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A História Medieval entre a formação de professores e o ensino na Educação Básica no século XXI: experiências nacionais e internacionais | José Luciano Vianna

Falar do Ensino de História no momento tão complicado da política e da economia do Brasil, sem esquecer dos já existentes problemas estruturais educacionais da sociedade, é um grande desafio. Vivemos em um tempo em que as narrativas de Fake News estão presentes nos meios de comunicações, e os discursos negacionistas contra a ciência ocupam espaços, plantando as discórdias sobre as teorias e os métodos utilizados pelos pesquisadores científicos de diferentes áreas do conhecimento.

Em meio a esse cenário o Ensino de História absorve e sofre com os impactos vividos pela sociedade. O saber histórico é questionado, de uma forma a negar o seu passado, distorce-lo, e até mesmo apropriar-se dele e usá-lo de forma indevida, por determinados grupos sociais, que constroem narrativas, a fim de legitimarem, por meio do passado, os seus atos e discursos.

Diante desse debate não podemos esquecer dos profissionais da educação, que são criticados e sobrecarregados pelo sistema de ensino, mas que possuem a árdua missão de ensinar e orientar os discentes dos acontecimentos contemporâneos, conduzindo-os ao processo de problematização e reflexão, para a formação da consciência crítica e histórica do tempo presente.

Ensino de História e a formação continuada de professores da Educação Básica são dois aspectos pertinentes e relevantes que precisam ser debatidos para entender e acompanhar as mudanças do fazer historiográfico, das práticas pedagógicas e das estruturas educacionais do Brasil. Tais abordagens apresentadas acima estão presentes no E-book intitulado: A história medieval entre a formação de professores e o ensino na educação básica no século XXI: experiências nacionais e internacionais, organizado pelo professor Luciano José Vianna, publicado de forma eletrônica, em 2021, pela editora Autografia.

O livro é disponível de forma online e de fácil acesso. A sua divulgação se deu por meio da plataforma digital, o Youtube, o canal Spatio Serti Oficia1, nele encontram-se os vídeos do lançamento do livro, a atividade cultural e 18 mesas, que foram realizadas semanalmente no período de 25/08/2021 a 17/12/2021, em que os autores (as) apresentaram e debateram sobre os seus capítulos e com a participação do público.

Este importante trabalho nos conduz à reflexão dos problemas vividos atualmente no Brasil, os quais foram apontados acima, e o material tem como objetivo discutir o Ensino de História Medieval, da forma como está sendo ensinado na sala de aula, como os livros didáticos estão abordando a temática e a sua adequação as normativas curriculares. Além disso, tem-se a preocupação com a formação de professores, voltados especificamente para a História Medieval, seja para o profissional da educação do nível superior ou da Educação Básica, e aponta os caminhos que viabilizam a aplicabilidade do conhecimento sobre Idade Média na sala de aula.

Discutir sobre o Ensino de História Medieval é voltar-se para os velhos questionamentos, como já apontados por José Rivair Macedo (2011), que são: O que ensinar de história medieval no Brasil; para que ensinar história medieval; como ensinar história medieval. Essas indagações são necessárias diante das apropriações e usos indevidos do passado medieval na contemporaneidade, como bem explica Paulo Pachá (2019), atualmente grupos da extrema direita no Brasil se utilizam de um passado português medieval fictício, como cristão, branco, patriarcal e conservador, para reforçar a presença de um legado europeu e de dominação no país.

Compartilhando com o pensamento de Paulo Pachá, Carlile Júnior (2019), explica sobre as releituras do passado medieval, suas apropriações, os usos e a presença de um imaginário sobre esse período. Segundo Carlile, a construção da imagem do líder da política nacional brasileira atual está atrelada ao aspecto religioso cristão medieval, a civilização judaica cristã. Nessa perspectiva o atual governante era visto como um salvador que iria libertar o país dos inimigos “bárbaros”, esse discurso, assemelha-se com as cruzadas, indicando que o Ocidente está em perigo.

Esses discursos e narrativas do passado medieval abordados por Paulo Pachá e Carlile Júnior perturbam e incomodam os professores e pesquisadores do ensino de história medieval, por isso, a relevância do presente e-book organizado pelo professor Luciano Vianna, que abre um espaço de possibilidades para divulgação dos objetos de estudos que são pesquisados sobre a Idade Média e, sobretudo, permite a formação dos professores para a temática de História Medieval, tanto para os professores (as) do nível superior como para a Educação Básica.

