Norse warfare: unconventional battle strategies of the ancient viking | Martina Sprague

Os escandinavos são alguns dos mais famosos guerreiros do medievo. Suas ações de pirataria e feitos militares são popularizadas pelo imaginário e cultura de massa até nossos dias, ao mesmo tempo em que constituem temáticas de investigações pelos acadêmicos contemporâneos, sempre buscando compreender o impacto nórdico no continente europeu: “Os vikings estavam entre os povos mais belicosos e resistentes que jamais assaltaram a civilização” (Keegan 2006: 372).[1] A maior parte dos pesquisadores vêm buscando explicações para o sucesso das empreitadas nórdicas, geralmente dentro de dois referenciais, um interno – que procura as motivações dentro dos próprios valores sociais e culturais da Escandinávia, e outro externo, relacionado principalmente com os fatores econômicos, políticos e sociais da Europa cristã.[2]

Em sua recente obra, Norse warfare, a historiadora Martina Sprague [3] estrutura a maior parte de suas problemáticas de investigação dentro do referencial internalista. Deste modo, o livro pode ser dividido em três partes distintas: a que engloba os capítulos 1 ao 4, referente às características gerais da sociedade escandinava e do estilo de vida dos vikings; uma segunda abrangendo a tecnologia náutica, equipamentos militares e técnicas de batalha (capítulos 5 a 7) e a terceira, exemplificando o tema com guerreiros famosos (capítulos 8 a 15).

O primeiro capítulo (Raids on the Christian world) trata do impacto causado pelas incursões de pirataria e pilhagem dos nórdicos pela Europa nos séculos VIII e IX d.C. A autora reconstrói as incursões por meio de diversas fontes não escandinavas (como os Anais de São Bertin, As crônicas anglo-saxãs, cartas de Alcuino, a Gesta Normannorum, entre outras), mas procurando sempre contrastá-las com fontes escandinavas (especialmente as sagas), buscando assim uma reflexão histórica que consiga atingir as motivações sociais e culturais destas atividades – não ficando apenas nos estereótipos e imagens degradantes fornecidos pelos povos atingidos. Inclusive, a imagem dos raids vikings como desorganizados – muito comum nas fontes nãoescandinavas – é contestada pela autora: os ataques surpresas realizados por pequenos grupos criavam uma idéia de caos a povos acostumados com a presença de exércitos regulares, seja para manutenção da ordem quanto em ações militares. O modus operandi típicos destes grupos atacantes (entrar, assaltar, enriquecer e sair) é competentemente comparado por Sprague aos soldados de forças especiais dos tempos contemporâneos, onde o ataque de pequenas unidades com objetivos específicos e bem determinados, o uso de táticas, maneabilidade, flexibilidade, rapidez, surpresa e boa comunicação fazia toda a diferença: deixou boa parte das forças militares européias sem ação, alterou o panorama político e intranquilizou boa parte das populações européias da Alta Idade Média.

Os capítulos 2 (Live hard, Die with honor) e 3 (Going a-Viking) aprofundam o entendimento do papel do guerreiro na cultura nórdica, especialmente como os ideais de força, lealdade e coragem encontravam respaldo na religiosidade, na política e nas leis. A experiência de “sair como um viking”[4] não somente concedia oportunidade aos jovens para obterem uma melhor formação e experiência militar, mas também um melhor status na sociedade. No caso dos adultos, tanto o enriquecimento quanto as motivações religiosas eram impulsionadoras destas participações. A figura do líder demonstra essa ideologia: o guerreiro mais forte, de maior coragem e com mais sucesso nas batalhas era o indicado ao papel de comando, sempre coadunado com os modelos heróicos da tradição oral e religiosa.

