Posts com a Tag ‘University Press (E)’
Freedom’s Price: Serfdom, subjection and reform in Prussia, 1648-1848 | Sean Eddie
Poucos momentos na história do Ocidente foram tão profundos quanto as reformas agrárias dos séculos XVIII e XIX. Surgidas no contexto europeu pré-revolucionário e parte dos processos de modernização da sociedade e quebra dos estamentos tradicionais, as reformas agrárias ultrapassaram fronteiras e se tornaram elementos de construção dos estados nacionais e de novas configurações sociais em diferentes partes do globo. Mesmo sociedades como a brasileira, que se estruturava em torno do escravismo e latifúndio exportador, ou seja, detentora de realidades agrárias e sociais muito distintas daquelas da Europa central, não escaparam de tal desenvolvimento (Carvalho, 2003, p. 350-351) iii. O distante Japão, a “Prússia da Ásia”, a partir do fim do Xogunato e ascensão Meiji Tenno igualmente elaborou suas reformas agrárias a partir do modelo do reino dos Hohenzollern (Chung, 2018, p. 78) iv. No século XX, reformas no campo recebem o impulso das revoluções socialistas; alterações no status quo das estruturas do mundo agrícola foram, geralmente, prioridade para governos revolucionários no sentido de mudanças sociais profundas (Filippi, 2005, p. 27) v. De fato, o fenômeno descrito pelo historiador britânico Sean Eddie, embora confinado em sua análise na via prussiana das reformas agrárias, insere-se numa perspectiva temática de possibilidades globais, que extrapolam o século por ele descrito. Leia Mais
Dynasties: A Global History of Power/1300–1800 | Jeroen Duindam
En este libro el historiador Jeroen Duindam propone un nuevo modo de abordar y sistematizar la historia política de los tiempos modernos. A lo largo de los cuatro capítulos de la obra se observa la emergencia de un relato global, munido de las grandes transformaciones teóricas, epistemológicas y metodológicas que tuvieron lugar en las últimas décadas, y que transformaron la historia y las ciencias sociales radicalmente. Leia Mais
The Yellow Demon of Fever: Fighting Disease in the Nineteenth-Century Transatlantic Slave Trade | Manuel Barcia
Não é necessário ser especialista para saber que o tráfico de pessoas escravizadas entre o continente africano e as Américas, ao longo dos séculos, foi um mar de horrores em termos sanitários, dentro e fora das embarcações. Nem é coincidência que os navios que transportavam esses africanos e africanas para a venda na outra costa do Atlântico fossem chamados de tumbeiros. Mas, além da dor e da desumanização de suas vítimas, a viagem negreira foi também uma experiência sobre o conhecimento das doenças que se manifestavam durante a travessia. Foi também o terreno em que diferentes tratamentos daquelas enfermidades puderam se desenvolver para salvar vidas. Leia Mais
Marking samba: A new History of race and music in Brazil – HERTZMAN (NE-C)
HERTZMAN, Marc. A. Marking samba: A new History of race and music in Brazil Durhcham: University Press, 2015. Trad. Livre Dmitri Cerbonicine Fernandes. Resenha de: FERNANDEZ, Dmitri Cerbonicine. De “pelo telefone” a “internet”: tensões entre raça, direitos, gênero e nação. Novos Estudos – CEBRAP, São Paulo, n.102, Jul, 2013.
Nos últimos quinze anos, os chamados brasilianistas norte-americanos e britânicos voltaram seus olhos a temas anteriormente circunscritos aos nativos – caso geral da música popular brasileira e, em específico, do samba e do choro1. Se, por um lado, nossas obras musicais populares desde há tempos são bastante apreciadas e (re) conhecidas, chamando a atenção de vasto público, o mesmo não se poderia dizer das reflexões acadêmicas tecidas sobre essas obras e seus criadores.Os trabalhos da nova geração de brasilianistas são,por isso mesmo,um alento em diversos sentidos.A mera existência de um interesse estrangeiro por objetos de pesquisa tradicionalmente relegados a segundo plano nas ciências humanas auxilia a modificação do panorama de certo desapreço pelo assunto, forçando a universidade e demais instituições a reverem suas posições.A lastimável ausência de tradução dessas pesquisas para o português e a falta de interlocução dos estudiosos brasileiros – muitas vezes encerrados apenas na discussão em língua pátria e,quando não,em sua própria área ou subárea-talvez estejam com os dias contados; prenúncio de uma possível maturação de um campo de estudos que, embora secundário se comparado com o dos “grandes temas” – políticos, históricos, sociais -, não se iniciou ontem2.
Conquanto os resultados das análises empreendidas por esse novo grupo de brasilianistas variem bastante em termos de metodologia empregada, escopo, materiais coletados e ineditismo, são evidentes o impacto e a qualidade, se não de todas, pelo menos de algumas delas, o que as equipara ao que de melhor já foi escrito por aqui sobre a música popular em seus diversos aspectos. Dentre os livros que se destacam, um deles, sem dúvida, é Making samba: a new history of race and music in Brazil, do professor da Universidade de Illinois, Estados Unidos, Marc A. Hertzman. Originalmente uma tese de doutorado em História da América Latina defendida na Universidade de Wisconsin-Madison, em 2008, o livro recebeu dois prestigiosos prêmios nos Estados Unidos3, o que o gabaritaria, por si só, à tradução imediata.
Logo de início, Marc Hertzman propõe um novo mergulho em águas passadas, quer dizer, ele se dispõe a revisitar pelo menos três eixos estruturantes de nossa música que já foram, em separado, alvos da bibliografia específica: 1) o lugar do negro e as possibilidades de ação, repressão e reconhecimento no nascente universo artístico4; 2) o aparecimento das instituições comerciais em meio ao fazer musical popular e as resistências e colaborações que essas instituições passaram a alimentar da parte de artistas, intelectuais, jornalistas, políticos, folcloristas etc.5; 3) os sentidos do entrelaçamento da ascendente forma musical popular brasileira no início do século XX com a ideia emergente de nação e a instauração da República6. No entanto, há em sua problematização um entrelaçamento entre esses três eixos, algo que nunca havia sido tentado antes. O resultado é um livro que traz inúmeros dados, situações, fotos e declarações que recebem nova luz interpretativa, fornecendo no conjunto um panorama inédito de questões que se pensavam solucionadas.Os que,mesmo assim,ainda imaginarem que se trata de mero exercício desnecessário e repetitivo de diletantismo rapidamente se convencerão do contrário por conta de outro motivo: a presença de um elemento que confere o tom central à obra e que, sozinho, já a justificaria de imediato. Falamos aqui da postura epistemológica adotada por Hertzman, que o diferencia do viés que predominou durante largo espaço de tempo na academia brasileira: o do ensaísmo.