Um dos desafios abordados nos capítulos que compõem o e-book é demostrar a pluralidade de temáticas a serem trabalhadas sobre o período medieval, e fazer com que esse saber ao ser aplicado na sala de aula pelos professores (as) não caiam nas armadilhas de serem meros reprodutores dos estereótipos desse grande período denominado de Idade Média, e nem ficarem restritos ao livro didático, mas buscarem os infinitos aspectos da medievalidade, os quais estão diluídos na contemporaneidade, e que permitem a relação heurística entre o presente e o passado.

O organizador Luciano Vianna teve a grande missão de convidar e reunir os textos de diversos pesquisadores (as) e professores (as) de diferentes regiões do Brasil, incluindo convidados estrangeiros que são da Argentina, Suécia e Espanha a escreverem sobre temas voltados para o período histórico denominado de Idade Média. Conforme Vianna, em sua introdução, os textos “ […] foram produzidos entre os meses de maio e novembro de 2020” (VIANNA, 2021, p. 13). Um período delicado para a história da humanidade, a vivência da pandemia COVID-19, que mudou drasticamente a vida dos homens e mulheres em que precisávamos nos isolar, nos proteger e nos reinventar no trabalho, principalmente na área educacional.

Nesse período de maio a novembro de 2020 que os autores se dedicarem a escrever sobre a História Medieval, explanando sobre seus objetos de estudos, refletindo-os sobre as possibilidades de trabalhos pedagógicos na sala de aula para formação de professores, indicando as fontes, bibliografias e compartilhando as suas trajetórias de experiências como pesquisadores (as) e professores (as).

Experiências compartilhadas e textualizadas é a definição do professor Luciano Viana sobre o livro, que foi o responsável por organizar e reunir os textos dos autores (as), o presente trabalho contém 40 capítulos que foram escritos por 49 autores (as). Os perfis deles, em sua grande maioria, atuam no nível superior de formação de professores e na Educação Básica. No final de cada capítulo é apresentado uma pequena biografia acadêmica de cada autor (a) e descobrimos as instituições de ensino e os Laboratórios e os Grupos de Pesquisa de História Medieval, os quais os autores (as) pertencem, e que estão espalhados pelo país, e verificamos as pluralidades de estudos com temas, temporalidades e espacialidades diversificadas do período medieval.

Os capítulos dialogam entre si de forma interdisciplinar numa perspectiva global e cultural e apresentam uma diversidade de assuntos, como por exemplo, o feminismo, a música, a literatura, os judeus, as cidades, entre outros. Além disso, o debate em comum que norteia todos os capítulos, e que os ligam é sobre a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Os autores e autoras demonstram a preocupação sobre as mudanças da estrutura curricular da educação brasileira, em meio ao contexto histórico e político em que foi proposto pelo documento e de como isso afetou o Ensino de História Medieval.

A BNCC é um documento normativo que explícita sobre as habilidades e competências dos componentes curriculares programáticos para cada nível educacional da Educação Básica. Ela foi discutida entre os anos de 2015-2017 no momento de grande polarização política e ideológica no Brasil. O processo de construção do documento foi marcado por preocupações, reflexões e embates, pois a primeira versão excluiu algumas temporalidades históricas em detrimento de outras, entre elas a História Medieval, dessa forma fragilizava-se o conhecimento sobre a história da humanidade.

Diante de várias críticas a segunda proposta incluiu a História Medieval no 6º ano do Ensino Fundamental, porém de forma eurocêntrica, e conteudista demostrando o distanciamento das discussões historiográficas acadêmicas e permanecendo a visão tradicional sobre essa temática. Já a terceira versão da BNCC propôs um novo viés ao propor a História Medieval no âmbito sociocultural.

Douglas Mota Xavier de Lima (2019) traz à luz a discussão sobre a BNCC, conforme o autor, devemos incorporar “ […] a pluralidade cultural do período, descentralizando o medievo da experiência europeia ocidental, incluindo novos grupos sociais e abordando os usos contemporâneos do passado medieval. ” (LIMA, 2019, p. 18).

Nessa perspectiva indicada por Douglas Lima que os capítulos apresentados buscam alinhar os objetos de estudos e pesquisas sobre a Idade Média com a BNCC, discutindo as competências e habilidades propostas pela normativa, de como inserir as pesquisas que estão sendo desenvolvidas com um novo olhar para o Ensino de História Medieval, e alertam para as dificuldades e ausências de trabalharem com determinadas temáticas, como por exemplo o Oriente, que ainda não é contemplado nos currículos escolares de história.

