Taxonomias da aprendizagem empregadas pelo SAEB

axonomias da aprendizagem empregadas pelo SAEB SAEB

Para citar este quadro

OLIVEIRA, Margarida Maria Dias de; FREITAS, Itamar. Futuros para a formação de professor no Brasil: a posição dos profissionais de História. In: ZARBATO, Jaqueline Aparecida Martins; RODRIGUES JUNIOR, Osvaldo (orgs.). Guerras de narrativas em tempos de crise: ensino de história, identidades e agenda democrática. Cáceres: Unemat Editora, 2021. p.1168-169.

Progressão das aprendizagens para teorias gerais da educação escolar

Cliche 1 Imagine timelines SAEB
Clichê 1 – Imagine timelines: One or more timelines representing different periods of history, each with icons or small pictures representing important historical events or figures from those periods. Watercolor –ar 745:423 | Imagem: IF/IA/Midjourney (2023)

 

Introdução

Colegas, boa oite!

Ontem, encerramos um minicurso sobre Inteligência Artificial e Ensino de História. Ali, reiterei que a estrutura sintática de uma expectativa de aprendizagem (ou objetivo específico de um curso). Vimos que os principais elementos do comando de um objetivo geral, de uma expectativa de aprendizagem, de uma atividade ou de um item de prova são: sujeito, verbo, complemento do verbo e circunstância.

Na interação desta noite, vou tratar apenas da disposição dos objetos de aprendizagem no tempo de um curso. Vou tratar da sequência didática, que envolve os modos planejar a hierarquização de habilidades e conhecimentos.

E vou tratar desse assunto em três etapas: definindo progressão, apresentando ferramentas para o planejamento da progressão, que são as taxonomias e, por fim, aplicando duas dessas taxonomias na construção de sequências didáticas de conhecimentos declarativos.

1. Progressão

No ensino superior, temos o costume aplicar o mesmo Plano de Curso em qualquer ano da graduação. Supomos que todos os alunos já estão “crescidos” e “maduros”. O próprio qualificativo – “superior” – é, muitas vezes, entendido como “fase” final de uma formação escolar exigida pela sociedade. Uma formação que se inicia de estudos gerais sobre a vida e se finda com a especialização profissional.

Até aí, a maioria concorda: as aulas devem respeitar as “dimensões” cognitiva, física e afetiva dos alunos e as complexidades das futuras tarefas profissionais. O problema começa quando somos chamados a justificar e anunciar os critérios empregados na “programação” dessas sequências didáticas.

E não é qualquer sequência didática. É uma sequência em progressão. Uma sequência planejada a partir da distribuição criteriosa dos conhecimentos e habilidades e capacidades ao longo do tempo acadêmico.

Na base dessa ideia de progressão está o princípio de que a formação acadêmica significa também um processo de maturação do corpo discente em seus aspectos físico, cognitivo e afetivo.[1] Até aí, temos consenso. Mas como por em prática esse princípio? Como evitar que as progressões sejam planejadas de modo não arbitrário?

Para a resolução desse problema, contamos com os estudos de filósofos, psicólogos e dos profissionais das neurociências.

 2. Taxonomias

Filósofos e psicólogos, principalmente, têm aprofundado estudos sobre as nossas possibilidades, instrumentos, objetos e hierarquias do conhecer (que aqui eu emprego como sinônimo de aprender).

Nessa busca, pensadores como I. Kant, J. Dewey, J. Piaget e S. Wygotsky[2] foram movidos por questões do tipo: Conhecemos pela razão, pelos sentidos ou pela razão e os sentidos simultaneamente? Como se constitui a mente? Quantos e quais são os poderes da mente? Existe uma hierarquia entre esses poderes?

As respostas mais conhecidas estão no senso comum: as faculdades humanas são, por exemplo: sensação, pensamento e vontade ou sensação, pensamento e memória.

Nos últimos 60 anos, porém, cada uma dessas habilidades macro foi subdividida e hierarquizada de tal maneira que possuímos dezenas de mapas ideais-típicos de como a mente funciona. Esses mapas são chamados Taxonomias dos objetivos educacionais ou Taxonomias das aprendizagens.

