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A vertigem das artes no Sul global | PerCursos | 2021

Capa da coletânea ‘100 Anos de Gonzagão’ Bento Andreato/Divulgação | Imagem: Veja São Paulo, 2019

Viajando pela Vertigem das Artes no Tempo Presente do Sul Global

Nas últimas décadas, as artes têm sido tradutoras de muitos dos dilemas sociais no Sul Global (GUERRA, 2021a). Através delas, inúmeros artistas têm expressado suas opiniões e tecido críticas e/ou elogios aos poderes instituídos. Múltiplas formas de arte têm sido dedicadas às vivências quotidianas insurgentes. Essas expressões artísticas são também atos de cidadania ativa, na medida em que envolvem uma afirmação ou luta por direitos ou espaço: daí, ser “urgente analisarmos os sons e os espaços como formas de agenciamento das vidas e das cidades”, daí destacarmos a importância das “sociabilidades urbanas” (GUERRA, 2021b: 173). O simples ato de criação questiona o instituído, produz inovação e propõe transformação social. É através de processos criativos e de produção e consumo estéticos que os jovens (GUERRA, 2020), em particular, se dedicam a causas sociais, a movimentos alternativos de resistência aos poderes dominantes, à constituição de políticas de identidade em torno do gênero, da etnia, etc.; nesse sentido, aponta-se o importante papel político das culturas do-ityourself (DIY) (GUERRA, 2018) ou do ativismo cultural (GUERRA, 2019). O conceito de artivismo surge, entre outros, na literatura acadêmica, para dar conta de toda esta dinâmica entre criatividade simbólica e agência política. O artivismo pode ser descrito como uma nova linguagem baseada numa relação orgânica entre arte e ativismo, que apela à antiga ligação entre arte e política. Sublinha-se a sua relação profunda com as práticas de ocupação do espaço público e os emergentes movimentos sociais, apontando necessariamente para a decolonização da ciência e da arte.

No Brasil e um pouco por todo o Sul Global, vão emergindo criações culturais e artísticas fora da lógica dominante da criação artística. O cinema experimental defende escolhas estéticas e técnicas contra tendência, optando por utilizar equipamentos tradicionais, na era digital. Produzindo filmes com orçamentos muito limitados e fora dos canais de distribuição usuais, pretende reavivar o filme fotográfico e ensinar métodos e saberes antes que se percam. A título exemplificativo podemos adiantar que uma nova geração de cineastas franceses descendentes de imigrantes, afirma, com orgulho, a sua identidade pós-colonial e anseia criar uma representação alternativa das áreas estigmatizadas, rompendo com imagens veiculadas pelas mídias. Os atores destas cenas independentes já provocaram mudanças e continuam a provocar e fazem-nos acreditar que o território é o terreno para o surgimento da criação artística, dentro de um grupo de pares que compartilha afinidades estéticas ou políticas. E isto é artivismo (VIVANT; MORTEAU, 2020). Também podemos rememorar aqui o influente papel que o ativismo artístico tem na transformação da política urbana em torno da gentrificação. O ativismo artístico está a chamar a atenção crítica para as vozes dos deslocados que de outra forma não seriam ouvidas, demonstrando como o ativismo artístico atual está alcançando o público em geral, os comerciantes, os legisladores e os ativistas acadêmicos para progredir na luta árdua por uma cidade espacialmente justa: mostrando como este ativismo artístico pode reunir diversos atores sociais em coalizão para reivindicar controles democráticos sobre a gentrificação comercial, abrindo espaço para a reorganização dos sujeitos políticos (LEE; HAN, 2020).

De Norte a Sul, os mundos da vida parecem cada vez mais atravessados pela pluralidade da arte, que nos ajuda a pensar, rever e sentir aspectos da nossa história, levando-nos a equacionar a negritude, as pós-memórias, as identidades subalternas e as formas de re-existência. Neste mesmo movimento, tanto a história do tempo presente quanto a história das artes vêm adquirindo maior espaço na historiografia, e o que antes era frequentemente visto como mera história factual ou de segunda categoria ganha, agora, importância redefinida exemplificada pelo crescimento do estudo das artes, da cidade, das paisagens sonoras e urbanas, no tempo presente. Nesse âmbito, não podemos descurar a crescente importância, a diferentes níveis, dos meios digitais nas artes contemporâneas. É necessário levar em conta a sua influência nos processos de criação e nos modos de produção dos criadores; o surgimento de novas linguagens estéticas ou mesmo novas ferramentas e instrumentos musicais e cinematográficos e literários; a mudança do papel da criatividade; a transformação das relações entre autoria e produção; as novas relações estabelecidas entre os novos e os “velhos” meios de comunicação; as formas de tirar partido dos meios de comunicação digitais na organização das carreiras artísticas; e as formas de controle desses processos.