Luciano Vianna optou em estruturar os capítulos do e-book didaticamente por temáticas em quatro partes que são: Novas Abordagens Contemporâneas; Antigos temas sob novos olhares; Objetos de ensino e pesquisa: possibilidades de abordagens; Territorialidades: entre (des) conhecidas e tradicionais.

A primeira parte, Novas Abordagens Contemporâneas, apresenta os novos objetos e temáticas de estudo para a História Medieval, os quais são relevantes para as inquietações e compreensão do tempo presente. Assim, encontramos no capítulo Desafios e perspectivas: o enfoque sobre o feminino medieval no ensino fundamental de Mirtes Emília Pinheiro, em que discute sobre as representações das mulheres no medievo, e a necessidade de dar voz e visibilidades as figuras femininas no livro didático e no ensino de história, as quais devem estar alinhadas a normativa da Base Nacional Comum Curricular para aplicação na Educação Básica para o Ensino Fundamental.

Uma nova abordagem contemplada é sobre os estudos da Ásia para o ensino de história, capítulo intitulado Uma notável ausência: a Grande Ásia, o Ensino de História e a circulação de saberes no medievo, de Alex Degan e Lucas Saldanha Silva, os autores chamam atenção para descentralizar o estudo do medievo Ocidental e olharmos para o Oriente, a Ásia, e inseri-lo no ensino de história para a compreensão do contato e circulação do conhecimento entre o Oriente e o Ocidente.

Os desafios do Ensino de História na contemporaneidade sobre os usos das tecnologias digitais é o tema abordado por Lukas Gabriel Grzybowski e Renan Marques Birro em seu capítulo História Medieval, Internet e Tecnologias na formação de professores, alertam para os pesquisadores medievais se inserirem no espaço digital e buscarem meios para a divulgação cientifica dos seus trabalhos, como uma forma de frear os avanços das apropriações indevidas do passado medieval, e oferecer por meio da Internet ,conteúdos de qualidade para o público de forma geral.

Nessa mesma linha de temática sobre tecnologias temos o trabalho de Rodrigo Bonaldo e Lucas Tubino Piantá, com o texto, Curadoria digital e ensino de professores: o caso do verbete Scriptorium da Wikipédia lusófana, em que discutem a relação entre a história digital e a história pública no processo de divulgação científica do conhecimento histórico, por meio da ferramenta Wikipédia. Assim, os autores apresentam o projeto Teoria da História na Wikipédia, no caso específico o verbete Scriptorium, algo essencial para a contribuição do ensino de história medieval e a formação de professores.

Refletir sobre a conjuntura política do Brasil e os usos e apropriações do passado medieval na contemporaneidade consiste na abordagem do capítulo de Carlile Lanzieri Júnior, em Cavaleiros de papel: considerações sobre as histórias conectadas de diferentes usos do passado medieval na contemporaneidade dentro e fora do Brasil e seus possíveis impactos na formação do conhecimento histórico escolar. O autor analisa a relação entre o medievalismo, os seus usos na prática política da atualidade que são propagados nas mídias de massa e nos conduz a refletir sobre a história pública e o conhecimento histórico escolar.

As representações que os medievos europeus tinham sobre a natureza é o assunto do capítulo Representações da sociedade da Alta Idade Média sobre a natureza e os animais e o que podemos aprender sobre a nossa própria relação com o meio natural de Raquel de Fátima Parmegiani. A autora analisa a adaptação da natureza e dos animais pela lógica cristã, por meio das obras de Agostinho de Hispona e Isidora de Sevilha, e traz alguns apontamentos de como levar o debate para a sala de aula por meio da dialética.

Analise da música medieval na Baixa Idade Média em Portugal e suas possibilidades de aplicação no ensino de história é o objetivo dos professores Lenora Pinto Mendes e Márcio Paes Selles, em seu capítulo A música medieval na sala de aula da educação básica (subsídios para o professor), que reflete sobre as heranças ibéricas que se manifestam na cultura e no imaginário do brasileiro e que devem ser temas do ensino de história.

