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Alagoas Contemporânea: Economia e Políticas Públicas em Perspectiva | FAPEAL

Os últimos anos do século passado, e as primeiras décadas do presente, viram um recrudescimento dos estudos regionais, em especial do Nordeste brasileiro. Tais estudos intentaram retomar a problemática do desenvolvimento e da superação de barreiras formadas ao longo da história da região, fossem essas provenientes de razões econômicas, sociais, políticas ou mesmo uma junção de todas. Portanto, o assunto do livro assinado pela FAPEAL, agência que teria como seu propósito fomentar a pesquisa em Alagoas a partir do dinheiro do contribuinte, pode ser considerado de significância, por visar expor os elementos da economia do Estado que mostram-se hoje como permanentes, para além de mudanças conjunturais. Alagoas é um dos estados mais subdesenvolvidos do país, em que aspectos como a posse concentrada de terra, ou do poder público por oligarquias que vem se perpetuando desde o tempo das capitanias hereditárias mostram sua olorosidade mais acre. Um livro – ainda que fosse mais um – deveria ser mais do que bem vindo pela comunidade científica interessada no problema do subdesenvolvimento e sua superação. Ainda mais quando assinada por estudiosos do Estado, os quais deveriam estar comprometidos com o problema.

Entretanto, a forma e a metodologia com que a obra foi realizada trazem desalento a quem esperava substância. O que se observa é um conteúdo altamente desatualizado, com temas que tentam apear-se na temática do desenvolvimento, como a “inovação”, ou certo enfoque herdado da quase centenária “teoria do lugar central” weberiana, requentada sob a forma conceitual dos “arranjos produtivos locais”, ou como seus autores gostam de apelidar, APLs, os quais já se encontram em desuso em outras áreas das ciências sociais aplicadas.

Antes de nos adentrarmos em uma análise mais pontual dos textos que compõem a obra, faz-se necessário realizar um breve aposto sobre a editoração e a organização. A obra transparece claramente como compêndio de textos diversos forçadamente conectados pelo tema de economia regional contemporânea. Inconsistências como variação na qualidade dos gráficos e tabelas, que aparecem em vários trechos desfocados e fora de escala o que prejudica sua compreensão e mesmo a interpretação. Não é a primeira vez que isso acontece por lá, e é lamentável que se repita. Reiteramos que isso inviabiliza uma iniciativa digna, que é o estudo econômico das estruturas em nível regional. Trapalhadas editoriais e acadêmicas como essa dão pretexto ao ataque de órgãos públicos de pesquisa que deveriam estudar desenvolvimento. Não apenas os que realizam tais pataquadas, mas órgãos sérios e consistentes, como é o caso recente da Fundação de Economia e Estatística, em Porto Alegre (RS), por exemplo. O sucateamento dos estudos sobre desenvolvimento em Alagoas conduz à inoperância crônica das políticas públicas ou mesmo ao seu abandono.

Isto posto, a obra organizada ela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas (FAPEAL) chama atenção, com sua capa bonita de cores vibrantes e tema tão próximo a sociedade Alagoana como um todo. Era de se esperar uma discussão com importantes contribuições para a problemática das políticas públicas do estado, considerando a pertinência do tema a formação de ações que possam guiar o setor público a tratar de problemas estruturantes.

Esse não é o do presente livro. Em suas mais de duzentas e cinquenta páginas, a falta de coerência entre os textos, juntados em doze capítulos, mina qualquer possibilidade de uma contribuição significativa para a temática proposta.

O primeiro texto intitulado “ A Evolução Recente Da Economia Alagoas”, de Reynaldo Rubem e Francisco Rosário, trata-se de um estudo de variáveis que simplesmente não contempla os objetivos propostos pelos próprios autores no texto, sendo esses de descrever e analisar a atual estrutura do estado. Devido a falha – referente à análise ou mesmo à coleta e processamento dos dados – ao tentar descrever o arcabouço estrutural os autores limitam-se a uma periodicidade inconsistente, com observações da composição setorial do PIB alagoano realizada sobre os anos de 1990, 2000 e 2009 em contraposição ao recorte temporal de atividade incentivadas pelo governo, valor da transformação industrial, distribuição de renda domiciliar, dentre outros que são observados dos anos de 2007 a 2014. Os fatos expostos no texto não são suficientes para corroborar a frágil estrutura com baixa densidade empresarial e desorganização estrutural descrito no texto, isso associado ao fato de que a crescente representação do PIB do comércio e dos serviços não se trata de algo peculiar ao estado, nem mesmo a região, retira qualquer credibilidade das conclusões do estudo.