A autora também concede um pequeno vislumbre na questão dos mais polêmicos guerreiros da Escandinávia Viking, os berserkers (no nórdico antigo – plural: berserkir; sing.: berserkr). Estes constituíam um grupo militar de elite, associado diretamente às crenças odínicas (da qual seriam inspirados no momento de fúria alucinada) e utilizados em operações terrestres no front da formação (para um primeiro ataque e choque) e em batalhas náuticas para proteger o navio real.[5] A autora preocupa-se em tentar explicar o estado alterado de consciência destes guerreiros pela teoria mais tradicional, surgida durante a década de 1950, a de que estes utilizariam bebidas e substâncias alucinógenas (como o fly acaris e a Amanita muscaria), mas não elenca os experimentos mais recentes que a questionam totalmente, comprovando a limitação da capacidade de batalha pelos efeitos colaterais provocados no guerreiro. A historiadora conclui o tema, afirmando que os berserkers eram muito admirados e temidos, mas o seu emprego militar foi limitado no período viking, devido à exigência de lealdade e confiança para os padrões sociais verificados no período, algo questionável, visto que a representação destes personagens nas sagas é variável e algumas vezes pode ter sido influenciada pelo referencial do período cristão em sua elaboração textual. De qualquer maneira, algumas fontes (como a Egil saga einhenda ok Ásmundar berserkjabana 8) apresentam os berserkers como soldados de extrema confiança do rei, realizando operações especiais a seu mando. A relação entre a percepção social e o registro histórico-literário é algo ainda passível de várias abordagens para o futuro (as formas de representação literária dos berserkers não dependeriam originalmente de sua percepção para os camponeses da Escandinávia viking, que os temiam, e a aristocracia, que contratava seus serviços e os enaltecia?)

Os capítulos 4 (Building the ship) e 5 (Seamanship and navigation) aprofundam a questão do grande referencial tecnológico dos escandinavos em relação aos métodos europeus do período, o navio de guerra, “um recurso contra o qual nenhum reino europeu tinha antídoto” (Keegan 2006: 371). O sucesso das empreitadas dos vikings não se explica somente pela sua superioridade tecnológica, mas também pelo grande conhecimento de navegação, orientação e sobrevivência pelo litoral (navegação de cabotagem) e alto mar, especialmente pelo Atlântico Norte. O navio adapta-se perfeitamente ao tipo de guerra anti-convencional praticada pelos soldados – naves robustas, espaçosas e flexíveis, importantes tanto para uma aproximação num curto espaço de tempo, como também imprescindíveis para uma rápida e segura saída de regiões pouco favoráveis em termos geográficos ou militares. Um pequeno detalhe omitido pela autora é referente à fabricação das velas (como também das roupas para alto-mar): elas não somente eram revestidas de alcatrão e gordura animal, mas originalmente feitas de um tipo de lã impermeável, obtidas de carneiros das altas montanhas.

O capítulo seguinte (weapons and armor) detalha a questão do armamento nórdico: os escudos de madeira e sua utilização como principal defesa corporal; as espadas com a média de dois quilos, simples e funcionais; lanças e dardos, utilizados a distância ou corpo a corpo; o machado de batalha e seu efeito devastador para a psicologia do inimigo; arcos e flechas como retardadores do avanço das tropas opositoras. As cotas de malha e os capacetes eram pouco utilizados, geralmente pelos aristocratas e pessoas mais ricas. Para Sprague, os equipamentos de batalha eram muito pouco diferentes dos outros povos europeus do período e o que explicaria o sucesso dos vikings seria muito mais a sua capacidade de comando, estratégia e liderança nos ataques.

Sem dúvida, o capítulo mais importante é o sétimo (Military organization and battlefield tactis), demonstrando que a formação do guerreiro nórdico provinha essencialmente de uma sociedade baseada na honra, bravura e no preparo para a guerra, muito mais do que um treinamento organizado, extensivo e disciplinado. A estratégia básica para qualquer tipo de operação militar era o conhecimento prévio do local a ser atingido (seja por informações de comerciantes, espiões ou mercenários), antecipando- se ao inimigo e preparando-se previamente para a batalha. No caso das pilhagens, tanto a inexistência de defesa permanente quanto os conflitos internos das regiões a serem atacadas (como Irlanda, Inglaterra e França) colaboraram para o triunfo escandinavo.

A população, geralmente camponeses, era responsável pela manutenção dos navios e da provisão do exército. Com o avanço das conquistas, da colonização nórdica e da centralização monárquica em várias regiões, a necessidade de armadas profissionais – incluindo oficiais, guarnições fortificadas e equipamentos mais padronizados – tornou-se freqüente. Alguns guerreiros e seus oficiais chegaram a viver periodicamente em guarnições separadas das cidades.

A descrição do cenário de batalha é aprofundada pela autora em diversos momentos, como, e.g., a situação do líder – considerado o homem mais forte e corajoso– que comanda o front da formação junto ao seu melhor subordinado e protegido por uma formação circular de escudos, sendo o primeiro homem a confrontar o inimigo. Quanto mais intrépido e audaz fosse o chefe, mais eficiente seria seu exército. Nos confrontos internos da Escandinávia, a probabilidade de confusão e acidente pelo fogo inimigo ou amigo era muito comum, como na famosa batalha de Stiklestad (Stiklarstaðir) na Noruega em 1030.

