O dossiê “100 anos do Partido Comunista Brasileiro (PCB) (1922-2022): Processos históricos, políticos, sociais, teóricos e culturais” tem por objetivo a publicação de artigos originados em pesquisas referentes ao PCB, na efeméride dos seus cem anos de existência. Em 25 de março de 2022, o PCB completou um século de existência que se integra à classe trabalhadora brasileira e ao Brasil republicano. Como dizia Gildo Marçal Brandão, o PCB se tornou uma das instituições permanentes da sociedade brasileira.
Na cerimônia de fundação em Niterói, no Rio de Janeiro, estavam presentes o jornalista do Rio de Janeiro Astrojildo Pereira, o barbeiro originário do Líbano Abílio Nequete, o contador pernambucano Cristiano Cordeiro, o gráfico paulistano João da Costa Pimenta, o eletricista da cidade de Cruzeiro Hermogênio da Silva Fernandes, o alfaiate do Rio de Janeiro Joaquim Barbosa, o sapateiro do Rio de Janeiro José Elias da Silva, o alfaiate espanhol, Manoel Cedón e o vendedor de vassouras do Rio de Janeiro, Luís Peres. Desde a origem, o PCB enfrentou condições dificílimas de atuação, encontrou aqui um cenário pouco favorável para a recepção do comunismo. Na época, o movimento operário e sindical encontrava-se desarticulado, resultado dos quatro últimos anos de estados de sítio decretado pelo presidente Arthur Bernardes e, como consequência, sua política de perseguições policiais, prisões e deportações de importantes lideranças operárias. A situação internacional era também hostil à difusão das ideias comunistas, com o refluxo da revolução mundial e estabilização do capitalismo. Ainda assim, os dirigentes pecebistas logo perceberam a necessidade de construção de uma teoria revolucionária alicerçada no marxismo, referencial que serviria para ação organizada da classe operária. Tendo sobrevivido às perseguições políticas e ditaduras, seus integrantes jamais deixaram de pensar na construção da revolução brasileira.
A história do PCB se refere, igualmente, à história da esquerda brasileira em suas diferentes fases, sendo também um importante núcleo da cultura nacional, que abrigou intelectuais, artistas, movimentos, revistas, jornais e demais expressões culturais. Ademais disso, a trajetória do PCB está no cerne da história do marxismo no Brasil, sendo um dos responsáveis por sua recepção, nacionalização, desenvolvimento e difusão. Um século depois de seu surgimento, o PCB é uma referência histórica incontornável da esquerda e da política brasileira, bem como uma fonte de compreensão de nossa história republicana vista a partir da dissidência e dos “de baixo”. Nesse sentido, o leitor encontrará no dossiê artigos que abordam o PCB em diferentes aspectos.
O artigo “O Partido Comunista do Brasil (PCB) em São Paulo: das origens até a Aliança Nacional Libertadora (1922 – 1935)”, de Lucas Alexandre Andreto, apresenta um panorama das formas de organização política do Partido Comunista Brasileiro desde sua origem até o período da insurreição de 1935, enfatizando, sobretudo, o papel desempenhado pelos intelectuais paulistas. É objetivo do autor demonstrar os desafios dos pecebistas paulistas para expandir na primeira década de existência do partido, bem como o isolamento dos comunistas paulistanos em relação a direção do PCB.
O artigo “A atuação parlamentar dos comunistas nos primeiros anos da Terceira República”, de Rodrigo da Costa Lima e João Henrique Zanelatto, procura analisar a atuação do Partido Comunista do Brasil nos anos iniciais da Terceira República, entre 1945 e 1947. O objetivo dos autores é compreender como a estratégia da revolução democrático-burguesa e a tática de união nacional influenciaram na atuação parlamentar dos comunistas na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, em particular na elaboração da Constituição estadual.
O artigo “Resistências negras contra o capital: Laudelina de Melo Campos e Minervino de Oliveira”, de Ana Luiza Almeida Passos, apresenta uma análise da classe trabalhadora negra no Brasil no período posterior a abolição da escravatura, enfatizando a resistência de Minervino de Oliveira e Laudelina de Melo Campos, personagens importantes para a história da classe trabalhadora do Brasil e negra, e também para o Partido Comunista Brasileiro.
O artigo “Nelson Werneck Sodré, reescritas da história do Brasil sob o conceito de Formação”, de Tiago Conte, apresenta um debate historiográfico a partir das obras do intelectual marxista Nelson Werneck Sodré, Formação da sociedade brasileira (1944) e Formação histórica do Brasil (1962). Em sua análise, o autor procurou demonstrar as diferenças conceituais entre os dois trabalhos, além de haver elucidado a transição entre uma imagem organicista do Brasil para a afirmação da existência de modos de produção diferentes e simultâneos no país.
O artigo “Revolução e democracia: o eurocomunismo no Brasil, no crepúsculo da ditadura militar”, de Ana Maria Said, realiza uma reflexão acerca do pensamento de Antonio Gramsci, a partir dos seus Cadernos. O objetivo foi demonstrar a influência que esse pensamento exerceu na esquerda brasileira e, igualmente, como os conceitos elaborados pelo pensador italiano passaram por interpretações diversas, desviando-se da formulação gramsciana. Desse modo, procurou-se enfatizar o debate que ocorre em 1980, no interior do PCB, a fim de avaliar os conceitos de democracia e revolução gramscianos. Para essa análise, a autora retorna aos conceitos básicos da teoria gramsciana e sua estratégia para a revolução comunista, o que possibilita uma análise crítica do eurocomunismo europeu e seus braços no Brasil, com as consequências atuais do recrudescimento conservador e o perigo da retomada dos grupos políticos de direita, e fascistas, em nosso país.
Por fim, em “Anita Leocadia Prestes: professora, historiadora, militante”, Yuri Martins-Fontes procura elucidar alguns aspectos centrais da trajetória da professora, historiadora e militante comunista Anita Leocadia Prestes, a partir de sua participação em projetos educacionais do Núcleo Práxis-USP. O autor se apoia nas entrevistas da historiadora a fim de refletir acerca da realidade histórica brasileira e internacional e, igualmente, a trajetória do PCB e do comunismo.
Agradecemos aos autores a valiosa participação em nosso dossiê. Desejamos aos leitores uma boa leitura.
Organizadores
Rodrigo Jurucê Mattos Gonçalves – Professor do Curso de História e do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Estadual de Goiás (PPGHIS/UEG). Doutor em História pelo PPGH/UFG.
Denilton Novais Azevedo – Doutorando em História pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Referências desta apresentação
GONÇALVES, Rodrigo Jurucê Mattos; AZEVEDO, Denilton Novais. Apresentação. Revista Expedições: Teoria da História e Historiografia. Morrinhos, v. 14, p. 1-3, fev./jul. 2022. Acessar publicação original [DR/JF]
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