No entanto, também não podemos descurar a relação da sociedade e das artes com o seu passado. Neste contexto, conceitos como memória, herança ou tradição são relevantes. Recentemente, novos discursos relacionados com a retromania e a nostalgia têm vindo a perpassar a produção, a difusão e o consumo cultural e artístico contemporâneo. Torna-se importante estudar as técnicas e modos de produção que foram recuperados e a influência da abordagem retro/nostálgica na produção artística contemporânea, nos processos de trabalho e gestão das carreiras artísticas, bem como, no consumo das artes.

Entre a segunda metade do século XX e as primeiras décadas do século XXI, a expansão do interesse pelas artes foi evidenciada pelo consumo ampliado de seus produtos, bens de consumo que atingiram grande difusão entre as diferentes classes e grupos. Um exemplo histórico é a televisão: desde que começou a despontar na década de 1950, adquiriu tamanha proporção que passou a difundir moda, costumes, desejos, exercendo importante interferência na política. O advento da Internet também trouxe grandes mudanças para o universo da cultura, retirando o monopólio das grandes gravadoras, difundindo obras até então restritas a uma parcela da sociedade ou a acervos particulares e permitindo a diversas manifestações culturais participar da disputa por visibilidade. E, ainda é preciso mencionar, nesse mesmo período, a construção de um star system, primeiro através da rádio e depois pela televisão. Esse lugar ocupado pelos(as) artistas faz com que, por vezes, eles(as) se tornem porta-vozes de setores sociais, não só através da sua arte, mas também de discursos, passeatas, entrevistas, nas quais assumem dilemas do seu tempo. Relativamente ao universo da música em particular, os crescentes avanços tecnológicos e a generalização da aplicação das novas tecnologias de informação e comunicação, levou a uma pulverização contínua de diferentes formatos de comercialização e serviços de difusão musicais: desde os vinis, cd´s, MP3 até às várias plataformas de streaming. Essa diversidade merece uma atenção particular, assim como os seus impactos na criação e apropriação da música, abrindo a discussão sobre as transformações em curso no mundo da música popular e da música contemporânea.

Diante dessa multiplicidade da produção e do consumo de arte e da grande importância que o campo artístico ocupa na sociedade atual, este Dossiê almeja reunir algumas peças do imenso caleidoscópio que forma a história das artes no Sul Global, considerando as diferentes abordagens às várias vertentes da arte, como música, cinema, literatura, teatro, artes plásticas, entre outras, e sua força motriz na ressignificação dos (novos) movimentos sociais contemporâneos ligados ao feminismo, decolonialidade, artivismos, corporeidades alternativas, movimentos LGBTQIA+ e ecologia.

Desta forma, e começando por apresentar as peças deste caleidoscópio, Paula Guerra transporta-nos a “Uma Lisboa só dele(s). Processos artivistas de recriação de paisagens sonoras contemporâneas”. Neste artigo, a autora expõe a trajetória de um músico português – Tó Trips – e da sua última banda – os Dead Combo – no intuito de fundir um percurso musical com uma paisagem sonora. Socorrendo-se, em termos metodológicos, de uma história de vida e de materiais documentais, estabeleceu uma sincronia entre a cidade, sons, a criação musical e a intervenção artística. Os Dead Combo e Tó Trips são, no quadro deste artigo, os (re)criadores ativos de Lisboa, permitindo, simultaneamente, estabelecer algumas asserções sobre o valor do som e da música como carburantes de identidades coletivas e individuais; e a potenciação da construção de imaginários simbólicos e afetivos face a um espaço urbano. Assim, num processo que alguns designam como spatial turn nas últimas décadas, demonstra-se que a globalização parece ter renovado a ênfase no local, encorajando reconstruções identitárias através do surgimento de novas expressões artísticas de vínculo à cidade e, portanto, de uma reimaginação da cidade, partindo de uma produção artística territorialmente ancorada, vivida e sentida.

