Jovens e Cotidiano: trânsitos pelas culturas juvenis e pela escola da vida – STECANELA (ER)

STECANELA, Nilda. Jovens e Cotidiano: trânsitos pelas culturas juvenis e pela escola da vida. Caxias do Sul: EDUCS, 2010. Resenha de: ROSA, Marcelo Prado Amaral. Educação & Realidade, Porto Alegre, v.37 n.2, maio/ago., 2012.

O livro Jovens e Cotidiano é resultante do estabelecimento de elos entre a empiria e a teoria, tendo como objeto de análise a dimensão educacional não formalizada, pautado no diálogo entre a sociologia da educação e a sociologia da juventude, buscando interfaces como forma de compreender os processos informais da socialização juvenil. Tais entrelaçamentos foram possíveis através da ocorrência, ao longo da produção textual, de um diálogo em três dimensões, articulando as vozes dos interlocutores empíricos com os interlocutores teóricos e com os conhecimentos tácitos da própria autora, objeto de estudo e problema de pesquisa do projeto de doutoramento. Ainda, o livro apresenta três dimensões de abordagem que, mesmo integradas, oferecem contribuições originais e individualizadas sem prejuízo algum com relação ao todo, sendo as dimensões: discussão teórica sobre juventude; reflexão metodológica de pesquisa de acordo com a perspectiva etnográfica; e a construção dos itinerários de vida e dos processos identitários da juventude da periferia urbana de um município de porte médio do interior do Rio Grande do Sul. A leitura é recomendada para docentes atuantes em todos os níveis, graduandos e pós-graduandos da área de Ciências Humanas e Sociais e Licenciaturas em geral, além de todos os interessados em conhecimentos sobre os espaços não formais de educação.

A autora da obra, professora Nilda Stecanela, é doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Atualmente, é professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Caxias do Sul (UCS), além de professora na Rede Municipal de Ensino de Caxias do Sul. Coordenadora do Observatório de Educação da UCS e do Programa Nossa Escola Pesquisa sua Opinião no Polo Rio Grande do Sul. Atua, principalmente, nas seguintes linhas de pesquisa: Gêneros e processos de socialização; Formação de professores para educação básica; Infâncias, juventudes e processos de socialização e Filosofia e história da educação. É autora e/ou organizadora de outras cinco obras, entre elas, Mulheres e direitos humanos: desfazendo imagens, (re)construindo identidades (2009); Interação com o mundo natural (2007); Construção de conceitos de Ciências (2006); Fundamentos da práxis pedagógica (2005).

A obra em questão se apresenta dividida em nove seções, organizadas de forma exemplarmente didática, a saber: introdução; capítulo 1 – A problemática do estudo; capítulo 2 – Os dilemas conceituais; capítulo 3 – Percursos metodológicos; capítulo 4 – Os percursos juvenis; capítulo 5 – Desafios interpretativos: o que comunicam as palavras sobre o cotidiano?; conclusões; referências; e, por fim, anexos. A obra completa apresenta 368 páginas. Ainda, os autores que inspiraram a forma de escrita do trabalho como um todo foram José Machado Pais e Alberto Melucci, o que proporciona uma escrita densamente descritiva pelos avanços e retrocessos realizados pela autora, além de emocionante, com conexões metafóricas com a poesia de Manuel de Barros, fazendo da exposição despida e ousada da escrita a característica peculiar da obra. Na seção dos anexos ainda são apresentados os perfis dos jovens entrevistados, o que possibilita ao leitor suscitar uma espécie de grau de empatia com os coautores1 do texto.

O primeiro capítulo do trabalho em questão – A problemática do estudo –, tem como objetivo situar sobre os caminhos percorridos para a construção do objeto, intenções e o problema de pesquisa que deram a direção do estudo. Este capítulo encontra-se subdividido em quatro seções.

m Caminhos e motivações para a definição do objeto, é exposta rapidamente a trajetória dentro do curso de mestrado da autora, em que se tem o princípio de um olhar para a dimensão não formalizada da educação a partir de indícios sobre a ausência do diálogo entre as trajetórias juvenis e os conhecimentos escolares. Ainda, aqui, é explicitado os marcos teóricos para o ajustamento focal deste estudo.

Já em Os objetivos, o problema e as hipóteses de investigação, é apresentada a definição do objetivo que norteou o trabalho, sendo “[…] conhecer e compreender as dinâmicas que envolvem os processos educativos não-escolares dos jovens de uma periferia urbana, a fim de possibilitar releitura das práticas educativas escolares” (p. 20), juntamente com a conceituação de periferia. Desta forma, a autora julga prudente o afastamento da escola para compreendê-la, navegando pelos usos temporais e espaciais que os jovens praticam na possibilidade de identificação de como e quais conhecimentos os mesmos constroem nas suas práticas culturais cotidianas. Sobre as hipóteses, a autora afirma categoricamente que não elaborou hipóteses prévias, evitando, assim, o condicionamento das lentes sobre o panorama da pesquisa, adentrando tal cenário munida de intuições.

