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Tempo presente: História, Educação e Educação Histórica / Perspectivas e Diálogos – Revista de História Social e Práticas de Ensino / 2018
O nosso objetivo com o dossiê, Tempo presente: História, Educação e Educação Histórica, foi apresentar aos nossos leitores trabalhos acadêmicos que podem trazer o Presente à reflexão enquanto temporalidade histórica e objeto de interesse historiográfico, com as perspectivas e abordagens temáticas e metodológicas suscitadas. Atendendo ao nosso chamado, pesquisadoras e pesquisadores, de diferentes origens geográficas, agraciaram-nos com estes trabalhos que nos dão a dimensão da importância dos estudos e discussões nos campos da História, História da Educação e Educação Histórica.
O texto, Entre consciência histórica e narrativa mestra: a identidade na narrativa de jovens graduandos em história da cidade de Ponta Grossa, Paraná, de Giuvane de Souza Klüppel e Luís Fernando Cerri apresenta resultados parciais do projeto de pesquisa: O país e o mundo em poucas palavras: narrativas de jovens sobre seus pertencimentos – implicações para o ensino de Ciências Humanas. Os pesquisadores aplicaram questionários qualitativos a estudantes de diferentes níveis de ensino na cidade de Ponta Grossa – faixa etária entre 12 e 24 anos – para conhecer suas narrativas sobre “a história do seu país” e sobre “o desenvolvimento da democracia”. Os dados, produzidos pelos 277 questionários aplicados, foram analisados com o auxílio de softwares que tornaram possível sistematizar, em formato de gráfico, dados como: frequência no uso de determinados termos, com potencial para desvelar sentidos de conjuntos discursivos. A análise foi realizada à luz de reflexões teóricas sobre Consciência Histórica, baseada nas pesquisas do historiador Jörn Rüsen; e sobre Narrativa Mestra, com base no trabalho de Mario Carretero e Floor Van Alphen. As reflexões dos autores nos apresentam elementos para melhor compreender os processos de construção de narrativas sobre a nação e o mundo por parte de jovens de diferentes idades e em diferentes etapas de escolarização. Também nos possibilitam compreender sobre os sentidos que eles atribuem às inter-relações entre passado, presente e futuro na construção de suas narrativas em temas como identidade nacional e democracia / convivência democrática.
Maryana Gonçalves Souza e Antonieta Miguel, em A docência em Guanambi durante a ditadura militar: uma análise sobre o Colégio Luiz Viana Filho, investigam as características dos professores e permitem discutir sobre instrução, formação docente e composição escolar do referido Colégio, sob o recorte temporal da ditadura militar brasileira. Segundo as autoras, a ditadura militar foi uma forma de governo que interferiu diretamente em diversos públicos e, em razão de os docentes terem sido um dos principais agentes de combate ao regime, o trabalho docente pode se tornar uma fonte de pesquisa sobre esse período histórico. As autoras apresentam o resultado da pesquisa em que fizeram o cruzamento entre os dados bibliográficos sobre a História da Educação, instituições escolares e corpo docente com a documentação do arquivo da instituição, seguida da catalogação das fontes. A partir da análise dos documentos, em particular das instituições escolares da cidade de Guanambi, Estado da Bahia, as pesquisadoras esboçam um panorama do campo educacional brasileiro no período ditatorial.
O terceiro texto que compõe este dossiê é de autoria de Polliana Moreno dos Santos e se intitula: Religiosos e a «não-violência ativa» na memória mediatizada dos 50 anos do golpe civil-militar no Brasil (1964-1985). A autora aborda questões que possibilitam o diálogo da História do Tempo Presente com a História Pública. Discute, com propriedade, a participação de religiosos na resistência contra a Ditadura Civil-Militar (1964-1985). Apresenta como eixo a memória mediatizada presente na série jornalística “Silêncios da Ditadura” exibida pelo jornal SBT Brasil, considerando o contexto da justiça de transição no Brasil e os estudos da História do Presente. O episódio analisado é a Operação Gutemberg, organizada pelos militares com o objetivo de controlar a missa em memória do jornalista Vladimir Herzog, assassinado nos porões do DOI-CODI, evitando, destarte que se transformasse num ato político. Esta cerimônia religiosa foi realizada por três figuras importantes da resistência à Ditadura: o rabino Henry Sobel, o arcebispo Dom Evaristo Arns e o reverendo Jaime Nelson Wright. A disputa de narrativas, tão característica dessa História, fez-se relevante por revelarem os contextos nos quais cristãos, ou não, estiveram envolvidos, construindo uma memória mediatizada. A autora sinaliza que, cada vez mais, é importante aceitar os desafios de disputar memórias e narrativas da História.