Nessa mesma perceptiva sobre as reminiscências medievais no território brasileiro o professor Luciano José Vianna, em A arquitetura românica na formação de professores de História: algumas possibilidades, discute a interação entre o presente e o passado por meio da arquitetura românica medieval e a sua aproximação com as estruturas das catedrais do Brasil, possibilitando a discussão para a formação de professores do contexto histórico do período analisado.

A segunda parte do ebook, Antigos temas sob novos olhares, preocupa-se em revisar os conceitos que são constantemente utilizados no ensino de história, como por exemplo, cristianismo, feudalismo, antiguidade tardia, entre outros, os quais os autores irão debater e propor indicação de propostas pedagógicas para formação de professores.

O capítulo de Bruno Uchoa Borgongino, Monaquismos cristãos no começo da Idade Média (sécs. IV-VIII): possibilidades para a formação de professores, debate a importância dos estudos do monaquismo na Idade Média, apresentando seu conceito, acervos documentais e de recursos didáticos para o ensino de história.

A relação entre história e literatura é a análise do capítulo La búsqueda de los orígenes para comprender el presente: la literatura medieval y su historia, de Antonio Contreras Martín, discute os diversos aspectos da cultura medieval, por meio de uma perspectiva global, e estabelece as aproximações do ensino de história com os textos literários do período medieval.

A cidade medieval e a cultura política são o tema de André Miatello em As muitas faces da cidade medieval e a participação política nas comunas: caminhos epistemológicos para a formação de professores que aborda as cidades como palco dos poderes políticos e nos instiga a olharmos para o presente. A figura do modelo ideal de mercador medieval como análise de estudo, em O mercador medieval: uma proposta de estudo na formação de professores, de Jaime Estevão dos Reis; Liliana Grubel Nogueira; Augusto João Moretti Júnior, analisa o mercador medieval no Livro da Arte do Comércio, e propõem habilidades e competências a serem trabalhadas para a formação de professores.

A idade média é a preocupação de inserção na estrutura curricular de forma transversal e interdisciplinar em La educación en la Edad Media: possibilidades curriculares de Josué Villa Prieto, apresenta a educação na Idade Média e as possibilidades de aplica-la na sala de aula por meio das fontes de das metodologias ativas.

A atuação do papado medieval é o tema de Leandro Duarte Rust e Magda Rita Ribeiro de Almeida Duarte, em Desaprender para reaprender: o Papado Medieval na formação de professore, os autores propõem o estudo desse objeto como um campo de práticas pedagógicas. O feudalismo é colocado em xeque no capítulo Para além do passado: o lugar do feudalismo na formação de professoras e professores de História no século XXI, de Bruno Gonçalves Alvaro, o autor discute as premissas historiográficas que rodam esse conceito e de como abordá-lo no ensino de história.

A periodização do período medieval é revisitada em O conceito de Antiguidade Tardia na formação de professores de Kelly Mamedes e Marcus Cruz, as concepções de crise e decadência da antiguidade tardia são debatidas e o capítulo reflete sobre a instrumentalização analítica desse período na formação de professores.

Os grupos excluídos ganham voz no texto de Sérgio Alberto Feldman, em Excluídos e marginalizados no medievo, em que retrata o preconceito e a intolerância sobre os judeus pelo víeis religioso. O cristianismo e suas singularidades são debatidos em O cristianismo medieval na formação de professores, de Edmar Checon de Freitas, em que o autor se preocupa com a fragmentação do saber da Idade Média e as abordagens conceituais em torno de Cristianismo, Cristandade e Igreja.

A terceira parte Objetos de ensino e pesquisa: possibilidades de abordagens, os autores analisam a Idade Média nos manuais escolares e livro didático e apresentam as diversas metodologias de linguagens e fontes que podem ser utilizadas de forma pedagógica e lúdica no ensino de história medieval e para a formação de professores.

David Waiman, em seu capítulo La edada media y suas periodizaciones en los manuales escolares argentinos nos apresenta os manuais escolares da Argentina e a forma de com a Idade Média é retratada, com uma narrativa tradicional, e com diversos problemas de cronologia. Aqui no Brasil a abordagem do período medieval nos livros didáticos não é diferente, como explica Douglas Mota Xavier de Lima, em A Idade Média nos livros didáticos em que se verifica o distanciamento entre o saber acadêmico e a prática do ensino de história na sala de aula.

O cinema é mostrado como recurso pedagógico para as aulas de história no texto de Nilton Mullet Pereira e Patrícia Pereira Pimenta, em Sobre os usos do passado medieval: cinema e ensino de história. Desenhos animados como veículo de comunicação e ensino são apresentados por Marcelo Pereira Lima, em A cultura da mídia, animações e (neo) medievalidades: horizontes de reflexão para o ensino de história e a formação docente.

