Neste primeiro número de 2018, a Revista Brasileira do Caribe (RBC) convidou ao professor Dernival Venâncio Ramos Junior que organizou em 2017 uma jornada intitulada “Cem anos de solidão de Gabriel García Márquez. Leituras 50 anos depois”, evento ocorrido no Campus de Araguaína da Universidade Federal do Tocantins, e que deu nome ao dossiê. A RBC, volume 18, No.36, de janeiro a junho de 2018 oferece aos leitores um dossiê temático composto por cinco artigos, além de três colaborações livres.
Em 2017, Cem anos de solidão de Gabriel García Márquez completou cinqüenta anos de publicação. Desde o seu lançamento em 1967, o livro foi lido e relido a partir de diversos pontos de vista, o histórico, o político, o sociológico, o cultural, o literário e o filosófico. Essa riqueza da fortuna crítica indica uma obra multifacetada e de difícil apreensão por um viés disciplinar. Por isso, convidaram-se pesquisadores de diversas áreas (História, Lingüística, Arquitetura, Filosofia, Geografia e Crítica literária) a participar da seguinte edição. As perguntas feitas, tanto no evento quanto no dossiê foram: Como as novas gerações de leitores e leitoras, críticos e críticas leram a obra Cem Anos de Solidão? O que ainda falta dizer sobre ela, que apenas as novas gerações podem dizer? O que as traduções da obra ajudam a dizer sobre ela e sobre a fortuna crítica? O que precisa ser dito sobre as linhas interpretativas clássicas sobre essa obra? Qual o lugar dessa obra na atual cultura caribenha, latino-americana e ocidental? Sabemos que essas perguntas são difíceis de responder, mas acreditamos que elas estarão sempre no horizonte das gerações e gerações de leitores dessa obra clássica da literatura colombiana e caribenha. Afinal, o clássico é o que se relê, que se relê, que se relê… O clássico sempre coloca respostas novas a velhas perguntas ou perguntas novas a consolidadas respostas.
Abre o dossiê o artigo “Cem anos de Solidão: resistências, invenção e decolonialidade” de Pláblio Marcos Martins Desidério e Ludmila Brandão que problematizam a obra de Gabriel Garcia Márquez a partir da decolonialidade. Afirmam que a obra Cem Anos de Solidão pertence a “zonas pelágias” e procuram problematizar a forma como a crítica e os leitores europeus classificaram o romance como “realismo mágico.” Também propõem mostrar como o autor colombiano escapa da hegemonia eurocêntrica, pois ele indica caminhos para fugir da abissalidade atribuída pela colonialidade.
Em seguida, Olivia Cormieiro e Euclides Antunes de Medeiros em “Caminhos entre imaginação e método historiográfico na obra Cem Anos de Solidão” trabalham na interface entre Literatura e História, propondo-se descrever as relações entre a dimensão metodológica da pesquisa histórica e a dimensão imaginativa das obras ficcionais. Questões como memória, escrita, invenção e sensibilidade, presentes nas obras literárias, se pode transformar em mecanismos úteis ao trabalho de pesquisa dos historiadores. Articulado à História, mas escrito por uma semioticista, o artigo “Das engrenagens da leitura e do tempo em Cem anos de solidão” de Luiza Helena da Silva aborda o romance a partir de dois aspectos: primeiro, privilegia o caráter propriamente textual e descreve a sua poética; depois, discorre sobre o episódio do massacre dos trabalhadores em greve problematizando a circularidade da narrativa e a história mesma, para iluminar os mecanismos que incidem sobre o binômio memória e esquecimento, tanto em textos ficcionais, quanto na história social da América Latina e Caribe. Nessa mesma linha temática, Marcio de Araújo Melo escreveu “Não esquecer.” O autor centra sua reflexão em um momento de Cem anos de Solidão, qual seja, a peste da insônia e seus desdobramentos como o esquecimento, problematizando-a a partir da etiquetação de objetos e animais com seus nomes, funções e sentimentos, numa tentativa de preservar seus usos práticos, nas leituras do passado através do baralho por Pilar Ternera e, por fim, através do “dicionário giratório”, a máquina que traria os conhecimentos elementares para os cidadãos de Macondo. Assim, o autor discute as formas da memória, das mais simples às mais complexas, destacando o esforço humano por não se deixar ser sugado e destruído pelo esquecimento.
