Arte e Política: raça, gênero e nacionalidades | Faces de Clio | 2021

É com enorme satisfação que apresentamos a edição número treze da Revista Faces de Clio com o dossiê “Arte e Política: raça, gênero e nacionalidades”, contando com 12 artigos ligados à temática do dossiê e 5 artigos livres. Temos a proposta, nesta edição, de apresentar discussões que contribuam nas pesquisas e reflexões acerca da complexa e estreita relação da arte com a política. Novamente apresentamos pesquisas que se detém sobre os mais diferentes suportes, desde o videogame, a ópera e a literatura, passando pela performance, pela dança, arquitetura e pintura. No presente dossiê reunimos artigos ligados à temática da raça, do gênero e das nacionalidades, pensados todos, claro, através e, a partir, da arte!

Este é o terceiro volume da Revista Faces de Clio publicado durante a pandemia do coronavírus e gostaríamos de agradecer à equipe da Faces de Clio por todo empenho em continuar com as atividades da revista diante de um cenário desolador da pandemia e do desmonte da pesquisa e da ciência no Brasil. É na resistência que encontramos formas de continuar sobrevivendo e lutando por um país mais justo e igualitário. Agradecemos também aos pareceristas que contribuíram com a revista e nos ajudaram a manter a qualidade de nossa publicação.

Abrindo o dossiê apresentamos o artigo da mestranda Bárbara Denise que tem o objetivo de investigar e analisar comparativamente algumas capturas de tela do videogame Apocalipsis: Harry at the end of the world com imagens oriundas dos séculos XV – XVI que podem ter servido de inspiração para a estética do jogo. Utilizando como embasamento teórico leituras de Umberto Eco sobre a presença da Idade Média hoje, o conceito de intermidialidade exposto por Claus Clüver e o conceito de retrolugares proposto por Alberto Venegas Ramos.

Continuando o dossiê, a mestra em História, Cristina Santos Lucio, aborda em seu artigo o Jongo, uma manifestação cultural afro-brasileira registrada como patrimônio cultural imaterial em 2005. De forma mais específica, a autora se debruça sobre a Comunidade Jongo Dito Ribeiro situada em Campinas-SP, no que diz respeito à importância política dessa prática tanto em seu desenvolvimento, ainda no século XIX, quanto em relação a sua permanência e existência no século XXI. Entende-se que a continuação da prática desse saber implica em questões relacionadas à legitimação identitária e reitera a inserção social da população negra.

Seguindo a leitura, Elen Patricia e Juliane Oliveira, no artigo “Performance Revitalize: Um diálogo com a poética da artista Laura Miranda, no âmbito do Evento Escultura Pública de 1992”, têm o objetivo de estabelecer uma relação entre a proposta da performance Revitalize em diálogo com a proposta poética da artista Laura Miranda, no âmbito do evento Escultura Pública, de 1992. Esta ação urbana chamou a atenção dos habitantes da cidade para as relações fenomenológicas, sociais e políticas mobilizadas pelo trabalho de Laura Miranda, especialmente, no que se refere ao debate sobre arte pública.

Em nosso quarto artigo, Isabela Ribeiro busca elaborar uma leitura dos dois romances publicados por Milton Hatoum na trilogia “O lugar mais sombrio”. Ao longo do texto, a autora procura refletir sobre as experiências do protagonista, marcadas pelo contexto da ditadura militar. A mobilização da memória, não somente na construção da narrativa, mas também como objeto de reflexão de alguns personagens, foi pensada a partir das relações com o exílio, com a escrita e com as formas de resistência ao autoritarismo.

As autoras Tatiana de Carvalho Castro e Jéssica Wisniewski no artigo “Um pássaro rebelde: Violência simbólica e subversão feminina na ópera “Carmen”” trazem uma análise de dois momentos do texto da ópera Carmen (G. Bizet) para evidenciar como a personagem principal, que leva o nome da obra, foi um instrumento de recepção de violências simbólica e física, fundamentando-se nos Estudos de Gênero

A doutoranda pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Lorraine Mendes no artigo, “Meu avô não foi qualquer um Sankofa em A Redenção de Cam”, realiza uma análise afrocentrada do quadro “A Redenção de Cam”, de Modesto Brocos, priorizando as relações raciais tensionadas a partir da figura da avó. Para tanto a autora procura teorizar sobre as relações raciais na construção da identidade nacional, utilizando um arsenal teórico diverso para, em uma crítica às narrativas hegemônicas da história da arte brasileira, enunciar a presença de uma Sankofa na tela, conceito a ser desenvolvido ao longo do artigo.

No artigo “Entonces, Victoria, plante su cruz ahora, la cruz de los suyos”, Maria Soledad González aborda Victoria Ocampo como gestora artística e cultural antes de Sur, abordando, para isso, algumas passagens de Testimonios e o quarto volume de sua autobiografia para compreender seu trabalho e consagração a partir dos trinta anos. A autora busca, por meio do recurso da comparação, interpretar Ocampo em dois cenários que permitem explicar sua agência: o da hospitalidade e o do institucional.

Seguindo a leitura, a mestranda em História pela Universidade Federal do Paraná, Michele de Oliveira, explora em seu artigo as possibilidades de análise do filme Padmaavat do diretor Sanjay Leela Bhansali, lançado em janeiro de 2018. No texto, a autora procura contextualizar o surgimento dessa personagem e desenvolver três linhas principais de interpretação do filme, dando enfoque ao processo de politização da narrativa.

No artigo “Expressões orientalistas na França: Desenvolvimento de artes e ciências após a Campanha do Egito (1798)”, Nina Paschoal analisa obras de arte do século XIX para identificar aquilo que foi consagrado como a temática orientalista da pintura, analisando os estereótipos e discursos coloniais propagados através dela.

