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Escolas isoladas e reunidas: a produção da invisibilidade / Revista Brasileira de História da Educação / 2016
Nos últimosanos, no Brasil, tem se apresentado uma significativa produção acadêmica no campo da história da educação a respeito do projeto de educação primária das primeiras décadas do regime republicano. Enfoca-se basicamente a constituição de uma nova organização escolar, a escola graduada, cuja institucionalização teria ocorrido por meio dos grupos escolares, que são tomados como vitrines do projeto republicano e símbolos da modernidade. Porém, o avanço das pesquisas e o contato mais sistemático com as fontes tem demonstrado que os grupos escolares não predominaram na maioria dos estados brasileiros. Na realidade, em várias regiões do país, imperaram, em termos quantitativos, ou seja, em número de unidades escolares e de matrícula, as chamadas escolas isoladas e reunidas, cujas condições de financiamento e manutenção eram precárias.
Dar visibilidade a essas instituições de ensino primário significa contribuir para a necessária revisão historiográfica da difusão da educação elementar no país. De modo algum, o enaltecimento de um tipo de escola em detrimento de outro se vislumbra como perspectiva adequada. Ao contrário, cabe dimensionar quantitativa e qualitativamente o lugar ocupado pelos diferentes tipos de instituição destinados à escolarização da infância. O recomendável, sem dúvida, é a perspectiva relacional que amplia a perspectiva analítica do alcance das escolas no atendimento à população.
O cuidado para não embarcar nas representações dos educadores em circulação em vários momentos do período republicano é medida cautelar desejável. Considerar o número de escolas e de alunos matriculados, o nível de formação dos professores, a infraestrutura material e as condições de trabalho dos professores também constitui procedimento analítico necessário. Tomar qualquer um desses tipos de escola como objeto histórico requer considerar o significado político e sociocultural da diferenciação da rede escolar de ensino público. Não é demais ressaltar que a atenção dada nos últimos anos pelos historiadores da educação aos diferentes tipos de escola primária mantidos pelos governos dos estados para o povo tem uma dimensão política e pedagógica. A diferenciação interna da rede escolar é um problema central para a compreensão das desigualdades educacionais que predominaram na instrução pública do país. Escolas isoladas, grupos escolares, escolas ambulantes, provisórias, rudimentares, promíscuas, reunidas, mistas, noturnas, entre outras denominações, diferenciaram modos de ensino, tempo de duração do curso primário, programas escolares, nível de formação dos professores, condições salariais, localização espacial, etc. Por sua vez, essas múltiplas diferenciações implicaram e justificaram dotações diversas de recursos públicos. Da perspectiva pedagógica, sobressai a diversidade da produção da escola e da experiência docente.
Nesse sentido, no estudo das escolas isoladas e reunidas, tanto a produção da invisibilidade quanto a permanente precariedade material inscrevem-se como aspectos determinantes no estudo crítico e aprofundado da história do ensino primário.
Os textos reunidos neste dossiê têm esse intuito. Contemplando contextos nacionais ( Brasil e México) e regionais distintos ( São Paulo, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais), períodos históricos diversos( final século XIX e meados século XX), aspectos variados no tratamento do tema(formação de professores, estatística escolar, organização das salas de aula, condições de funcionamento ) fontes múltiplas ( relatórios de inspeção, estatísticas escolares, legislação, currículos escolares, entre outros), tem-se em vista contribuir para a produção de uma historiografia das escolas isoladas e reunidas. Procura-se apreender as múltiplas possibilidades de instrução da infância no interior do espaço escolar, bem como as diversas configurações que a instituição escola assumiu ao longo da história.
Maria Cristina Soares de Gouvêa – Universidade Federal de Minas Gerais. E-mail: crisoares43@gmail.com
Rosa Fátima de Souza – Universidade Estadual de São Paulo- Unesp / Araraquara.