A segunda peça intitula-se “De(s)colonial artístico como potencialidade de recriação de mundos: lugares de re-existir e re-pensar a si”. Nesta, as autoras Gisele Cristina Voss e Franciele Clara Peloso desenvolvem um ensaio teórico que tem como objetivo versar sobre a arte e o/a artista a partir das contribuições de intelectuais latino-americanos, promovendo uma análise dessas contribuições junto a categoria da práxis de re-existência. Ao tecer reflexões de(s)coloniais dentro deste assunto, estas autoras ampliam as possibilidades de compreensão sobre o sujeito artista e a arte, a partir da América Latina. São eles: o antropólogo, pintor e investigador afro-colombiano Adolfo Albán Achinte, o historiador literário brasileiro Alfredo Bosi e o filósofo argentino Enrique Dussel. A partir das reflexões apresentadas sobre o fazer artístico, reconhecemos suas possibilidades de resistência aos domínios do padrão de poder moderno-colonial, e os/as artistas como sujeitos que têm condições de contribuir nas transformações buscadas na de(s)colonialidade. Destacam características como a inteligência criativa, a reflexão crítica, a relação com o tempo e a capacidade de expressão de si e de seu entorno, que se apresentam como ferramentas para a re-criação de lógicas outras de ser e estar no mundo.

Seguidamente, Bibiana Bragagnolo apresenta-nos o artigo intitulado “A identidade do performer musical: marcas e possibilidades de desclassificação”. A autora defende que a performance musical aparece como um âmbito bastante classificado e, por consequência, colonizado, o que acaba por refletir na própria identidade do performer musical e em suas práticas artísticas. Assim, este artigo analisa tal identidade para, a partir desta compreensão, estabelecer algumas possíveis rotas de fuga em direção a práticas musicais mais plurais. A partir desta proposição de análise, a autora promove a observação e a identificação das marcas identitárias e territoriais que configuram o performer musical, apresentando duas estratégias de desclassificação: o uso do oxímoro e da polissemia. Tal processo desclassificatório é, sobretudo, um processo emancipatório e decolonial, e que tem o intuito de criar possibilidades para práticas musicais plurais e não hegemônicas, nas quais as narrativas artísticas ausentes possam emergir.

Fábio Leonardo Castelo Branco Brito apresenta-nos a peça “Imagens do Brasil: precursores e redescobertas do mito da brasilidade”. Neste artigo, de perfil ensaístico, o autor analisa as maneiras como, entre meados dos anos 1920 e meados dos anos 1960, se delinearam formas de definir o “ser” da cultura brasileira, notadamente a partir das perspectivas dos intelectuais. Para tanto, discute perspectivas a respeito da identidade do Brasil lançadas por intelectuais tais como Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Alcântara Machado, Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Ariano Suassuna. De modo específico, observa as maneiras como se opuseram, no cenário intelectual, as perspectivas de modernismo propostas pelos grupos paulistas e pernambucanos que, nesse cenário, disputavam o protagonismo no processo. Empiricamente, foram utilizados materiais hemerográficos, produção literária e ensaios culturais de época. Em termos de referenciais historiográficos, foram utilizados autores tais como Manoel Luiz Salgado Guimarães, Renato Ortiz, Mônica Pimenta Velloso e Eric Hobsbawm.

Fazendo a ponte com as representações dos intelectuais brasileiros, Vitor da Silva Costa apresenta-nos o trabalho “Metendo dança: saberes estético-corpóreos nas músicas do rapper Rincon Sapiência”. Neste artigo, o autor teve como objetivo realizar uma breve reflexão sobre as significações das músicas do rapper paulistano Rincon Sapiência, sobretudo, no tocante ao conteúdo das músicas presentes no seu mais recente trabalho Mundo Manicongo: Dramas, Danças e Afroreps. A proposta de análise empreendida visa identificar a contribuição cultural e pedagógica que este disco possui, quando pensamos sobre o prisma da corporeidade negra e as ressignificações identitárias dos sujeitos pertencentes a este grupo. Desta forma, além de evidenciar o impacto das músicas de Rincon na construção de identidades negras contemporâneas, almejou também, apontar as concepções históricas acerca das sociabilidades negras. Diego dos Santos Reis e Elisângela Araújo desvelam “A margem da margem: o lugar do feminino na literatura periférica paulista”. Neste ensaio, os autores analisam o protagonismo das escritoras negras de territórios periféricos na literatura marginal a partir do entrelaçamento entre literatura, política e movimentos insurgentes na cena paulista contemporânea. Para tanto, o texto busca contextualizar a contribuição desse importante acervo poético para os círculos literários femininos, na interlocução entre o biográfico e o político. Trata-se de refletir, ademais, como esses movimentos poéticos-periféricos femininos redefinem identidades e representações, por meio de coletivos de resistência articulados em torno do slam, dos saraus e da poesia ambulante. Para isso, além da revisão bibliográfica, são analisados documentários e videoclipes produzidos por mulheres implicadas com as lutas desses movimentos, considerando o cenário literário dividido em três momentos: a literatura marginal dos anos 2000; a literatura periférica, a partir de 2005; e a literatura periférica feminina, produzida desde 2013, e seus desdobramentos. Por fim, o ensaio tematiza o memoricídio e o apagamento da literatura feminina no Brasil, especialmente da literatura feminina periférica paulista, e as estratégias atuais de denúncia e de resistência que são forjadas por escritoras negras paulistanas, ressignificando não só o espaço público, mas também a potência política de corpos e de territórios marginalizados.

