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Cronistas do Rio | Revista IHGRJ | 2021

Na opinião de Machado de Assis, o cronista seria uma espécie de historiador do cotidiano, que transita entre as fronteiras imprecisas da literatura com a história, a registrar acontecimentos corriqueiros que dificilmente renderiam manchetes nos jornais, mas que permitem ao historiador contemporâneo compreender as ideias que circulavam na sociedade durante uma determinada época, além de conhecer suas práticas e costumes1. Pois bem, este número da Revista é aberto pelo dossiê “Cronistas do Rio”, que contempla a obra de três escritores, que perscrutaram, cada qual a seu modo, a “vida ao rés-do-chão”2 da urbe carioca: o flâneur João do Rio (1881-1921), o rebelde Lima Barreto (1881-1922) e o “anjo pornográfico” Nelson Rodrigues (1913-1980), estudados respectivamente por Antonio Edmilson Martins Rodrigues, Luiz Ricardo Leitão e Marco Santos.

Como de costume, além do dossiê, a Revista se organiza em dois segmentos. O primeiro está voltado para contribuições acadêmicas, enquanto o segundo apresenta uma síntese da vida social do IHGRJ, eventos e informações de natureza institucional.

No primeiro, a seção ARTIGOS publica oito inéditos, a começar pelo resultado das pesquisas de Nelson de Castro Senra, que propõe um recorte no Censo de 1950, quando se examinou pela primeira vez, sob o ponto de vista estatístico, a questão das favelas no Rio de Janeiro, então Capital Federal, privilegiando as ideias defendidas por Alberto Passos Guimarães. Já Vera Lucia C. de Queiroz de Andrade, em ensaio intitulado “As moradas do rei”, analisa essas residências enquanto elementos históricos de legitimação do poder do monarca e sede do governo, inicialmente na configuração política do Reino Unido e depois na do Império brasileiro. Segue-se o trabalho de Maria de Fátima de Castro Neves, que, apresentando comentários de contemporâneos, recolhidos por meio de entrevistas, recupera a história da Sociedade dos Artistas Nacionais. Na sequência, Neusa Fernandes, no ensaio “Heranças Judaicas”, toma como objeto de investigação o legado dos cristãos-novos, tanto através de palavras, costumes e expressões, quanto do repertório das tradições dos judeus que se incorporaram à vida do povo e à cultura brasileira. Ainda no mesmo segmento, destaca-se a discussão levantada pelos historiadores Luís Reznik e Rui Aniceto Fernandes, a respeito dos processos de modernização pelos quais passou a cidade de São Gonçalo na primeira metade do século XX, fruto das ações desenvolvidas pelo médico, intelectual e político Luíz Palmier (1893-1955). Por seu turno, Roselene de Cássia Coelho Martins, no texto “Memória e patrimônio em Vassouras”, apresenta os resultados de pesquisa empreendida sobre os vestígios materiais da riqueza proporcionada pela produção cafeeira na região, na segunda metade do Oitocentos. Aliás, a problemática do patrimônio material também vem a ser tangenciada por Carlos Augusto Nobre, em “O Monumento-altar de São Sebastião: a saga cívico-religiosa de uma devoção”, que joga luz sobre a história quase desconhecida da maior estátua da capital fluminense, homenagem ao seu santo padroeiro, erguida e oferecida à municipalidade pelo Instituto Histórico e Geográfico do Rio de Janeiro, em 1965, na passagem do IV centenário da cidade. Por último, Magaly Oberlaender, no artigo intitulado “Santo Antonio do Relento”, penetra no campo do patrimônio imaterial, descrevendo e analisando a “invenção” do santo casamenteiro, desvelando as crenças sobre seus poderes e as relações travadas entre o divino e o profano.

A seção denominada ESBOÇO TEMÁTICO traz contributos de dois autores, que se ocupam de temas e questões pouco exploradas, mas que vale a pena aprofundar em futuros estudos. Naftale Katz levanta a discussão sobre as causas que teriam impedido a concessão do Prêmio Nobel ao cientista brasileiro Carlos Chagas. Por sua vez, Miridam Britto Falci oferece um exercício de geohistória, ao relacionar a importância do rio São João para o município de Casemiro de Abreu.

Completam a parte do conteúdo disciplinar deste número três resenhas críticas de obras recentemente lançadas. O livro Maria Graham: uma inglesa na Independência do Brasil (Rio de Janeiro: Editora CRV, 2020), escrito por Denise Porto, é alvo da apreciação de Miridan Brtto Falci, enquanto Vera Lucia C. Queiroz Andrade analisa a obra de Manuel José de Miranda Neto, por sinal, atualíssima, intitulada O Brasil resiliente: estímulos criativos para sua reconstrução (Rio de Janeiro: PoD Editora, 2021). Arrematando a seção dedicada à crítica historiográfica, Paulo Knauss de Mendonça oferece a recensão do livro Portugueses no Brasil: negócios, trajetórias e cenografias urbanas (Rio de Janeiro; Ayran, 2021), fruto de pesquisa alentada, empreendida por Lená Medeiros de Menezes (Rio de Janeiro)

O segundo segmento da Revista apresenta um inventário das atividades do Instituto no ano de 2021. Essa parte burocrática está composta por três títulos: “Discursos e saudações”, com a transcrição de discursos de posse e de recepção a novos sócios, seguindo-se “O Instituto mês a mês”, que contempla a memória das sessões ordinárias, dos ciclos de palestras e as entrevistas realizadas com confrades e confreiras, no âmbito do projeto “Encontro com os sócios do IHGRJ). Por último é apresentado o “Quadro Social”, com a relação atualizada dos sócios que ocupam as cinquenta cadeiras estatutárias.

Boa leitura!

 Notas

1 Ver, MACHADO DE ASSIS, J. M. Conversas Hebdomadárias. A Constituinte perante a história, pelo sr. Homem de Melo. Sombras e Luz, do sr. B. Pinheiro. Obra completa em quatro volumes. 2ª edição, Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2008, vol. 3, pp. 1058-1059.

2 CANDIDO, Antonio. “A vida ao rés-do-chão”. In: Para gostar de ler: crônicas. Volume 5. São Paulo: Ed. Ática, p.89- 99.


Organizadores

Lená Medeiros de Menezes

Lucia Maria Paschoal Guimarães

Olinio Coelho (in memoriam)


Referências desta apresentação

MENEZES, Lená Medeiros de; GUIMARÃES, Lucia Maria Paschoal; COELHO, Olinio. Apresentação. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, ano 28, n.28, p. 9-11, 2021. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

Itamar Freitas

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