Fecha o dossiê o texto “Macondo: o espaço de existência em Gabriel García Márquez” de Jean Carlo Rodrigues, o autor, propõe pensar a obra a partir da concepção de “vida virtual” de Susanne Langer e “terrae incognitae” de John Wright, tentando mostrar como o espaço imaginado, em obras literárias e poéticas é uma instigante forma para a compreensão da relação homem e espaço e por isso propõe, como hipótese geral, que o direito à arte, à subjetividade e à imaginação sejam resguardados dos ataques positivistas.
Os artigos, assim, a partir de diversos pontos de vista disciplinar e interdisciplinar produzem uma rica leitura da obra magistral de Gabriel García Marquez. Esperamos que o resultados desse esforço coletivo se desdobre em interesse das novas gerações e que essas, ao lê-lo, encontrem respostas as inquietações de seu tempo, mas sobretudo encontrem novas perguntas.
Os três artigos seguintes fazem parte da seção “Outros Artigos” da RBC. Em “Gestionando la identidad:el cabello como capital”, Kristell Villarreal Benítez enfatiza como o cabelo é usado por parte de um grupo de mulheres afrocolombianas, pertencentes ao Caribe colombiano e à cidade de Bogotá, como um capital racial que lhes permite desenhar estrategias para a gestão e negociação de sua identidade em seus contextos específicos. No artigo seguinte: “Bolero, samba-canção e sambolero: matrizes, nomadismo e hibridismo de gêneros musicais latino-americanos no Brasil, anos 1940 e 1950” de Raphael Fernandes Lopes Farias, o autor analisa o encontro do gênero musical caribenho do bolero com o samba-canção no Brasil, ocorrido a partir dos anos 1940 e com forte presença nas mídias sonoras até a década seguinte.
Para tanto, o autor levou em consideração o caminho percorrido pelo bolero e suas afinidades com o samba-canção e com o cenário brasileiro. O autor conclui de “que tanto o sambacanção quanto a Bossa Nova, encontraram no bolero protagonismos, antagonismos e práticas musicais que compõe a identidade da música brasileira”.
No último artigo que encerra este número da Revista Brasileira do Caribe, Danny Armando González Cueto apresenta “La representación visual y las versiones sobre el Carnaval de Barranquilla: de las tres culturas a la fiesta contemporânea”. O autor apresenta as maneiras como se olha para o Carnaval de Barranquilla, levando em consideração “que a diferencia de muitos outros carnavais no mundo, o seu componente cultural se deve em grande medida ao cruzamento de culturas”.
Agradecemos a todos os que viabilizaram o lançamento deste novo número da Revista Brasileira do Caribe, especialmente, à Pós-graduação em História da Universidade Federal do Maranhão, a Editora e gráfica da Universidade Federal do Maranhão e a todos os pareceristas que participaram com o seu trabalho e generosidade na avaliação dos artigos recebidos.
Agradecemos também à Superintendência de Comunicação (Sucom) da Universidade Federal do Tocantins pela disponibilização da arte do evento para usarmos como capa deste número da revista.
Convidamos a todos os leitores a percorrer as páginas desta nova edição da Revista Brasileira do Caribe que nos apresenta diversos pontos de vista da produção historiográfica sobre o Caribe.
Dernival Venâncio Ramos Júnior – Organizador do Dossiê temático e Editor Adjunto da RBC.
Isabel Ibarra Cabrera – Editora da Revista Brasileira do Caribe.
VENACIO, Dernival. Cem anos de solidão de Gabriel García Márquez. Revista Brasileira do Caribe, São Luís, v.19, n.36, p.4-6, jan./jun., 2018. Acessar publicação original. [IF].
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