Na subseção O cenário e os sujeitos da pesquisa, são apresentadas sucintas retomadas históricas da formação e desenvolvimento da cidade de Caxias do Sul e da comunidade O Reolon onde estão localizados os sujeitos da pesquisa, dezoito jovens de ambos os sexos, em situações divergentes em relação à escola, à família e ao trabalho. Para análise detalhada são reconstruídas as trajetórias de quatro jovens (capítulo 5). Em As fronteiras disciplinares, é declarada a característica de interdisciplinaridade do trabalho, tendo como porto seguro a Educação, justificando o entrelaçamento de disciplinas no hiato comunicativo existente entre a Sociologia da Educação e a Sociologia da Juventude. Sobre o distanciamento entre estas duas possibilidades da Sociologia, Abrantes (p. 26) expõe “[…] ocorre um distanciamento entre os “alunos” dos estudos sobre educação e os “jovens” dos estudos culturais, deixando transparecer, em várias situações, que não se está falando dos mesmos atores”. Os principais autores utilizados para a contextura teórica deste capítulo são José Machado Pais, Paulo César Carrano, Juarez Dayrell, Paulo Freire e Alberto Melucci.

O objetivo do segundo capítulo da obra – Os dilemas conceituais – foi contextualizar teoricamente os temas e conceitos implicados no estudo, baseando-se na produção sociológica sobre o assunto. Encontra-se subdividido de acordo com os subtítulos A pesquisa com jovens com base na sociologia do cotidiano, que focaliza a sociologia da vida cotidiana como perspectiva metodológica. Segundo Pais, quando se adota tal ponto de vista como propulsão para o conhecimento, se “[…] condena os percursos de pesquisa a uma viagem programada […] que facultam ao pesquisador a possibilidade de apenas ver o que seus quadros teóricos lhe permitem ver” (p. 31). Ainda, a autora aqui, apresenta como justificativas para adotar essa abordagem metodológica os aspectos de ser este um posicionamento de abertura ao inusitado, afastando-se da “lógica do preestabelecido”, procurando apreender algo que está presente de modo bruto; ao passo que procura transformar o cotidiano em durável admiração ou espanto, centrando sua atenção nos desaterros dos detalhes da vida cotidiana. Nesse capítulo, é colocado à vista o mergulho etnográfico realizado pela autora, visando à potencialização da decifração dos enigmas contidos nos trânsitos dos jovens participantes da pesquisa.

m Para além da hegemonia da forma escolar, os processos educativos não escolares, a autora tece a trama escolar através da história e procura compreender, através da trajetória dos jovens da pesquisa, a questão da exclusão social e escolar provocada tanto por fatores endógenos quanto exógenos à escola. Seguindo no texto, a autora se concentra nos alicerces da crise da escola. Aponta as mutações que a instituição escolar sofreu ao longo do século passado, na qual “[…] a escola passou de um contexto de certezas para um contexto de promessas, situando-se hoje num contexto de incertezas” (p. 43) e a “[…] invasão da escola pelo social, e o social invadido pela escola” (p. 45) e a “[…] nostalgia das representações que acreditam ser possível à escola dar conta de todas essas [qualificação escolar, educativa e de socialização] funções” (p. 48) como pontos nevrálgicos da mutação da escola. Para finalizar esse subcapítulo, concentra cuidados sobre o “saber de experiência feito” (p. 64) através da metáfora escola de borracha.

m A juventude possível reinventada pelas classes populares, a autora aborda as divergentes tipologias de passagem à vida adulta, problematizando, assim, a categoria juventude. Para isso, parte da perspectiva das transições, buscando tramar as culturas juvenis com as correntes teóricas da sociologia da juventude desenvolvidas por José Machado Pais: a corrente geracional e a corrente classista. Ao final, faz uma reflexão sobre a relação entre as biografias padronizadas e as biografias de escolha nos percursos da composição das identidades juvenis em contextos de pressão do cotidiano.

or fim, Nas cronotopias do cotidiano, o rolar das identidades juvenis, a autora encadeia as identidades juvenis com a articulação cronotópica do cotidiano, marcada principalmente pela dessacralização do espaço físico. É destaque nesse capítulo a estruturação dos subcapítulos, pois a leitura dos mesmos pode ser realizada independente da sequência temporal apresentada na obra sem o risco de incompreensões. As principais referências neste capítulo são Alberto Melucci, Rui Canário, Juarez Dayrell, François Dubet, Phillipe Áries, Jaume Trilha, Paulo Freire, Alfred Schutz, José Machado Pais, Pedro Abrantes Maria das Dores Guerreiro, Joaquim Casal, Michel Certeau, Marília Sposito, Gisela Tartuce, Mario Margulis e Marcelo Urresti.

