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A cidade e os rios na história do Brasil / História Revista / 2009
Neste número apresentamos ao público o dossiê temático: A cidade e os rios na história do Brasil, organizado pelo professor Leandro Mendes Rocha (UFG), professora Gercinair Silvério Gandara (PNPD-CAPES / UFG) e professor Laurent Vidal (Université de La Rochelle / Paris III-Sorbonne Nouvelle). A temática é fruto da aproximação e cooperação acadêmica entre universidades brasileiras (Universidade Federal de Goiás, Universidade Católica de Goiás, Universidade Federal do Piauí, Universidade de Brasília, Universidade Federal de Viçosa, Universidade Federal do Pará) e universidades francesas (Universidade de Paris III-Sorbonne, Universidade de La Rochelle, entre outras). Nesta cooperação, incluem-se o intercâmbio de pesquisadores e a realização de eventos no Brasil e na França, bem como as publicações de pesquisas em parcerias. Como parte da cooperação realizou-se em junho de 2009, o III seminário itinerante franco-brasileiro intitulado: “A cidade e os rios na história do Brasil: identidades e fronteiras”, sediado em Belém do Pará. A temática principal deste evento foi as cidades e os rios da Amazônia brasileira. Na programação, intercalaram-se viagens planejadas pelos rios Guamá e Tocantins. Todavia, vale lembrar que, em agosto de 2004, organizou-se no Estado de Goiás, o primeiro seminário itinerante franco-brasileiro, e o objeto de estudos foi a história das cidades brasileiras com a temática “A cidade no Brasil: nascimentos, renascimentos – Séculos XVIII – XX”; contou-se com o apoio das Universidades Federal de Goiás, Estadual de Goiás e da Universidade de La Rochelle. Nesse evento propôs-se a refletir sobre a multiplicidade das formas de surgimento das cidades e do urbano nas regiões de fronteiras do Brasil.
Em maio de 2008, realizou-se o segundo seminário franco-brasileiro com a temática “a cidade e os rios na história do Brasil”. O objetivo foi investigar a importância dos rios e das vias de comunicação naturais, na estruturação de uma rede urbana regional e nacional, sobretudo, a partir da segunda metade do século XVIII. Nesse seminário, procurou-se, ainda, compreender a configuração das identidades, nestas cidades, entre a atração do rio e a atração do interior, o foco principal foi o rio Parnaíba no Piauí, e três cidades foram visitadas, Teresina / PI, Parnarama / MA e Parnaíba / PI.
Em 2009, realizou-se o III seminário Itinerante Franco-Brasileiro intitulado: “A cidade e os rios na história do Brasil: identidades e fronteiras”. A missão neste evento foi investigar a forma como vivem as populações amazônicas, suas relações históricas, geográficas, econômicas, ambientais, sociais e culturais com os rios, com os diversos espaços de urbanidade e ruralidade, localidade e globalidade e, neste processo, como se pensam e produzem suas identidades na Amazônia contemporânea.
A proposta de eventos itinerantes surgiu e desenvolveu-se da necessidade de reivindicar para o público acadêmico o direito e a responsabilidade de conhecer essas histórias. Deste modo, a organização e publicação deste dossiê têm como princípio atender anseios de divulgar as pesquisas, bem como a proposta dos seminários itinerantes franco-brasileiro. Vale ressaltar que a proposta dos seminários itinerantes reflete uma postura acadêmica diferenciada. Considera-se, que as ciências humanas trouxeram ao conhecimento novas luzes a partir dos fundadores dos Annales, que conclamaram, os historiadores a saírem de seus gabinetes e farejarem “a carne humana” em qualquer lugar, onde pudesse ser encontrada por quaisquer meios. A partir de então o texto de historiadores ganhou contornos mais amplos, incluindo toda produção material e espiritual humana. De lá para cá se promoveu uma interdisciplinaridade entre a história e as demais ciências humanas, com objetivo de desenvolver uma metodologia adequada aos novos objetos e abordagens. Todavia, sabe-se que os eventos científicos no cotidiano acadêmico são componentes importantes e se realizam comumente nas dependências das universidades ou de instituições de pesquisas. Diante disso, os eventos itinerantes são avessos à rotina universitária. O equilíbrio e a sobriedade deste tipo de evento sobrepujam-se ao vigor emotivo da experiência, como do contato direto com os objetos estudados.
