A Vulva é uma Ferida Aberta e Outros Ensaios | Gloria Anzaldúa

Gloria Anzaldua Imagem American Statesman 1
Gloria Anzaldúa | Imagem: American-Statesman

O ato de falar e de escrever é marcado por relações de poder e atravessado por modelos epistemológicos que tentam suprimir línguas e formas de existir (Conceição EVARISTO, 2021). Questiona-se: quem ousa falar tem o poder de se fazer ouvir? É da complexidade que envolve essa pergunta que sugerimos a leitura de Gloria Anzaldúa. A autora, ao produzir teorias sobre a sua existência nas fronteiras, dá cores e tons a sua linguagem insubmissa que desafiou os olhos do homem branco. A tradução do livro de Gloria Anzaldúa, A Vulva é uma Ferida Aberta e Outros Ensaios, foi lançada no Brasil em 2021, pela editora A Bolha.

O livro reúne seis ensaios e um poema produzidos em momentos distintos da sua carreira. Neles se encontra uma amálgama de discussões sobre as questões de mestiçagem, fronteira, raça, gênero, sexualidade, classe, saúde, espiritualidade, escrita e linguagem, que são questões centrais em sua obra. Cláudia de Lima Costa e Eliana Ávila (2021), tradutoras da obra de Gloria Anzaldúa no Brasil, assinam o prefácio do livro e destacam a importância da autora para o surgimento da discussão sobre diferenças – sexual, étnica e pós-colonial – no bojo feminismo norte-americano. Já o posfácio é um ensaio de AnaLouise Keanting (2021), professora na Texas Women’s University, em estudos de mulheres, e é a atual depositária do Gloria Anzaldúa Literary Trust. Nesse texto encontramos uma importante reflexão sobre as teorias mais recentes de Gloria Anzaldúa, pós-Borderlands/La Frontera, tornando a leitura de A Vulva é uma Ferida Aberta e Outros Ensaios ainda mais instigante. Leia Mais

Gênero, sexualidade e redes sociais: a desigualdade social “curtida” e “compartilhada” | Rafael Morato

Genero
Gênero, sexualidade e redes sociais | Detalhe de capa

O livro aqui resenhado foi publicado em 2019, mas as questões que ele nos traz fazem pensar que estamos séculos atrás. Como é possível ainda nos depararmos com o fato de que a nossa sociedade vive para criticar e aprovar a sexualidade e os comportamentos do outro? Estamos na chamada era digital, em que as redes sociais atuam com força e protagonismo nas interações humanas, cada curtida ou compartilhamento feito nesses meios digitais carrega consigo uma carga ideológica muito grande, julgando comportamentos e influenciando opiniões.

Nesse universo de possibilidades que a vida, o corpo humano e as relações sociais nos apresentam, há inúmeras formas de ser e de viver os gêneros e a sexualidade. No entanto, o que se percebe através de redes sociais como o Facebook, por exemplo, é que continuamos nos apegando a críticas pautadas na dualidade, que giram em torno de um modelo de homem e de mulher socialmente construídos, e de uma sexualidade baseada na heteronormatividade, invisibilizando – e muitas vezes condenando – outras formas possíveis de ser e de se relacionar emocional e sexualmente. Leia Mais

Racismo y sexualidad en la Cuba colonia. Intersecciones | Verena Stolcke

Verena Stolke 2
Verena Stolke | Canal Santiago Morcillo

Racismo e sexualidade em CubaPeço licença para contar uma anedota. Penso que ela ajudará a compreender a importância do recentemente publicado Racismo y sexualidade em la Cuba colonial. Intersecciones. Também, auxilia a contextualizar as contribuições do livro, seja para os estudos de gênero e sexualidade, seja para os estudos de raça, seja para a história da antropologia. O ano era 2011. Eu havia ingressado no Mestrado em Antropologia Social na Unicamp. Em uma das disciplinas obrigatórias o professor responsável, Omar Ribeiro Thomaz, nos apresentou uma série de obras por ele denominadas de “heterodoxas”. Eram trabalhos que incorporavam a dinâmica social, os conflitos, a transformação sociopolítica e traçavam novos caminhos, métodos e técnicas do fazer antropológico. Em síntese, eram investigações de temas antropológicos considerados clássicos, mas realizados por perspectivas analíticas pouco usuais. Marriage, Class and Colour in Nineteenth Century Cuba. A study of Racial Attitudes of Sexual Values in a Slave Society, de Verena Stolcke, publicado originalmente em 1974 e reeditado em castelhano em 2017, era um destes livros.

Como bem salienta a autora (César; Lassali; Stolcke, 2017), é interessante notar que o título da versão em castelhano é mais apropriado que em inglês. Isso porque afirma ela, dimensiona não apenas a intersecção dos temas abordados, como destaca os elementos centrais que organizavam a sociedade cubana na época colonial. Na disciplina, não lemos o livro todo, fruto de sua pesquisa de doutoramento em Oxford orientada por Pierre Rivière, mas as discussões foram importantes para compreender os motivos pelos quais a “heterodoxia” de Verena nos fornecia uma instigante e inovadora maneira de fazer e praticar pesquisa antropológica. O trabalho de campo por ela realizado se centrou em Arquivos Coloniais de Cuba e Espanha. É verdade, porém, que este não fora desde sempre o objetivo da investigação. Stolcke conta que tinha como objetivo estudar as mudanças na família depois da Revolução de 1959. Chegou a ficar alguns meses em Sierra Maestra – juntamente com sua filha e com seu marido que investigava os efeitos da reforma agrária implementada por Fidel Castro – realizando a pesquisa. Entretanto, politicamente havia um contexto delicado e a presença de europeus passou a não ser bem quista. Leia Mais

Corpos em Aliança: Diálogos Interdisciplinares sobre gênero, raça e sexualidade | Ana Claudia Martins e Elias Ferreira Veras

Nas últimas décadas, temos testemunhados constantes transformações sociais, históricas, políticas e culturais, que abalaram as estruturas cishetonormativas dos antigos padrões de gênero, raça e sexualidade. As lutas feministas, as conquistas LGBTQIA+, os movimentos trabalhistas e a descolonização dos países africanos, por exemplo, que perpassaram o século passado, desdobrando-se até os dias atuais, culminam em novas formas contemporâneas de fazer política e ciência.

A obra Corpos em Aliança: Diálogos Interdisciplinares sobre gênero, raça e sexualidade, organizada por Elias Ferreira Veras e Ana Claudia Aymoré Martins, professor/a da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), aparece nesse contexto teórico-metodológico-político de transformações, sendo oriundo dos debates realizados durante o II Colóquio diálogos interdisciplinares sobre gênero, raça e sexualidade: corpos em aliança, organizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em História, Gênero e Sexualidade (GEPHGS/CNPq), do Curso de História da UFAL – com apoio do CNPq -, em Maceió (AL), no mês de maio de 2019. Leia Mais

Queer in the Tropics: Gender and Sexuality in the Global South | Pedro Paulo Gomes Pereira

Queer in the Tropics: Gender and Sexuality in the Global South, de Pedro Paulo Gomes Pereira, é apresentado pelo autor como um livro-experiência. São vidas e teorias que tecem trajetórias e(m) afetos. Pedro Paulo vai incorporando seus encontros com experiências-outras, e aqui o uso do gerúndio se faz necessário, posto que o movimento e o devir são constituintes de um caminhar que segue abalando as teorias que viajaram aos trópicos, ao Sul Global. O livro constrói uma análise que, a partir da teoria queer, convida à interpelação da configuração sexo/gênero como parte do projeto colonial.

