Espaço e lugar privilegiado para formação de professores: Instituto de Educação “Fernando Costa” (1953-1975) | Aline de Novaes Conceição
A presente obra é fruto de uma dissertação de mestrado defendida em 2017 no Programa de Pós-graduação da Faculdade de Filosofia e Ciências da UNESP, campus de Marília. Neste livro, Aline de Novaes Conceição pesquisa como o Instituto de Educação (I.E) “Fernando Costa”, instalado em Presidente Prudente/SP, desenvolveu suas atividades, sobretudo, as finalidades previstas no Código de Educação do Estado de São Paulo.
O livro foi prefaciado por Macioniro Celeste Filho, professor permanente do Programa de Pós-graduação em Educação, da Faculdade de Filosofia e Ciências da UNESP, campus de Marília. A obra é dividida em três capítulos que analisam os diversos aspectos da formação de docente no I.E “Fernando Costa”.
No texto introdutório da obra, a autora destaca que o primeiro Instituto de Educação foi instalado no Distrito Federal, em 1932, e que se tratava de uma instituição escolar que, além de abrigar diversos níveis de ensino (Escola Normal, Curso Colegial, Curso Ginasial e Escola Primária Anexa), tinha a formação docente como centro de suas atividades. Descreve a escassez de pesquisas sobre os Institutos de Educação e enfatiza que a pesquisa buscou reconstruir elementos relativos à instalação do I. E Fernando Costa (em 1953), ao encerramento das atividades (em 1975), bem como à atuação dos indivíduos nesta instituição. Para isso, a autora se respaldou nos referenciais da História Cultural e das culturas escolares, lançando mão da análise de um variado corpus documental.
O primeiro capítulo, intitulado “Instituto de Educação ‘Fernando Costa’” (p. 27- 60), dedica-se à discussão dos aspectos organizacionais, à instalação e ao encerramento do I.E. “Fernando Costa”. A referida instituição, assim como suas congêneres espalhadas pelo território nacional, abrigava diversos níveis de ensino, desde o pré-primário até o médio. Havia uma integração entre esses níveis com foco na formação de docentes como, por exemplo, no caso do Ensino Primário que servia de espaço de estágio para as (os) estudantes do Curso Normal. No âmbito dos Institutos de Educação, o Curso Normal deveria formar, além de professoras (es), as (os) orientadoras (es), as (os) supervisoras (es) e as (os) administradoras (es) para o ensino primário.
Ao descrever a trajetória de implantação da instituição, a autora ressalta que ela tem início em 1943, quando foi decretado que Ginásio do Estado do município de Presidente Prudente passaria a abrigar um Colégio, tendo sido denominado “Fernando Costa”, em homenagem ao então Interventor Federal do Estado de São Paulo (cargo ocupado entre 1941 e 1945). Em pouco tempo, a instituição passou a abrigar uma Escola Normal (1947), um Ginásio (1953), culminando, em 20 de outubro de 1953, com a criação do Instituto de Educação “Fernando Costa”. O ano de 1953 marcou também a disseminação desse modelo escolar pelo interior paulista, com instalação de mais 15 Institutos de Educação (em Ribeirão Preto, Bauru, São José do Rio Preto, Botucatu, Itapetininga, Franca, Pirassununga, São Carlos, Guaratinguetá, Tatuí, Piracicaba, Santa Cruz do Rio Pardo, Jaú, Casa Branca e Jundiaí).
Como o primeiro Instituto de Educação do Estado de São Paulo foi fundado em 1933, no apogeu da Escola Nova, esse pensamento orientou a formação de docentes nos demais Institutos inaugurados nas décadas posteriores. Os Institutos de Educação encerraram definitivamente suas atividades em 1976, por força da Lei no 5692/71, que se estabeleceu que a formação de docentes deveria ocorrer em cursos superiores.
O segundo capítulo, sob o título “Elementos arquitetônicos e espaciais do Instituto e Educação ‘Fernando Costa’” (p. 61-96), aborda os aspectos relativos ao edifício da referida instituição, embasada em Antonio Viñao Frago. A autora discute o processo de aquisição do terreno e de construção do prédio destinado Ginásio do Estado (em 1941), que, posteriormente, seria convertido no I.E “Fernando Costa” (em 1953). A partir do momento em que o I.E. foi instalado, emergiu a necessidade de sua ampliação, haja vista que passaria a ofertar mais cursos.
Apresentando um diversificado material iconográfico, Conceição exibe desde o princípio da edificação até a estrutura atual da escola, destacando a sua localização privilegiada no centro de Presidente Prudente, o que denota a importância que se atribuiu à instituição. Ademais, exibe o empenho que os próprios estudantes, pais e docentes, reunidos no Órgão de Cooperação Escolar, para angariar fundos para a manutenção e as reformas do prédio. Descreve, outrossim, outros elementos materiais que compunham a cultura escolar, tais como o ditafone, o porta-chapéus, o cinematógrafo etc.
Destaca-se ainda, dentro da proposta pensada por Fernando de Azevedo, a presença de laboratórios. No caso do I.E “Fernando Costa”, o laboratório de química era mais equipado.