Outra preocupação da autora é com a descrição dos métodos de batalha naval, muito pouco explorados pelo cinema e literatura, consistindo desde a preparação das embarcações até em como podiam ser movimentadas umas com relação às outras, além do tipo de armamento utilizado (arcos e flechas, dardos, projéteis).

O capítulo oitavo descreve os mais renomados guerreiros profissionais da Escandinávia medieval, os jomsvikings, que serviam basicamente na fortaleza de Jomsborg, no Báltico. Realizavam duros testes de admissão e viviam sob um estrito código de ética e comportamento, sendo extremamente fiéis a seus companheiros e sem nenhum medo da morte. Participaram de uma das mais sangrentas batalhas dos vikings, a de Hjörungavágr (entre noruegueses e dinamarqueses, século X).

Outro renomado grupo militar nórdico, os varegues, são analisados no capítulo seguinte. Após a instalação dos suecos na área eslava oriental, formaram-se várias cidades e centros comerciais, que constituíram a base para os futuros ataques escandinavos à cidade de Bizâncio, na época a mais importante do medievo euroasiático. Logo, o sucesso dos vikings os colocou a serviço mercenário de outros povos, como foi o caso da guarda do próprio imperador de Bizâncio. Neste caso, o serviço estrangeiro constituía um meio de se obter prosperidade e fama para o referencial interno da Escandinávia, como foi o caso do rei norueguês Harald Hardrada. A principal função da guarda vareguiana era o de escolta, guarnição e policiamento da cidade.

Outros casos históricos e legendários analisados por Sprague são os de Ragnar Lodbrok e seus filhos (campanhas na Inglaterra anglo-saxônica); Rollo (pirataria e posteriormente colonização feudal na França); Erik Segersäll (o vitorioso), triunfante na batalha de Fýrisvellir (980, Suécia); Olaf Trygvason, o cristianizador da Noruega; Canuto (Knut), o Grande, construtor do maior império viking, unificando temporariamente a Inglaterra, Dinamarca e Noruega; Harald Hardrada, o último líder viking.

O livro de Sprague, enquanto manual sistematizador, não tem a competência e o detalhamento da obra de Paddy Griffith (The Viking Art ofWwar), mas certamente é uma ótima leitura recomendada aos iniciantes nas investigações sobre a história, cultura e literatura da Escandinávia Medieval.[6] Seu grande mérito é demonstrar que os vikings não foram mais cruéis do que os outros povos de sua época, nem que “a brutalidade é exclusiva dos não cristãos” (Sprague 2007: 309), diz a autora, citando as ações de Carlos Magno no processo de evangelização forçada dos saxões. Apesar da reputação dos nórdicos como uma cultura violenta, sua herança cultural ainda fascina o homem moderno por sua audácia, dinamismo e mobilidade.

AGRADECIMENTO

Ao Prof. Dr. Álvaro Alfredo Bragança Júnior (UFRJ) pelos comentários e sugestões ao presente texto.