Ensaio passos entre mundos e teorias, daqui do interior, com um olhar caipira de quem desconfia de muita coisa: o encontro com o livro me afetou de modo a querer contar umas histórias com Pedro Paulo. Mas, no meio do caminho tinha uma pedra1. Não bastasse Richard Miskolci ter escrito a apresentação, Judith Butler escrevera o prefácio do livro. Para que eu adentraria nessa prosa? Leia Mais

Memórias de Plantação: episódios de racismo cotidiano – KILOMBA (S-RH)

KILOMBA, Grada. Memórias de Plantação: episódios de racismo cotidiano. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019. Resenha de: NICHNIG, Claudia Regina. “Escrevo da periferia, não do centro”: mulheres negras e experiências de racismo cotidiano”. SÆCULUM – Revista de História, João Pessoa, v.25, n.43, p.398-405, jul./dez. 2020.

O livro de Grada Kilomba é resultado de sua tese de doutorado defendida e publicada na Alemanha em 2008 somente dez anos mais tarde publicado no Brasil, em 2019. A pesquisadora, escritora e artista, nascida em Lisboa, na apresentação da edição de seu livro ao público brasileiro, aponta que sua experiência de estudante negra em Lisboa-Portugal, mas também em Berlim-Alemanha, fez com que se sentisse em um não lugar destinado à pesquisadora negra, jamais reconhecida nesta posição, muitas vezes confundida com a pessoa da limpeza. Ao discutir a história colonial destes dois países, Grada Kilomba vai mostrar como o racismo se faz presente nas práticas diárias e que, mesmo que estes países não tenham mais colônias na atualidade, a herança deste período ainda persiste nas marcas coloniais. Foi na Alemanha que encontrou “uma forte corrente de intelectuais negras que haviam transformado radicalmente o pensamento e o vocabulário contemporâneo global durante várias décadas” (KILOMBA, 2019, p. 12) e, portanto, a sua escrita dialoga com as mais importantes autoras e autores da diáspora africana e do feminismo negro, como Gayatri Spivak, Patricia Hill Colins, bell hooks, Philomena Essed, Frantz Fanon, Stuart Hall, Paul Gilroy, destacando autoras que abordam as questões de gênero entrelaçadas com o debate de raça. Leia Mais

What Is Sexual History? | J. Weeks

In 1974, when I announced to my faculty adviser that I intended to do a dissertation on some aspect of the history of homosexuality, the decision represented an act of faith on my part. At that point, there was no “gay history,” the phrase I would have then used among my peers. The year before, I had met Jonathan Ned Katz, who, together with me and a few others in New York, founded the Gay Academic Union as an effort to bring researchers of various sorts together to explore how our skills could be used to support the gay liberation movement. Katz had already written a play, Coming Out!, whose script was drawn entirely from documents he had discovered related to the history of homosexuality in the United States. He was continuing to pursue that research, and it would culminate in the massive documentary collection, Gay American History, that he published in 1976.1 Gay American History was a groundbreaking—indeed, revolutionary—piece of work. But, to me, still in the early stages of dissertation research, documents that stretched across 350 years of history on a broad range of topics— law, culture, science, social life, and more—did not necessarily demonstrate the feasibility of writing the kind of tightly knit, focused monograph that a history department expected from a graduate student. Leia Mais

Sexo e Violência – Realidades antigas e questões contemporâneas – GRILLO et al (RMA)

GRILLO, José Geraldo C.; GARRAFFONI, Renata S.; FUNARI, Pedro Paulo A. (Orgs.). Sexo e Violência – Realidades antigas e questões contemporâneas. São Paulo: Annablume, 2011. 284p. Resenha de: POZZER, Katia Maria Paim. Revista Mundo Antigo, v.I, jun., 2012.

Este livro é o resultado de encontros. Encontro entre jovens pesquisadores e experimentados estudiosos, encontro entre o mundo antigo e o mundo contemporâneo. Todos dispostos a refletir sobre dois assuntos que são, ao mesmo tempo, absolutamente atuais e muito antigos: sexo e violência. Para tratar destes temas os organizadores da obra optaram por uma perspectiva multidisciplinar, onde a história, a antropologia, a psicologia, a arqueologia, a filosofia, a educação física, entre  outras, são chamadas a colaborar neste debate. Além disso, o livro apresenta recortes cronológicos que retomam as práticas e as percepções dos homens e mulheres de outros tempos acerca da sexualidade e da violência.

O livro abre com um polêmico texto de Ian Buruma, jornalista e professor de direitos humanos em Nova York, originalmente publicado no Corriere della Sera, na Itália. Ele propõe uma discussão sobre a relação entre a sexualidade e o fascismo na Europa dos anos 40 e, a sexualidade a intolerância na Europa dos dias de hoje. Leia Mais

Mulher e Literatura: história, gênero e sexualidade | Cecil J. A. Zinani

O imbricado narrativo literário é tão revelador de um mundo imaginário de modelos de gênero quer seja em relação às estratégias dominantes quanto de corpos não conformados que resistem à imposição de normas. Neste sentido, encaminho nestas linhas algumas discussões presentes na obra auferida em torno das aproximações entre a literatura e a história, as relações de gênero e modelos de feminilidade. Também se apresenta exemplos da autoria feminina latino-americana em relação a diferentes vivências de personagens mulheres.

Nesta obra, o conjunto de textos apresenta mulheres escritoras, suas protagonistas e demais personagens em diferentes obras literárias latino-americanas contemporâneas. O livro foi organizado em três seções: história, gênero e sexualidade. Estas três seções e as diversas autorias contemplam a necessidade de outros olhares sobre as narrativas cujas tramas tecem imaginários diferenciados. Assim, percebe-se a tentativa de aproximação entre várias áreas do conhecimento humano como a psicologia, antropologia e a história para dar conta das relações entre mulheres, homens e de sexualidades não conformadas. Destarte, a literatura e seu contexto são reveladores de histórias minúsculas, mas tão ricas e significativas como as demais histórias. Leia Mais

Histórias íntimas: sexualidade e erotismo na história do Brasil | Mary Del Priore

Recentemente a teledramaturgia brasileira protagonizou o primeiro beijo lésbico: representada em Amor e Revolução, a cena durou aproximadamente cinqüenta minutos. Os pontos a mais na audiência que a cena garantiu para o SBT mostram como este gênero televisivo, bem como os demais meios de comunicação, sempre funcionou como termômetro da sexualidade brasileira. Se em Amor e Revolução a temperatura subiu, em 2005 a temperatura despencou devido ao que deveria ser o primeiro beijo gay da televisão brasileira: a Rede Globo chegou a gravar a cena, mas não a levou ao ar no último capítulo de América. Caso se volte mais de duas décadas, contudo, o termômetro registrou novamente elevada temperatura: em 1979 o seriado Malu Mulher, também da Rede Globo, apresentou o primeiro orgasmo da televisão brasileira. Leia Mais

Linguagem, gênero, sexualidade: clássicos traduzidos – OSTERMANN (REF)

OSTERMANN, Ana Cristina; FONTANA, Beatriz. Linguagem, gênero, sexualidade: clássicos traduzidos. São Paulo: Parábola Editorial, 2010. 166 p. Resenha de: ANDRADE, Daniela Negraes Pinheiro. Questões linguísticas envolvendo gênero, sexualidade e interação social. Revista Estudos Feministas v.19 n.1 Florianópolis Jan./Apr. 2011.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos,1 no seu artigo primeiro, diz que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos” e que, portanto, “dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”. Partindo do pressuposto, elaborado pelo filósofo alemão Immanuel Kant, de que o ser humano é, primordialmente, fruto daquilo que a educação faz dele, é plausível pensar que a construção de uma sociedade livre, fraterna e igualitária passa pelo acesso ao conhecimento. É sabido, contudo, que não todo e qualquer tipo de conhecimento se põe a serviço do respeito à diversidade em amplo aspecto como fator preponderante para a humanização das relações sociais de modo a assegurar o convívio livre, fraterno e igualitário entre as pessoas.