O pesquisador na itinerância desses seminários tem visão ampla do espaço-tempo e não se deixa aprisionar em compartimentações de alvenarias. E, quando o tema proposto envolve aspectos relacionados aos rios e às cidades, a itinerância se fortalece. Ela flutua, pois além de o objeto de estudo estar em permanente movimento, as suas margens surgem aos olhos atentos do investigador e emergem histórias profundas. Os rios até agora por nós itinerados são rios distantes, periféricos, pouco integrados à chamada vida nacional. Sabíamos que um grande número de rios brasileiros ficou sempre como um mistério a desvendar nas paisagens, nas gentes. Muitos rios brasileiros estão com seus dorsos lisos à espera daquele eterno fluir. O simbolismo do rio é o da fluidez. Foi sobre os alicerces desses esforços que erguemos orgulhosos os eventos e tentamos compor as histórias dos rios, das ribeiras e, ou, das cidades. Dos rios não nos impressiona apenas o equilíbrio e a pujança das proporções, a linha em que se desenvolvem e se estendem, serpenteando, a contornar a lomba dos declives. São as lições admiráveis, construções, na humildade do encantamento de quem sente o orgulho do rio ao emprestar seu dorso à arte, que se projeta aos olhos nus com a paixão, ou o desprezo dos sentimentos que o animam. E, os rios, nisto são tão sensíveis e expressivos, tão naturais, como a riqueza sedutora da própria vida. Patenteia-se, portanto, o comprazimento e, ao mesmo tempo, a consciência de obreiro, no respeito comovedor do material com que labora e, sobretudo, na exemplar devoção deste dossiê. Assim, no humano encantamento de ver luzir esta obra trabalhou-a com mãos laborosas para realçar nas suas páginas uma formosura, a dos rios e das cidades na história do Brasil. Há brandura no correr. Há gentes que lhes vão às margens com a dureza das suas vidas de quase todos os dias. Há o rio! As cidades aqui aparecem, definidas a golpes de luz, em meandros, vivos e secretos. E no escuro sonâmbulo das águas principia-se um grande espaço, que termina muito ao longe. Entre a nascente e a foz varrem a sombra dos vales que tomam um nítido colorido, nas suas saliências arquiteturais, as cidades.
No dossiê, “A cidade e os rios na história do Brasil”, reúnem-se pesquisas que trazem contribuições significativas ao abordarem diferentes aspectos da história das cidades e dos rios na história do Brasil.
O artigo “Vareiros do rio Grajaú”, de Alan Kardec Gomes Pachêco Filho, analisa a História, a memória e as condições, de trabalho dos vareiros negros e índios do rio Grajaú, localizado no centro sul maranhense, no início do século XX.
O artigo “Cadê a água que estava aqui? Os leitos secos na memória e na história”, de Alexandre Martins de Araújo, é um estudo de caso a respeito de para onde são mandados os rios que secam, mostra que os múltiplos espaços hidráulicos, principalmente aqueles cujos leitos já secaram, participam diretamente da construção de memórias.
O artigo “Entre rios, rodovias e grandes projetos: mudanças e permanências em realidades urbanas do baixo Tocantins (Pará)”, de Bruno Cezar Pereira Malheiro e Saint-Clair Cordeiro da Trindade Júnior, traz a reflexão acerca das mudanças e permanências das cidades ribeirinhas na Amazônia, assume uma importância especial, pois permite analisar o perfil sócio-espacial dessas cidades consideradas tradicionais.
