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As alternativas políticas à Democracia no século XX / Intellèctus / 2017

Apresentamos neste número o dossiê As alternativas políticas à Democracia no século XX, de produção historiográfica de autores de diferentes universidades.

O objetivo deste dossiê se confunde com o objetivo da revista: ele “destina-se a publicar estudos em História Intelectual e dos Intelectuais bem como sobre a produção cultural dos países que compõem o universo cultural da Latinidade“, abordando questões pertinentes à: Política, Economia, Sociedade, Filosofia e Artes.

Além disso, a temática do dossiê é dedicada ao pensamento, às organizações e aos indivíduos que durante a época contemporânea se opuseram à Democracia no Ocidente. Este desafio nasceu a partir da leitura do livro de Jan-Werner Müller “Contesting Democracy. Political Ideas in Tewntieth-Century Europe”, editado pela Universidade de Yale em 2011. Esta obra se tornou uma referência para todos os que se dedicam ao estudo das ideias políticas e ao processo de (des)construção da Democracia no século XX, especialmente no entre guerras. Segundo este autor, a esfera política e os indivíduos nunca terão sido tão influenciados por escritores como neste período. Talvez por isso, o século XX é para muitos historiadores “a era das ideologias”, e, que pelas suas características violentas, fanáticas e irracionais, levaram Eric Hobsbawn a batizar os anos de novecentos como a “Era do Extremos”.

Recebemos valiosas contribuições, que certamente nos auxiliarão na tarefa de refletir a respeito dos temas aqui sugeridos, que forçosamente caminharam partindo dos seguintes temas:

  1. A contestação da Democracia e dos seus valores ao longo da época contemporânea no campo político e intelectual;
  2. A apresentação no campo político e intelectual de alternativas à Democracia, como, por exemplo, Autoritarismo, Corporativismo e Fascismo;
  3. A circulação e a influência transnacional do pensamento conservador, autoritário e fascista no espaço europeu e ibero-americano.

Delineamos, com a reunião destes artigos, um percurso investigativo que aponta traços bastante comuns entre a intelectualidade brasileira e estrangeira, no que diz respeito à fragilidade do ideário democrático no Ocidente em tempos não tão distantes, e que, sob qualquer ótica, ainda se apresenta bastante viva.

O primeiro artigo, intitulado “Minando o sistema republicano-liberal desde dentro. Os partidos políticos portugueses no contexto europeu e ibérico (1919-1926)”, de Manuel Baiôa, lança a proposta de analisar os partidos políticos portugueses, após a Primeira Guerra Mundial, apontando suas especificidades, ao continuar preso “à tradição liberal e oligárquica do século XIX”, ainda que numa versão republicana e com um sistema multipartidário de partido dominante com uma crescente falta de legitimidade. O autor nos apresenta o conjunto político europeu, analisando o sistema de representação, em diferentes contextos nacionais e o surgimento de novos partidos, complexificando a situação portuguesa dentro do Velho continente.

O segundo artigo, “A construção de uma historiografia autoritária pelo estado novo de Getúlio Vargas: o caso da revista Cultura Política (1941-1945)”, de Rafael Nascimento Gomes, como descrito no resumo, “propõe-se a analisar as visões de história do Brasil disseminadas durante a Ditadura do Estado Novo de Getúlio Vargas (1937- 1945). Em outras palavras, busca-se apresentar os esforços governamentais voltados para uma releitura da história brasileira. Para isso utiliza-se como principal fonte a revista Cultura Política, editada pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), vinculado diretamente à Presidência da República, entre 1941 e 1945”. Constitui-se como um importante instrumento de análise deste período da nossa história, principalmente no que tange à construção, ou reconstrução de nossa identidade, a partir da atuação do Estado varguista, em sua engenharia política e propagandista.

Seguindo a ordem, no terceiro artigo, “Miguel Reale: do fascismo ao autocratismo”, o autor, Rodrigo Jurucê Mattos Gonçalves, procura analisar “a trajetória pós-integralista de Miguel Reale, sobretudo com a abordagem de sua principal obra jusfilosófica: “Filosofia do Direito” (1953). Neste livro, Reale traz a lume de forma mais acabada a teoria autocrática que começa a desenvolver a partir do ocaso do integralismo em 1938”.

O quarto artigo, “El nuevo golpismo, el estado de excepción y los modelos de modernización en América Latina”, István Szilágyi, “analiza los distintos modelos de modernización,las estrategias alternativas y los cambios geopolíticos ocurridos en América Latina durante los últimos sesenta años”, dando conta de conceitos tão explicativos à realidade latino-americana, como “Estado de exceção”, conceito esse combinado à ideia de modernização – obrigando ao autor a análise de suas mais diferentes expressões, e de identidade.

“A luta armada contra a ditadura militar: revisitando os debates sobre esse movimento no Brasil e na Argentina”, de Luiz Fernando Mangea da Silva, o último artigo deste dossiê, objetiva estruturar “uma análise interpretativa da atuação das esquerdas revolucionárias que pegaram em armas contra a ditadura tanto no Brasil quanto na Argentina”, preocupando-se também em apontar semelhanças e diferenças entre os regimes ditatoriais, onde ambos buscavam, em seu discurso, legitimar o governo, através do que acreditavam ser uma defesa ás tradições e valores nacionais. O autor ainda trabalha o conceito de construção da memória, apoiado em uma rica bibliografia.

De certa forma, os artigos dialogam entre si, expondo questões e trazendo luz aos temas propostos, e apresentando caminhos de análises bastante fundamentados.

Esperamos, com este dossiê, o reavivamento, em tempos atuais tão preocupantes, das discussões a respeito da necessidade de defesa do princípio democrático como sustentáculo das sociedades ocidentais.

Nos deparamos, a cada dia, com fatos que parecem tornar incerto, no Ocidente, o futuro do Estado Democrático de Direito; com isso, fortalecer o espaço de reflexão se torna, por isso, cada vez mais imperativo.

Recuperando a noção de intelectuais orgânicos, tão bem estruturada por Antonio Gramsci, e que nos perceber que o intelectual não está dissociado do mundo real, e o responsabiliza pela tarefa de construção de uma consciência crítica, onde o fim último é modificar o mundo, acreditamos que este dossiê represente, não só para a comunidade acadêmica, mas para o público em geral, uma significativa ferramenta de luta contra um projeto que parece ter como objetivo a paulatina destruição da democracia como valor maior de uma sociedade.


Apresentadoras

Eliana Brites Rosa (Universidade de Lisboa)

Fabiana Saboia (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro)

Julho de 2017


Referências desta apresentação

ROSA, Eliana Brites; SABOIA, Fabiana. Apresentação. Intellèctus. Rio de Janeiro, v.16, n.1, 2017. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

Itamar Freitas

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