Se o conhecimento é a chave para o entendimento e o aprimoramento das relações sociais dos seres de natureza humana, independentemente de raça, etnia, credo, opinião política, orientação sexual etc., toda obra que contribua para a construção do saber nesse sentido é digna de elogio. O livro Linguagem, gênero, sexualidade: clássicos traduzidos, sendo assim, merece ser celebrado. A obra presta um grande serviço à comunidade acadêmica leitora do português brasileiro e aos demais públicos interessados em prol do fortalecimento dos estudos voltados para a construção de um saber humanizador no tocante à questão da diversidade de gêneros e à questão da sexualidade no âmbito das interações sociais. Organizada por Ana Cristina Ostermann, ph.D. em Linguística (Universidade de Michigan, EUA), e por Beatriz Fontana, Doutora em Letras (UFRGS, Brasil), a publicação traz a compilação, competentemente traduzida, de artigos acadêmicos escritos por pesquisadores e pesquisadoras estadunidenses e britânicos/as considerados basilares dentro do escopo compreendido por gênero, sexualidade e interação social, abordado sob o viés da linguística interacional. Leia Mais

Prazeres dissidentes. – DÍAZ-BENÍTEZ; FIGARI (REF)

DÍAZ-BENÍTEZ, María Elvira; FIGARI, Carlos Eduardo (Orgs.). Prazeres dissidentes. Rio de Janeiro: Garamond, 2009. 600 p. Resenha de: NICHINIG, Claudia Regina. Entre a perversão e a dissidência: práticas sexuais, corpos e prazeres. Revista Estudos Feministas, vol. 18, no. 3, p. 943-945, setembro-dezembro – 2010.

Ao publicizar novas pesquisas sobre formas de sexualidade no Brasil, a partir de novos e velhos enfoques revisitados, Prazeres dissidentes demonstra a importância e a efervescência do campo. A coletânea lançada em setembro em Buenos Aires, em outubro em São Paulo e em novembro de 2009 no Rio de Janeiro é fruto do encontro de pesquisadores no Grupo de Trabalho “Corpos, desejos, prazeres e práticas sexuais ‘dissidentes’: paradigmas teóricos e etnográficos”, que aconteceu em Porto Alegre no ano de 2007, durante a VII Reunião de Antropologia do Mercosul (RAM).

Permeado por autores como Michel Foucault e Georges Bataille, considerados autores clássicos no estudo do erotismo e da sexualidade, e somadas as discussões teóricas levantadas por Judith Butler, principalmente no artigo de abertura da coletânea de Vitor Grunvald,1 que traz com propriedade a discussão acerca dos conceitos de abjeção, política da performatividade e lesbianidade, o livro se divide em quatro partes – “Corpos e interações de fronteira”, “Encontros ao avesso”, “Sociabilidades fluidas” e “Jogos proibidos” -, que revelam formas de sexualidade e busca de prazeres considerados marginais. Leia Mais

Prazeres dissidentes – DÍAZ-BENÍTEZ; FIGARI (REF)

DÍAZ-BENÍTEZ, María Elvira; FIGARI, Carlos Eduardo (Orgs.). Prazeres dissidentes. Rio de Janeiro: Garamond, 2009. 600 p. Resenha de: NICHNIG, Claudia Regina. Entre a perversão e a dissidência: práticas sexuais, corpos e prazeres. Revista Estudos Feministas v.18 n.3 Florianópolis Sept./Dec. 2010.

Ao publicizar novas pesquisas sobre formas de sexualidade no Brasil, a partir de novos e velhos enfoques revisitados, Prazeres dissidentes demonstra a importância e a efervescência do campo. A coletânea lançada em setembro em Buenos Aires, em outubro em São Paulo e em novembro de 2009 no Rio de Janeiro é fruto do encontro de pesquisadores no Grupo de Trabalho “Corpos, desejos, prazeres e práticas sexuais ‘dissidentes’: paradigmas teóricos e etnográficos”, que aconteceu em Porto Alegre no ano de 2007, durante a VII Reunião de Antropologia do Mercosul (RAM).

Permeado por autores como Michel Foucault e Georges Bataille, considerados autores clássicos no estudo do erotismo e da sexualidade, e somadas as discussões teóricas levantadas por Judith Butler, principalmente no artigo de abertura da coletânea de Vitor Grunvald,1 que traz com propriedade a discussão acerca dos conceitos de abjeção, política da performatividade e lesbianidade, o livro se divide em quatro partes – “Corpos e interações de fronteira”, “Encontros ao avesso”, “Sociabilidades fluidas” e “Jogos proibidos” -, que revelam formas de sexualidade e busca de prazeres considerados marginais. Leia Mais

Gerações, família, sexualidade | Gilberto Velho e Luiz Fernando Duarte

Os organizadores deste livro já são conhecidos dos cientistas sociais no Brasil. Tanto Gilberto Velho quanto Luiz Fernando Duarte representam uma parte importante da antropologia urbana brasileira e foram os responsáveis por esta obra. Além deles, contribuíram para o livro Myriam Moraes Lins de Barros, Jane Russo e Maria Luiza Heilborn, também autoras bastante conhecidas dos cientistas sociais.

Inicialmente, os autores ressaltam a importância do tema para a antropologia urbana, citando a Escola de Chicago e a antropologia social britânica como fontes importantes para a discussão. Também destacam a discussão interdisciplinar, principalmente através da psicologia, como uma rica contribuição para esses debates.

O texto trata das transformações no âmbito da sexualidade e da família, enfocando prioritariamente as mudanças sociais referentes a gênero e gerações. Tal temática já vem sendo abordada de forma interessante por autores como Michel Bozon, cientista social francês que tem produzido principalmente com Maria Luiza Heilborn.

O texto “Sujeito, subjetividade e projeto”, de Gilberto Velho, aborda uma discussão que o autor já faz desde a década de 1980. Velho – que cita Alfred Schutz e George Simmel como fontes importantes do seu trabalho – apresenta seu objeto de investigação, que são as trajetórias individuais dos sujeitos e as gerações. Isso porque analisa hoje a geração dos que seriam filhos dos seus pesquisados do passado. Sua preocupação com a temática aparece há muito tempo, desde quando elaborou sua tese de doutorado. Só que neste texto fica explícito o que tem procurado investigar: o que muda nessas gerações, principalmente através dos “objetivos e metas, […] valores e autopercepções de individualidade e subjetividade” (p. 9).