Fruto de sua pesquisa de mestrado, o artigo de Vânia Muniz dos Santos, Orientando crianças, jovens e adultos: ações da Bahia na promoção da Educação Moral e Cívica durante o regime militar, faz algumas considerações sobre ações impostas no Estado da Bahia, durante o Regime Militar, no que concerne à organização da Coordenação de Educação Moral e Cívica – COMOCI / BA –, responsável, no âmbito estadual, por coordenar e fiscalizar as ações desenvolvidas nas instituições escolares na disciplina Educação Moral e Cívica. Através da análise de documento, que elucidam a forja das políticas educacionais pelo Conselho Estadual de Educação, o texto traz elementos para a reflexão sobre a importância desta disciplina escolar para atingir os propósitos do regime ditatorial.
E, para finalizar, contamos com o artigo A área de estudos sociais no uso dos estudos dirigidos no ginásio vocacional Oswaldo Aranha (SP, 1962- 1964), colaboração de Yomara Feitosa Caetano de Oliveira Fagionato. A autora apresenta as múltiplas apropriações dos docentes da área de Estudos Sociais do uso dos Estudos Dirigidos na cultura escolar da mencionada instituição educativa de 1962 até o golpe de 1964. Chamando a atenção para a importância da discussão sobre o conceito de cultura escolar e de como este conceito pode ser ampliado para outras análises, a exemplo da cultura escolar vocacional de 1964, que transformou a disciplina Estudos Sociais em área, quando passou a enfrentar novos dilemas a ponto de se produzir uma nova cultura escolar. Para tanto, a autora recorta seu estudo no período inicial da Ditadura Civil Militar, 1962 até 1964. De forma responsável, a autora faz usos de fontes como relatórios, planejamentos e práticas educativas dos professores de Estudos Sociais, que são analisadas metodologicamente de forma qualitativa sustentada pela noção de apropriação cunhada por Roger Chartier (1988; 2002). A autora organiza o texto em duas seções, na primeira, analisa os Estudos Dirigidos nos planejamentos da cultura escolar vocacional em uma sociedade democrática; e, na segunda parte, analisa essa mesma prática registrada nesse conjunto de fontes escolares docentes do ano 1964, quando se forja uma nova cultura escolar. Os resultados possibilitam perceber as inquietações docentes ao refletirem sobre esses saberes voltados para uma sociedade brasileira democrática.
A História nos diz muito sobre a sociedade contemporânea, desde as suas prioridades e de seus valores até sobre comportamentos e atuações dos diversos grupos sociais que a compõe. A História do Tempo Presente reafirmou, no século XX, que testemunhos históricos são fonte histórica legítima, a história contemporânea pode ser objetiva, a memória oral não é mais problemática que a escrita, a função política da História em formar cidadãos pode partir de fatos de passados recente como remotos e, finalmente, o compartilhamento do tempo histórico do historiador com aqueles que fazem a história pode ter um lado positivo, visto que o historiador deve dividir “(…) com os que fazem a história, seus atores, as mesmas categorias e referências. (…) a falta de distância, ao invés de um inconveniente, pode ser um instrumento de auxílio importante para um maior entendimento da realidade estudada (…). (CHARTIER, 1993 apud FERREIRA, 2000, p.10).
Referências
CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Tradução: Maria Manuela Galhardo. Lisboa, Portugal: DIFEL, 1988.
______. À beira da falésia: a história entre incertezas e inquietudes. Porto Alegre: Editora da Universidade / UFRGS. 2002
FERREIRA, Marieta de Moraes. História do tempo presente: desafios. Cultura Vozes, Petrópolis, v.94, n.3, p.111-124, maio / jun., 2000.
Celia Santana Silva – Doutora em História pela Universidade do Estado de Santa Catarina. Professora da Universidade do Estado da Bahia, Departamento de Ciências Humanas e Tecnologias, Campus XVIII / Eunápolis. E-mail: celiasantanauneb@gmail.com
Luciana Oliveira Correia – Doutora em Educação pela Universidad de Alcalá. Professora da Universidade do Estado da Bahia, Departamento de Ciências Humanas, Campus VI / Caetité. E-mail: lcorreia@uneb.br
SILVA, Celia Santana; CORREIA, Luciana Oliveira. Apresentação. Perspectivas e Diálogos – Revista de História Social e Práticas de Ensino. Caetité, v.1, n.2, jul. / dez., 2018. Acessar publicação original [DR]