Brazilian Foreign Policy in Changing Times: the quest for autonomy from Sarney to Lula | Tullo Bigevani e Gabriel Cepaluni
Ao final da primeira década do século XXI, a visibilidade do Brasil no sistema internacional tornou-se mais evidente, graças, em grande medida, ao sucesso alcançado pelo país nos campos econômico e político-diplomático. Percebeu-se, em contraste, a existência de uma grande carência na literatura internacional, a qual, muito ocasionalmente, desvia seu foco dos países centrais do sistema internacional. Neste sentido, a obra de Tullo Vigevani e Gabriel Cepaluni aqui apresentada preenche uma importante lacuna editorial não apenas por ser publicada em língua inglesa, mas sobretudo por permitir que o público estrangeiro conheça as grandes linhas da política externa brasileira tanto do ponto de vista teórico quanto empírico, por meio do estudo de vasta literatura produzida por pesquisadores latino-americanos.
O tema central do livro é a busca brasileira por autonomia, desde a segunda metade dos anos 1980 – com a inauguração do regime democrático – até 2009. Segundo os autores, a noção de autonomia (capítulo 1) é entendida pelos latino-americanos como a capacidade de se proteger contra os efeitos mais nocivos do sistema internacional e dos constrangimentos impostos por países poderosos. Vigevani e Cepaluni explicam que a autonomia se expressa por meio de três táticas distintas: pela distância perante países dominantes; pela participação ativa em instituições internacionais; e pela diversificação de parcerias e fóruns de atuação.
Durante o Governo José Sarney (1985-1990), os autores afirmam ter sido predominante a tática da autonomia pela distância (capítulo 2). Porém, sobretudo em razão de quatro situações – moratória da dívida externa brasileira, disputa contra os Estados Unidos sobre patentes farmacêuticas e sobre tecnologia da informação e posição brasileira na Rodada Uruguai do GATT –, a política externa brasileira foi pressionada a mudar ao final dos anos 1980. Elementos internos, como o esgotamento do modelo de substituição de importações, também colaboraram para a adoção uma postura menos autárquica e mais liberal.
Sob os impactos das transformações provocadas pelo fim da Guerra Fria, o governo Fernando Collor de Mello (1990-1992) hesitou entre dois paradigmas diplomáticos (capítulo 3): primeiro, distanciou-se das práticas tradicionais e alinhou-se às visões e valores dos países desenvolvidos; em seguida, aproximou-se de países do Cone Sul, sinalizando atitude de maior autonomia. Já o governo Itamar Franco (1992-1994) herdou tanto um cenário doméstico instável quanto uma agenda internacional dominada por pressões norte-americanas pró-reformas econômicas liberais, tendo hesitado em reconhecer os Estados Unidos como principal parceiro. Para os autores, ambos os governos foram incapazes de estabelecer uma política externa coerente, seja por terem enfrentado forte instabilidade político-econômica, seja por terem tido gestões de curto prazo com freqüentes trocas de chanceleres.
Vigevani e Cepaluni acreditam que foi sobretudo com o governo Fernando Henrique Cardoso (capítulo 4) que se buscou internalizar diversas mudanças liberais propostas pela globalização, mantendo-se ao mesmo tempo o apoio a certos instrumentos econômicos e empresas estatais. A autonomia pela participação fez com que o país se aproximasse dos pólos centrais internacionais e admitisse uma maior aderência aos regimes internacionais.
Percebendo a necessidade de se combater assimetrias e aumentar o peso do país nas negociações político-econômicas internacionais, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (capítulo 5) propôs o exercício da autonomia por meio da diversificação de parceiros, tendo sido especialmente incentivadas as relações com países em desenvolvimento.
Os processos de integração regional e as relações com vizinhos como Argentina (capítulo 6) e Venezuela (capítulo 7) foram considerados de alta relevância econômica e estratégica pelo governo brasileiro. Porém, a baixa sensibilidade de determinados grupos de interesse a questões regionais, a não aceitação de seu aprofundamento institucional, ademais da alta importância atribuída pelo governo a questões e agendas globais, teriam dificultado o exercício da autonomia brasileira em seu entorno.
Em seu conjunto, seja pela riqueza de detalhes com que percorre a política externa brasileira no último quarto de século, seja pela inovadora estrutura analítica proposta, acredita-se que a obra de Vigevani e Cepaluni constitui uma relevante contribuição para os estudos brasileiros em relações internacionais, agora a serem igualmente apreciados pelo público anglófono
Resenhista
Danielly Silva Ramos Becard – Professora Adjunta do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB. E-mail: daniellyr@yahoo.com
Referências desta Resenha
VIGEVANI, Tullo; CEPALUNI, Gabriel. Brazilian Foreign Policy in Changing Times: the quest for autonomy from Sarney to Lula. Translated by Leandro Moura. Lanham: Lexington Books, 2009. Resenha de: BECARD, Danielly Silva Ramos. Meridiano 47, v.11, n.122, p.42-43, nov./dez. 2010. Acessar publicação original [DR]