Nefatalin Gonçalves Neto patenteia-nos com a “Discursividade: da obscura poética solar de Éder Rafael de Araújo”. Este artigo almeja analisar o que o autor denomina de discursividade nos textos do poeta Éder Rafael de Araújo. Para cumprir tal proposta, realizou, em primeiro, reflexões sobre a constituição e desenvolvimento da poesia brasileira na segunda metade do século XX, bem como suas vertentes e oposições. Após a pequena súmula, debruçou-se sobre os poemas, em especial dos livros Eu no mundo que sou no mundo que há em mim e Poesia e revolta, para demonstrar como essa pretensa discursividade que conclama se faz presente e qual sua importância para a elaboração poética de Araújo.

Junta-se, neste caleidoscópio, uma peça fundamental intitulada “Pode a mulher artista falar? A experiência de Helena Almeida a partir da série Ouve-me (1978-80)” da autoria de Vera Rozane Araújo Aguiar Filha. O artigo teve como objetivo, a partir de uma reflexão teórica que aproxima feminismo e marxismo, o estudo de alguns trabalhos da série Ouve-me da artista portuguesa Helena Almeida (1934-2018). Para tanto, as categorias analíticas de gênero, ideologia e experiência são mobilizadas na análise dos caminhos percorrido pela artista, durante as décadas de 1960 e 1970. Através de sua prática artística, em que o corpo é elemento chave, a autora destaca como a pintora observa, pensa, registra e critica o meio social e cultural ao qual esteve inserida.

Continuando a falar de mulheres e artes, evidencia-se o artigo “Pontos de intersecção nas escritas de mulheres na Argentina e na Palestina: autoficção, trauma e pós-memória” de Carolina Ferreira de Figueiredo e Marina Lis Wassmansdorf. O foco deste artigo situou-se na proposição de pontos de contato entre as experiências de violência e produção de memória no contexto da Argentina e da Palestina, a partir da análise de duas obras distintas, um livro autobiográfico escrito pela palestina Ibtisam Barakat e um livro de memórias produzido por um coletivo de filhos/as de repressores argentinos. Partindo de campos diversos, as fontes apresentam um potencial analítico em comum: a escrita contemporânea de mulheres, com formas narrativas e preocupações temáticas relacionáveis. Relevam-se reflexões entre as obras analisadas, considerando dois objetivos principais: de que forma a “pós-memória” pode ser uma categoria pertinente para pensar esses processos históricos, a partir de uma revisão bibliográfica do conceito que o testa em cenários marginais, e conjecturar sobre o lugar da autoficção feminina na produção do passado recente.

Seguindo na vertigem das artes no Sul Global, Talita Baldin, Paulo Eduardo Viana Vidal e Simone Ravizzini apresentam o artigo “Teatralidade, Artaud e subjetividade: uma proposta de análise para a teatralidade na vida tal como ela é”. Este trabalho é fruto da experiência de seus autores com a clínica psicanalítica e o teatro. Tem como propósito a articulação do conceito de teatralidade de Josette Féral com o teatro da crueldade de Antonin Artaud para, em seguida, desenvolver uma análise acerca da teatralidade vivida na dimensão da vida no sujeito do cotidiano. A crítica de Artaud aos modos de se fazer teatro em sua época transportou os autores para um questionamento sobre qual é a arte ou o fazer artístico que nos interessa e como ele se apresenta em nosso dia a dia, abordando casos conhecidos pelo grande público: Coringa do filme Joker (2019), e dois casos reais, de Sandro, do ônibus 174 em 2002, e de William, que parou a ponte Rio-Niterói em 2019. Com suas histórias, o artigo resgata a recepção pela escuta – que vai muito além de ouvir – como ferramenta imprescindível para alguém se fazer sujeito e concluímos que a teatralidade pode ser uma saída encontrada na vida tal como ela é, por cidadãos comuns, para subverter o discurso do Outro, o qual nos arremessa no desafio de sobreviver às violências inerentes à vida suburbana, racismo, pobreza, violência física e dos discursos.