No terceiro capítulo de Jovens e Cotidiano – Percursos metodológicos –, é apresentado os percursos metodológicos da pesquisa, incluindo as posturas assumidas pela autora em relação ao cenário da investigação. Este capítulo encontra-se seccionado em subcapítulos, a saber: Do estudo exploratório aos “inventários dos usos dos tempos”; Vozes que compõem o diálogo: a sociologia da amostra; A arte da escuta na pesquisa com o cotidiano; Da escavação do cotidiano à escovação das palavras: o tratamento dos dados.

No primeiro, a autora descreve suas incursões pela comunidade e imersões nas estratégias de abordagem da pesquisa. No segundo, a autora clarifica aspectos referentes à amostra do estudo. Já no terceiro, os aspectos-chave da escrita recaem sobre a “presença participante” (p. 145) e a “escuta sensível” (p. 146) da autora no cenário da pesquisa. O primeiro aspecto é tomado como um procedimento alternativo frente à impossibilidade de imersão na realidade dos jovens do estudo; o segundo, “evoca a habilidade do observador em perceber e respeitar a fala do outro […]. Para ser sensível, a escuta não deve compreender somente a audição, mas convocar os demais sentidos para perceber os gestos, os silêncios, as pausas, as emoções […]” (p. 146).

Na quarta e última seção, a parte mais densa do capítulo, pois, aqui, a autora organiza e trata os dados da pesquisa. O procedimento adotado para a análise e interpretação das narrativas dos jovens participantes da pesquisa é a análise textual discursiva. Neste subcapítulo, a autora descreve minuciosamente toda a sua trajetória dentro do procedimento adotado, desde a organização do corpus até a produção do metatexto que comunica os resultados a que chegou a pesquisa, tendo como norte a metáfora do mosaico. Neste capítulo, no decorrer da escrita da autora, são destaques os referenciais Alberto Melucci, Howard Becker, José Machado Pais e Roque Moraes.

No quarto capítulo, Os percursos juvenis, a autora apresenta os percursos juvenis por via das trajetórias de quatro jovens da pesquisa, reconstruídas na forma de mosaico. A voz dos interlocutores empíricos é trazida em primeiro plano e, a partir da descrição, são recompostas suas narrativas, orientadas por categorias emergentes na forma de trânsitos, agregando diferentes temporalidades e espacialidades. Assim como os outros capítulos, este também se encontra dividido em subcapítulos, a saber: Trajetórias de Preto: o “Educador do Cotidiano”; Trajetórias de DL: um MC de um grupo de Rap; Trajetórias de Benhur – B-boy de um grupo de Rap e, por fim, Trajetórias de Daiana: a jovem escondida na Caderno de segredos. As trajetórias, expostas aqui, compõem extratos da biografia dos jovens e não tem o objetivo de representar o mundo juvenil, “[…] mas podem representar um mundo juvenil, através dos quais outros casos poderão ser analisados a partir do efeito da reflexividade” (p. 165).

No capítulo Desafios interpretativos: o que comunicam as palavras sobre o cotidiano?, procurou-se informar as categorias que emergiram no campo de investigação, de modo a entrelaçar os sentidos das narrativas dos jovens, estando organizado em “unidades contextuais” (p. 323). A divisão capitular aqui é entre: Trânsitos com a pressão do cotidiano, Trânsitos com as biografias de escolha e Trânsitos com a escola da vida. Neste capítulo também existe a preocupação da autora em expor a incompletude do trabalho perante a gama possível de análises da realidade a partir da realidade. Houve o cuidado em nomear cada jovem participante da pesquisa a partir de suas próprias palavras ou dos significados que elas produziam no entender da autora. As referências base neste capítulo são Alberto Melucci, Rui Canário, Juarez Dayrell, Gisela Tartuce e Mario Margulis.

Nas Conclusões é destaque a tentativa da autora em manter um distanciamento do olhar sobre o conjunto de palavras que compõem o estudo, ou seja, procurou-se um afastamento das peculiaridades da juventude analisada para vislumbrar uma aproximação com o contexto jovem de modo generalizado. Pode-se evidenciar com este trabalho, que a moradia, educação e trabalho são os elementos que mais afetam diretamente o trânsito dos jovens da pesquisa, sendo a escola um dos primeiros recuos ante aos desafios na garantia da sobrevivência. Nesse cenário, de intensa pressão do cotidiano, aparecem como alternativas de descompressão as culturas juvenis, como a música baseada nos ritmos rap e rock e a religião, sendo possível assim vincular a cultura local dentro do contexto de mundo externo à periferia. Analisar as narrativas dos jovens permitiu conhecer as experiências criativas que os mesmos aplicam no seu contexto para viver numa sociedade em mutação. O desafio destes cidadãos é viver em um intenso movimento de reinvenção baseado na aprendizagem que se fundamenta na experiência não escolar, sendo assim possível afirmar que os jovens da periferia aprendem e ensinam, convertendo o conhecimento em ação a partir da ação cotidiana, “[…] relembrando que somos seres incompletos, e que a vida é uma escola […]” (p. 349).