O autor aponta para mudanças significativas dos sujeitos e suas relações consigo mesmo e com aquilo que ele chama de “ethos psicologizante” (grifo do autor). Curiosamente, localiza nos estoicos esse processo sobre a individualização dos sujeitos, mas, devido à brevidade do artigo, não chega a aprofundar seus argumentos. No fim do artigo, o autor estabelece as relações da sua pesquisa com países como Portugal e Estados Unidos, além de citar alguns pesquisadores da mesma temática, como já foi apontado por Simmel. Sem apresentar grandes novidades, o artigo faz uma retrospectiva do que o autor produziu até os dias de hoje.

O texto de Luiz Fernando Dias Duarte – intitulado “Família, moralidade e religião” – aponta para a complexidade da administração da vida privada nas diferentes camadas sociais da vida urbana no Brasil. Há, conforme o autor, uma oposição entre os valores como religião, família, moralidade e, principalmente, sexualidade na modernidade. Três interessantes questões vêm sendo estudadas por ele, junto a camadas populares, são elas: a) há formas de conjugalidade diferentes de modelos tradicionais contrastando com formas que reforçam padrões de casamento tradicionais; b) existe um aumento da individualização da sexualidade, ao mesmo tempo que existe uma ampliação sobre seu controle; e c) ocorre um aumento da adesão às religiosidades específicas de certos segmentos, simultaneamente à diminuição da religiosidade e da crença em jovens. Para o autor, isso tem relação com o aumento do subjetivismo.

Segundo Duarte, não existe uma diferença entre camadas sociais sobre essas alterações de moralidade. Assim, tanto camadas médias superiores quanto camadas populares podem oscilar entre esses padrões. Uma pista interessante sugerida por Duarte e que pode contribuir com as pesquisas sobre essa temática é que, independentemente dos diferentes níveis de camadas sociais, o processo de individualização também é importante presença na constituição da singularidade de camadas sociais de baixa renda. Esse fato é muitas vezes negligenciado por pesquisadores que diferenciam as classes sociais pelas distâncias sociais econômicas entre elas.

O autor cita que dentro de camadas médias e letradas existe uma concepção de que ser moderno é estar mais atento às mudanças de comportamentos de sexualidade e relativos – controle de natalidade, mais especificamente. Aqui, mesmo que não tenha sido citado, é possível comparar ao clássico texto de Giddens sobre A transformação da intimidade.1

A contribuição de Duarte aqui é apontar de forma significativa as tensões sobre as disposições “liberais” e as “morais”, mas não fica claro como estas se constituem no universo social desses grupos sociais. Ele utiliza uma categoria que curiosamente chama de “desentranhamento” (p. 23) e que é uma das responsáveis por compreender as mudanças sociais na vida cotidiana.

O autor ao final revela que a sua proposta foi de, através do conceito de cismogênese (abordado de forma muito interessante em seu texto), encontrar elementos teóricos para compreender as “tensões contrastivas” que se apresentam para esses grupos, principalmente a partir da experiência religiosa.

No texto “Três gerações femininas em famílias de camadas médias”, Myriam Moraes Lins de Barros aborda as transformações sociais e de gênero advindas do envelhecimento da população. O estudo enfocou principalmente as mulheres, por meio de 24 entrevistas. Foram escolhidas mulheres nascidas nas décadas de 1940 e 1950, devido às transformações sociais que vão desde o casamento até o trabalho ocorridas para essas gerações.

A autora ressalta a importância dos movimentos sociais da década de 1960 para a “configuração dos valores individualistas” (p. 48). Ela deixa claro que seu interesse é descobrir formas psicológicas de introjeção dos valores individualistas. Uma leitura à primeira vista demonstra forte influência da psicologia, uma marca de todos os trabalhos desta obra. Myriam de Barros ainda aponta para a importância de se entenderem as relações de gênero nas dinâmicas interacionais.

Uma das principais mudanças, segundo a autora, é sobre a compreensão de conjugalidade para as mulheres entrevistadas, que se diferenciou a partir das gerações pesquisadas. A autora identificou tensões entre os grupos pesquisados, principalmente atreladas às diferenças geracionais. O processo de individualização foi fundamental para que as entrevistadas pudessem estabelecer novas relações com seus parceiros, assim como com suas famílias.

No texto intitulado “A sexologia na era dos direitos sexuais: aproximações possíveis”, de Jane Russo, a temática é a politização dos movimentos sociais sobre a sexualidade. Ela inicia falando do movimento gay e sua articulação para tirar a homossexualidade do rol das perversões.

A autora faz uma constatação: houve, simultaneamente, uma politização das sexualidades divergentes e uma medicalização da sexualidade heterossexual. Ela revela que a preocupação com a sexualidade surge na passagem do século XIX para o século XX com estudiosos, dentre eles talvez o mais conhecido seja Havelock Ellis. Essas considerações são claramente influenciadas por Foucault, citado pela autora em diversos momentos. Um apontamento trata da discussão de Russo sobre a despatologização dos chamados desvios sexuais, a partir do discurso sobre os direitos sexuais. O interessante é que, ao mesmo tempo que isso acontece, existe uma crescente disciplinarização da sexualidade dos casais heterossexuais.

A autora apresenta um quadro com datas e acontecimentos políticos significativos para a discussão sobre os movimentos sociais que lutaram contra a medicalização da sexualidade, como a Revolta de Stonewall, por exemplo, em 1969. Aqui vale lembrar o recente livro intitulado Preconceito contra homossexualidades: hierarquia da invisibilidade,2 que faz uma importante retrospectiva do movimento gay nos Estados Unidos e no Brasil.

O que a autora revela é que começa a haver um levantamento de novas condutas da sexualidade para os casais heterossexuais, principalmente as defendidas como ideal de saúde e bem-estar. Assim como Michel Bozon,3 ela cita o surgimento do Viagra como a inauguração da medicalização da sexualidade. O curioso é que, com o lançamento desse medicamento, aumenta o conceito de disfunção erétil como um problema de saúde pública nos Estados Unidos, atingindo 52% dos homens entre 40 e 74 anos, ou seja, existe uma orientação da sexualidade que passa por uma forma de medicalização dela.

No último texto, intitulado “Homossexualidade feminina em camadas médias no Rio de Janeiro sob a ótica das gerações”, Maria Luiza Heilborn aborda – em uma etnografia realizada em sua tese de doutoramento no Rio de Janeiro com mulheres homossexuais – fortes características de uma valorização da conjugalidade. A autora se propõe a investigar as gerações e a maneira como as suas entrevistadas apresentavam-se em relação à própria orientação sexual. Revela que sua preocupação não está relacionada com a identidade sexual, mas é inegável que essa discussão a tangencia em todo o seu texto. Ela elabora uma interessante definição de conjugalidade, centrando-a principalmente em um tipo de relação estabelecida entre os companheiros, independentemente de serem heterossexuais ou homossexuais. Ainda assim, talvez esse conceito pudesse ser mais bem descrito, pois, em caso de pesquisas, a ideia de “não conjugalidade” dificulta uma distinção, por exemplo, de uniões estáveis para namoros com casais que não coabitam e também se relacionam afetiva e sexualmente. Curiosamente, em sua atual pesquisa, a autora identificou que as mulheres recusaram o modelo de masculinidade lésbica.