A proposta de se trabalhar com a hagiografia mendicante na sala de aula é a abordagem de Victor Mariano Camacho, em Possibilidades de abordagens sobre a hagiografia mendicante no ensino de História Medieval na educação básica. Nessa mesma linha temos o capítulo a História Monástica e BNCC: o plano de St. Gall (séc. IX) em sala de aula, de Victor Sobreira, ambos os textos propõem em trabalhar com manuscritos medievais na educação básica, apresentando roteiros didáticos de aplicação.

A relação entre a história e a literatura é apresentada em forma de um jogo didático em torno da narrativa arturiana, na busca pelo Graal, em A demanda pelo Graal: práticas em sala de aula para a compreensão do mito graaliano e suas releituras, de Cláudia Regina Bovo e Daniele Gallindo Gonçalves. As fontes visuais também são exploradas para a formação de professores, no capítulo de Luciano José Vianna e Juliana Gomes Rodrigues, em O uso de fontes visuais medievais na formação de professores: um exercício de (des) construção histórica.

Olhar para a Idade Média para além do Ocidente de forma global e conectado com outros espaços e a proposta de Aline Dias da Silveira, em O Mediterrâneo medieval Muçulmano na formação de professores de História. Ensinar sobre a religiosidade cristã do Além Medieval por meio de um jogo lúdico para ser aplicado no Ensino de História e a discussão realizada pelas professoras Adriana Zierer e Solange Pereira Oliveira, em Ensinando e aprendendo o Além medieval na sala de aula: inferno e paraíso num jogo de tabuleiro.

A última parte, Territorialidades entre (des) conhecidas e tradicionais, trata de expandir o olhar do Ocidente medieval europeu para outras espacialidades que não estão inseridas nos currículos escolares, como é o caso do Oriente e da África Medieval. Os estudos sobre essas territorialidades estão avançando nas pesquisas acadêmicas, mas infelizmente não são contempladas no ensino de história na sala de aula, quando são abordados o olhar é restrito por meio das narrativas exóticas e descontextualizadas, por isso a importância dessa temática no ebook que irá ajudar na formação de professores ao ensinarem e pesquisarem sobre esse assunto.

A história da Ásia, no caso especifico da Índia, é o tema de Alex Degan e Lucas Saldanha Silva, em Milhões de Motins: a Índia como proposta para o Ensino História da Ásia. A China também é analisada, em O território da China na formação de professores, de André Bueno, ambos os textos trazem as discussões de forma descentralizada da narrativa eurocêntrica, ao olhar para o Oriente e apresentam a diversidades dos territórios e as conexões estabelecidas com o Ocidente.

Olhar para os Vikings na Idade Média suas representações estereotipadas e homogeneizadas que precisam ser descontruídas e debatidas para a formação de professores é o capítulo de La Escandinavia medieval en la formación de professores de Historia: teoria y práctica de la enseñanza de Historia Medieval, de Kim Bergqvist. Além da ausência da Ásia temos também da África Medieval nos cursos de formação de professores é a preocupação de Otávio Luiz Vieira Pinto, em Campos de Ouro, Terras de Reis: a formação de professor e o ensino de história medieval da África do Sul ao Saara.

A necessidade de dialogar com a história de Portugal para a formação de professores e o entendimento dos elementos indentitário no Brasil é a discussão de Marcella Lopes Guimarães, em O estudo de Portugal Medieval a serviço de uma compreensão mais larga da História por parte das crianças e dos jovens brasileiros. O mundo ibério-hispânico medieval nos livros didáticos e a falta de conexões com o Brasil é o capítulo de Marcelo Pereira Lima, em O mundo ibérico-hispânico medieval, gênero e a formação docente: ausências e presenças em um livro didático de História no Brasil.

A Germânia e seus olhares distorcidos sobre seus povos e localizações é discutido por Daniele Gallindo Gonçalves e Vinicius Cesar Dreger de Araujo em A Germânia no ensino de História Medieval. Romper com o olhar homogeneizador sobre o território da França é a proposta de Flávia Amaral, em Desnaturalizando conceitos na formação de professores de História: o ‘território francês’ entre os séculos XI e XV.