Para finalizar esta resenha, o desafio imposto à autora nesta jornada pelo cotidiano dos jovens foi “compor uma sinfonia” (p. 148) partindo de acordes e notas musicais inaudíveis e talvez até descompassadas quando ouvidas individualizadas. Entretanto, com a regência musical empregada, eclode aqui com toda a dramaticidade, emoção e paixão, sem notas destoantes na partitura ou cacofonia na união do coro, uma composição de melodia harmônica ímpar que ao descer das cortinas se reconhece, através da entonação das palavras e na afinação do arranjo instrumental da orquestra, numa sublime trilha sonora sobre as dimensões não escolares da educação, digna das mais belas óperas.

NotaS

1 Para a autora, os sujeitos da pesquisa são os coautores do trabalho, pois somente através da escuta sensível das palavras dos sujeitos da pesquisa é que foi possível o surgimento de categorias nomeadas com expressões nativas, como pressão do cotidiano e escola da vida (exposição oral).

Marcelo Prado Amaral Rosa – Graduado em Química Licenciatura pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI), campus de Frederico Westphalen. Especialista em Metodologia do Ensino de Química pela Universidade Gama Filho (UGF). Mestrando em Educação na Universidade de Caxias do Sul (UCS), Rio Grande do Sul, vinculado à linha de pesquisa em Educação, Linguagem e Tecnologia, E-mail: marcelo.pradorosa@yahoo.com.br

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Línguagem e comunicação – PAVIANI (C)

PAVIANI, Neires Maria Soldatelli. Línguagem e comunicação. Caxias do Sul: Educs, 2008. Resenha de: ROSA, Marcelo Prado Amaral. Conjectura, Caxias do Sul, v. 16, n. 2, Maio/Ago, 2011.

O livro Linguagem e educação é uma produção textual vinculada a projetos de pesquisa que possuem temática dirigida a considerações sobre leitura e gêneros discursivos, aspectos socioculturais e regionais da linguagem. A organização em forma de livro visa a alcançar a homogeneidade temática, pois alguns desses ensaios já foram publicados, na íntegra ou parcialmente em revistas especializadas. É destinado diretamente aos docentes do Ensino Fundamental e do Médio e, do mesmo modo, para acadêmicos de cursos de graduação em licenciaturas e de programas de pós-graduação.

A autora da obra, professora Neires Maria Soldatelli Paviani, é Doutora em Educação, na área de Metodologia de Ensino, pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar-SP). Atualmente, é professora no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Caxias do Sul (UCS), vinculada às linhas de pesquisa educação, linguagem e tecnologia. Tem experiência na área de Linguística, com ênfase em Sociolinguística e Dialetologia, atuando principalmente nos seguintes temas: professor de Português, situações de bilinguismo, formação do professor. É autora e coautora de outras sete obras, entre elas, Universo acadêmico em gêneros discursivos (2010), Práticas de linguagem: gêneros discursivos e interação (2009) e Linguagem e práticas culturais (2006).

A obra em questão se apresenta dividida em oito capítulos estruturalmente independentes, podendo cada texto ser usado de forma individualizada sem prejuízo nenhum de compreensão por parte do leitor; ao mesmo tempo, são textos que podem vir a se complementar.

Os capítulos da obra são: (i) “Situações de bilinguismo e variação linguística no ensino”; (ii) “Estudos sociolinguísticos e valores”; (iii) “Estigma social da pronúncia no ensino do Português”; (iv) “Linguagem literária e os saberes”; (v) “A função do professor e o ato de ler do aluno”; (vi) “A leitura na formação científica do profissional”; (vii) “O meio cultural na formação do leitor”; e (viii) “A linguagem do teatro e a educação”. A obra completa apresenta 129 páginas.

O primeiro capítulo, “Situações de bilinguismo e variação linguística no ensino”, que contém os seguintes subtítulos: i.i) conceito de língua; i.ii) variação linguística; i.iii) noções de norma e (dialeto) padrão; i.iv) situações de bilinguismo; i.v) comunidades bilíngues e tipos de bilinguismo; i.vi) intereferências, empréstimos e influências de bilinguismo; e i.vii) referências, tem como base um estudo realizado no município de Flores da Cunha – RS, uma vez que esta localidade é caracterizada por apresentar diferentes modos de composição da fala bilíngue. Ainda apresenta como objetivo principal as definições operacionais dos seus tópicos secundários acima expostos. Procuro, assim, mencionar aqui diferenças, identidades e outras operações analíticas e interpretativas no desenvolvimento da temática. Tais definições se evidenciam como de suma importância devido à diversidade de pontos de interpretação, que os conceitos tratados neste estudo podem vir a ter.

Assim, o redimensionamento de conceitos gerais e amplos, como no caso de língua e de conceitos mais específicos, como de bilinguismo, podem vir a mostrar variedade ou graus de bilinguismo social, estando entre as principais referências utilizadas para as construções teóricas os textos de Câmara Júnior, Saussure, Titone, Savedra e Heye.

