A obra organizada pelo professor José Flávio Sombra Saraiva, reconhecido estudioso das relações internacionais do Atlântico Sul, representa um primeiro ensaio publicado no Brasil sobre esse relevante tema. Oferecendo ao leitor um primeiro balanço da infanta instituição, criada em Lisboa em 1996, o livro tem como característica marcante “a qualidade didática de seus textos”, conforme lembra o ex-chanceler Luiz Felipe Lampreia, ao prefaciá-lo.
Saraiva expressa, na introdução da obra, certa vontade apostólica de contribuir para a melhor compreensão, por parte da opinião pública brasileira, do papel que a CPLP vem procurando desempenhar desde sua criação. Nesse sentido, os capítulos que compõem a obra foram talhados por diferentes especialistas, escolhidos quer pela experiência na cooperação com os países africanos e no exercício de funções voltadas para a aproximação do Brasil a Portugal, na prática diplomática ou na gestão de projetos específicos, quer pela experiência de reflexão acumulada sobre as relações internacionais do Brasil com a África.
Há em comum o fato de os autores terem vínculos acadêmicos, diplomáticos e afetivos com o mundo da língua portuguesa e com os países que carregam esse patrimônio comum, elemento essencial na formação nacional e na afirmação internacional de todos os países comunitários. A CPLP composta por Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal e São Tomé e Príncipe está retratada como uma obra em construção, como um projeto em curso e como uma possibilidade de relançamento, de forma mais horizontal e sem o prisma do colonialismo, de relações do Brasil e de Portugal com a África. Os autores rejeitam a imagem de um passado comum dos povos de língua portuguesa, no contexto do Atlântico Sul e do Índico, marcado apenas pela afetividade natural.
A obra é aberta com o capítulo de Juliana Soares Santos. Ao indagar acerca das condições de criação da CPLP, incluindo suas motivações políticas, históricas e culturais, a autora aborda, em especial, a desvinculação dos interesses brasileiros na África das relações especiais que sempre animaram o relacionamento do Brasil com Portugal. Mas não deixa de perceber que a oficialização e a relevância da língua portuguesa na África, em conseqüência da independência, mantiveram os países que expressam essa língua naquele continente como membros potenciais da futura CPLP. O arcabouço institucional e os mecanismos de funcionamento da CPLP são igualmente explorados pela autora.
Saraiva, no capítulo atinente à dimensão político-diplomática da CPLP, explora a possibilidade de tal instituição vir a transformar-se em plataforma operacional para uma nova concertação entre seus Estados-membros. O autor propõe que a CPLP deva explorar a condição de ser formada por países pouco dotados de excedentes de poder em escala global para se conformar em fórum supletivo à promissora inserção internacional do conjunto de países que assinaram sua Declaração Constitutiva.
O organizador da obra nutre esperança de que a CPLP possa vir a desempenhar um papel um pouco mais ativo no concerto das nações. A mesma posição é compartilhada por Enilde Faulstich, no seu argumento central sobre o valor político da língua portuguesa. Argumentando que a CPLP é um lugar de falas múltiplas, a estudiosa observa, em especial, a evolução das discussões para a formação do Instituto Internacional da Língua Portuguesa e para a aprovação do Acordo Ortográfico.
Aos pilares da concertação político-diplomática e da valorização da língua portuguesa no mundo, agrega-se, na obra, a dimensão da cooperação econômica, científica, educacional e tecnológica no âmbito da CPLP. Na abordadem de Irene Gala, Alice de Abreu e Márcio Fernandes, a CPLP vem ganhando força por meio dos caminhos que se abrem no plano da cooperação, especialmente diante da possibilidade inédita do trabalho conjunto entre o Brasil e Portugal no aprofundamento de ações em relação aos países africanos de língua portuguesa.
Nessa mesma linha, o economista angolano José Gonçalves analisa o tema das relações econômicas no contexto da CPLP. Discutindo em especial as condições precárias com as quais os países africanos têm de lidar no início da nova década, Gonçalves enfatiza a necessidade do desenvolvimento de uma política mais ativa no campo material da CPLP.
Em conclusão, a obra organizada por Saraiva alcança seus objetivos fundamentais. Articula a informação com a aguda percepção crítica das oportunidades que se abrem para a CPLP no seio da sociedade internacional. Demonstra, ademais, o quanto o Brasil poderia fazer mais para que essa nascente instituição, dotada de personalidade jurídica internacional, possa de deslanchar como parte de um projeto de relançamento da relativamente abandonada política africana do Brasil.
Resenhista
Pio Penna Filho
Referências desta Resenha
SARAIVA, José Flávio Sombra (Org.). Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP): solidariedade e ação política. Brasília: Instituto Brasileiro de Relações Internacionais, 2001. Resenha de: PENNA FILHO, Pio. Revista Brasileira de Política Internacional, v.44, n.1, 2001. Acessar publicação original [DR]
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