A análise é relativa à sexualidade como uma biografia, citando John Gagnon, que tem sua primeira obra publicada no Brasil em 2006, intitulada Uma interpretação do desejo: ensaios sobre o estudo da sexualidade.4 Tal perspectiva tem encontrado forte amparo nos pesquisadores das ciências sociais, principalmente na Europa e no Brasil. O estudo parte do que Gagnon chama de scripts sexuais: uma relação entre perspectivas sociais, interpessoais e intrapsíquicas; uma teoria complexa, mas de grande contribuição para o campo de conhecimento da sexualidade. Heilborn ainda aponta que os scripts sexuais podem ser úteis para compreender as nuances cada vez mais significativas da orientação sexual, não como algo fixo, mas sim fluido. Aqui é clara uma influência do pensamento queer de Butler, mesmo sem ser citado.

A autora aborda ainda que existem poucas produções sobre homossexualidade feminina no mundo acadêmico nacional, mas que aparecem já algumas teses e dissertações relativas ao tema. Isso teria relação com a imbricação entre sexualidade e gênero. A visibilidade é muito maior entre homens gays do que entre mulheres. A autora revela que a conjugalidade acaba sendo uma preferência das lésbicas, devido à sua constituição caracteristicamente atribuída ao universo feminino.

A obra analisada apresenta contribuições interessantes em relação à temática, principalmente da sexualidade e do gênero, passando pela discussão sobre família e gerações. Mas o que chama realmente a atenção é a influência do processo de individualização sobre os sujeitos, que, na maior parte dos artigos, se faz presente. Essa discussão é um dos principais objetos da psicologia, especialmente da psicologia social. Mas o que podemos identificar é que existe aqui um claro diálogo interdisciplinar que está presente nos trabalhos dos autores e da antropologia que eles abordam.

Os artigos apresentam, na maior parte das vezes, uma contribuição importante para as discussões sobre as mudanças sociais e da família e sua interlocução sobre a sexualidade, ainda que por vezes pudessem aprofundar mais ou trazer outros textos, pois o livro apresenta apenas cinco artigos. Seria mais enriquecedor se outros autores participassem também com suas pesquisas sobre a temática. Ainda assim, como é de praxe, os autores trazem leituras instigadoras para novos pesquisadores que se aventuram no campo da sexualidade, do gênero e da família.

Notas

1 Anthony GIDDENS, 1993.

2 Marco Aurélio Máximo PRADO e Frederico Viana MACHADO, 2008.

3 Michel BOZON, 2004.

4 John GAGNON, 2006.

Referências

BOZON, Michel. Sociologia da sexualidade. Rio de Janeiro: FGV, 2004.         [ Links ]

GAGNON, John. Uma interpretação do desejo: ensaios sobre o estudo da sexualidade. Rio de Janeiro: Garamond, 2006.         [ Links ]

GIDDENS, Anthony. A transformação da intimidade: sexualidade, amor e erotismo nas sociedades. 2. ed. São Paulo: UNESP, 1993.         [ Links ]

PRADO, Marco Aurélio Máximo; MACHADO, Frederico Viana. Preconceito contra homossexualidades: hierarquia da invisibilidade. São Paulo: Cortez, 2008.         [ Links ]

Leandro Castro Oltramari – Universidade Federal de Santa Catarina e Universidade do Sul de Santa Catarina


VELHO, Gilberto; DUARTE, Luiz Fernando (Orgs.). Gerações, família, sexualidade. Rio de Janeiro: 7 letras, 2009. 96 p. Resenha de: OLTRAMARI, Leandro Castro. As transformações na família e na sexualidade. Revista Estudos Feministas, v.18, n.3, 2010.

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Mujeres, entre la casa y la plaza – BARRANCOS (CA-HE)

BARRANCOS, Dora. Mujeres, entre la casa y la plaza. Buenos Aires: Sudamericana, 2008, 208 p. Resenha de: BORDAGARAY, María Eugenia. Clío & Asociados. La Historia Enseñada, La Plata, n. 13, p.186-191, 2009.

Este trabajo pertenece a la colección Nudos de la Historia Argentina, que dirige Jorge Gelman, la que es descripta por el director como una colección de libros atractivos, sólidos, susceptibles de ser leídos y cuyo objetivo es que sean disfrutados por la gente interesada en la historia. A través de las doscientas páginas de Mujeres, entre la casa y la plaza quien lea podrá acercarse a un relato cuyo objetivo es contribuir a renovar la interpretación sobre nuestro pasado y presente desde la perspectiva de la diferencia sexual.

La obra delinea las grandes nervaduras de la historia, sin embargo, ello no le impide a la autora profundizar y avanzar en algunos problemas que ha estudiado en otras oportunidades, por lo que la obra resulta de temáticas largamente meditadas a la vez que condensa un cúmulo de consideraciones surgidas de la producción de la historia de mujeres en nuestro país. Barrancos va desplegando sobre el relato esos problemas sin abandonar una narrativa construida sobre comprensiones más generales de la historia.

El relato se estructura en torno a un ordenamento cronológico que comienza a fines del siglo XIX y se extiende hasta fi nes del XX y recorre los problemas planteados por la historiografía para cada uno de estos nudos temáticos, puntualizando en aquellos que la autora imagina como adscriptos a la temática del género, la sexualidad y a las mujeres dentro del curso de “ la” historia argentina. A su vez, esboza las deudas que la sociedad mantiene con el presente y los compromisos que nos pueden exigir los escenarios futuros.

A diferencia del trabajo anterior de la autora, Mujeres en la Sociedad Argentina,1 en el que establece las diferentes concepciones de mujer entre las poblaciones originarias americanas en tiempos precolombinos y las provenientes de las sociedades europeas conquistadoras, el recorrido comienza hacia fi nes del siglo XIX.

Entonces primaba un orden patriarcal severo, cuya base era el matrimonio forzado, aunque hubo diferencias entre la elite local y las clases populares en cuanto a un mayor grado de libertad de elección para estas últimas. Las reformas liberales implementadas a partir de 1870 se pueden caracterizar por la promoción de una laicización general de lo público, las que no signifi caron lo mismo en el orden doméstico.

La autora percibe que es en la esfera familiar donde los valores patriarcales fueron defendidos con recelo colocando a la familia como “célula” moral de una sociedad que sufría profundos cambios en otras esferas: el ideal de mujer debía discurrir su vida en la domesticidad.

Así como lo hace en Inclusión/Exclusión, Historia con mujeres, 2 las biografías de deter minados/as personajes tienen un lugar muy importante en todos los capítulos de este libro a modo de señalar las imbricaciones individuales y sociales. Para este primer período, la autora considera a Dalmacio Vélez Sársfi eld quien en 1869 reforma el Código Civil y a partir del cual la mujer es considerada ante la ley como una menor de edad. También, rescata la fi gura de Rosa Guerra, escritora del primer manual argentino para enseñanza de urbanidad, buenos modales y otras conductas apropiadas para el sexo y, fi nalmente, recobra a quien introdujo por primera vez al país el concepto de “feminismo”: Ernesto Quesada.