Por um lado, é bem verdade, tal pendor ao ensaio conformou uma maneira toda especial, muito criativa e prolífica de interpretação em um ambiente científico inóspito e incipiente,momento em que financiamentos para a realização de surveys e a disposição de arquivos e materiais minimamente organizados eram escassos em nosso país. Em tal conjuntura, onde sobravam erudição e capacidade de síntese aos nossos intelectuais “heroicos”, a necessidade teve de se fazer virtude, e os clássicos pioneiros demarcaram o início de uma profunda autocompreensão que ensejou, por linhas tortuosas, trabalhos como os do próprio Marc Hertzman. Por outro lado, há até hoje resquícios desse modo de fazer que, desacompanhados das antigas virtudes, mais servem para escamotear resultados duvidosos, destilar arrogância, falta de empenho e de energia em vasculhar bibliotecas, museus e arquivos do que em iluminar o que quer que seja. Atêm-se ou a materiais recauchutados, apropriando-se de modo acrítico de “verdades” jornalísticas que rondam os mais diversos estudos sobre música no Brasil há tempos, ou a letras de canções e células musicais, como se a partir delas, e só delas, fosse possível, sem um objetivo claro ou um problema teoricamente orientado, reconstruir toda a história de um gênero musical ou de uma época.
Nesse sentido, Hertzman desdobrou-se como poucos haviam feito nos estudos históricos sobre o samba; correu atrás de comprovações documentais, muitas delas localizadas em acervos pessoais de difícil acesso ou em museus que, geralmente, sofrem e sofreram durante décadas com o descaso governamental, a falta de verbas, incêndios, desfalques, perdas, desorganização. O resultado dessa tarefa árdua e minuciosa de levantamento de informações não o tornou mero coletor nem fez de seu trabalho uma descrição insossa de materiais repertoriados,o que costuma ocorrer quando tamanha energia tem de ser gasta tão somente no serviço de garimpagem. Pelo contrário, ele logrou conectar a criatividade intelectual e a audácia interpretativa de nossos antigos ensaístas com o emprego de uma empiria embasada em recolhimento e análise de dados, descortinando de maneira surpreendente, aos nativos e aos gringos, um novo universo em torno de um domínio que, à primeira vista, nada mais ou muito pouco ainda tinha a render. Dito isso, não se trata, assim, de qualquer “revisita” às três questões apontadas; antes, de uma pesquisa de fôlego que tenta fornecer, se não a última palavra sobre o assunto, ao menos uma palavra muito mais balizada, material e metodologicamente bem orientada do que as que tínhamos à mão até o presente momento.
O livro percorre um largo período cronológico ao longo de seus nove capítulos: passa-se desde a abolição da escravidão no Brasil, em 1888,até meados da década de 1970,quando se dá a instauração definitiva das modernas leis de proteção aos direitos autorais – embora as análises mais consistentes do livro, com fartura de materiais inéditos, estejam concentradas nas quatro primeiras décadas do século XX. Apenas o último capítulo se dedica ao escrutínio da conjuntura musical da década de 1960 em diante, o que, no conjunto da obra, representa mais elemento de verificação das teses defendidas sobre a “época de ouro” do que uma parte autônoma. O acompanhamento da noção de autoria, em termos legais e materiais, e seu correlato simbólico, qual seja, a individuação dos artistas, bem como o desenvolvimento das instituições que lidavam com essas questões e a legislação pertinente serviram como o fio de Ariadne de toda a estruturação do argumento de Hertzman; ele empregou uma embocadura até então menosprezada pelos demais estudiosos no intento de penetrar, de modo inovador, por veredas já caminhadas: “Embora estudiosos de muitas disciplinas venham se fascinando com a construção da autoria, poucos se interessaram pela relação entre propriedade intelectual e constituição nacional pós-colonial – sobretudo nas Américas – ou as histórias imbricadas entre raça, propriedade intelectual e nação” (p. 3)7.Em outras palavras,os marcos legislativos e as instituições que regulamentavam o fazer musical, a distribuição monetária e o papel desempenhado pelo Estado na garantia,manutenção e modernização de todo o engenho assomado no espaço de tempo compreendido pela pesquisa fizeram render uma nova visão sobre processos há muito mal compreendidos, pois faltavam materiais pertinentes ao demais autores,conforme argumentado,a fim de que pudessem chegar a conclusões mais robustas e precisas, que ultrapassassem o acolhimento acrítico dos depoimentos de quem viveu os acontecimentos em tela – referenciais fartamente empregados até então por alguns estudiosos.E é justamente a esta tarefa que Marc Hertzman se propõe:buscar no emaranhado que se formou entre as questões que envolvem raça, propriedade intelectual e nação o sentido da constituição do samba e, em uma via de mão dupla, a partir da problematização que parte da constituição do samba enquanto gênero musical negro, comercial e nacional, enxergar de modo mais exato e minucioso a imbricação de todo o processo cultural,econômico e político que conformou o Brasil.