O terceiro capítulo é intitulado “Vivências dos membros do instituto de educação ‘Fernando Costa’” (p. 97-184), cujo objetivo foi caracterizar os indivíduos que compunham a instituição, com destaque para os diretores, alunos, professores e pais de alunos. Conceição utiliza das fontes documentais e de material jornalístico para abordar a participação desses sujeitos. Cabe a menção à análise minuciosa que a autora realiza acerca de todos os registros disponíveis das visitas do Inspetor Escolar, sobretudo no que se refere à sua relação com a direção da instituição.
O protagonismo das professoras e dos professores do I.E também é evidenciado pela autora, que utiliza das fontes documentais e bibliográficas para exibir a atuação docente tanto intramuros quanto na sociedade prudentina. Um exemplo dessa atuação pode ser encontrado na criação da bandeira da cidade de Presidente Prudente, que foi concebida por Luiza S. Damato, professora de desenho no I. E “Fernando Costa”.
Em relação à trajetória das estudantes, há um destaque para os exames de admissão aos quais as/os estudantes deveriam se submeter para o ingresso nos cursos Ginasial, Colegial, Normal e de Aperfeiçoamento. A obra aponta o crescimento progressivo do I.E que, por abarcar tantos cursos, atraía um público diversificado e amplo, atingindo, em 1966, a marca de sete mil estudantes distribuídos por seções em outras instituições de ensino da cidade.
Um aspecto interessante da cultura escolar da instituição abordado pela autora se refere aos casos conflituosos envolvendo os estudantes e como a instituição lidava com essas ocorrências. Conceição aborda alguns exemplos de conflitos ocorridos no cotidiano do I. E. envolvendo, às vezes, membros externos à instituição para resolver problemas internos. Os conflitos eram discutidos por uma congregação docente que tinha poderes para aplicar sanções que, em casos extremos, poderiam resultar na transferência compulsória de educandas (os). Neste sentido, a pesquisa apresenta detalhadamente a quantidade total de punições aplicadas e os motivos mais recorrentes.
Outro elemento de destaque da cultura escolar era a existência de duas pessoas responsáveis pela direção. Isto se devia ao fato de existir um Curso Primário anexo ao I.E “Fernando Costa” que possuía a finalidade de ser um espaço de aplicação da prática de ensino pelas normalistas e, para a qual, existiram diretoras responsáveis pelas funções pedagógicas e administrativas. Essas diretoras se subordinavam aos diretores do I.E, o que é um elemento ilustrativo do processo de feminização do magistério brasileiro, isto é, as mulheres representavam a maioria na docência nos anos iniciais da escolarização, enquanto os homens eram maioria no Ensino Secundário. Essa característica se refletia também na instituição pesquisada, pois, conforme a autora, a direção do I.E “Fernando Costa” foi ocupada somente por homens e o Curso Primário Anexo foi administrado unicamente por mulheres, da fundação até o enceramento das atividades da escola.
A autora conclui o trabalho enfatizando a dificuldade em se estudar uma instituição tão diversa, em razão de abarcar muitos níveis de ensino. Além disso, há que se destacar a peculiaridade inerente à pesquisa histórica – especialmente em escolas – que é encontrar as fontes preservadas (haja vista a sua escassez e a precariedade com que geralmente são acondicionadas nos arquivos permanentes). Malgrado essas características, a pesquisadora conduziu uma investigação pioneira em relação ao I.E “Fernando Costa”, abordando vários elementos que caracterizaram a cultura escolar da instituição em seus 22 anos de existência.
Trata-se de uma obra que mergulha profundamente na faina diária do I.E “Fernando Costa”, instituição que centralizava “[…] quase que toda a vida educacional e cultural da cidade, […] uma das maiores instituições educacionais do Estado […]” (RIBEIRO, 1999, p. 119). Conceição descortina o funcionamento deste Instituto de Educação e a atuação dos indivíduos que construíram a história da escola, apresentando, portanto, um relevante contributo não somente para os estudos da história local e regional, mas em uma perspectiva mais ampla, compondo o rol de investigações sobre as culturas escolares a partir da história cultural, adensando a produção em história da educação no Brasil.
Referência
RIBEIRO, Arilda Ines Miranda. Subsídios para a História da Educação em Presidente Prudente: as primeiras instituições escolares. São Paulo: Clíper, 1999.
Resenhista
Jorge Luís Mazzeo Mariano – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. https://orcid.org/0000-0003-1716-6763 http://lattes.cnpq.br/5337334318541020 E-mail: jorgemariano86@yahoo.com.br
Referências desta Resenha
CONCEIÇÃO, Aline de Novaes. Espaço e lugar privilegiado para formação de professores: Instituto de Educação “Fernando Costa” (1953-1975). Marília: Oficina Universitária. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2020. Resenha de: MARIANO, Jorge Luís Mazzeo. A formação docente no Instituto de Educação “Fernando Costa” (1953-1975). Cadernos de História da Educação, v.21, e096, 2022. Acessar publicação original [DR]