Aunque con matices, estas tres fi guras representarán el ideal liberal burgués acerca del rol de la mujer en la sociedad de fi nes de siglo XIX y principios del XX.

Por esos mismos años, concomitantemente con la gran inmigración proveniente de Europa, comienzan a introducirse nuevas ideas al país. Barrancos destaca el accionar de los/las anarquistas, temática que conoce muy bien y que ya había abordado en obras señeras tales como Anarquismo, educación y costumbres en la Argentina de principios de siglo.3 Subraya que el anarquismo propone “la revolución también en la casa”, el amor libre, la limitación de los nacimientos y postulados relacionados con la teoría de la eugenesia. La autora evoca a Pepita Guerra con su periódico La Voz de la Mujer, a Juana Rouco Buela con Nuestra Palabra, a Salvadora Medina Onrubia en su amplia variedad de intervenciones políticas, poéticas y periodísticas. Paralelamente, las primeras feministas aparecen junto al ingreso de las mujeres a la educación. Primero a través del magisterio y como educadoras (Juana Manso), después en la Universidad (Élida Paso, Cecilia Grierson, Elvira López). María Abella Ramírez (con Nosotras, primera revista feminista) y Julieta Lanteri (la más activa y particular) representan lo más puro y dinámico del movimiento feminista. Elvira Rawson de Dellepiane y Eufrasia Cabral se sitúan dentro del radicalismo desde la “Revolución del Parque” que diera origen a ese partido. En el Partido Socialista, Alicia Moreau de Justo y Gabriela Laperriere de Coni actúan desde los primeros momentos del partido en nuestro país.

Con el fi n de la gran guerra y los cambios producidos en el escenario mundial y en el cuerpo social, las mujeres ganan mayor intervención pública. Se produce su ingreso masivo en el mercado laboral, aunque subraya que su presencia no evitó que las que debían ganarse la vida o arrimar sustento a los suyos no fueron bien observadas por la sociedad, por lo menos, hasta los 60.

En la Argentina, el movimiento feminista en la década de 1920 y el asomo de los primeros derechos para las mujeres se da con la continuación de la actividad de Lanteri, Rawson y Moreau. En el ámbito parlamentario se destacan los aportes de algunos notables legisladores de distintas fuerza políticas: Del Valle Iberlucea, Luis María Drago y Rodríguez Araya, quienes avanzaron con proyectos sobre la reforma política en relación a las facultades políticas de las mujeres, entre otros derechos.

El segundo capítulo trata sobre los cambios sociales y las mujeres entre 1930 y 1955. Se destaca el proyecto aprobado en diputados sobre el sufragio y el divorcio vincular en 1932 y la aparición de nuevas fuerzas que se suman a la defensa del voto femenino, como la agrupación de Carmela Horne de Burmeister que compenetrada con el ideal católico proponía un sistema de ampliación gradual y calificado. Del período, iniciativas muy valiosas por parte del Estado son la Caja de Maternidad, con la que se inicia la protección legal de la maternidad para obreras y empleadas; y el fi n de la prostitución reglamentada en 1936, que estaba legalizada y reglamentada desde fi nes del siglo XIX y permitía la existencia de prostíbulos y proxenetas.

Desde otro plano, la entreguerras signifi có un quiebre en los moldes arquetípicos de la moral sexual femenina: modas más osadas, erotismo en la publicidad, nuevos espacios para mujeres solas como hoteles, plazas, cine, etc. Ligada a una nueva subjetividad femenina aparece la idea del disfrute y del tiempo libre propio. También, la idea de un mejor porvenir para sus hijos relacionado directamente con la limitación en el número de vástagos a través de métodos anticonceptivos y contracepcionales.

La aparición de los estados totalitarios y “el fascismo” como fenómeno a ser combatido impulsa a las mujeres de los sectores de izquierda y liberales a colaborar con las expresiones que abogaban por la democracia y a tener un papel activo en el auxilio a las víctimas, especialmente las de la Guerra Civil Española que debían abandonar la península. La Junta de la Victoria fue uno de estos movimientos sostenido por mujeres antifascistas, entre 1941 y 1943, la que tuvo hasta 45 mil mujeres, con identidades políticas e ideológicas dispares, pero que marcan el interés femenino por la política nacional y mundial.

Cuando le toca el turno de hablar del peronismo, la autora opta por deshilvanar los signifi cados de la figura de Eva Perón, desde una óptica muy particular y no avizorada en ninguno de sus trabajos anteriores: la novedad es lo que simboliza, “(…) ofrece una paradójica alternancia entre la autonomía y la dependencia de Perón, porque a pesar de que la gravitación de la mujer del presidente tuviera tanta importancia y fuera algo inédito, reforzaba la fi gura masculina y aumentaba el reconocimiento del patriarcado político”.4

Pero por otro lado, se impulsa el debate acerca del voto femenino, frente al cual no hubo un rechazo directo de las otras fuerzas que lo habían impulsado anteriormente. La Rama Femenina del Partido Peronista, y luego el Partido Peronista Femenino, son un fenómeno totalmente nuevo y apreciable desde su organización, sistematicidad y operatividad, siempre de acuerdo a las prerrogativas cedidas por Eva Perón en un principio, y Juan Perón después de su fallecimiento. Desde lo biográfi co se destaca a la diputada Delia Deglioumini de Parodi, primera mujer en asumir la vicepresidencia de la legislatura de la cámara baja nacional y quien presenta el proyecto que da pie a la ley de divorcio vincular en 1954. En tono de balance, la autora señala que fueron muy importantes los avances en materia de derechos civiles para las mujeres, lo que contrasta con una fuerte represión y persecución a toda sexualidad alternativa, especialmente a la homosexualidad, durante esos años.

Las consideraciones sobre los antiperonistas tienen un papel muy importante en este trabajo. Sintéticamente, las socialistas estaban desilusionadas porque creían que el peronismo les había arrebatado la lucha por el voto y las leyes de protección de los trabajadores, lo que se expresa en La Vanguardia, donde escriben Alicia Moreau, Josefi na Marpons, María Luisa Berrondo, Leonilda Barrancos y Delia Etcheverry. El Partido Comunista caracterizó al peronismo de fascista, pero no dudó en tender lazos respecto a algunas cuestiones en las que coincidía con el régimen, como por ejemplo el voto femenino y las ideas acerca de la reforma agraria. La organización específi ca de las mujeres comunistas fue la Unión de Mujeres de la Argentina, cuya publicación Nuestras Mujeres da cuenta de los vaivenes de sus posiciones con respecto al accionar del gobierno peronista.

Sus figuras más destacadas fueron Alcira de la Peña, Fanny Edelman, Irma Othar, Nina Borzone. En las fi las del radicalismo se destaca la actuación de Clotilde Sabattini, quien adhiere al feminismo y motiva el Primer Congreso Femenino de la corriente en Córdoba. Si bien hubo numerosos congresos organizativos en el radicalismo, nada indica que hubiera existido una verdadera apertura por parte del partido hacia la participación de las mujeres en él.

El capítulo 3, es caracterizado como “un cambio de época”, e intenta asomarse a las transformaciones de las décadas del 60 y 70.

