O livro “Em busca do desenvolvimento perdido: um projeto novo-desenvolvimentista para o Brasil” foi escrito por Luiz Carlos Bresser-Pereira e lançado pela editora FGV Editora. Luiz Carlos Bresser-Pereira nasceu em 1934, em São Paulo, foi Ministro da Fazenda em 1985 e Ministro da Administração Federal e Reforma do Estado no governo de Fernando Henrique Cardoso (1999). Ganhou o título de professor emérito da Fundação Getúlio Vargas da qual é professor desde 1959, e é editor da Revista de Economia Política desde 1981.
A obra foi lançada em 2018 e se trata da proposição de um novo projeto desenvolvimentista como uma alternativa ao liberalismo econômico. Em princípio é feito uma abordagem da formação econômica, discorrendo sobre a adoção de investimentos no modo de produção industrial como foco de um projeto de desenvolvimento na década de 1940 a 1950, a estagnação econômica e a perda do projeto de desenvolvimento anterior a partir de 1980 e a adoção de medidas neoliberais como tentativa de retomada do crescimento econômico brasileiro a partir de 1990. O livro conta com uma introdução e sete capítulos. O autor tem forte base teórica em Marx, Weber, clássicos do desenvolvimentismo e Keynes, sendo indiscutível que sua obra tem matiz pós-keynesiana onde o desenvolvimento econômico é determinado pela demanda, acrescido ao argumento a ideia de Bresser-Pereira de que o acesso a essa demanda se daria a partir do controle da taxa de câmbio e da disciplina fiscal.
O objetivo central do livro é trazer à tona a discussão de um novo projeto desenvolvimentista. Para a elaboração da teoria, há inicialmente a exposição de um contexto de formação e desenvolvimento da sociedade capitalista. De acordo com o autor, o nascimento do capitalismo foi possível devido à formação de duas instituições essenciais para seu funcionamento: Estado e Mercado. O Estado funcionaria como um mecanismo de coordenação da sociedade e o Mercado como um mecanismo de coordenação das atividades econômicas. Dessa forma, o capitalismo é desenvolvimentista quando é dado ao Estado a função de coordenar setores não competitivos e aspectos macroeconômicos e ao mercado o plano microeconômico. Segundo Luiz Carlos Bresser-Pereira, a visão neoliberal, o capitalismo na forma liberal, limita o Estado a garantir o funcionamento do mercado, da permanência da propriedade e cumprimento dos contratos, sendo esta então uma das primeiras críticas que o autor fará ao sistema liberal no decorrer da obra.
Torna-se essencial destacar essas definições sobre o capitalismo desenvolvimentista e capitalismo liberal para compreender a proposta que Bresser- Pereira apresenta no livro, onde o projeto do novo desenvolvimentismo seria uma alternativa para essa arrancada neoliberal vivida pelo Brasil a partir de 1990. A história econômica brasileira, vinculada a transformações econômicas a nível mundial, atravessou um momento desenvolvimentista, onde o projeto de desenvolvimento era regido pela atuação do estado na construção de grandes projetos industriais, posteriormente volta-se para a adoção de práticas liberais, período que autor considera uma regressão, e desde 2008 estaria dando início a um processo de regulamentação financeira e retomada de algumas práticas desenvolvimentistas. Bresser- Pereira comenta ainda que o projeto liberal vigente não teria condições de proporcionar o desenvolvimento nos níveis de países ricos e que a alternativa seria a adoção do novo projeto de desenvolvimento que propõe principalmente o controle fiscal e cambial.
A partir dessas definições Bresser-Pereira trás enfim o novo desenvolvimentismo para a pauta, sendo este o ponto central do livro. Esse projeto se baseia justamente no controle da taxa de câmbio, de uma forma que a torne competitiva, na neutralização da doença holandesa e que a taxa de juros do país esteja próxima a taxa de juros internacional. Esses aspectos embasam todo o texto construído a partir do capítulo três.
Outro aspecto importante seria o desenvolvimentismo clássico, que parte do processo de acumulação de capital e da incorporação de progresso técnico, utilizando-se da industrialização para garantir o desenvolvimento econômico, amparado pela tese keynesiana e de estruturalistas como Raúl Prebisch, em contraponto a teoria das vantagens comparativas que definem a especialização da produção naquilo a qual o território possui vantagem. Utiliza para esse argumento o mapa da complexidade de Hausmann e Hidalgo (2014) onde a produção mais complexa, que possui cadeias produtivas mais complexas, são realizadas por países com um nível de desenvolvimento maior.