O objetivo do segundo capítulo, “Estudos sociolinguísticos e valores”, com os subtítulos: ii.i) “Interdisciplinaridade da sociolingüística”; ii.ii) “Definição de sociolingüística, segundo Berruto”; ii.iii) “Objeto e campos de ação da sociolinguística, conforme Berruto”; e ii.iv) “Referências”, é verificar que aspectos sociolinguísticos e culturais estão inter-relacionados na variedade do Português falada em uma região de descendentes de imigrantes italianos (Nordeste do Rio Grande do Sul). A importância deste estudo vem ao encontro de aspectos que nem sempre, nas diferentes pesquisas linguísticas, se dão conta da língua como um fenômeno global, fazendo com que a língua deixe de ser vista como prática cultural. Nesse capítulo também é abordado, de forma muito bem-amarrada com a história da própria sociolingüística, a questão da importância interdisciplinar da sociolinguística e que, devido a esse aspecto, é possível a realização de estudos sobre fenômenos culturais extralingüísticos, que interferem e influenciam no uso da língua e não somente dos aspectos linguísticos em si. As principais referências neste capítulo são Labov, Santos, Tarallo e Berruto.

No terceiro capítulo do livro em questão, “Estigma social da pronúncia no ensino do Português”; é tratada a questão da importância da pronúncia (sotaque de uma língua) sobre a perspectiva da atuação do Professor no ensino de português em situações de bilinguismo e em grau relativo (falantes que falam línguas de imigrantes, ou que não falam, mas entendem). Para ilustrar a situação da abordagem desse capítulo, são apresentados trechos de depoimentos de professores do Ensino Fundamental de uma região colonizada por imigrantes italianos, o que traz para o texto um sentido de empatia com o público-alvo da região onde está localizada a Universidade de Caxias do Sul. É notória, nesse texto, a relevância desses aspectos para a comprovação de que o ensino de Língua Portuguesa deve ter suas peculiaridades em regiões marcadas pela imigração, pois o bilinguismo é um traço antropológico que vai além do mero “erro de pronúncia lingüística”. Vale destacar os textos de Bisol, Câmara Júnior, Titone, Mescka e Weinreich, que compõem o quadro referencial deste capítulo.

O quarto capítulo “Linguagem literária e os saberes” versa sobre o fato de a literatura ficcional servir de momento de aprendizagem para o leitor, devido à sua característica primeira de entretenimento. O texto expõe, de forma clara e simples (sem ser simplória), a relação entre literatura ficcional, saberes e vida acadêmica. A autora afirma categoricamente que “o ato de ler obras literárias é algo fundamental para as funções sociais e profissionais, pois amplia a visão e a compreensão dos problemas do homem e do mundo”. (p. 69). Nesse capítulo, friso a diferenciação entre leitura técnica e literária, dada pela autora, via palavras de Giannetti. Existe ainda o cuidado da autora em não mascarar, nem tampouco sobrepor um tipo (ficcional) de leitura sobre outro tipo (técnico), deixando claros os saberes que cada leitura proporciona ao leitor. Para ilustrar as experiências trazidas pela leitura literária, a autora ilustra com depoimentos informais de leitores. Ainda é destaque, juntamente com Giannetti na construção teórica, os autores Barthes, Bourdieu e Merleau-Ponty.

Na sequência, no Capítulo 5, “A função do professor e o ato de ler do aluno”, com os subtítulos: v.i) “Nos bastidores: as providências”; v.ii) “As expectativas do público”; v.iii) “Primeiro ato: sala de aula”; v.iv) “Segundo ato: aplicação (é fazendo que se aprende)”; v.v) “Desce a cortina: aplausos”; e v.vi) “Referências”, a autora, fazendo uma analogia com a linguagem teatral, trata especificadamente sobre o ato de selecionar textos e como trabalhá-los com finalidades didático-pedagógicas. Por meio das palavras de Braga e Silvestre, a autora traz para a conversa a identificação generalista e vaga da intencionalidade na seleção de textos. Dessa forma, são apresentadas, no texto, questões norteadoras que servem para o esclarecimento de decisões sobre ações de leitura. Nesse capítulo, ainda, enfatiza como é importante que o professor tenha consideração com as expectativas do público-alvo para quem é destinada a escolha das leituras, pois é preciso criar condições favoráveis de leitura ao leitor, para que a experiência de leitura textual seja agradável, prazerosa, enfim que a leitura não seja um mero exercício, uma vez que “o papel do professor é semelhante àquele que pretende acender uma fogueira” (p. 84) que, uma vez acesa, queima sozinha. Ainda, no decorrer da leitura, são apresentadas atividades de leitura em três etapas que podem vir a auxiliar as atividades dos docentes, desde que processadas de forma integrada.