La aparición de la “nueva izquierda” reformula algunos elementos del peronismo: “(…) comulga con las profundas razones del pueblo que se identificaba con Perón y eliminan la noción de fascismo que le era adjudicada por la izquierda antiperonista”.5

A este imaginario, se le suma el triunfo de la Revolución Cubana como símbolo de la liberación latinoamericana y el triunfo de las ideas socialistas. Lo nuevo para las mujeres es la habilitación de nuevos espacios de libertad, lejos de los cerrados ámbitos familiares; se percibe una nueva subjetividad de las mujeres jóvenes, relacionada con el compromiso con lo público y lo político.

El inicio de la libertad sexual y las relaciones prematrimoniales, ayudadas por la aparición de la píldora anticonceptiva son fenómenos de éste momento. “Se separaban así los vínculos afectivos, la experiencia amatoria, de la obligación reproductiva”.

6 Eso mismo contribuye al aumento de la participación de las mujeres en el mercado laboral en nuevas ocupaciones, lo que no cambia la segregación por sexo. La universalización de la educación universitaria para las mujeres jóvenes (y de clase media) aportará gran parte de esta fuerza laboral y signifi cará un nuevo espacio de acción para las mujeres. Desde allí se desarrollarán la mayoría de las agrupaciones que se guían bajo los preceptos marxistas leninistas. Posteriormente, la aparición de las agrupaciones armadas como Montoneros, ERP, FAP, FAL, cambió el eje de la política radicalizada. Tanto Montoneros como PRT-ERP defi nieron intervenciones estratégicas vinculadas a las mujeres de los diversos grupos populares donde anidaba.

En general, se oponían al feminismo pues lo consideraban una concepción burguesa, y en líneas generales, no hubo un planteo acerca de la liberación de las mujeres.

Otro punto que la autora resalta, y que ya fue trabajado en su libro anterior, es la aparición de la represión de la mano del terrorismo de Estado, para el que se implementaron distinciones de sexo. Hubo diferencias entre la violencia ejercida sobre hombres y mujeres: las violaciones, las condiciones del parto y el secuestro de los recién nacidos aumentaron la victimización de las mujeres. Siguiendo un análisis generizado de este oscuro período de la historia argentina, la autora se aproxima a las organizaciones de las Madres y Abuelas de Plaza de Mayo: las formas particularísimas que toman sus intervenciones, podrían estar ligadas al presupuesto por parte de las madres y abuelas, de que el ideal conservador que guiaba el ideario de los militares, funcionaría como freno para reprimirlas a ellas como madres y abuelas, y lo opuesto sucedería con sus maridos. Decidieron postular la idea de que era su condición de madres lo único que las movía.

En relación a la idea que atraviesa el texto, sobre los universos de lo público y lo privado, la autora afi rma: “Las madres y abuelas, que unieron rituales domésticos y escenarios públicos, dieron nuevo signifi cado entre la casa y la plaza”.

7 Para el mismo momento histórico, la autora visibiliza, y es una de las originalidades del trabajo, los movimientos feministas dentro de esta masiva participación de hombres y mujeres en pos de la transformación social, que coincide con la segunda ola del feminismo que se da a nivel mundial. Destaca el Movimiento de Liberación de Mujeres (MLM), cuyo medio de intervención era la “concienciación”, la Unión Feminista Nacional (UFN), el Movimiento de Liberación Femenina (MLF) y luego ALMA (Asociación por la Liberación de la Mujer Argentina). El aborto fue un tema central para todas éstas que abogaban por una nueva noción de cuerpo y sexualidad, pero la experiencia del terrorismo de Estado dio por tierra con todas sus aspiraciones y con las organizaciones mismas.

Con la vuelta de la democracia, aparecen expresiones feministas nuevas. Éstas comprendían reivindicaciones igualitarias en todos los planos de la vida, pero la preeminencia la tendrán la denuncia de la violencia doméstica, el reconocimiento de la sexualidad lésbica y el reto a las normativas heterosexuales. Desde el ámbito gubernamental, se destaca la creación del Programa de Promoción de la Mujer y la Familia en el ámbito del Ministerio de Salud y Acción Social, que luego sería la Subsecretaría de la Mujer y cuya principal fi gura es la de Zita Montes de Oca. Durante el gobierno de Menem se crea el Consejo Nacional de la Mujer, que apoyó lo que después sería la Ley de cupo femenino, bajo la dirección de Virginia Franganillo. Los Encuentros Nacionales de Mujeres son también fruto de la democracia.

Asimismo, desde los ‘90, hubo un desplazamiento de los feminismos a las universidades.

Es allí donde se introduce el término “género” al infl ujo de las infl uencias europeas y, rápidamente, se difunde como fórmula para una mayor aceptación por el mundo científi co.

El capítulo cuatro, titulado “ Progresos y Reveses ”, da cuenta del impacto del neoliberalismo sobre la condición de las mujeres y se resalta –entre sus consecuencias más nefastas– el fenómeno de la “feminización de la pobreza”.

Por otro lado, la brecha salarial entre hombres y mujeres se acentuó en los segmentos más califi cados y diminuyó en los de menor califi cación. A pesar de los cambios en la inclusión laboral de las mujeres, no hubo cambios en los roles dentro de la familia. Se destacan como positivos la obtención del divorcio vincular en 1987 (que en 1955 había sido suspendido tras el derrocamiento del peronismo), la ley de la patria potestad compartida de 1985, la ley de cupo femenino de 1993 y la ley sobre violencia familiar de 1995, entre otras.

La autora convierte las deudas sociales –todavía muy grandes– en un programa para la agenda pública: falta acatamiento a la normativa, equidad en la esfera laboral, mayor cobertura a las víctimas de la violencia doméstica y la trata, legalización del aborto, derecho a la identidad sexual.

Si en Mujeres en la Sociedad Argentina, la autora realizaba el ejercicio de construir una narrativa despojada de detalles pero sustentada en una rica comprensión de cuestiones de fondo, ello es aún más notable en este trabajo.

Ese despojo no implica el desconocimiento del método histórico, sino la agudeza en el análisis, 191 Dossier. museos, historia y memoria lo que le permite dar cuenta de los grandes problemas en unas pocas líneas, teniendo como eje la mirada analítica y crítica sin caer en descripciones adjetivas.

El mérito de este trabajo está en la forma en que la narración se convierte, a través de una atractiva y mordaz escritura, en un texto “apto para todo público”, al mismo tiempo que, parafraseando a la autora, intenta poner a la historia “patas para arriba”, con el fi n de hacer signifi cativa la condición femenina y la temática del género en sus múltiples acepciones.

Notas

1 Barrancos, D. B. (2007): Mujeres en la Sociedad Argentina. Una historia de cinco siglos. Editorial Sudamericana, Buenos Aires.

2 Barrancos, D. B. (2002): Inclusión/ Exclusión. Historia con Mujeres, Fondo de Cultura Económica, Buenos Aires.

3 Barrancos, D. B. (1991): Anarquismo, educación y costumbres en la Argentina de principios de siglo, Contrapunto, Buenos Aires.

4 Barrancos, D. (2008): Mujeres, entre la casa y la plaza, Editorial Sudamericana, Buenos Aires, p. 120.

5 Ibídem, p. 136.

6 Ibídem, p. 138.

7 Ibídem, p. 152.

María Eugenia Bordagaray – Universidad Nacional de La Plata – CONICET.