GOUVÊA, Maria Cristina Soares de; SOUZA, Rosa Fátima de. Apresentação. Revista Brasileira de História da Educação. Maringá, v. 16, n. 2, abr / jun, 2016. Acessar publicação original [DR]
Representações, práticas e políticas de escolarização da infância na zona rural / Revista História da Educação / 2014
Os estudos históricos acerca da educação primária, realizados nos últimos anos no Brasil, têm posto em relevo a importância da escola rural no processo de escolarização da infância durante o século 20. Apesar do descaso dos poderes públicos, da ausência de edifícios para escola e moradia dos professores, das condições adversas para o provimento e o trabalho docente, a infrequência contumaz dos alunos, o abandono escolar pelo trabalho na lavoura e a penúria material, a escola rural, localizada nos mais diversos e longínquos rincões do país, foi responsável pela alfabetização e disseminação de códigos culturais e de valores da nacionalidade para milhares de crianças no país.
A expansão do ensino primário rural ocorreu de forma significativa no Brasil no período de 1930 e 1970, quando foram implantadas políticas de escolarização no campo para construção de escolas e melhoria da educação na zona rural, resultado de acordos entre o governo federal e os Estados, com base no Fundo Nacional do Ensino Primário, por intermédio do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos – Inep.
Em meados dos anos 1930, por exemplo, 77,04% da população vivia na zona rural, contra 22,96% na zona urbana [1]. Dos 759.424 alunos matriculados nas 18.420 escolas primárias rurais, 592.869 as frequentavam regularmente. A diferença entre matrícula e frequência correspondia a 167.073 alunos – dados relativos aos anos de 1935 a 1937.[2]
No início dos anos 1950, com uma população ainda predominantemente rural, mais de 70% da população adulta da zona rural não sabia ler nem escrever. Segundo os dados oficiais, dos 51.944.397 habitantes existentes no país, 27.316.826 permaneciam na zona rural e 24.627.570 na zona urbana. Na zona rural 19.763.782 (72%) da população adulta não sabia ler nem escrever e o sabiam apenas 7.556,007 (28%).[3] Com relação ao número de unidades escolares, a expansão foi significativa neste período, pois o número de escolas primárias rurais praticamente dobrou, passando a 55.300 unidades em 1955.[4]
Os textos reunidos neste dossiê compreendem estudos acerca de políticas, práticas e representações da educação rural no Uruguai e no Brasil. Ao problematizar aspectos relevantes como o currículo, a formação de professores, as modalidades de escolas primárias rurais, as políticas para o ensino primário no campo e as representações das autoridades educacionais e dos educadores sobre a educação rural, os textos que compõem o dossiê contribuem para a compreensão da história do ensino rural na América Latina.
No Uruguai, como mostra o estudo Programa único ou diferenciado: especificidade curricular da escola rural uruguaia, prevaleceu, durante quase todo o século 20, um currículo diferenciado para as escolas rurais, definido após várias negociações entre o governo e os professores. No Brasil, a diversidade das experiências regionais de educação rural é uma característica marcante, uma vez que cada governo estadual implantou políticas específicas para o ensino primário rural. Tal diferenciação impele estudos particulares sobre essas realidades regionais. Ao tratar de representações, práticas e políticas de educação rural, os textos põem em questão os limites da ação do governo e dos professores e o embate entre concepções e propostas educacionais.
No caso uruguaio, o autor aborda o fenômeno da especificidade curricular que acompanha as escolas rurais há mais de um século e a ruptura histórica registrada em 2009, quando teve início a aplicação de uma estrutura curricular comum às escolas urbanas e rurais. Limber Santos analisa as circunstâncias históricas da pedagogia rural e, em particular, uma de suas materialidades simbolicamente mais potentes, constituída pelo Programa para Escuelas Rurales, de 1949.
No texto Escola como agência de civilização: projetos formativos e práticas pedagógicas para a educação rural no Brasil (1946-1964), destaca-se o papel de agência de civilização atribuído à escola rural no Brasil, frente ao projeto de expansão dos valores ligados ao espaço urbano e ao concomitante processo de industrialização que se aprofundou na segunda metade do século 20. A investigação apoiou-se em fontes documentais como pesquisas, projetos e propostas referentes ao tema do ensino primário rural, publicados entre o fim da ditadura varguista e o advento do golpe civil-militar de 1964 nas páginas da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, mantida pelo Inep.