Nesse capítulo, são destaques as referências a Braga e Silvestre, Freire, Martins e Merleau-Ponty. Já no texto do Capítulo 6, “A leitura na formação científica do profissional”, com os subtítulos: vi.i) “Como transformar o estudo da língua em modos de formação”; e vi.ii) “Referências”, o foco de abordagem da autora recai sobre a necessidade de atribuições de sentido ao que se ensina e de sensibilidade no ato de ensinar, pois a leitura é uma atividade social que possibilita o desenvolvimento e o amadurecimento da criticidade e da criatividade. Nas palavras de Martins (1993, p. 102), o professor “precisa mostrar ao aluno que ler significa inteirar-se do mundo, sendo também uma forma de conquistar autonomia, de deixar de ler pelos olhos de outrem”. Mais ao fim do texto, são expostas de forma sutil as teorias de argumentação, aspecto que saliento como valioso no texto devido à sua importância, uma vez que a língua é, por excelência, comunicação. Entre as referências usadas pela autora para a construção do texto, destacam-se os estudos de Duranti, Paviani, Perelman e Oldrechts-Tyteca, Silva e Toulmin.

Em “O meio cultural na formação do leitor”, Capítulo 7, cujos subtítulos são: vii.i) “O meio cultural e a leitura”; vii.ii) “Leitura e aspectos socioculturais”; vii.iii) “Uma fotografia sociolinguística”; vii.iv) “Considerações finais”; e vii.v) “Referências”, tem como importantes as influências que o meio cultural exerce sobre os hábitos de leitura como prática cultural, partindo de dados coletados entre estudantes ingressantes no Ensino Superior. Os dados foram coletados no ano de 2002 (Tear1), aprendizes matriculados na disciplina de Língua Portuguesa Instrumental, da Universidade de Caxias do Sul, totalizando uma amostra composta por 144 alunos. Os instrumentos para obtenção dos dados foram: um questionário socioeconômico e cultural e um teste de leitura em que se verificou: dominância explicativa e argumentativa de gêneros textuais, respectivamente, reportagem e editorial. Os dados revelam que a família desses ingressantes é de etnia italiana, em sua maioria, não passando de 15% os pais que possuem formação em curso de nível superior. Sobre o incentivo à leitura, o dado levantado de maior destaque é o fato de a figura da mãe ser a grande incentivadora, ficando em segundo plano a escola. Os referenciais de destaque nesse trabalho são Bourdieu e Marcuschi, além de outros.

No oitavo, e último capítulo da obra em questão, “A linguagem do teatro e a educação”, com os subtítulos: viii.i) “Experiência humana”; viii.ii) “Atividade educativa”; e viii.iii) “Referências”, em forma de relato, são abordados as consequências e os resultados de uma experiência teatral como atividade educativa, que, por aproximadamente uma década, foi realizada em uma escola. Essa experiência lúdica tem, em sua essência, objetivos pedagógicos (expressão e comunicação) mais que objetivos técnicos e profissionais relacionados ao teatro. A autora toma o cuidado de examinar que atenção é dada ao tipo de texto para a peça teatral, devendo esse ser adequado às peculiaridades do grupo e da escola. Ao final do texto, é ratificado o emprego do teatro na escola como recurso potencial e acessível para que o aluno venha a “perceber e a expressar a si mesmo o mundo que o rodeia”. (p. 127). A referência usada nesse capítulo é Montenegro.

Os textos que compõem o livro Linguagem e educação apresentam como características de escrita a clareza e a preocupação de servirem de subsídios diretos para a prática pedagógica, o que pode ser atestado pela ordem dos textos que basicamente se dirigem da teoria para a prática em sala de aula. Ainda: enfatizo a importância do livro com base na ampliação dos fundamentos e conceitos que se circunscrevem à área educacional, a partir, especificadamente, de aspectos relacionados à linguagem, à educação, à leitura, à literatura, à variação linguística, à sociolinguística, entre outros. Com base na análise geral do livro, evidencia-se o imbricamento existente e que a autora clarifica entre linguagem e pensamento, interação, expressão corporal, o outro, com as origens e com o mundo que nos cerca, implicando, de tal maneira, o entendimento do ser humano como um ser social. Assim, justifica-se a frase de Guimarães Rosa, que serve de epígrafe à obra: “A linguagem e a vida são uma coisa só”.

Devido ao supraexposto, é reiterada aqui a recomendação da leitura deste livro por professores, acadêmicos de cursos de graduação em licenciaturas e acadêmicos de Pós-Graduação vinculados à linha de pesquisas da área de educação, linguagem e tecnologia, devido ao fato de essa obra se apresentar como geradora de ideias, de propor soluções de problemas ou de instigar a leituras complementares e diálogos.

Marcelo Prado Amaral Rosa – Licenciado em Química pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI), campus de Frederico Westphalen/RS. Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Caxias do Sul (UCS). E-mail: marcelo.pradorosa@yahoo.com.br

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Pesquisando fundamentos para novas práticas na educação online – MORAES et al (C)

MORAES, M. C.; PESCE, L.; BRUNO, A. R. (Org.). Pesquisando fundamentos para novas práticas na educação online. São Paulo: RG, 2008. 149 p. Resenha de: ROSA, Marcelo Prado Amaral. Conjectura, Caxias do Sul, v. 15, n. 2, p. 181-189, maio/ago. 2010.