O artigo “Rio Araguaia: o caminho dos sertões, de Francisquinha Laranjeira Carvalho e Maria do Espírito Santo Rosa Cavalcante, investiga a multiplicidade, a diversidade e a complexidade que marcaram a historicidade do rio Araguaia, como via de integração, ressaltando o seu poder de coesão social.
O artigo “O rio Longá e o povoamento do norte do Piauí”, de José Luis Lopes Araújo e Accyolli Rodrigues Pinto de Sousa, analisa a bacia do rio Longá que representou importante fator de povoamento do norte do Piauí e seus usos pelas comunidades dos municípios que a compõem.
O artigo “Uma Veneza no sertão fluminense: os rios e os canais em Campos dos Goitacazes”, de Maria Isabel de Jesus Chrysostomo, analisa a importância dos meios materiais através dos quais uma sociedade constrói seu espaço de vivência e produção.
Para fechar o dossiê, o artigo “Encontros e desencontros no Oeste: Reflexões teóricas sobre as demarcações simbólicas das comunidades ribeirinhas do Rio das Almas em Goiás nas décadas de 1940 a 1950”, de Sandro Dutra e Silva, investiga como as fronteiras podem representar distinções entre geografia, temporalidades e identidades, dentre outras que reforçam, ao mesmo tempo, os traços do pertencimento e da distinção.
Há as resenhas das obras: VIDAL-NAQUET, P. Atlântida: pequena história de um mito platônico, escrita por Diogo da Silva Roiz; Omena, Luciane Munhoz de. Pequenos poderes na Roma imperial, escrita por Pedro Paulo Funari; e a resenha da obra FRANCO JÚNIOR, Hilário. A dança dos deuses: futebol, sociedade, cultura, escrita por Ademir Luiz da Silva.
Encontra-se também neste número o texto da conferência intitulada “Intelectuales, ideas e identidad en nuestra América”, ministrada pelo prof. Horacio Cerutti Guldberg, na abertura do IV Simpósio Internacional de História, Cultura e Identidades, realizado pela Faculdade de História da Universidade Federal de Goiás e pelo Núcleo Regional da ANPUH / GO, no Campus Samambaia da Universidade Federal de Goiás, na cidade Goiânia, em 13 de outubro de 2009.
E, por último, fechamos o número 2, volume 14, jun. / dez, 2009, apresentando o texto, da fala, da professora Lena Castello Branco F. de Freitas, proferida em sessão de homenagem promovida em 08 de dezembro de 2009, pela Faculdade de História da Universidade Federal de Goiás aos professores aposentados do Departamento de História. Jamais poderíamos deixar de apresentar neste número, que inicia sua circulação a partir do dia 30 de dezembro, parte do tempo que, ao se ler o texto de Lena Castello Branco, compreende-se também o sentido do texto: “O passado presente no amanhã”, de Nasr Fayad Chaul, que homenageia os mestres que desbravaram temas e abriram caminhos, sempre na vanguarda do que se considera a historiografia produzida em Goiás, na defesa apaixonada do historiador e atento ao presente, revelou que no passado é o lugar de se buscar o entendimento do presente e as formas de como neste atuar. Com a homenagem, torna-se acessível a compreensão da história dos professores do antigo Departamento de História, que constituíram os alicerces da atual Faculdade de História da Universidade Federal de Goiás. Convidamos à leitura.
Gercinair Silvério Gandara
Leandro Mendes Rocha Laurent Vidal
Organizadores do dossiê
Comissão Editorial
Maria da Conceição Silva-Editora
Armênia Maria de Souza
David Maciel
Luciane Munhoz de Omena
GANDARA, Gercinair Silvério; VIDAL, Leandro Mendes Rocha Laurent; et al. Apresentação. História Revista. Goiânia, v.14, n.2, 2009. Acessar publicação original [DR]