No primeiro capítulo, Hertzman procura traçar uma espécie de pré-história das formas musicais populares que desaguariam no samba, bem como dos condicionantes sociais que assomavam ao final do século XIX com elas, isto é, os lugares de raça, de autoria e do vínculo possível dessas formas artísticas e seus produtores correspondentes com a ideia de nação em uma sociedade escravocrata. Hertzman, no entanto, passa longe de um denuncismo vazio ou de tomar um parti pris tão comum nos estudos atuais sobre raça e nação. O autor deixa claro desde o início que não guarda o propósito de esposar asserções como as que essencializam o samba como puro produto de uma “resistência negra” em abstrato nem as que retiram a agência dos negros, outorgando aos intelectuais brancos ou ao Estado varguista a proeminência na conformação dos traços das expressões culturais brasileiras. Hertzman tampouco se vincula seja à visão que adula a intermediação efetuada pelos meios de reprodução comercial da música popular,seja à que a rechaça apriori,pois considerada maléfica ou deturpadora de uma imagem “pura” e “autêntica”.Pelo contrário,colocar todas essas cosmovisões nativas abraçadas pela academia em perspectiva, fazê-las confrontarem-se umas com as outras para que, ao fim e ao cabo, venha à tona um panorama mais complexo do que aquele com o qual a literatura específica se habituou: este sim é um dos propósitos centrais de Hertzman, alcançado justamente por meio do que anunciamos como o grande feito de seu trabalho, quer dizer, a confrontação com materiais inéditos, que auxiliam a desvendar mitos até então inquestionáveis e uma visão que não se detém em fronteiras específicas do saber.
Um desses mitos que fundamentaram o memorialismo da música popular brasileira é o do que o autor denomina de “paradigma da punição” (p. 31). A ação supostamente praticada por parte do Estado de maneira sistemática,que penalizava os praticantes do samba com a prisão, de acordo com declarações à imprensa de sambistas que viveram a “época gloriosa dos primórdios”,é posta em suspenso no segundo capítulo. Hertzman, por meio de pioneiro mergulho nos arquivos penais das primeiras décadas do século XX,descobre que jamais houve uma única punição estatal por conta da prática do samba,ao contrário do que é alardeado em quase todos os trabalhos acadêmicos que lidam com a época. Tal relato mais servia como estratégia discursiva – um tanto exagerada para antigos sambistas firmarem-se como mártires de uma época ou para construírem a autenticidade requerida do gênero samba e, de lambujem, de si mesmos, dentro do circuito de valores que aos poucos foi se estabelecendo naquele gênero – do que refletia fielmente os processos históricos, entremeados na realidade de alianças e colaborações entre a polícia, o Departamento de Imprensa e Propaganda de Vargas e os órgãos representativos dos músicos.Isso não quer dizer, por outro lado, que Hertzman pinte um ambiente de igualdade e liberalidade generalizados para a prática musical popular no início do século XX, conforme veremos a seguir.
O olhar atento do historiador,que busca em uma miríade de eventos nem sempre vinculados imediatamente ao fenômeno a ser explicado os desenvolvimentos possíveis dos caminhos da história, evidencia-se no terceiro capítulo, em meio à interpretação de uma ilustração de um jornal da década de 1910 trazida à baila por Hertzman. O desenho tentava retratar uma tragédia: um dos primeiros artistas populares de relativo sucesso à época, um negro de apelido “Moreno”, havia sido supostamente traído por sua esposa,uma branca portuguesa.Ele resolveu matá-la a facadas e, em seguida, se matar. A representação da situação congregava todas as chaves necessárias para o desvendamento da figuração que ascendia na primeira década do século XX, para os temores que suscitava, para as apreensões que fazia refulgir: um novo universo estava se abrindo,com possibilidade de fama e sucesso àqueles que sempre foram apartados da ribalta da vida nacional, embora prenhe de todas as contradições que tão bem expressam a nossa formação. Que se atentasse para o “perigo” de permitir que essas figuras tão fascinantes quanto temerárias, aos olhos dos brancos, prosseguissem por uma via de acesso a patamares que já tinham dono: as mulheres brancas, o dinheiro, a fama. Isso é o que argumentavam os jornalistas que comentaram a mencionada cena de “Moreno”:o negro não tinha estruturas psicológicas nem sociais para angariar sucesso, para se manter na independência econômica, para se casar com uma mulher branca, em suma, para deixar de ser negro naquela sociedade dominada pelos brancos (p. 87). A igualdade democrática, o reino do direito abstrato e universal, a possibilidade de uma vida econômica e socialmente digna em seu próprio país não passavam de quimeras. Afinal, “quem eles pensavam que eram?”. Em contrapartida, alguns conseguiam escalar parcialmente as trilhas abertas pelo desenrolar da individuação artística e pelo novo comércio, por mais que tivessem que forjar por meio de suas mãos,do sangue de “Moreno”,ou de oportunidades ímpares, por um lado, ou apoiados em trajetórias distintas e caminhos compartilhados com os dominantes, por outro.
O que importa até aqui é que não cabem mais,de acordo com a proposta do autor,a aceitação pura e simples de quaisquer generalizações de categorias, como as de “o samba”, “a raça”, “a nação”, “a autoria” ou “o comércio”: há nas entrelinhas dos processos constitutivos de cada um dos fatores assinalados minúcias geralmente ignoradas, tensões e conflitos constitutivos dos próprios conceitos e processos que, se vistos desvinculados dos artífices que lhes deram viço,de seus tempos históricos, das funções que cumpriram e das atuações concretas dos atores que as encarnavam, mais borram a compreensão historiográfica do que a auxiliam em sua missão de reconstituição da figuração em pauta. Assim, Hertzman dá à mostra que existiram projetos autorais, intelectuais mesmo, por trás de cada grupo e personagens distintos que ocupavam posições díspares na sociedade brasileira das primeiras décadas do século XX. Figuras que, ao mesmo tempo que se confrontavam, teciam por vezes alianças e podiam ainda manter certo grau de cumplicidade, de animosidade, de distanciamento ou de proximidade, a depender de coordenadas e de conjunturas específicas.