Notas

1. O historiador John Keegan possui uma visão extremamente tradicional sobre os nórdicos, impregnado do referencial britânico e francês sobre os povos ditos “bárbaros”, contrapostos aos civilizados: “(…) os vikings e magiares pagãos ainda viviam no mundo primitivo de deuses vingativos ou distantes ao qual pertenciam os povos teutônicos e da estepe antes de ouvirem a palavra de Cristo ou Maomé (…) cristãos, tal como o inglês São Bonifácio, apóstolo dos germânicos, também morreram como mártires no esforço de implantar o evangelho entre povos selvagens (…) Com efeito, uma Europa pós-romana sem a Igreja romana teria sido um lugar bárbaro” (Keegan 2006: 373, 374). A percepção sobre os antigos germanos vem sofrendo modificações, advindas da tradição acadêmica alemã, como podemos perceber na recente obra do historiador francês Jérôme Baschet: “ Bárbaro (…) a conotação negativa adquirida por este termo torna difícil empregá-lo hoje sem reproduzir um julgamento de valor que faz de Roma o padrão da civilização e de seus adversários os agentes da decadência, do atraso e da incultura (…) Interrogar-se sobre as noções de barbárie e de civilização e pôr em dúvida a possibilidade de julgar as sociedades humanas em função de tal oposição: é também isso que nos convida a história da Idade Média” (Baschet 2006: 49, 26). Também historiadores britânicos vêm questionando o antigo modelo de perceber as culturas não-romanas: “O declínio do Império romano não deve ser considerado a derrota da ‘cultura’ pelo ‘barbarismo’, mas sim um choque de culturas. Os Ostrogodos, Visigodos, Vândalos e outros grupos tinham suas próprias culturas (valores, tradições, práticas, representações e assim por diante). Por mais paradoxal que possa parecer a expressão, houve uma ‘civilização dos bárbaros’” (Burke 2000: 246). O referencial de Keegan sobre uma suposta superioridade religiosa do cristianismo em relação ao paganismo nórdico também é questionável: “nenhuma religião ou crença conduz à barbárie ou é uma proteção contra ela (…) O discurso do civilizador tem sempre esta estrutura: ‘Vamos levar a civilização (ou a verdadeira religião) aos povos bárbaros. Nossa superioridade nos autoriza a tratá-los como inferiores. Eles nos devem gratidão, já que contribuímos para arrancá-los de sua barbárie – ou da ignorância, ou do paganismo’. De modo geral, a noção de civilização serve tanto para valorizar a si mesmo como para justificar a sujeição de outros povos (ou sociedades)” (Wolf 2004: 28). O próprio ato do pesquisador em emitir juízos de valor sobre o passado tem uma longa tradição de questionamentos: “A função do historiador é compreender, não julgar o passado. Logo, o único referencial possível para se ver a Idade Média é a própria Idade Média” (Franco Júnior 1986: 20). Algumas vezes, referenciais sobre as religiosidades do passado remetem às próprias convicções pessoais dos acadêmicos, como no caso de John Keegan: “ (…) o ângulo de abordagem de religiões que já desapareceram costuma ser bastante diferente do que se aplica às religiões cuja vigência continua no presente (…) se vincula às repercussões das militâncias e vivências religiosas presentes hoje em dia” (Cardoso 2005: 209).

2. Para uma visão sistemática e crítica da arte da guerra entre os vikings, o melhor autor é Griffith 1995, que possui detalhados gráficos, tabelas, ilustrações, esquemas e uma competente descrição das fontes mais importantes para o estudo da temática, ao final da obra. Outros estudos complementares para a história militar escandinava são: Whittock 1997; Siddorn 2003; Short 2009.

3. Martina Sprague nasceu em Estocolmo e é mestre em História Militar pela Universidade de Norwich, Estados Unidos. É também autora do livro Sweden: an illustrated history.

4. O termo víkingr refere-se no contexto centro-medieval (fontes a partir do século XI) a toda pessoa que saía além mar para atividades de navegação, comércio, mas especialmente aos atos relacionados à pilhagem ou pirataria e atividades militares. A concepção original parece estar relacionada aos habitantes do fiorde de Vik (Hall 2007: 8).

