“Art. 3.º Empregado rural é toda pessoa física que, em propriedade rural ou prédio rústico, presta serviços de natureza não eventual a empregador rural ou agroindustrial, sob a dependência e subordinação deste e mediante salário ou remuneração de qualquer espécie”.
Projeto de Lei N. 6442/2016 de autoria do deputado federal Nilson Leitão (PSDB-MT)
Aproximando-se do marco de 130 anos da abolição da escravatura no Brasil, a se realizar em 2018, o tema que nunca deixou de figurar entre as principais problemáticas do universo acadêmico, volta à baila do modo mais cruel possível, o da permanência que se veste de trajes de retrocesso não só social, mas também político e institucional. A proposta de lei que busca reordenar as relações de trabalho no espaço rural, prevendo a possibilidade de remuneração em forma não salarial, abrindo espaço para converter fornecimento de alimentos e moradia enquanto contrapartida ao trabalho, assustadoramente remonta ao inglório tempo da escravatura no Brasil, o que nos leva à observação do quanto nosso pacto social ainda precisa ser fortalecido para que se atinja padrões mínimos de civilidade.
De certa forma, debruçar-se historicamente sobre as relações de trabalho ensejadas no seio do sistema escravista, é também um exercício político, de explicitação de suas contradições, ambiguidades e consequências ainda não de todo superadas. Nesse sentido, a eleição das chaves temáticas “Escravidão, Abolição e Pós-Abolição”, que intitulam o dossiê dessa edição, representam uma contribuição dos estudos históricos para a compreensão do passado, em diálogo com as questões do nosso próprio tempo. Julgamos perfeitamente plausível, que a reflexão atual sobre a saúde pública, por exemplo, possa surgir à mente do leitor que se debruçar sobre o artigo “Cólera, varíola e fome no interior da Província do Ceará” de Darlan Reis Junior. Nele o autor estuda o impacto de doenças epidêmicas sobre a população empobrecida, evidenciando a situação de extrema precariedade com a qual o Estado atuava sobre essa problemática coletiva. De modo semelhante, a participação política popular assomada à agenda pública em tempos de polarização, pode ser visualizada em termos históricos, respeitadas as óbvias diferenças, no transcorrer dos anos 1880 quando a crise da escravidão ganhou contornos dramáticos e mobilizou a atuação política de vários segmentos sociais, notadamente da população de cor, escravizada ou não. É o que se pode ler por exemplo, no artigo “O 25 de março de 1884 no Ceará e a luta pela libertação dos escravos em Pernambuco”, de Maria Emília Vasconcelos dos Santos.
Outros trabalhos trazem resultados de pesquisa que enfocam a questão da família escrava, chave de leitura privilegiada para a compreensão do cotidiano e visão de mundo por eles desenvolvida. É o caso de “Antonio, cabra, filho de tapuia com mulato”: família escrava, família mestiça – Cariri Cearense (1850 – 1884)”, de Ana Sara Cortez Irffi e “Livres, escravos e forros nos registros de casamentos e batismos nas Freguesias de Aracati e de Russas, Ceará (1720-1820)” de Elisgardênia de Oliveira Chaves. Neles, as autoras investigam a constituição das famílias escravas, bem como processos da miscigenação pelos quais transitavam ao longo do tempo.
A relação entre senhores e escravos é abordada no contexto do século XIX a partir de dois artigos desse número. Em “Tecendo distintos laços familiares: as relações de compadrio dos escravos do Barão Alfenas – Freguesia de São Tomé das Letras do termo de Baependi-MG. (séc. XIX)”, o autor Juliano Viana empreende um esforço de análise sobre a instituição de redes familiares no interior da comunidade de escravizados do Barão Alfenas, buscando perceber as estratégias dos mesmos para angariarem vantagens no quadro geral de exploração aos quais estavam inseridos. O segundo artigo dessa chave é o de Carlos Rafael Caxilé, cujo título “Dinâmica social entre senhores e cativos no sistema escravista brasileiro – Lei 2040/1871, Lei do Ventre Livre”, analisa um processo crucial da escravidão brasileira, a inserção do Estado no bojo das relações entre senhores e escravos, mormente no que se refere à capacidade de cessão da liberdade. Já Raimundo Nonato Rodrigues de Sousa apresenta uma contribuição em torno da noção de “elites de homens de cor” em pleno Ceará Colonial, para dar conta das evidências históricas que apontam para o enriquecimento e mobilidade social de várias famílias que se estabeleceram nas ribeiras do Acaraú, adquirindo terras, ampliando redes de sociabilidade, prestando serviços d’arma ao Rei.
Outra questão importante contemplada nesse número é a da educação para a diversidade étnico cultural, presente no artigo “Reflexões sobre história e cultura afrobrasileira e africana na sala de aula” de Maria Edleuza Maia e Edvanir Maia da Silveira. Nele são trabalhadas dificuldades e possibilidades de atuação na área do ensino de História no Ensino Médio, mobilizando o flanco aberto pela lei que tornou obrigatório o ensino de História e Cultura Africanas e afro-brasileiras (Lei 10639/2003).
Desta sorte, cremos que a diversidade temática, analítica e temporal presente nos artigos poderá oferecer aos leitores uma aproximação inspiradora com o desenvolvimento de pesquisas sobre questões tão prementes para a compreensão do passado escravista.
Boa leitura
Organizadores
Raimundo Nonato Rodrigues de Sousa – Professor da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA. E-mail: raisouza2013@hotmail.com
Paulo Henrique de Souza Martins – Professor substituto da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA. E-mail: phhistoria10@gmail.com
Referências desta apresentação
SOUSA, Raimundo Nonato Rodrigues de; MARTINS, Paulo Henrique de Souza. Apresentação. Revista Historiar, v. 9, n.16, jan./jun. 2017. Acessar publicação original [DR]
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