Pelo texto Da roça para a escola: institucionalização e expansão das escolas primárias rurais no Paraná (1930-1960) busca-se, por meio das iniciativas empreendidas pelo governo estadual e sua correspondência com os ditames federais e as tematizações relacionadas à educação rural, compreender o processo de institucionalização e expansão das escolas primárias rurais no Paraná entre as décadas de 30 a 60 do século 20. As fontes documentais que deram suporte à investigação constituem-se em mensagens e relatórios de governadores estaduais e interventores federais no Estado do Paraná, analisados a partir da produção historiográfica sobre o tema.
A situação do ensino primário rural retratada pelos delegados do ensino do Estado de São Paulo é a temática analisada no texto O espírito de horror à vida educativa nos campos: a educação rural paulista nas décadas de 1930 e 1940. Ao explorar os relatórios de 21 delegacias de ensino, referentes ao período de 1933 a 1945, o autor identifica os principais problemas para o desenvolvimento da educação rural, segundo a posição dessas autoridades do ensino público. Dessa maneira, é possível apreender, tanto o modo como os responsáveis pela administração do ensino concebiam a educação rural, quanto a avaliação que faziam dos problemas e as soluções aventadas.
Em As disputas em torno do ensino primário rural (São Paulo, 1931-1947), analisamse as disputas pelo ensino primário rural no Estado de São Paulo, no período entre 1931 e 1947, com destaque para os embates entre defensores da ruralização do ensino e os partidários da escola comum. Examinam-se, também, os avanços e a insuficiência das políticas dos governos paulistas para o ensino rural. A investigação está alicerçada em artigos veiculados na imprensa periódica educacional e nas iniciativas políticas empreendidas pelo poder público.
Além de contribuírem para o preenchimento de lacunas no conhecimento histórico sobre a educação primária, os artigos deste dossiê podem instigar novas investigações e convidam ao debate.
Notas
1. Cf. Anuário Estatístico do Brasil. Rio de Janeiro: Tip. do Departamento de Estatística e Publicidade, 1936.
2. Cf. Brasil. Repertório estatístico do Brasil situação cultural. Rio de Janeiro: IBGE, 1941, ano 5, separata.
3. Cf. Brasil. Anuário estatístico do Brasil: 1952. Rio de Janeiro: IBGE, 1953.
4. Cf. Brasil. Anuário estatístico do Brasil: 1952. Rio de Janeiro: IBGE, 1953
Rosa Fátima de Souza
Virgínia Pereira da Silva de Ávila
Organizadoras do dossiê.
SOUZA, Rosa Fátima de; ÁVILA, Virgínia Pereira da Silva de. Apresentação. Revista História da Educação. Porto Alegre, v. 18, n. 43, maio / ago., 2014. Acessar publicação original [DR]
A matemática nos anos iniciais escolares em perspectiva histórico-comparativa / Revista História da Educação / 2014
Matemática nos Anos Iniciais escolares em perspectiva histórico-comparativa / Revista História da Educação / 2014, VALENTE Wagner Rodrigues (Org d), Matemática (d), Anos Iniciais do Ensino Fundamental (d), Revista de História da Educação (RHEd) Este dossiê reúne estudos sobre a Matemática no curso primário, no Brasil, em perspectiva histórica. Estão presentes resultados do desenvolvimento do projeto temático intitulado A constituição dos saberes elementares matemáticos: a aritmética, a geometria e o desenho no curso primário em perspectiva histórico-comparativa, 1890-1970, que conta com o apoio do CNPq.
Os programas de pós-graduação da Universidade Federal de São Paulo, da Universidade Federal de Santa Catarina, da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, da Universidade Federal de Alagoas, da Universidade Federal de Sergipe, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, da Universidade Severino Sombra, RJ, da Universidade Bandeirante de São Paulo, da Universidade do Vale do Sapucaí, MG, da Universidade Federal do Mato Grosso, da Universidade do Vale dos Sinos, RS, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul integram-se nesta investigação constituindo núcleos locais de desenvolvimento de subprojetos voltados ao tema da constituição histórica dos saberes elementares matemáticos.