5. Para um referencial genérico da temática dos berserkers, consultar Langer 2007b: 44-47. Uma excelente sistematização do tema com farta bibliografia é disponível em Ward 2004. Sobre a questão da inexistência histórica da conexão entre o deus Odin e os berserkers e a polêmica das fontes literárias medievais, verificar Liberman 2004: 97-101. Aqui questionamos o autor: sua idéia de que somente a Heimskringla associa este deus aos berserkers (portanto, o escritor Snorri Sturluson teria se apropriado de forma fantasiosa do folclore de seu tempo) e que os guerreiros alucinados não tem nenhuma relação com cultos religiosos é limitada. Existem fontes materiais para comprovar isso: a plaqueta de Torslunda; o fragmento de Gutenstein; capacetes pré-vikings e saxões com gravuras de guerreiros portando máscara de lobo e urso e em posição de dança. O imperador bizantino Constantino VII no Livro das cerimônias descreveu o que ele denominou de “dança gótica”, realizada pela guarda vareguiana com máscaras e peles (Barry 2003: 3). Como a série de fontes imagéticas sobre os berserkers está conectada aos simbolismos do deus Odin (muitas possuem dois pássaros, representações de Hugin e Munin), confirma-se o relato de Snorri como sendo originalmente de tradição pagã e não uma criação do período cristão. Outro erro de Liberman é procurar vestígios dos berserkers diretamente na mitologia: realmente os einherjar e a caça selvagem não têm nenhuma relação direta com os berserkers. Contudo, uma coisa são as narrativas mitológicas e outra os cultos: enquanto os einherjar, as valquírias e o valhala são temas imaginários, os berserkers são personagens históricos e enquadrados dentro da religiosidade, dos cultos e crenças da Era Viking. Por este motivo foram excluídos pelas leis islandesas de 1123 – pela associação aos ritos odínicos, e não simplesmente por serem enquadrados como fora da lei ou bandidos sociais, como quer Liberman 2004: 101. A respeito das transformações mítico-religiosas e dos estados alterados de consciência dos berserkers, verificar: Grundy 1998: 103-120. Para um excelente estudo comparativo das atividades dos berserkers entre os antigos germanos e na Escandinávia da Era Viking: Birro & Fiorio 2008. Porém, apresentamos algumas correções a esta última pesquisa. Reiterando Benjamin Blaney, o artigo afirma que a figura 2, plaqueta de Torslunda, com a imagem de um guerreiro com duas lanças – seria uma representação do deus Odin (Birro & Fiorio 2008: 60, 61).Trata-se de um equívoco interpretativo. Na maioria das fotografias e reconstituições ilustrativas deste objeto, a figura em questão não é caolha, mas possui dois olhos com o mesmo tamanho e forma. Todas as representações antigomedievais que permitem uma identificação objetiva de que são figuras desta deidade – pingentes, esculturas em madeira de igrejas norueguesas, etc, possuem um dos olhos fechados (para um panorama, ver Boyer 2004: 5-12). Somente algumas que não possuem este detalhe são consideradas como Odin pelos especialistas – como a estela gotlandesa de Ardre VIII – um resultado obtido pela análise de toda a cena/conjunto: pelo fato do deus montar o cavalo de oito patas, Sleipnir (se bem que existe a possibilidade de ser um morto em batalha, montado no dito cavalo, bebendo hidromel que recebera de uma Valquíria ao lado…); ou de figuras sendo devoradas por um lobo (como esculturas em igrejas e o relevo na cruz de Gosforth). Para estes temas, consultar Langer 2006, 2007a. Outro fato que desacredita esta interpretação de Blaney, e conseqüentemente também Birro & Fiorio, é o contexto da cena da plaqueta de Torslunda. Além de duas lanças, a figura porta uma espada – algo inusitado em se tratando de imagens de Odin, tanto para o período pré-viking quanto viking (a espada não é um dos objetos/atributos do deus caolho). Além disso, a figura está nitidamente em caracterização de dança, o que confirma algumas fontes bizantinas para o culto odínico dos berserkes. O capacete da dita figura não apresenta “duas serpentes gêmeas”, como afirma o artigo (Birro & Fiorio 2008: 61), e sim contém a figura de dois corvos na extremidade de um par de chifres. Isso é confirmado pela presença de outros objetos semelhantes encontrados em Starayja Ladoga e relevos em capacetes anglo-saxões e pré-vikings. Também em diversas imagens do período de migrações da antiguidade germânica foram representados guerreiros com lança e acompanhados por dois pássaros. A serpente não tem ligação direta com os cultos odínicos e a maior parte dos especialistas em mitologia-religiosidade viking (Régis Boyer, Rudolf Simek) e cultura material (Richard Hall 2007: 219, James Graham-Campbell), entre outros, identificam as duas figuras da plaqueta de Torlunsda como sendo dois guerreiros “dançando” para Odin. O artigo também relaciona uma interessante problemática investigativa: “A imagem dos combatentes acometidos pelo berserkgangr sofreu transformações à medida que o cristianismo penetrou na Escandinávia, pois os berserks passaram a despontar na literatura, ora como heróis, ora como vilões – um exemplo é a luta entre Egill e Ljótr; o oponente do herói era um berserk perverso e viciado em batalhas que desposou forçosamente a filha de um camarada de Egill” (Birro & Fiorio 2008: 65) Dependendo da fonte analisada, os berserkers podem ter conotação positiva, e em outros momentos negativa. Todavia, não poderia ser simplesmente a reprodução ou conservação de uma tradição oral escandinava dos tempos vikings, onde os guerreiros possuíam certa temeridade entre os camponeses e mais prestígio entre os aristocratas? Tal questão necessita de maiores aprofundamentos críticos.

6. A obra possui um excelente glossário terminológico, notas detalhadas e um eficiente índice remissivo. A bibliografia é genérica e não contém todos os títulos consultados: para isso é necessária uma revisão às notas dos capítulos. As fotografias são em preto em branco e não possuem muita qualidade de resolução.

Referências

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