Uma das mais expressivas comprovações diz respeito ao escrutínio dos que rodeavam a famosa casa de Tia Ciata, figuras centrais que participaram do que se convencionou denominar de “a nossa música” (p. 95): Hertzman demonstra no quarto e no quinto capítulos que jamais eles poderiam ser equiparados sem mediação a outros artistas que não tivessem nem a inserção socioeconômica deles, nem o conhecimento formal de música, nem o trânsito com jornalistas, industriais da arte e figurões da política e da intelectualidade nacional, nem a decorrente capacidade de mediação, seja artística ou intelectual. Igualar um Pixinguinha a um Baiaco ou a um Brancura, ou até mesmo a um Ismael Silva, pelo simples fato de serem negros esconde um abismo muito revelador do próprio modo pelo qual o racismo à brasileira se constituiu: por meio de reentrâncias e sutilezas, ou, mais especificamente, por meio de um engenhoso dégradé. Se é verdade que em determinado momento de suas trajetórias artísticas todos os citados enfrentaram alguma face do racismo, não se pode dizer que tenha sido da mesma maneira: as margens de manobra variavam muito, bem como o grau de sofrimento que os acometia,a depender da posição social que ocupavam. No caso de Pixinguinha e dos seus, tratou-se de notícias jornalísticas denominando-os de “negroides pardavascos”, incapazes de representar o Brasil,ou de pretendentes a um patamar mais elevado, como Catulo da Paixão Cearense, a desatiná-los (p. 113); no caso de Brancura, Baiaco e Ismael, tratou-se de uma vida tortuosa e de pobreza, de marginalidade, eivada de prisões, brigas e outros eventos manifestos de violência. Embora todos eles, de alguma forma, tenham contribuído para a criação e sustentação de símbolos guindados à condição de “nacional”, Hertzman chama a atenção para o fato de que cumpre visualizar com cuidado os modos pelos quais quando e cada um deles pôde – e se pôde – e por meio de quais contextos e estratégias ser alçado e se alçar ao panteão do samba e, por que não e por consequência, ao panteão nacional. A luta que envolveu a imposição de certa visão que concedia às suas criações a imagem de autêntica, única, sofisticada e respeitável toma, assim, lugar de destaque na análise (p. 115).
Transparecem, destarte, por meio de diversos exemplos, elementos intrínsecos à formação da nação, caracterizada sobretudo pelo tipo de estrutura social herdada da escravidão. Pela primeira vez tal situação é sistematicamente levada em consideração em conjunto com os efeitos simbólicos e econômicos que incidiram nas atividades artísticas populares. Hertzman demonstra no capítulo sexto como até mesmo intelectuais e artistas do porte de Villa-Lobos,Mário de Andrade e Luciano Gallet compartilhavam com maior ou menor ênfase de visões de época, segundo as quais se deveriam abrir alas à construção de um desejado Brasil “civilizado” e seu pressuposto, as correntes da modernidade, o que incorria em algum tipo de rebaixamento do que era apreendido como hierarquicamente inferior em uma escala artística de sensibilidade e racionalidade. Nesses casos, iniciavam-se discussões sobre o que podia ser aproveitável ou não para se entabular o concerto da nação,e aquilo que identificassem como “africano” era posto na berlinda.O mesmo se passava entre os intelectuais nativos do samba, como Tio Faustino, Vagalume ou China, irmão de Pixinguinha,que buscavam enfatizar a autenticidade de certa herança da África contra o que viria a ser uma África corrompida (p.156).Nesse cenário, alguns podiam tanto desempenhar o papel de dominantes em meio aos dominados como podiam ser defenestrados e ter as portas fechadas em diversos âmbitos. Em outros momentos, conforme frisado por Hertzman no capítulo sétimo, alguns podiam até mesmo se reportar diretamente ao presidente da República, como ocorreu em 1930 com os mencionados Pixinguinha e Donga, que clamavam a Getúlio Vargas,em meio a uma procissão de músicos,o auxílio do “pai dos pobres” à música nacional (p. 170). Já dentre os diversos artistas negros, sobretudo os semidesconhecidos resgatados pelo autor na intenção de iluminar comparativamente as possíveis trajetórias artísticas e seus liames com suas posições sociais, a situação era distinta: torna-se claro como os empecilhos enfrentados por eles dificultavam não só suas condições simbólicas naquelas instituições como ainda a simples manutenção econômica de suas vidas. A vinculação desses e de vários estorvos com outros fatores, como o de gênero, foi realizada no trabalho também de modo pioneiro.
A ascensão do samba em sua concretude pôde ser vislumbrada por meio de representações monetárias de quanto ganhava um grande artista – um cantor branco como Francisco Alves, por exemplo – em comparação com um compositor negro à margem dos estabelecimentos comerciais da música, como Ismael Silva (p. 129); de outro lado,a partir da constatação de uma tal pista micro,quer dizer, da assimetria econômica existente entre figuras de um mesmo universo, passa-se ao escrutínio do modo pelo qual se organizavam as instituições políticas e culturais, e como os elementos “raça”, “classe” e “gênero” se vinculavam de forma intrínseca ao funcionamento dessas instituições. É o que se vê com nitidez nos capítulos sétimo e oitavo. No caso das que lidavam com a música popular, como a Sociedade Brasileira de Autores (SBAT, fundada em 1917), a primeira que tomou para si a função de arrecadação e distribuição monetária dos proventos das atividades artísticas em geral no Brasil, percebia-se em suas entranhas a reprodução de todas as desigualdades de nossa sociedade em termos econômicos e simbólicos. O mesmo ocorrendo com os produtos de seus cismas ao longo do tempo,casos da União Brasileira dos Compositores (UBC),a Sociedade Brasileira de Autores, Compositores e Escritores de Música (SBACEM) etc., todas as que deram origem ao moderno sistema de arrecadação e distribuição de direitos ainda hoje vigente.Seus dirigentes,em maioria homens brancos vinculados a atividades consideradas “nobres” à época – como o teatro ou a “grande” música, em meados dos anos 1910 e 1920,ou os mais bem-sucedidos em termos econômicos com a ascensão do universo musical popular, a partir dos anos 1930 -, não se fizeram de rogados para eternizar a posição subalterna que os artífices negros, sobretudo os socialmente mais desprivilegiados, ocupavam em meio às estruturas das instituições à primeira vista “universais” que dirigiam, o que sublinha o caráter racial e economicamente assimétrico que perpassou a constituição de todas as nossas instituições democráticas, quando vistas de mais perto.