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Carne, moral e pecado no século XVI. O Ocidente e a repressão aos “delitos” por cúpula “ilícita” | Ruston Lemos de Barros

Resenhista

José Ernesto Pimentel Filho


Referências desta Resenha

BARROS, Ruston Lemos de. Carne, moral e pecado no século XVI. O Ocidente e a repressão aos “delitos” por cúpula “ilícita”. São Paulo: USP, 1993. Resenha de: PIMENTEL FILHO, José Ernesto. A sexualidade, a Igreja e o Santo Ofício no Brasil. SÆCULUM – Revista de História. João Pessoa, n. 1, p. 139-143, jul./dez. 1995.

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La decouverte de l’Amèrique? Les regards sur Vautre à travers les manuels scolaires du monde / Pierre Ragon

Situada em local onde havia uma antiga livraria brasileira de oposição à ditadura, em Paris, a editora/livraria L’harmattan encontra-se entre as quinze primeiras editoras francesas. Criada em 1974, voltada sobretudo para as ciências humanas, L’harmattan concede ao denominado “Terceiro mundo” um espaço privilegiado, que começou pelas publicações que tratavam da África e do Brasil. Atualmente, ela cobre toda a América Latina e oferece ao público cerca de seiscentos títulos novos por ano. A maior parte dessas publicações permanece, no entanto, ignorada pelo público brasileiro. Nesse sentido, é interessante salientar dois trabalhos publicados por ocasião das comemorações do V Centenário do descobrimento da América.

O primeiro é La decouverte de l’Amèrique? Les regards sur Vautre à travers les manuels scolaires du monde (1922). O organizador é Javier Pérez Siller, sociólogo e historiador mexicano, professor da Universidade Nacional do México, que tomou como ponto de partida o fato de ser o descobrimento da América um dos poucos acontecimentos históricos considerado como patrimônio universal. Em todos os países do mundo, as crianças aprendem que em 1492 Cristóvão Colombo descobriu a América. Com isto, Javier Pérez Siller lançou um desafio a um grupo de pesquisadores das mais diversas nacionalidades: demonstrar como o descobrimento da América foi representado nos manuais escolares. Foram pesquisados 150 manuais escolares em uso em setenta países.

O grande mérito e originalidade desse livro de agradável leitura encontra-se na sua proposta. Javier Pérez Siller reuniu pesquisadores da Alemanha, França, Grécia, Portugal, Venezuela, Colômbia, Camarões e Marrocos, dentre outros países.

O trabalho permite, assim, uma leitura comparativa a respeito dos descobrimentos, nos manuais escolares, das diversas partes do mundo, rompendo com a visão europeocentrista.

A inspiração do organizador não é difícil de adivinhar. Muitos certamente lembrar-se-ão, imediatamente, de Marc Ferro em Comment on raconte l ‘histoire aus enfants a travers le monde entier ( Paris, Payot, 1986) e em L ‘histoire sous surveillance (Calmann-Levy, 1985). Muito antes das comemorações do V Centenário do descobrimento da América, Ferro já denunciava as conseqüências de uma visão teleológica e europeocêntrica da história. Prefaciando a obra organizada por Péres Siller, Ferro adverte que “não se trata de um catálogo”, mas de uma confrontação entre as diferentes visões da história, a partir de um observatório particular”. A leitura do livro reafirma as observações de Marc Ferro.

A descoberta da América, como acontecimento que se representa, submete-se a um jogo complexo que envolve aspectos nacionais, internacionais, culturais e étnicos. Lamentavelmente, embora trabalhos como este questionem a história europeocentrista, os manuais escolares continuam perpetuando uma história centrada nos valores europeus ocidentais. Resta ao menos refletir entre a distância que no Brasil separa a produção acadêmica da produção do manual escolar.

O segundo livro, Les itidiens de la découverte. Evangélisation, mariage et sexualité (1992) é de autoria de Pierre Ragon, jovem historiador interessado em história religiosa da América Latina na época moderna e professor da Universidade de Paris X — Nanterre. Pierre Ragon segue bem de perto, nesse trabalho que trata do México pós-conquista, a trilha aberta já há alguns anos pela historiografia francesa, que aproxima a história da antropologia. O autor propôs-se a analisar o encontro de duas culturas, concedendo a evangelização o papel de transposição dos valores europeus — moral e concepções de vida — para a sociedade ameríndia completamente desconhecida.

Na abordagem dessa transposição, o autor elegeu o estudo da introdução do casamento cristão entre os índios. Ragon não restringiu o seu trabalho a um estudo de história religiosa. Com a análise do casamento, penetrou na sociedade indígena, desvendando os laços mais elementares ali existentes.

No contexto da colonização espanhola deteve-se no exame da complexa passagem de uma sociedade “paga” à cristandade, destacando com perspicácia como, aos poucos, o casamento e a sexualidade foram se tornando prioritários para os evangelizadores, uma vez que pelo casamento cristão era possível normalizar a vida dos indígenas, segundo uma fé que eles passavam a adotar. O autor insiste ainda na “abertura de espírito” de grande parte dos religiosos que aceitaram muitas das instituições indígenas, viabilizando assim a implantação das novas normas de vida. Integrando a reflexão teológica aos costumes desses povos desconhecidos, buscavam no pensamento de São Tomás de Aquino (definição do casamento e concepção da lei natural) a defesa da validade das uniões indígenas.

De forma interessante, num estilo elegante, Ragon mostra como os religiosos foram além da reflexão intelectual, lançando-se na prática a uma tarefa pedagógica que inicialmente procurou o apoio das elites indígenas, intervindo nos conflitos pelo poder, contando com o apoio feminino, enfrentando resistências e, finalmente, modificando e impondo com o casamento cristão uma reestruturação do sistema de alianças políticas, anteriormente fundadas na poligamia.

As fontes utilizadas pelo autor revelam a seriedade e a profundidade do trabalho, que não se contentou com análises superficiais. Foram pesquisados tratados de teologia, processos da Inquisição, exposições, questionários, catecismos, manuais de confissão e a correspondência dos missionários. A obra possui quatro capítulos, nos quais Ragon discorre sobre a definição dos casamentos indígenas, os teólogos do Novo Mundo e a escolástica medieval, as novas regras de comportamento e, finalmente, a evolução das relações matrimoniais e o impossível controle das condutas. O livro é ainda enriquecido por um léxico, anexos, esquemas, gráficos e fotografias.

A retomada das teses clássicas da filosofia tomista pelos missionários do século XVI e a amplitude da cristianização na América diminuem certamente as fronteiras temporais que separam a Idade Média dos tempos modernos. Javier Guerra, no prefácio ao livro de Ragon, afirma que ‘”nosso conhecimento desses fenômenos no México pode esclarecer, por analogia, os processos de aculturação que se produziram antes, na Europa, quando da cristianização dos germanos, dos eslavos e dos escandinavos”.

Maria Eurydice de Barros Ribeiro – Universidade de Brasília.


SILLER, Javier Pérez. (Org). La decouverte de l’Amèrique? Les regards sur Vautre à travers les manuels scolaires du monde. 1922; RAGON, Pierre. Les indiens de la découverte. Evangélisation, mariage et sexualité. 1992. Resenha de: RIBEIRO, Eurydice de Barros. V Centenário do descobrimento da América. Textos de História, Brasília, v.2, n.4, p.182-184, 1994. Acessar publicação original. [IF]