, colocá-los em evidência. É observar, fundamentalmente, sua relevância na construção de novos conhecimentos e na forma de apreensão da história através das inquietações que causam.

Afora as linhas temáticas propriamente ditas, contemplou-se no dossiê, também, a discussão no entorno das diferentes metodologias de pesquisa no campo do patrimônio e das artes, bem como as possibilidades junto a acervos e fontes diversos. A pluralidade de trabalhos que buscamos conjugar e fazer dialogar na presente publicação, contribuirá de forma relevante para a construção de novas percepções acerca de diferentes objetos de pesquisa.

Na publicação que ora apresentamos, destacamos três eixos temático que contemplam a temática. Em Acervos e espaços de arte memória, Jacqueline Custódio, no artigo A poética da carne dilacerada em Trouxas Ensanguentadas, traz a reflexão acerca da expografia das obras de arte e sua relação com as novas questões apresentadas pela Arte Moderna e Contemporânea. A autora problematiza tais elementos partindo da obra Trouxas Ensaguentadas de Artur Barrio. Na sequência Ana Celina Figueira da Silva, em A Pinacoteca do Museu Júlio de Castilhos, apresenta a criação do espaço no museu bem como o processo de aquisição de obras. Por meio de doações e encomendas à artistas regionais e nacionais, a análise centrou-se, também, nos discursos e narrativas selecionados para circular no espaço expositivo e de memória.

A segunda parte do dossiê, Arte, imagem e patrimônio, traz dois textos que tensionam a questão da imagem e sua relação com o patrimônio. Em Relatos de uma não-viagem: o gaúcho na obra de Jean-Baptiste Debret, Luciana da Costa de Oliveira analisa a produção das aquarelas de temática gauchesca que foram elaboradas por Debret discutido, ainda, a maneira com a qual o artista, que possivelmente não conheceu a região in loco, elaborou suas imagens a partir de relatos de outros viajantes. O artigo Entre a arte e a técnica: a fotografia como suporte memorial em São Miguel das Missões/RS, assinado por Ivo dos Santos Canabarro, Juliani Borchardt da Silva e Noli Bernardo Hahn, traz importante abordagem acerca das funções e usos da fotografia no contexto da arqueologia. Problematizando, inicialmente, questões específicas da imagem, os autores analisam a forma com a qual tal suporte alia-se ao trabalho arqueológico e patrimonial.

A terceira e última parte do dossiê, dedicada aos Espaços de memória e lugares do patrimônio, apresenta estudos que, mesmo com temáticas diferenciadas, dialogam ao problematizar os espaços do patrimônio e da memória. Ianko Bett e Natália Paola Laux, em O prédio do Arsenal de Guerra de Porto Alegre e a Guerra da Tríplice Aliança e o Paraguai: (novas) narrativas históricas e a ressignificação do patrimônio edificado, identifica aspectos da historicidade do prédio em questão, hoje Museu Militar do Comando Militar do Sul, observando suas diversas funcionalidades ao longo do tempo, especialmente durante a guerra entre a Tríplice Aliança e o Paraguai. É interesse dos autores, também, observar o processo de patrimonialização dos bens culturais militares.

O trabalho de Larissa Patron Chaves e Mônica Lucas Leal de Macedo, intitulado O Parque Souza Soares: espaço de representação e simbologia no enlace entre mundos, apresenta uma reflexão acerca dos torna-viagem, portugueses que migraram ao Brasil e, por seu rápido enriquecimento, retornam à Portugal laureados com e como símbolos de riqueza. Para o estudo, as autoras se utilizam do Parque Souza Soares como representação desse processo que, dentre outras coisas, é centrado na questão identitária do sujeito. Por fim, encerrando o dossiê, apresentamos o trabalho de Marcos Paulo Moraes Oliveira, Funk: um ritmo musical controverso e multicultural para nosso patrimônio. Neste, o autor traz ao debate o gênero musical do funk e o relaciona à identidade e resistência de grupos sociais menos favorecidos. Por meio de revisão bibliográfica, o autor busca ratificar o funk como patrimônio cultural brasileiro.

Antes de encerrar esta breve apresentação, gostaríamos de dedicar este dossiê à memória da Professora Drª. Eloísa Helena Capovilla da Luz Ramos, que nos deixou este ano em decorrência de complicações da Covid-19. Elô Capovilla dedicou a vida ao ensino e a pesquisa nos campos da História e o patrimônio cultural, foi nossa mestra, nossa fonte de inspiração.  A edição infelizmente não pode contar com um texto dela, conforme convite que havíamos feito, mas ela segue presente aqui e seguirá em todos os nossos trabalhos. A ela a nossa reverência e a nossa gratidão.

Desejamos a todas e todas uma excelente leitura.

Novembro de 2021


Organizadores

Darlan De Mamann Marchi – Coordenação do GT História Cultural/ ANPUH-RS.

Luciana da Costa de Oliveira – Coordenação do GT Acervos: História, Memória e Patrimônio / ANPUH-RS.


Referências desta apresentação

MARCHI, Darlan De Mamann; OLIVEIRA, Luciana da Costa de. [História, arte e patrimônio cultural: interlocuções na construção do conhecimento histórico]. História em Revista. Pelotas, v.27, n.1, dez. 2021. Acessar publicação original [DR]

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