Emerge, assim, uma verdadeira história “materialista” do samba – e, por que não, do choro -, na melhor acepção do termo: em primeiro lugar, pelo fato de Hertzman lidar com estimativas sistematizadas de vendas de discos, com cifras relativas aos direitos autorais de canções, de lucros de gravadoras e de estações de rádio, de execuções de canções e de várias operações econômicas que dão à mostra a real dimensão das transformações estruturais ocorridas em meio à atividade musical popular. Em segundo lugar, o aspecto eminentemente “materialista” de sua proposta também se revela por conta do método: a visada totalizante, que pressupõe uma aguçada capacidade comparativa entre fatos, personagens e momentos aparentemente despidos de qualquer relação ou pertinência a fim de iluminar, a partir de distintos vieses, uma mesma questão específica. Hertzman arrisca, destarte, uma espécie de história total, onde condicionantes institucionais, geográficos, raciais, econômicos e culturais são movimentados para dar vida à agência dos atores (p. 11). Modificando seu foco a todo instante,passando de uma interpretação de um fato micro a uma correlação estrutural macro,e vice-versa,um verdadeiro mosaico das relações que davam viço àquela figuração nascente vem à tona. Embora a incursão na justificativa teórica de seu trabalho seja deveras enxuta,haja vista Hertzman nomear,e muito de relance,apenas Homi Bhabha, Michel Foucault e Peter Wade como inspiradores da empreitada (p. 10), é notória a contribuição tácita de autores como Norbert Elias, Pierre Bourdieu, Fernand Braudel, E. P. Thompson, Raymond Williams,dentre outros grandes nomes das ciências humanas,em seu modo de reconstituir a urdidura da história em voga. Mas essa explicitação, enfim, é o que menos importa, pois o primordial foi efetuado, quer dizer, o manejo teoricamente orientado do material levantado para além das fronteiras disciplinares artificialmente demarcadas.
Notas
1 Ver, por exemplo, DAVIS, DARIÉN J. White face, black mask: Africaneity and the early social history of popular music in Brazil. East Lansing: Michigan State University Press, 2009; Livinsgton-Isenhour, Tamara E. e Garcia, Thomas G. C. Choro: a social history of a Brazilian popular music. Bloomington: Indiana University Press, 2005; McCann, Bryan. Hello, hello Brazil: popular music in the making of modern Brazil. Durham: Duke University Press,2004;Stroud,Sean.The defence of tradition in Brazilian popular music: politics, culture and creation of Música Popular Brasileira. Aldershot: Ashgate, 2008; Shaw, Lisa. The social history of the Brazilian samba. Aldershot: Ashgate, 1999.
2 Ressalte-se a ausência de obras dedicadas à reflexão sobre música popular nos principais centros brasileiros produtores de conhecimento até meados da década de 1970, que vê, muito timidamente em sua segunda metade, o início de estudos regulares e sistematizados sobre o assunto. Balanços críticos de publicações na área podem ser encontrados em Béhague, Gerard. “Perspectivas atuais na pesquisa musical e estratégias analíticas da Música Popular Brasileira”. Latin American Music Review. Austin: University of Texas Press, v. 27, no 1, 2006; Napolitano, Marcos. “A Música Popular Brasileira (MPB) dos anos 70: resistência política e consumo cultural”. In: IV Congreso de la Rama Latinoamericana del IASPM, 2002, Nicarágua. Atas del IV Congreso de la Rama Latinoamericana del IASPM, 2002, mimeo; Naves, Santuza C. et alli. “Levantamento e comentário crítico de estudos acadêmicos sobre música popular no Brasil”. Revista Brasileira de Informação Bibliográfica em Ciências Sociais — BIB. São Paulo: ANPOCS, no 51, 2001.
3 Trata-se do prêmio de melhor tese de doutorado da New England Council of Latin American Studies (NECLAS) e de uma menção honrosa do Bryce Wood Book Award pelo livro, comenda concedida anualmente pela Latin American Studies Association ao melhor livro que verse sobre a América Latina.
4 Como, por exemplo, RODRIGUES, Ana Maria. Samba negro, espoliação branca. São Paulo: Hucitec, 1984.
5 Como, por exemplo, FROTA, Wander Nunes. Auxílio luxuoso: samba símbolo nacional, geração Noel Rosa e indústria cultural. São Paulo: Annablume, 2003.
6 Como, por exemplo, WISNIK, José Miguel e SQUEFF, Enio. Música: o nacional e o popular na cultura brasileira. São Paulo:Brasiliense,2a ed.,1983.
7 Tradução livre realizada pelo autor da resenha.
Dmitri Cerboncini – Fernandes– Professor de Sociologia na Universidade Federal de Juiz de Fora.
Knowing, teaching and learning History: National and international perspectives – STEARNS et al (ECS)
STEARNS, Peter N.; SEIXAS, Peter; WINEBURG, Sam (eds.). Knowing, teaching and learning History: National and international perspectives. New York: University Press. 2000. 475p. Resenha de: RODRÍGUEZ, A. Ernesto Gómez. Enseñanza de las Ciencias Sociales, v.1, p.113-114, 2002.
Pronunciarse sobre los requisitos que confieren calidad a la enseñanza de la historia es, sin duda alguna, una complicada cuestión que precisa de la concurrencia de múltiples y variadas opiniones; pues bien, ésta es una de las características a destacar de la obra que comentamos: la confluencia de autores procedentes de campos tan dispares –psicólogos e investigadores de la educación, historiadores, didactas y profesores de historia– que aportan numerosas e interesantes ideas sobre cómo ha de entenderse su enseñanza en unos momentos de cambios sociales y culturales tan profundos.
Las aportaciones se debatieron en la conferencia de la American Historical Association celebrada en Pittsburgh en 1997 y más tarde fueron recogidas en un texto que se estructura en cuatro partes y en el que se hace una reflexión sobre la enseñanza de la historia, entendida ésta como una asignatura independiente en el currículo escolar. A pesar de la distancia, es una obra perfectamente adecuada para abordar su enseñanza tanto en nuestra ESO como en la secundaria postobligatoria, una etapa bastante abandonada por las editoriales españolas, quizás porque los pasados debates se centraron, sobre todo, en torno a la cuestión de ciencias sociales o geografía e historia.