Isadora Castro e Raphael Barros analisam a perpetuação da representação cultural da personagem histórica Marielle Franco, mais especificamente, no período de junho de 2018, tendo como recorte geográfico a Cinelândia, no Rio de Janeiro. Os autores afirmam que as intervenções artísticas propagadas na Cinelândia possibilitam analisar certo discurso e disputa acerca da memória que é perpetuado na história recente desta localidade.

O doutor pela Universidade Federal do Ceará Reginaldo Souza Chaves, busca discutir, em seu texto, as linguagens artísticas de Waldemar Cordeiro e Wesley Duke Lee em meio ao processo de metropolização e cosmopolitização da cidade de São Paulo entre a década de 1950 e 1964. Para isso, o autor coloca em discussão os debates artísticos da época, situando os dois intelectuais a partir de suas perspectivas sobre modernidade e visualidade e aponta as diferenças entre as propostas dos artistas em urdir temporalidades, acionando sensibilidades utópicas e modernizantes em Waldemar Cordeiro e nostálgicas e antimodernas em Wesley Duke Lee

No artigo “Orientalismos como espelhos: olhares ocidentais mirando um Oriente na arquitetura.” Renato Brancaglione Cristofi discorre sobre a historicidade, fenomenologia e sentidos do Orientalismo nas arquiteturas europeias do século XIX. O autor oferece uma abordagem conceitual sobre tais manifestações e linguagens na cultura material edificada, enquanto produções sociais marcadas por tensões próprias de linguagem arquitetônica fundamentalmente parlante e de representação do ‘outro’

Finalizando os artigos do nosso dossiê, o mestre em História pela UFRJ, Saulo Castilho Pereira, em seu artigo “Idas e vindas do navio negreiro Brookes: Arte como ação política na apropriação de um ícone do abolicionismo britânico.”, analisa os trajetos do diagrama do navio negreiro Brookes, de Thomas Clarkson, através das obras de Romuald Hazoumé e Rosana Paulino. O autor procura responder como as apropriações artísticas podem ajudar a construir um quadro de revisão crítica, não somente da imagem do navio Brookes e das contradições do discurso abolicionista, mas de uma reatualização das lutas contra o racismo e outras formas de dominação como a violência racial e de gênero no tempo presente.

A nossa seção de artigos livres inicia com o texto da Carolina Pedro Soares “A constituição do destombamento entre as disputas das redes nacionais e locais na preservação do patrimônio cultural no governo de Getúlio Vargas.”. No artigo a autora analisa a construção das redes que influenciaram direta ou indiretamente as motivações que levaram a concepção do Decreto-lei 3.866/1941, em que passa a ser instituído o cancelamento do tombamento – ou destombamento. Para isso, é analisado o processo de tombamento da Igreja de Nossa Senhora do Rosário, em Porto Alegre.

Em seu artigo “A presença africana registrada por meio do comércio interno de escravos em Juiz de Fora, MG (1870-1880)”, Dayana de Oliveira da Silva, tem o objetivo de examinar a presença de cativos de origem africana através do comércio interno de escravos na cidade de Juiz de Fora (MG) durante a década de 1870. A autora busca compreender, com base em análises qualitativas e quantitativas, a constituição do processo operacional e da logística relacionados à comercialização dos escravizados.

Em seguida, Glauber Eduardo Ribeiro da Cruz, em seu artigo “Patrimônio(s) e educação patrimonial: a relação entre a sociedade luziense e o patrimônio da cidade de Santa Luzia/MG” propõe, por meio da educação patrimonial, refletir sobre a construção de vínculos entre os/as estudantes da cidade de Santa Luzia e o patrimônio cultural do município. Para isso, o autor apresenta a similaridade entre as análises acadêmicas e institucionais sobre a valorização do centro histórico da cidade e um distanciamento da sociedade luziense com os patrimônios culturais delimitados pelo poder público.

No artigo ‘“Empalideciam e ficavam imóveis como estátuas” O cólera na cidade do Icó, província do Ceará (1862)”, o professor da Universidade Federal do Cariri, Jucieldo Ferreira Alexandre, demonstra, através de manuscritos e jornais, como a memória local inflacionou o impacto demográfico da epidemia cólera que atingiu Icó, Ceará, em 1862. O autor apresenta uma narrativa dos dias de crise, especialmente indicando os efeitos no cotidiano local: um tempo de medo e tensões sociais. A apresentação do drama epidêmico indicia o que levou o cólera a permanecer sendo acionado na memória local quase cento e sessenta anos depois.

Finalizando a edição 13 da Revista Faces de Clio o artigo do Leandro Ribeiro Brito, “A violência nos séculos XI e XII: uma análise a partir da contemporaneidade” tem por objetivo analisar o uso da palavra violência nas documentações dos séculos XI e XII. O texto, busca também compreender a relação com a construção de uma verdade que tem como propósito determinar o que é ou não violência e, a partir daí, refletir sobre o que hoje consideramos um ato violento.

Esperamos que vocês aproveitem a leitura e que sejam inspirados pelos textos aqui publicados. Nós reforçamos nosso compromisso com a defesa da ciência, da pesquisa e da Universidade pública no Brasil.


Organizadores

Bárbara Ferreira Fernandes – Editora-chefe da Revista Faces de Clio e doutoranda em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: barbaraffernandes@outlook.com

Carolina Martins Saporetti – Editora-chefe da Revista Faces de Clio e doutoranda em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: carolinamartinssaporetti@gmail.com


Referências desta apresentação

FERNANDES, Bárbara Ferreira; SAPORETTI, Carolina Martins. Apresentação. Faces de Clio. Juiz de Fora, v. 7, n. 13, p.1-5, jan./jul. 2021. Acessar publicação original [DR]

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