Os Capítulos 2 e 3 são exemplos da falta de coerência entre os textos que compõe a obra, São os únicos textos do livro que se utilizam de “modelagem econométrica” para descrever a relação de causalidade entre diversos condicionantes e o fluxo comercial do estado de Alagoas. Quanto a metodologia de cálculo, o esforços dos autores seria até louvável. Entretanto, a utilização de um arcabouço teórico ainda derivado da teoria do lugar central limita o modelo as mesmas fraquezas que esta possui. Além disso, os estudos não intentam observar possíveis quebras estruturais na composição dos fluxos comerciais, o que poderia ser desconsiderado, caso o texto fosse um artigo científico isolado. Já no corpo de uma obra que visa descrever os problemas estruturais de Alagoas, faz-se necessário entender as forças que possam alterar a dinâmica dos fluxos de comércio, e isso se encontra para além dos modelos ali expostos.

O capítulo 4 de Reynaldo Rubem, Thierry Prates e Ana Lúcia Fontenele é provavelmente o mais nocivo à temática proposta de desenvolvimento. Parte novamente de um objetivo até nobre: a democratização dos recursos financeiros para empresas de pequeno porte. Entretanto, na constante busca dos autores a dar respaldo à proposta de financiamento com base no conceito de “finanças de proximidade” para ofertar microcrédito, os próprios autores são obrigados a reconhecer que “não há consenso” no tema. Essa incerteza, associada ao alto risco dos micronegócios, propiciaria, se levada a sério por quem faz política pública, o surgimento de uma massa de empréstimos como ativos de Sunk costs, o que ampliaria a margem para argumentos de sucateamento e desmanche neoliberal das agências de fomento ao desenvolvimento. Em uma analogia simplória, os pesquisadores sugerem que um doente de cirrose hepática tome um litro da “boa” cachaça alagoana, de uma vez só, ainda que isso não seja “consensual entre os médicos”…

Os capítulos subsequentes não trazem de novo absolutamente nada, repetindo os contrasensos já vistos em obras anteriores. Há porém mais 8 textos, de diversos autores, com alunos e professores do programa do mestrado em economia aplicada. É esse o tom final do livro, um meio pelo qual a organização do programa de mestrado tem para disseminar a produção acadêmica de seus discentes e docentes passando pelo crivo da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas, composta pelos próprios autores.

Por fim, faz se necessário ressaltar que a forma e metodologia do livro ora analisado, não tira o mérito das questões do desenvolvimento econômico para o estado de Alagoas, de fato, é possível encontrar diversos estudiosos do passado, como o geógrafo, cientista social e político Josué de Castro ou o geógrafo, historiador e economista Manuel Correia de Andrade que tem muito mais a oferecer do que o conteúdo que se encontra no livro de capa vibrante publicado pela FAPEAL. É muito triste e preocupante que, em sua segunda tentativa, o mesmo coletivo não tenha apresentado evolução de análise ou metodologia. Afinal, é a partir de sua intelectualidade que surgem as análises, conceitos, propostas e políticas de desenvolvimento de uma sociedade. Esses acadêmicos, certamente, estão em débito para com a sociedade.


Resenhista

Rafael Aubert de Araujo Barros – Economista. Mestrando em História Econômica pela Universidade de São Paulo.


Referências desta Resenha

Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de alagoas (Org). Alagoas Contemporânea: Economia e Políticas Públicas em Perspectiva. Maceió: FAPEAL, 2014. Resenha de: BARROS, Rafael Aubert de Araujo. Revista de Economia política e História Econômica. São Paulo, ano 12, n. 37, p. 231-233, janeiro, 2017. Acessar publicação original [DR]

 

Itamar Freitas

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