No caso do Brasil, o desenvolvimentismo foi adotado na Era Vargas, com diversos aspectos do governo da década de 1930 voltados a estratégia de industrialização e substituição de importações e continuado nas duas décadas seguintes. Em seu livro, Bresser-Pereira destaca essas estratégias desenvolvimentistas adotadas por Vargas. Foi um período desenvolvimentista, principalmente regido pelo estado, com um poder centralizador na construção de grandes projetos industriais e de infraestrutura. O autor também avalia esse momento como sendo o período da implantação de uma Revolução Capitalista Brasileira, justamente pela formalização de uma nação e a formação de um mercado interno, essenciais para o desenvolvimento do capitalismo, como já comentando anteriormente. O autor apresenta as falhas nesse projeto desenvolvimentista e também os resultados aos quais considera êxitos de projeto.
Cita então três erros que considera importantes para a falha do projeto desenvolvimentista, sendo a falha na gestão da educação no país, a ausência da reforma agrária e a política econômica neoliberal. Os dois primeiros aspectos influenciam diretamente na diminuição das desigualdades sociais. A adoção de medidas neoliberais e política de crescimento com a poupança externa é um equívoco, segundo Bresser Pereira.
Esse equívoco é um dos motivos da quase estagnação econômica brasileira de 1990, onde o abandono das estratégias desenvolvimentistas deu lugar a medidas neoliberais. O Brasil embarcou nesse sistema, ao contrário do que ocorreu em outros países que hoje despontam com altos níveis de desenvolvimento e crescimento econômico, citando aqui China e Índia como exemplos. Depois de passado o período de 1980, a década em que a economia brasileira foi determinada pela crise da dívida externa e alta inflacional, o governo de Fernando Collor de Melo (1990 a 1992) assume as diretrizes econômicas internacionais, pautadas principalmente no Consenso de Washington, e de abertura comercial e financeira segundo o FMI. Porém, essas novas medidas, segundo a leitura de todo livro de Bresser-Pereira, foram um equívoco: não produziram crescimento nem estabilidade econômica e ainda acrescido a esse cenário, levaram a crises financeiras, a uma onda de desindustrialização sucedido pelo desenvolvimento da doença holandesa.
O governo centro-esquerda de Luiz Inácio Lula da Silva, iniciado em 2002, tinha um projeto desenvolvimentista, porém durante a permanência de dois mandatos, a política vigente era claramente neoliberal: o mesmo regime de abertura comercial, com pouco mais de controle sobre os capitais, mas mantendo a abertura financeira. E o governo seguinte, de Dilma Rousseff, também passou pela tentativa de retomar um projeto desenvolvimentista principalmente pelo controle da taxa de juros, de uma política industrial de desonerações fiscais, motivo pelo qual desenrolou-se a crise fiscal no governo. Na mesma época houve a queda do preço das commodities gerando recessão. Sem apoio político e com o fracasso econômico, Dilma Rousseff acaba sofrendo o processo de impeachment.
Ao final da obra, Luiz Carlos Bresser-Pereira nos apresenta ao seu projeto de novo desenvolvimentismo a partir do que ele considera serem reformas necessárias na estrutura econômica e financeira brasileira. Essa série de reformas incluem: novo teto fiscal que contemple um teto para a despesa corrente e para o investimento público; a reforma da previdência; a reforma cambial (sendo a taxa de câmbio um dos assuntos importantes abordados por toda a obra); a neutralização da doença holandesa; a proibição da indexação formal; a reforma política; a promoção da governança das empresas controladas pelo Estado; a reforma gerencial do Estado; a política de exportação de manufaturados e a política industrial. O capítulo sete, sobre as reformas necessárias, trata de elaborar cada uma dessas mudanças estruturais econômicas.
Dessa forma, pretendeu-se abordar os principais pontos do livro, recordando a retrospectiva econômica brasileira desde 1930, o processo de Revolução Capitalista e a indústria como um dos principais fatores do desenvolvimentismo clássico, até a adoção de estratégias liberais, abertura comercial e financeira do Brasil frente a modificações na economia internacional, e também da possível retomada de um novo projeto desenvolvimentista a partir do controle da taxa de câmbio, das taxas de juros e da doença holandesa.
A partir de 2019, data pós publicação do livro de Luís Carlos Bresser- Pereira, o novo governo eleito abandona completamente a ideia do desenvolvimentismo e propõe um novo projeto fundamentado no que seria o cerne do liberalismo econômico: afastamento quase completo do Estado da estrutura de mercado. Ainda, o governo atual não se aparta da ideia de desindustrialização: dirige quase exclusivamente toda a produção brasileira e benefícios fiscais para o agronegócio. Dessa forma, a abordagem de Bresser – Pereira sobre o novo projeto desenvolvimentista, embora tenha tomado fôlego em certa medida no governo de Dilma Rousseff, não está mais perto de ser implementado durante a vigência do atual governo.
Resenhista
Luciana Santos Paes – Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Socioeconômico Universidade Federal do Maranhão.
Referências desta Resenha
BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. Em busca do desenvolvimento perdido: um projeto novo-desenvolvimentista para o Brasil. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2018. Resenha de: PAES, Luciana Santos. Revista de Economia política e História Econômica. São Paulo, ano 17, n. 47, p.173-175, jan. 2022. Acessar publicação original [DR]
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