Para este curso, separamos as duas das mais referidas pelos psicólogos e teóricos do currículo: a Taxonomia dos objetivos educacionais de Benjamin Bloom, em versão revisada por Lorin Anderson (2001), e a Taxonomia SOLO (1982), de John Biggs e Kevin Collins. [Structure of the Observed Learning Outcome).

Quando pensamos em taxonomias, imaginamos verbos e habilidades mentais. Na prática, as taxonomias são multidimensionais, isto é, tipificam habilidades mentais e também as coisas que devem ser retidas, aplicadas, construídas ou avaliadas. Taxonomias, em síntese, tratam dos dois principais componentes do objeto de aprendizagem: a habilidade e o conhecimento ou, como vimos na aula 1, o verbo e o complemento do verbo.

2.1. Taxonomia revisada de Bloom

A taxonomia revisada de Bloom[3] é um modelo clássico de explicação sobre o funcionamento da mente. É clássico por causa do universalismo que a sustenta. Lembra as classificações que reinaram entre os séculos XVI e XIX, entre a Filosofia e as Ciências Naturais, sobretudo em relação às habilidades mentais.

Assim, para Bloom e seus revisores, os humanos partilhariam das mesmas potencialidades cognitivas hierarquizadas entre as mais simples e as mais complexas. Todos seriam passíveis de lembrar, compreender, aplicar, analisar, avaliar e criar.

A Taxonomia revisada de Boom também tipifica o conhecimento. Para o psicólogo, os produtos da mente poderiam ser classificados como: factuais (terminologia, por exemplo), conceituais (teoria da evolução, teorema de Pitágoras), processuais (técnicas de pintura) e metacognitivos (conhecimento do aluno sobre as suas próprias estratégias de aprendizagem). 

2.2 Taxonomia de Biggs e Collins

Comparada à Taxonomia revisada de Bloom, a Taxonomia de Biggs e Collins é um modelo alternativo.[4] Claro que os autores pensam em humanos típico-ideais, como Bloom e Anderson. Mas eles deixam aberta a possibilidade de fazermos o percurso em sentido contrário, quando quisermos estabelecer a hieraquização dos objetos de aprendizagem: pensamos a tarefa em sua ideal perfeição e, em seguida, fazemos as gradações do mais complexo ao mais simples, dentro de determinados critérios.

As habilidades são semelhantes às de Bloom: memorizar, classificar, aplicar e generalizar, por exemplo, mas as formas de hierarquizá-las diferem. Ao invés de estabelecerem seis níveis hierárquicos, eles oferecem quatro, caracterizados pela qualidade da resposta do aluno.

Estes níveis são: uniestrutural (memorize ou identifique), multiestrutural (descreva ou classifique), relacional (compare ou explique) e abstrato-estendida (elabore hipóteses ou generalize).[5]

Como vemos, a complexidade da tarefa é oferecida pelo tipo de habilidade mobilizada pelo aluno. Em uma proposta para o ensino superior, Biggs e Tang informam sobre outro nível de progressão que tem a ver com a natureza do objeto de aprendizagem.[6]

Se o objeto são símbolos e proposições, por exemplo, algo que o aluno recebe dá voz do professor ou dos textos que ele indica e é instado a verbalizar (“isso é um…”, “isso é do tipo…”, “isso serve para…”, “tal personagem fez…” etc.,) ele recebe o nome de declarativo. Se o objeto são esses mesmos símbolos e proposições, mas também técnicas e instrumentos que o aluno é instado a resolver um problema em seu campo profissional, el recebe o nome de funcional.

3. Progressão dos conhecimentos declarativos

Já vimos duas propostas de hierarquização de conhecimentos e habilidades. Vamos, agora, empregá-las na construção de comandos de atividades em progressão.

Na proposta de Bloom e Anderson, a aplicação dos níveis de hieraquização é, dominantemente, a priori. Na proposta de Biggs e Collins, a aplicação dos níveis de hierarquização é dominantemente a posteriori. Considere a atividade “resenha”. Em geral, as atividades são dispostas em ordem crescente de complexidade, segundo a Taxonomia de Bloom e Anderson. O professor pensa o produto resenha como mobilizador das habilidades de apresentar autor e obra, identificar contexto de produção da obra, identificar ideias centrais, sintetizar ideias centrais e criticar ideias centrais do livro resenhado. A progressão tomou, então a figuração que esse segue.