O tema central do livro, Pesquisando fundamentos para novas práticas na educação online, é dirigido às considerações teórico-metodológicas, às abordagens educacionais e aos fundamentos epistemológicos que estão ocultos nas atuais práticas em educação online e tem como público-alvo os profissionais que estão de alguma forma relacionados à educação online na contemporaneidade.

A referida obra foi organizada por três autoras: Maria Cândida Borges de Moraes, Doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP). Atualmente é professora no Programa de Pós- Graduação em Educação na Universidade Católica de Brasília e pesquisadora do Grupo Internacional Consolidado de Pesquisa (Giad) da Universidade de Barcelona, Espanha. Tem experiência na área de educação, com ênfase em fundamentos da educação, Educação a Distância, atuando, principalmente, nos seguintes temas: epistemologia, didática, paradigma, complexidade, transdisciplinaridade, informática na educação e Educação a Distância (EAD). É autora e/ou coautora de outras 22 obras, sendo algumas dessas: i) Complexidade e transdisciplinaridade em educação: teoria e prática docente (2010); ii) Como pesquisar em educação a partir da complexidade e da transdiciplinaridade? (2008); iii) Ecologia de los saberes: una comunidad de conocimiento para una nueva conciencia (2008); iv) Pensamento eco-sistêmico (2008). Nessa obra, analisa as recomendações do documento do ForGRAD – Fórum de Pró-Reitores de Graduação das Universidades Brasileiras sobre políticas e diretrizes em EAD, destacando a necessidade de uma reconfiguração do cenário epistemológico dos ambientes digitais de aprendizagem; Lucila Maria Pesce de Oliveira (Lucila Pesce) é Doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP) e Pós- Doutora em Filosofia e História da Educação pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Professora adjunta nível I na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Tem pesquisado temas como: aprendizagem em ambientes digitais, formação de educadores em ambientes digitais, educação em saúde mediada por computador.

Publicou outros dois livros: i) Educação on-line: cenário, formação e questões didático-metodológicas (2010); ii) Formação on-line de educadores: identidade em construção (2009). Nessa obra, a autora promove uma reflexão sobre as possibilidades de se efetivar a avaliação formativa nos Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVAs); e Adriana Rocha Bruno é Doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP). Professora adjunta na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Atua principalmente nos temas: educação online, didática e didática online, aprendizagem de adultos em ambientes digitais, formação de educadores, neurociência e neuropsicologia, linguagem emocional e educação e tecnologias. Publicou em 2009, Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA): a prática com Moodle. Nessa obra, a autora anuncia a mediação partilhada e a interação digital, tecidas pela linguagem emocional, em ambientes de aprendizagem online como possibilidade para transformar a prática pedagógica em uma aprendizagem integradora.

A obra em questão está composta por elementos pré-textuais e textuais. Os primeiros são: capa, ficha catalográfica, dedicatória, epígrafe, prefácio, apresentação e sumário. Os segundos são compostos por seis capítulos escritos por seis diferentes autores; cada um dos capítulos apresenta subdivisões internas: i) Educação a Distância e a ressignificação dos paradigmas educacionais: fundamentos teóricos e epistemológicos: i.i) resumo; i.ii) introdução; i.iii) análise contextual da problemática educacional; i.iv) visão ecológica e sistêmica da realidade; i.v) ambiente digital de aprendizagem sob enfoque ecossistêmico; i.vi) reconfigurando o cenário epistemológico da EAD; i.vii) pressupostos teóricos e epistemológicos norteadores das ações de educação a distância; i.viii) princípios norteadores das ações em EAD; i.ix) considerações finais; i.x) referências bibliográficas; (Maria Cândida Moraes); ii) Avaliação formativa: desafio aos processos de formação veiculados nos ambientes virtuais de aprendizagem: ii.i) resumo; ii.ii) introdução; ii.iii) avaliação da aprendizagem e as distintas concepções educacionais; ii.iv) Avaliação formativa: primeiras aproximações; ii.v) avaliação nos Ambientes Virtuais de Aprendizagem: apontamentos iniciais; ii.vi) considerações finais; ii.vii) referências; (Lucila Pesce); iii) Mediação partilhada e interação digital: tecendo a transformação do educador em ambientes de aprendizagem on-line, pela linguagem emocional; iii.i) resumo; iii.ii) introdução; iii.iii) mediação pedagógica e interação digital; iii.iv) a mediação partilhada; iii.v) a mediação partilhada em ambientes de aprendizagem on-line; iii.vi) a linguagem emocional como “tom” da mediação partilhada; iii.vii) considerações finais; iii.viii) referências bibliográficas; (Adriana Rocha Bruno); iv) Planejamento em ação e sistemas sociais humanos: expressões do cuidado em educação on-line: iv.i) resumo; iv.ii) introdução; iv.iii) os alunos: seres vivos, seres humanos; iv.iv) o cuidado: identificando e respeitando diferentes estruturas; iv.v) o grupo: sistemas sociais humanos; iv.vi) o planejamento e a formação de sistemas sociais; iv.vii) o cuidado: identificando emergências; iv.viii) conclusão: o cuidado para não fechar… idéias; iv.ix) referências bibliográficas; (Rosamaria de Medeiros Arnt); v) Ambientes virtuais de aprendizagem: os velhos problemas dos ambientes presenciais?; v.i) resumo; v.ii) introdução; v.iii) ambientes de aprendizagem: algumas considerações; v.iv) conclusão; v.v) referências bibliográficas; (Duglas Wekerlin Filho); vi) Sentipensar, tecnologias e mídias digitais: possíveis interfaces do pensamento transdisciplinar no trabalho docente em ambiente virtual de aprendizagem: vi.i) resumo; vi.ii) introdução; vi.iii) objetivos; vi.iv) metodologia; vi.v) componentes teóricos de apoio à pesquisa; vi.vi) análise dos dados obtidos no campo de pesquisa: um olhar inicial; vi.vii) considerações finais; vi.viii) referências bibliográficas; (Acássia Araújo Barreto). A obra completa apresenta 149 páginas.