En la primera parte, titulada «Cuestiones actuales de la enseñanza de la historia» se aborda, desde siete colaboraciones pertenecientes a diferentes contextos –Canadá, EEUU, Gran Bretaña, Estonia–, las cuestiones de qué es la historia y cómo debería enseñarse. Entre ellas destacan la de Seixas, que analiza la naturaleza del conocimiento histórico, sopesando los pros y los contras de tres corrientes a través de las cuales el profesorado maneja conflictivas interpretaciones de los acontecimientos históricos: la memoria colectiva, la orientación disciplinar y la orientación postmoderna. Por su parte, James Wertsch analiza las diferencias entre los conceptos de maestría y apropiación, al objeto de responder a la cuestión de si se pueden simultanear valores y conocimientos en la enseñanza de la historia. Desde la experiencia escolar canadiense, Morton, plantea la necesidad de reflexionar profundamente antes de aplicar soluciones simplistas que abogan por una explotación del pasado para solucionar los problemas políticos contemporáneos.
Ante la incapacidad del alumnado inglés para construir un mapa coherente del pasado, Shemilt no tiene más remedio que reconocer cierto fracaso del Schools History Project, a pesar de que su currículo se articulaba y estructuraba, esencialmente, para lograr esa orientación.
Como conclusión general de esta sección, hay que reconocer que, a pesar de la profundidad de las reflexiones, resulta imposible establecer el consenso entre ellas.
La segunda parte ofrece menos utilidad para el caso español, al centrarse en problemas y cuestiones específicamente norteamericanos; en líneas generales, argumenta la necesidad de introducir cambios en la enseñanza de la historia. La historiadora Ravith, muy implicada en las conservadoras reformas curriculares de los años noventa, responsabiliza de la mala calidad de la historia que se enseña a la mala formación histórica del profesorado, sin entrar en otras circunstancias. Otro capítulo analiza un programa piloto universitario destinado a la formación del profesorado de historia, subrayando la necesaria e imprescindible colaboración entre los departamentos de Historia y de Educación. El tercero versa sobre la reforma de la enseñanza de la historia emprendida en un distrito escolar californiano, cuyo éxito se justifica en que se basa en el desarrollo profesional de los docentes y en la intervención activa y coordinada de departamententos universitarios de contenidos y de educación.
La tercera parte se dedica a «La investigación sobre la enseñanza y el aprendizaje de la historia» y la integran siete colaboraciones de conocidos didactas y psicólogos educativos, aunque algunas de ellas –las de Leinhart y von Borries– parecen fuera de contexto. Los británicos Lee y Ashby exponen los resultados de un proyecto curricular destinado a incrementar la comprensión de la historia entre el alumnado de 7 a 14 años, y sus conclusiones confirman que el aprendizaje histórico resulta mucho más complicado y variado de lo que tradicionalmente se creía. Por su parte, la didacta Levstik establece comparaciones entre la forma de percibir la historia por unos alumnos y la distinta percepción de sus profesores y de profesores en formación. La cuestión más interesante es que, mientras que los primeros se muestran bastante sensibilizados por abordar las cuestiones conflictivas de la historia del país, los segundos muestran una marcada tendencia a dejar aparcados los aspectos más candentes de la historia y reflejan una profunda despreocupación hacia aquellos temas que realmente suscitan la participación cívica. Finalmente, Wineburg destaca, a través de los datos proporcionados por un estudio longitudinal, que en la actualidad la escuela no es más que uno de los muchos espacios donde se puede enseñar y aprender la historia en la sociedad moderna.
Los seis capítulos de la quinta y última parte tratan la cuestión de «los modelos de enseñanza» mediante informes de experiencias destinadas a mejorar el rendimiento del alumnado; unas experiencias que parten desde distintas interpretaciones de lo que constituiría el conocimiento y la comprensión histórica y que pretenden constatar la viabilidad y la eficacia de las técnicas educativas que se aplican.
Las tres aportaciones más interesantes son las de Gutiérrez que, narra su experiencia en una high school californiana con elevada población «marginal». Básicamente, esta autora percibe la comprensión histórica en términos de desarrollo personal y de capacitación del alumnado para participar de manera efectiva en la comunidad democrática. Bain desarrolla un planteamiento más academicista y expone su experiencia docente centrada en la adquisición de estrategias cognitivas dirigidas a desarrollar la habilidad del alumnado en el manejo de recursos históricos variados. Por último, Boix-Mansilla relata una experiencia encaminada a revisar algunas cuestiones sociales problemáticas actuales a la luz de acontecimientos ya históricos, pretendiendo y fomentando una interpretación e intervención valorativa del alumnado. En síntesis, estos modelos de enseñanza pueden servir para animar al profesorado en la búsqueda de nuevas fórmulas educativas.
En general, pese a los desequilibrios que se aprecian en ella, podemos valorar positivamente esta obra que, como señalan sus editores, en un campo acosado por serios problemas e incertidumbres, sugiere nuevas vías para discutir sobre cuál y cómo debería ser la aportación de la historia a la educación.
Ernesto Gómez Rodríguez – UMA.
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Knowing, Teaching & Learning History – STEARNS et al (CC)
STEARNS, Peter. SEIXAS, Peter; WINEBURG, Sam Wineburg (éd.). Knowing, Teaching & Learning History. New York: University Press, 2000. 482p. Resenha de: Philippe Haeberli. Le cartable de Clio – Revue romande et tessinoise sur les didactiques de l’histoire, Lausanne, n.2, p.284-288, 2002.
Publié en association avec l’American Historical Association, cet ouvrage de près de 500 pages est issu d’un congrès tenu à la Carnegie Mellon University en novembre 1998. Il réunit une vingtaine de communications d’un panel de chercheurs anglo-saxons venus d’horizons différents (éducation, enseignement, histoire, psychologie, sociologie, sciences cognitives, sciences politiques…) et s’intéressant aux développements récents de la recherche sur l’enseignement et l’apprentissage de l’histoire. La volonté des éditeurs Peter Stearns, historien, Peter Seixas, spécialiste en plan d’études (curriculum) et ancien enseignant d’histoire au secondaire et Sam Wineburg, psychologue spécialisé dans les problèmes d’éducation, est de combler avec cet ouvrage une lacune, estimant que les historiens n’ont pas donné d’écho suffisant à l’intérêt grandissant du public américain pour la question de l’histoire à l’école. En effet, dès 1995 et la mise en débat au Congrès américain, on a assisté à une médiatisation croissante outreatlantique de la question de l’histoire à l’école. Des pratiques dans lesquelles des historiens non-professionnels évoquent, narrent ou utilisent des représentations du passé (commémorations, expositions, fictions, films…), l’enseignement scolaire de l’histoire reste, de l’avis des éditeurs, le parent pauvre de la recherche historique.