O projeto reúne dezessete pesquisadores doutores de dez Estados brasileiros, com o objetivo de analisar a trajetória de constituição dos saberes elementares matemáticos – a Aritmética, a Geometria e o Desenho – presentes no curso primário de diferentes regiões brasileiras, desde o período de criação do modelo grupo escolar até a sua extinção, a partir da criação da escola obrigatória de oito anos. A pesquisa orienta-se pelas seguintes questões: que trajetórias de constituição tiveram a Aritmética, a Geometria e o Desenho para os primeiros anos escolares? Ou, dizendo de outro modo, como foram organizados e reorganizados os saberes elementares matemáticos para estarem presentes na escola graduada? Como o modelo grupo escolar, difundido a partir de São Paulo, constituiu saberes elementares matemáticos em diferentes pontos do Brasil?
Na organização inicial do projeto, percebeu-se que raras são as pesquisas que se referem aos saberes elementares matemáticos presentes nos anos iniciais escolares. Considerando-se este estágio inicial do conhecimento, criou-se a necessidade de avançar-se para a elaboração de um conhecimento glocal, entendido como articulação das produções locais em perspectiva ampliada. Nestes breves termos, justifica-se a promoção de uma pesquisa de âmbito histórico-comparativo, com vistas à produção de conhecimento acerca da constituição dos saberes elementares matemáticos presentes no curso primário brasileiro.
No âmbito deste projeto entende-se que a organização dos saberes elementares matemáticos revela-se em várias instâncias: nas diretrizes curriculares oficiais; nos impressos pedagógicos para professores, como as revistas com orientações didáticas para o ensino; nos relatórios de estágio docente; nos manuais e livros didáticos; nos documentos de elaboração de aulas dos professores; nos materiais dos alunos – cadernos, fichas -; na docimologia escolar – exames, provas e testes de aferição da aprendizagem -, dentre muitos outros documentos ligados ao funcionamento do cotidiano escolar de outros tempos.
As fontes estão sendo coletadas e inventariadas por pesquisadores de diferentes Estados e disponibilizadas num repositório virtual localizado no sítio eletrônico https: / / repositorio.ufsc.br / handle / 123456789 / 1769 , da Universidade Federal de Santa Catarina.
A possibilidade de construir coletivamente um repositório de fontes de pesquisa abre um leque de alternativas de estudos e investigações, na medida em que inaugura um novo processo de produção científica. Permite a cada pesquisador acessar às diferentes fontes ao longo do desenrolar do projeto e, assim, desde o seu início, exercer a ousada tarefa de comparar ensinos de Matemática a partir de seus saberes elementares, em diferentes regiões, num período definido.
Dentre as várias produções já elaboradas, foram selecionados cinco estudos. O primeiro deles aborda a trajetória do ensino de Matemática no curso primário do Rio Grande do Sul, considerando as normativas oficiais para o ensino de Aritmética, com o estudo realizado pela pesquisadora Elisabete Búrigo. O segundo, escrito pelo pesquisador David Antonio da Costa, trata da Aritmética, levando em conta a análise da circulação do modelo pedagógico paulista dos grupos escolares no Estado de Santa Catarina. O terceiro texto refere-se à elaboração dos programas de ensino no Paraná e em São Paulo relativamente, também, à Aritmética escolar, tendo sido elaborado pela professora Neuza Bertoni Pinto. Ainda tratando do ensino de Aritmética, o quarto estudo analisa a produção e circulação das Cartas de Parker, material didático-pedagógico transformado em ícone da moderna pedagogia do ensino de Aritmética. Por fim, a professora Maria Célia Leme da Silva apresenta os resultados da pesquisa sobre a circulação e apropriação de práticas de ensino do Desenho e da Geometria no curso primário.
Wagner Rodrigues Valente – Universidade Federal de São Paulo.
VALENTE, Wagner Rodrigues. Apresentação. Revista História da Educação. Porto Alegre, v. 18 n. 44, set. / dez., 2014. Acessar publicação original [DR]