No artigo “Inventar el cine: sobre técnicas e estéticas de documentários latino-americanos”, Daniel Velasco Leão expõe e discute as diferentes formas pelas quais o cinema documentário latino-americano buscou traduzir os dilemas sociais do continente. A partir da análise de filmes realizados no continente nos últos 60 anos, abordou algumas das principais escolas e modos de fazer documentário, como os modelos inglês e sociológico, o terceiro cinema, o documentário em primeira pessoa e o filme-ensaio. O autor intentou, ainda, apontar as origens das distintas abordagens (tanto cinematográficas quanto social) nos distintos contextos sociais, circunstâncias históricas e em novas possibilidades de deslocamento e registro propiciadas pelo advento de novas tecnologias.

Natalie Lima, com o seu trabalho intitulado “Dentro, fora, antes ou depois? – A política espaço-temporal de Notícias da América” investiga a performance Notícias da América do artista mineiro Paulo Nazareth. Nela são identificadas discussões (e ações) que podem ser entendidas como pós-utópicas no sentido que o poeta e teórico Haroldo de Campos dá ao termo: manejam uma pluralidade de passados (ancestrais, coloniais) e, ao mesmo tempo, abrem perspectivas relacionais, característica típica da arte contemporânea desde os anos 1960. Na performance, à medida que Nazareth se desloca por cidades latino-americanas, as imagens e os discursos produzidos forjam um espaço comum entre ele próprio, seus interlocutores e a paisagem. Simultaneamente, emerge uma temporalidade múltipla em que subjetividades periféricas se tornam visíveis. É também a partir dessa relação espaço-temporal que outras de suas produções artísticas (como a série Aqui é arte), que pouco se apoiam sobre o circuito da arte, podem ser desdobradas.

Começamos e terminamos este caleidoscópio turbilhante com música. Felipe Merker Castellani e Manoel Pêssoa de Lima no artigo denominado “Música, branquitude e experimentalismo: perspectivas críticas” estudam a perpetuação do racismo epistêmico no campo musical, iniciado no Brasil colônia e seguindo em direção aos contextos contemporâneos. Observando pressupostos universalizantes vinculados ao enfoque na materialidade do som apartado de implicações contextuais sócio-políticas, os autores delineiam tensões e incompatibilidades entre o experimentalismo musical e o ativismo político. Por fim, o artigo aponta iniciativas recentes de potencial contra-colonial no contexto da música experimental.

Referências

GUERRA, Paula. So close yet so far: DIY cultures in Portugal and in Brazil. Cultural Trends, [London], v. 30, n.2, p. 122-138, 2021a.

GUERRA, Paula. Sons, corpos e lugares. Para uma metonímia das cidades musicais contemporâneas. CSOnline – Revista Eletrônica de Ciências Sociais, n. 33, p.171-197, 2021b.

GUERRA, Paula. The Song Is Still a ‘Weapon’: The Portuguese Identity in Times of Crises. Young, [London], v.28, n.1, p.14-31, 2020.

GUERRA, Paula. Nothing is forever: um ensaio sobre as artes urbanas de Miguel Januário±MaisMenos±. Horizontes Antropológicos, V.28, n. 55. Porto Alegre Sept./Dec. 2019, p. 19-49, 2019.

GUERRA, Paula. Raw Power: Punk, DIY and Underground Cultures as Spaces of Resistance in Contemporary Portugal. Cultural Sociology, V. 12, n. 2, p. 241-259, 2018.

LEE, Seon Youn; HAN, Yoonai. When art meets monsters: Mapping art activism and antigentrification movements in Seoul. City, Culture and Society, V. 21, https://doi.org/10.1016/j.ccs.2019.100292, 2020.

VIVANT, Elsa; MORTEAU, Hélène. Reframing the creative city debate from locally-based artistic activities. The case of independent films scenes in Paris suburb. City, Culture and Society, V. 22, DOI: 10.1016/j.ccs.2020.100357, 2020.


Organizadores

Paula Guerra – Universidade do Porto https://orcid.org/0000-0003-2377-8045

Fábio Leonardo Castelo Branco Brito – Universidade Federal do Piauí – UFPI https://orcid.org/0000-0002-3228-3696

Daniel Lopes Saraiva – Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC https://orcid.org/0000-0002-8409-2314


Referências desta apresentação

GUERRA, Paula; BRITO, Fábio Leonardo Castelo Branco; SARAIVA, Daniel Lopes. Apresentação. PerCursos. Florianópolis, v. 22, n. 50, p. 05 – 14, set./dez. 2021. Acessar publicação original [DR]

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Itamar Freitas

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