O Império Bizantino entre os séculos IV e X: perspectivas para a pesquisa e ensino de Renato Viana Boy e O Território Império Bizantino (séculos XI-XV) na formação de professores de João Vicente de Medeiros Publio Dias, são capítulos que apresentam o Império Bizantino como um espaço conectado e de trocas culturais, mas que são esquecidos no ensino de história e necessários para a formação de professores.

O território da Inglaterra o uso e significado do termo anglo saxão na formação dos ingleses é a abordagem de Isabela Albuquerque, em De anglo saxões a ingleses: o processo de construção da Englalond (séculos IX-XI) na formação de professores e no ensino de história. O imaginário medieval da Inglaterra, a Guerra dos Cem Anos na sala de aula é a proposta de reflexão de Viviane Azevedo de Jesuz, em A Inglaterra medieval na sala de aula da Educação Básica: relações de identidade no medievo inglês (séculos XI- XV).

Ao percorrer por todos esses capítulos percebemos o quanto é necessário pesquisar, aprender, conhecer e discutir sobre a Idade Média, e que precisam se consolidar nas normativas educacionais do Brasil, pois o saber dessa temática demonstra o quanto estamos conectados com o passado medieval, e precisam ser debatidos para a formação dos professores e colocados em prática na sala de aula , para a compreensão das heranças e manifestações que estão presentes no nosso território e contribuem para o sentimento de pertencimento para um período considerando tão longe e distante, mas que se manifesta nas mídias e permeia o imaginário sobre o passado medieval.

Além disso, compreender as apropriações e os usos dos resquícios medievais na atualidade se faz de extrema importância, a fim, de identificar os interesses de reviver as representações da Idade Média, para qual finalidade, e debate-los no ensino de história, para que a História Medieval não seja abordada de forma preconceituosa, mas sim ver a sua pluralidade e conexões com o tempo presente.

Portanto, o livro organizado pelo professor Luciano José Vianna, apresenta uma grande quantidade e diversidade de objetos de estudos que estão sendo desenvolvidos pelos pesquisadores (as) e contribuem para a formação de professores, tanto do nível superior como para os da Educação Básica, e abre um leque de possibilidades, para futuros pesquisadores, e para os professores (as) aplicar esse conhecimento na sala de aula de forma pedagógica, interativa e mergulharem junto com os discentes no mundo da História Medieval.


Nota

1 Grupo de Estudos e Pesquisa e Medievalística- Universidade de Pernambuco- Campus Petrolina


Referências

LANZIERI JÚNIOR, Carlile Ontem e hoje, o porta estandarte. Reflexões sobre os usos do passado medieval, a estética bolsonarista e os discursos recentes da direita brasileira. Roda da Fortuna. Revista Eletrônica sobre Antiguidade e Medievo, 2019, Volume 8, Número 2, p. 189-209.

LIMA, Douglas Mota Xavier de. Uma história contestada: a História Medieval na Base Nacional Comum Curricular (2015-2017). Anos 90, Revista do Programa de Pós-Graduação em História. Porto Alegre, v.26, 2019, p. 1-21.

MACEDO, José Rivair. Repensando a Idade Média no Ensino de História. In: KARNAL, Leandro (Org.). História na Sala de Aula. São Paulo: Contexto, 2003, p.109-125.

PACHÁ, Paulo. Por que a extrema direita brasileira ama a Idade Média europeia. Disponível em https://www.viomundo.com.br/politica/paulo-pacha-por-que-a-extrema-direitabrasileira-ama-a-idade-media-europeia.html . Acesso em 29 de dezembro de 2020.

VIANNA, José Luciano. A História Medieval entre a formação de professores e o ensino na Educação Básica no século XXI: experiências nacionais e internacionais (Livro eletrônico) Organizador Luciano José Vianna, RJ: Autografia, 2021.


Resenhista

Bianca Trindade Messias – PPGHIST-UEMA/Brathair. Doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em História pela UEMA. Professora Substituta no Departamento de História da UEMA. E-mail: bia-tm@hotmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7928-5616


Referências desta Resenha

VIANNA, José Luciano (Org). A História Medieval entre a formação de professores e o ensino na Educação Básica no século XXI: experiências nacionais e internacionais. Rio de Janeiro: Autografia, 2021. Livro eletrônico. Resenha de: MESSIAS, Bianca Trindade. Brathair. São Luís, v. 21, n. 2, p. 184- 192, 2021. Acessar publicação original [DR/JF]

Itamar Freitas

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