La question qui sert de fil rouge à l’ensemble des communications tourne autour de la fonction attribuée à l’histoire à l’école: cette dernière estelle principalement un héritage non-critique destiné à transmettre une certaine version du passé ou la version élémentaire de la discipline historique au sein de laquelle la dimension critique domine et que certains pourront développer plus tard à l’université? Les auteurs démontrent tout au long de l’ouvrage que la question de l’enseignement de l’histoire ne se réduit pas aux débats à propos des faits historiques à enseigner ou des identités à mettre en lumière, mais qu’il existe des compétences étroitement liées à la pratique de l’histoire qui constituent une base indispensable à l’exercice de la critique et qui, à ce titre, doivent être enseignées aux élèves.
L’approche sur laquelle l’ensemble des contributeurs s’accordent est épistémologique et culturelle. La séparation entre le contenu et les processus d’apprentissage est considérée comme artificielle et dangereuse. Il est entendu pour tous que le processus de communiquer des connaissances sur le passé est, avant tout, un acte qui charrie des messages implicites sur ce que signifie « être historique » dans une société moderne. Pour paraphraser le philosophe américain de l’histoire Hayden White, il y a énormément de contenu dans la forme. D’un acte purement technique, l’acte d’enseigner est considéré comme un acte culturel où se posent les questions de la nature du savoir, du rôle de l’élève et de l’enseignant dans la production de l’histoire. La classe peut ainsi devenir un des lieux du débat démocratique autour de la question de la signification de l’histoire.
La didactique de l’histoire étant un champ récent, elle cherche encore sa légitimité. Les auteurs énoncent trois références possibles: la ’révolution cognitive’ dans l’apprentissage et l’enseignement, comme l’a dénommée Howard Gardner, grâce à laquelle on est passé d’une pédagogie centrée sur les comportements à une attention particulière attribuée à la signification et au sens donnés aux actes d’enseignement; l’ouverture des débats historiographiques aux différents groupes minoritaires composant la société américaine; un intérêt accru pour les questions de conscience historique, de mémoire collective, et de présentation publique de l’histoire.
L’ouvrage se découpe en quatre parties et les articles sont classés par thèmes de la manière suivante:
1° Les choix, les croyances et la compréhension
Quelle histoire doit être enseignée? L’enseignement de l’histoire implique des choix de contenu. Sur quels critères opérer ces choix? Deux historiens, Gary B. Nash et Ross E. Dunn font la suggestion suivante: soit les choix sont dûment explicités par les enseignants (comme c’est le cas dans le domaine de la recherche historique), soit ils font l’objet de discussions entre enseignants et élèves. Voilà pour la forme. Sur le fond, Nash et Dunn défendent la thèse que le contenu devrait être celui d’une histoire mondiale libérée des questions identitaires et de la recherche des origines. L’important étant pour eux les questions épistémologiques liées à cette histoire. Citant l’historienne Marylin Waldmann, Dunn finit son article par ces mots: «I think we need to stop arguing over which books to read or which cultures to study and start talking about which questions to ask » (p. 137).
2° Représentations partagées
Quel rôle pour l’histoire dans le projet identitaire? Dans quelle mesure les croyances à propos du passé influencent-elles le citoyen dans la compréhension qu’il a de lui-même et du monde qui l’entoure? James V. Wertsch, psychologue, apporte des éléments de réponse à ces questions. Il a pu conclure de ses recherches sur la conscience historique menées en Estonie qu’il existe deux actes mentaux de nature différente dans les jugements sur le passé. La croyance et le savoir (’belief ’ et ’knowledge’). Il observe que les gens stockent dans leur mémoire des constructions souvent très élaborées d’histoire officielle tout en continuant à croire profondément des récits alternatifs, voire contraires sur le passé.
Chose intéressante, les croyances même si elles sont souvent plus incohérentes que les connaissances, contribuent, selon Wertsch, beaucoup plus que ces dernières, à la constitution de l’identité et des conceptions politiques ou morales de la personne. Roy Rosenzweig a mené quant à lui une étude sur les représentations et l’utilisation des adultes américains à propos du passé dont les conclusions se montrent plutôt positives quant à l’importance accordée à l’histoire comme instrument de dialogue entre le passé et le présent. Enquête de même nature, mais effectuée de l’autre côté de l’Atlantique, l’enquête Youth and History dirigée par Bodo Von Borries, ancien enseignant reconverti dans la recherche en éducation, réalisée auprès de 32’000 jeunes en Europe et au Moyen Orient, démontre une certaine ignorance des méthodes d’enseignement ’ouvertes’ et ’centrées sur l’élève’ issues de 25 ans de réforme scolaire, autant chez les élèves que chez les enseignants interrogés. Empiriquement, les méthodes traditionnelles de l’enseignement de l’histoire semblent même donner des résultats supérieurs aux méthodes nouvelles selon les standards de l’enquête. Ces résultats exigent, selon von Borries, un réexamen de la légitimation théorique et normative de ces nouvelles méthodes d’enseignement de l’histoire. Linda S. Levstik décrit le décalage entre les attentes des élèves sur les aspects négatifs de l’histoire nationale (en l’occurrence américaine) et les réticences des enseignants à aborder des sujets et récits historiques polémiques, diviseurs ou même alternatifs pour la raison qu’ils n’ont rien à voir avec la formation identitaire des élèves. De manière générale, les questions relatives aux conceptions que les élèves peuvent avoir sur la méthode historique (quelle source historique croire? comment se comporter devant des sources conflictuelles? la nature réelle de l’argument historique?) sont discutées par la majorité des intervenants. Elles font l’objet de belles controverses et soulèvent une question pertinente: comment aborder dans la classe les différences de conceptions sur la manière d’étudier le passé? James F. Voss et Jennifer Wiley cherchent à répondre à deux questions liées intimement à l’écriture de l’histoire: présenter des segments de textes historiques séparément (textes multiples) produit-il de meilleures performances que de présenter le segment comme un seul texte? Et écrire un essai argumentatif sur un sujet historique produit-il des performances supérieures à écrire un autre type d’essai, comme le texte narratif? Dans un article surprenant, Sam Wineburg se demande quelles représentations du passé les jeunes acquièrent à travers les médias, la culture populaire, l’église et la vie familiale et comment ils les acquièrent. Son postulat de base est celui de la micro-histoire: il faut aller voir si les théories sociologiques générales se vérifient dans les représentations des individus. Autre interrogation plutôt provocatrice soulevée par Wineburg: et si les représentations produits par les médias et la culture populaire peuplaient la conscience historique américaine plutôt que celles issues du contenu des cours d’histoire à l’école? Son opinion sur la question est pour le moins atypique:
« Rather than pretending that we can do away with popular culture – confiscate videos, banish grunge rock and rap music, magnetize Nintendo games, and unplug MTV and the Movie Channel-we might well try to understand how these forces shape historical consciousness and how they might be used, rather than spurned or simply ignored, to advance student’s historical understanding » (p. 323).