Aplicando a Taxonomia de Biggs e Collins, a programação das atividades de um curso de introdução à metodologia científica, que inclui como expectativa de aprendizagem a elaboração de uma resenha, não necessariamente começaria pela imposição desses passos: ler, analisar, sintetizar e criticar. Ciente das dificuldades e das potencialidades dos alunos, como também das demandas e dos padrões de exigência acadêmico-profissional, o professor começaria pelo fim, ou seja, pelos resultados esperados segundo o referido padrão.

Em seguida, hierarquizaria os níveis de desempenho do aluno a partir da divisão quadripartite: uniestrutural, multiestrutural, relacional e abstrato-estendido.

Conclusões

Com essa exemplificação, encerramos nossa exposição. Esperamos que você tenha compreendido que a progressão das aprendizagens, no contexto desta fala, é o modo de dispor objetos de aprendizagem no tempo acadêmico discriminado por um curso.

Dentre várias possibilidades de progressão, vocês podem lançar mão da Taxonomia de Bloom e Anderson e da Taxonomia de Biggs e Collins.

Pelos primeiros, você pode hierarquizar comandos de atividades em até seis níveis. Pelos últimos, você pode hierarquizar comandos de atividades em até quatro níveis.

Usando Bloom e Anderson, priorizarão o enquadramento do aluno em tipologia cognitiva universal. Usando Biggs e Tang priorizarão o enquadramento das respostas do aluno em padrões estabelecidos pelo mundo do trabalho.

Notas

[1] Coste; Coste (2000).

[2] Freitas (2011a; 2011b).

[3] Anderson et al (2001, p.vi-vii).

[4] Biggs; Collins (1982, p.24-25).

[5] Biggs; Collins (1982, p.84-85); Biggs; Tang (2011, p.122-123).

[6] Biggs; Tang (2011, p.81-83).

Referências

BIGGS, John B.; COLLINS, Kevin F. Evaluating the quality of learning: The SOLO Taxonomy (Structure of the Observed Learning Outcome). New York: Academic Press, 1982.

BIGGS, John Biggs; TANG, Catherine Tang. Teaching for Quality Learning at University: What the Student Does. 4ed. New York: Open University Press, 2011.

BLOOM, Benjamin S., ENGELHART, D. Marx e FURST, J. Edward et. al. Taxonomia de objetivos educacionais: domínio cognitivo. 6 ed. Porto Alegre: Globo, 1977. [Primeira edição em inglês – 1956].

COSTE, Daniel; VÉRONIQUE, Daniel. La notion de progression. Lyon: École Normale Supérieure Fontenay/Saint-Cloud; Université de la Sorbonne nouvelle-Paris 3, 2000.

FREITAS ANDERSON, L. W.; KRATHWOHL, K. R. A. Taxonomy for learning, teaching and assessing: a revision of Bloom’s taxonomy or educational objectives. New York: Longman, 2001.

FREITAS, Itamar. Perspectivas desenvolvimentais, aprendizagem e possibilidades de progressão a partir da obra de Lev Semenovich Vigotsky Aracaju, 7 fev. 2011a. Disponível em< https://itamarfo.blogspot.com/search/label/Progress%C3%A3o> Capturado em 12 jun. 2020.

FREITAS, Itamar. Perspectivas desenvolvimentais, aprendizagem e possibilidades de progressão a partir da obra de Jerome Bruner. Aracaju, 4 mar. 2011b, Disponível em< https://itamarfo.blogspot.com/search/label/Progress%C3%A3o> Capturado em 12 jun. 2020.


Para citar este texto

FREITAS, Itamar. Progressão das aprendizagens para teorias gerais da educação escolar. Resenha Crítica. Aracaju/Crato, 01 junho 2023. Disponível em <https://www.resenhacritica.com.br/todas-as-categorias/progressao-das-aprendizagens-para-teorias-gerais-da-educacao-escolar/>.