A primeira revolução proletária vitoriosa da história impactou de formas variadas a política, a cultura e as sociedades das Américas. Diversos partidos comunistas foram fundados e revoluções ocorreram após 1917 e, indubitavelmente, a utopia entrou no coração e mente de diversos operários, intelectuais, artistas e militantes também do outro lado do Atlântico.
Passados 100 anos a Revolução Russa tem gerado debates diversos entre os movimentos dos trabalhadores e na academia, especialmente na área de História. O Curso de História da UFMS Campus de Três Lagoas soma-se a essa efeméride com o lançamento deste dossiê e, desde já, convida os leitores à participarem da XVII Semana acadêmica que traz o tema “Centenário da Revolução que abalou o mundo: história e historiografia”, com conferências, mesas, comunicações de pesquisa e minicursos. O evento ocorrerá entre os dias 30 de outubro e 01 de novembro de 2017.
O campo editorial também aproveita o centenário para reeditar clássicos da história da Revolução Russa, bem como publicar trabalhos recentes e novas abordagens. As revistas científicas da área de Ciências Humanas têm lançado dossiês nesta perspectiva, contribuindo para o debate ao publicizar pesquisas recentes de temas inéditos e revisões historiográficas. A revista do Curso de História da UFMS / CPTL segue essa “trilha” com o dossiê “Brasil e América Latina nas trilhas da Revolução Russa” ao reunir artigos historiográficos ou que tematizam as experiências políticas e culturais na Rússia e na América Latina pós-Revolução de 1917, e que dialogam com os acontecimentos russos e seus desdobramentos.
O dossiê inicia com o texto de Wanderson Melo, “O processo da Revolução Russa de Fevereiro de 1917: protagonismo dos trabalhadores, estouro revolucionário e dualidade de poderes”, que caracteriza a Revolução de fevereiro de 1917 como um movimento abrupto e espontâneo dos trabalhadores, resultando na dualidade de poderes.
Alexandre Costa, em “As práticas da edição e a Revolução Russa: as representações da URSS nas páginas da revista Inteligência: mensário da opinião mundial 1935-1939”, discute as representações da Revolução no periódico brasileiro de direita, revista Inteligência da cidade de São Paulo. A análise dos textos e caricaturas publicados na revista permite ao autor compreender as posições dos editores quanto à política interna brasileira.
O artigo de Luis Genaro, “Distopia permanente: projeto da modernidade, condição pós-moderna e o novo tempo do mundo”, traz um debate teórico acerca da modernidade, pós-modernidade e o “novo tempo do mundo”, tendo como marcos as revoluções burguesa, industrial e proletária. O autor destaca a atualidade das lutas sociais herdeiras de processos revolucionários do século XX.
Em “A Revolução Russa e o movimento operário brasileiro: confusão ou adesão consciente?” Carlos Prado analisa as repercussões da Revolução Russa no movimento operário brasileiro e a posição assumida pelos militantes libertárias diante da revolução bolchevique, tendo como fontes de informação os jornais operários e da grande imprensa brasileira.
Fabiane Muzardo, no artigo “A (re)construção da cultura nacional mexicana no período pós-revolucionário: a sobrevivência da cultura ancestral em ‘Ídolos tras los altares’”, estuda a produção cultural mexicana nas décadas de 1920 e 1930, pós-Revolução Mexicana, caracterizada por uma fusão de diversos elementos da cultura indígena e popular, bem como pela cultura do período colonial e contemporâneo. A primeira fase da Revolução Mexicana (1910 a 1920) antecede a Revolução Russa e, de certa forma, é o marco inicial das grandes revoluções sociais do século XX. Todavia, os ideais da Terceira Internacional (e mesmo da Quarta Internacional ainda nos seus rascunhos, com a presença física de Trotsky no México) chegaram ao país latino-americano nas décadas posteriores e também influenciaram intelectuais e artistas que produziam uma arte revolucionária na estética e no conteúdo.
O dossiê se encerra com o artigo “Mariátegui e a resposta socialista à crise do mundo burguês”, de Ricardo Streich. Uma abordagem instigante da perspectiva socialista adotada pelo peruano Mariátegui no início do século XX, e a leitura que este faz da crise do liberalismo pós-Primeira Guerra, e o constructo teórico desse teórico militante a partir de Bergson, Croce, Einstein e Freud.
Na seção “artigos livres” Noemia Oliveira analisa a atuação do clero na revolta popular no povoado de Fagundes, Paraíba, na década de 1870, iniciada pelo questionamento à mudança no sistema de medida. O artigo “Um missionário subversivo: o Padre Ibiapina na Revolta do Quebra-Quilos” discute o movimento no contexto das mudanças políticas da segunda metade do século XIX.
Em “ensaios de graduação” temos dois textos de graduandos do curso de História da UFMS / CPTL que discutem a história indígena nos séculos XIX e XX, com foco na região do alto rio Paraná: Lucas Moreira, em “Nimuendajú, Ribeiro, Freundt: Contribuições para mapeamento etnográfico Ofaié na primeira metade do século XX”, e Vanessa Serra, “Os Cayapó e a história agrária e indígena no sul de Mato Grosso: entre roças, estradas e aldeamentos; entre encontros e desencontros (século XIX)”.
Na seção “resenhas”, Eduardo Dianna apresenta a obra organizada por Rodrigo Patto Sá Motta, Ditaduras militares: Brasil, Argentina, Chile e Uruguai (2015).
Por fim, em “fontes” temos a apresentação que Daniel Caires faz do relato de viagem da família Segall em direção ao Brasil, em 1911, fonte sob a guarda do Arquivo Lasar Segall.
Fábio da Silva Sousa Vitor
Wagner Neto de Oliveira
Três Lagoas-MS, inverno de 2017
SOUSA, Fábio da Silva; OLIVEIRA, Vitor Wagner Neto de. Apresentação. Revista Trilhas da História. Três Lagoas, v.6, n.12, jan. / jun., 2017. Acessar publicação original [DR]
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