Peter Lee et Rosalyn Ashby estiment que la progression des représentations des élèves à propos de la discipline historique est une donnée importante à prendre en compte par les enseignants et les programmes. Ils cherchent ainsi à déterminer les différences de compréhension de l’histoire comme forme de savoir qu’il peut exister entre des enfants de 7 ans et des enfants de 14 ans. Leur enquête à laquelle ont participé 500 élèves anglais porte sur ce qu’ils appellent les idées de second-ordre (concepts de preuve, de changement, d’explication ou de récit historique) par opposition à l’histoire substantive qui concerne le contenu historique proprement dit. Les questions qui ont intéressé Lee et Ashby sont par exemple: qu’est-ce qu’un savoir à propos du passé? Quel genre de problèmes aborde l’histoire? Comment expliquer les différences dans les récits historiques? Comment expliquer les différences d’opinion entre auteurs?
3° Entre mémoire collective et histoire critique
La tension entre passé critique et passé utilisable est développée dans un certain nombre de communications. La question du but politique visé par l’enseignement de l’histoire est alors clairement posée. Peter Seixas expose et critique une alternative au choix cornélien entre mémoire collective et histoire critique, à savoir la perspective post-moderniste de l’histoire inspiré des écrits de Michel Foucault pour la rejeter en mettant le doigt sur les dangers de nihilisme et de relativisme extrême qu’entraîne cette position.
4° Recommandations pour des réformes (modèles pour enseigner)
Certains auteurs, praticiens, proposent des innovations qui pourraient servir de modèles pour la classe. Robert B. Bain, enseignant d’histoire à l’école secondaire pendant 26 ans, montre comment les sciences cognitives et la psychologie culturelle lui ont été utiles pour développer des nouvelles techniques d’apprentissage. Veronika Boix-Mansilla s’intéresse plus particulièrement à la relation passé-présent. Elle dénonce la subordination de l’histoire à des valeurs aussi respectables soient-elles (démocratie, droits de l’homme, identité nationale) et la transformation de l’histoire en leçons de morale ou en dogmes servant à diriger les comportements dans le présent. Elle suggère que les liens que font les élèves entre des événements historiques et des événements actuels sont souvent simplistes, quand ils ne sont pas faux. En utilisant une étude où les élèves devaient appliquer ce qu’ils savaient de l’Holocauste pour expliquer le génocide rwandais de 1994, BoixMansilla illustre sa suggestion. Peter Stearns identifie et discute des activités particulières à l’analyse historique rencontrées par des élèves de l’Université dans son cours sur l’histoire mondiale dont la comparaison interculturelle, la vérification de théorie et l’explication du changement en histoire. Il relève et souligne que ces activités requièrent certains savoirs que les enseignants secondaires négligent ou qu’ils considèrent comme déjà acquis par les élèves. Psychologue et linguiste, Charles A. Perfetti propose un outil informatique s’inspirant de recherches dans le domaine des sciences cognitives pour aider les élèves de secondaire à faire des liens entre différents documents historiques traitant du même sujet, partant, pour enseigner l’histoire à l’aide d’une multiplicité de documents. Quant à Diane Ravitch, historienne de l’éducation, elle considère qu’un des enjeux clés pour une réforme réside dans la formation des enseignants chez qui il existe, selon elle, trop souvent des lacunes dans le savoir historique. Or, remarque-t-elle, comment des enseignants à qui il manque les connaissances de base peuvent-ils enseigner ce qu’ils ne savent pas aux élèves? Le contenu d’un cours académique réservé aux enseignants historiens pose problème. Sur quel aspect du futur métier de l’enseignant mettre l’accent? G. Williamson et McDiarmid, tous deux professeurs d’histoire, et Peter Vinten-Johansen, professeur d’éducation, ont tenté de mettre en commun leur savoir au service des futurs enseignants dans un cours de méthodes d’enseignement historiques donné à l’Université de Michigan.
Nous retiendrons de cet ouvrage trois aspects susceptibles de nourrir la réflexion sur l’enseignement et l’apprentissage de l’histoire. L’approche pluridisciplinaire et en particulier la participation importante de chercheurs issus de la psychologie semblent enrichir le traitement et les réponses à des questions aussi complexes et hétérogènes que celles posées par l’enseignement et l’apprentissage de l’histoire ; même si les compétences liées à la pratique de l’histoire et notamment le développement d’un sens critique chez l’élève se révèlent prioritaires pour les auteurs, ils n’en oublient pas moins la question du contenu enseigné. Celui-ci fait l’objet d’une réelle réflexion et de discussions sérieuses, entre autres autour de la dimension identitaire de l’enseignement de l’histoire ; enfin, cet ouvrage démontre ce qu’une collaboration entre chercheurs et praticiens peut apporter comme résultats fructueux.
Philippe Haeberli – Université de Genève.
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