False Economy: a surprising economic history of the world | Alan Beattie

Alan Beattie é o editor de comércio do Financial Times e seu livro, uma provocação bem-humorada sobre políticas de desenvolvimento. Para Beattie, a principal razão para a prosperidade ou declínio das nações são as escolhas realizadas por seus governantes e empresários. Cada capítulo argumenta contra um tópico do que o autor chama de “falsa economia do pensamento – isto é, que nosso futuro econômico está predestinado e que somos arrastados de maneira indefesa por forças enormes, incontroláveis e impessoais” (p.2). Algumas opiniões de Beattie são percepções brilhantes, outras apenas irreverências sem profundidade. No geral, um livro que faz pensar, e quem sabe rever duas ou três convicções.

O capítulo sobre cidades examina as transformações dos centros urbanos com relação à economia. Da urbanização sem industrialização da África contemporânea, com migrantes que buscam o frágil aparato de serviços públicos, às novas cidades-globais que devem sua prosperidade mais à integração com os mercados internacionais do que com a realidade local. E que se estabelecem como pólos de serviços, cultura e qualidade de vida. Algumas metrópoles experimentaram transformações radicais em pouco tempo, como Nova York, cuja representação icônica na crise dos anos 1970 era o filme Taxi Driver, que a mostrava como “uma distopia violenta, amoral, ao passo que aquela de uma época posterior – Sex and the City – a mostrava como um playground para adultos, segura e indulgente” (p.70). No meio do caminho, há cidades como Dubai, nos Emirados Árabes, que se reinventou como centro financeiro e agora ensaia a construção de um complexo de biotecnologia.

Outro destaque do livro é a análise do comércio de “água embutida”. Quando um país importa alimentos que necessitam de grande quantidade de recursos hídricos para serem produzidos (carne de boi, trigo), de certo modo compra a água usada em sua preparação. Economia particularmente importante para nações semi-áridas do Oriente Médio e do Norte da África.

O autor discute de maneira interessante a relação entre religião e economia, tomando como ponto de partida a célebre análise do sociólogo Max Weber sobre protestantismo e capitalismo. Beattie é cético diante do primeiro estimular o segundo, chamando a atenção para o relativo atraso econômico de países calvinistas como a Escócia. Ele ressalta que credos religiosos e filosóficos que há poucos anos eram vistos como causas de fracasso nos negócios, como o hinduísmo e o confuncionismo agora são saudados pelos valores éticos que auxiliaram no desenvolvimento da Índia e da China. Critica a perspectiva tradicional de considerar os muçulmanos como pouco dinâmicos economicamente, lembrando que o Islã “é a única das grandes religiões a ter sido fundada por um comerciante” (p.136) e que seus governantes desempenharam relevante papel na criação de rotas comerciais que ligaram Ásia, Europa e África. A Malásia, um dos novos tigres asiáticos, é muçulmana.

Nem todas as histórias que Beattie conta são de sucessos. Ele dedica espaço aos fracassos de política econômica, em particular situações nas quais grupos de interesse conseguiram impor medidas que os beneficiavam, em detrimento do resto da sociedade, como regimes protecionistas: “Quando assumi como editor de comércio no Financial Times, logo me surpreendi em como cobrir a maioria das principais disputas comerciais internacionais – têxteis, vestuário, calçados, aço, açúcar – era um pouco como passear por um asilo povoado pelos decrépitos espectros da agricultura e manufaturas européia, americana e japonesa, que passavam seu tempo resmungando, reclamando sobre a insolência dos jovens estrangeiros pretensiosos, que os colocam de lado.” (p.163). Beattie acredita que o protecionismo não funciona e que apenas adia as mudanças inevitáveis em determinados setores econômicos. Seus heróis nesse aspecto são os industriais britânicos que conseguiram a abolição da Lei dos Cereais (1846). Seus vilões, os lobbies agrícolas que mantém altos subsídios nos Estados Unidos e na União Européia.

Se a defesa do liberalismo econômico pelo autor é ortodoxa, suas posições sobre corrupção o tornam quase herege. Contrariando o cânone dos doadores internacionais que a citam como um dos principais obstáculos ao desenvolvimento, Beattie argumenta que países como a Indonésia cresceram muito apesar de governos corruptos, enquanto nações como a Tanzânia tiveram presidentes honestos mas permaneceram pobres. Isso porque a ditadura que governava o primeiro Estado tinha um sistema de controle centralizado que limitava os efeitos mais perversos da corrupção e garantia um mínimo de eficiência, ao passo que o segundo regime adotou políticas de coletivização agrícola equivocadas, que fracassaram mesmo quando administradas de acordo com a lei.

Contudo, o livro padece de capítulos decepcionantes, como o que compara as trajetórias recentes da China, Índia e Rússia. Talvez a dificuldade do autor seja analisar modelos de desenvolvimento que contrariam seu paradigma favorito, o liberalismo, e que obtiveram sucesso com programas mais amplos de ação do Estado na economia.


Resenhista

Maurício Santoro Rocha – Doutor em Ciência Política pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro – IUPERJ e Especialista em Políticas Públicas e Gestão. E-mail: Mauricio.Rocha@mdic.gov.br


Referências desta Resenha

BEATTIE, Alan. False Economy: a surprising economic history of the world. Nova York: Riverhead Books, 2009. Resenha de: ROCHA, Maurício Santoro. Meridiano 47, v.10, n.109, p.40-41, ago. 2009. Acessar publicação original [DR]

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