No capítulo “Educação a Distância e a ressignificação dos paradigmas educacionais: fundamentos teóricos e epistemológicos”, o objetivo principal é analisar as recomendações estabelecidas no documento apresentado no Fórum Nacional de Pró-Reitores de Graduação das Universidades Brasileiras (ForGRAD), em setembro de 2002. De forma introdutória, a autora destaca a potencialidade da Educação a Distância (EAD) para a democratização do acesso à educação, frisando que a mesma não deve ser vista como a redentora dos problemas educacionais nacionais.

Ainda: observa que a política estabelecida no ForGRAD é de apontamento e não de operacionalização da EAD. Na subdivisão i.iii, a autora destaca duas realidades que a sociedade vive na contemporaneidade, em virtude da globalização: a expansão tecnológica e a expansão da pobreza. Como consequência dessas duas realidades, a crise nos fundamentos do conhecimento reflete-se no sistema educacional. Salienta o despreparo dos atores educacionais para atuarem em um mundo que funciona em rede. Ao fim dessa subdivisão, evidencia a importância da EAD pela possibilidade de vir a colaborar para a ressignificação dos paradigmas educacionais em voga. Na subdivisão capitular seguinte, i.iv, a autora destaca que, em função do funcionamento do mundo (sistêmico-organizacional), existe a necessidade de revisão dos paradigmas educacionais. Ressignificar tais paradigmas, partindo da visão ecossistêmica, significa compreender a relação indissociável entre indivíduo e contexto, pois a aprendizagem é fruto de uma cooperação global que envolve todo o organismo. Na subdivisão capitular que segue, i.v, a autora define e diferencia, superficialmente, ambientes digitais de aprendizagem construcionistas e instrucionistas. Na i.vi, é explicitado que ressignificar os paradigmas educacionais implica escolha de princípios e teorias que sejam capazes de fundamentar e organizar o conhecimento a ser construído no ambientes de aprendizagem, conhecimento esse amparado por um novo paradigma (ecossistêmico); a partir desse novo paradigma, é possível desenvolver uma nova práxis cognitiva/emocional.

Na i.vii, são apresentados pela autora seis desdobramentos provenientes dos pressupostos norteadores das propostas em EAD e que foram indicados no documento ForGRAD, tendo como referência o livro Paradigma educacional emergente (1997). Na i.viii, a autora traz sete princípios norteadores das atividades em EAD de acordo com o documento Forgrad: autonomia, pesquisa, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade, relação teoria e prática, trabalho colaborativo, dialogicidade e construcionismo contextualizado. Na i.ix, a autora destaca que o conhecer e o aprender são processos complexos que emergem, de dentro para fora, a partir de relações entre sujeito e objeto na criação de circunstâncias que possibilitem vivências significativas aos sujeitos aprendentes.

No capítulo “Avaliação formativa: desafio aos processos de formação veiculados nos Ambientes Virtuais de Aprendizagem”, o objetivo principal é refletir sobre as possibilidades de se efetivar a avaliação formativa nos AVAs. Na subdivisão capitular ii.iii, a autora traz os desdobramentos das cinco perspectivas ideológicas básicas, das quais se originam diferentes concepções de avaliação de aprendizagem, juntamente com os diferentes paradigmas educacionais existentes e seus reflexos nas práticas de avaliação. Na ii.iv, a autora distingue avaliação formativa de avaliação somativa, discorrendo e salientando a primeira, na qual é buscada a adequação entre diagnóstico inicial do processo educativo e o tratamento didático a ser implementado. Na subdivisão seguinte, ii.v, a autora procura analisar as especificidades dos AVAs e avançar na reflexão acerca dos recursos dos ambientes de rede que podem contribuir com a efetivação da avaliação formativa. Ao fim, a autora aprofunda a discussão sobre as possibilidades de se efetivar a avaliação formativa nos ambientes de rede, baseada em três categorias: avaliação e metarreflexão; leitura, escrita e avaliação; e avaliação e situação de interlocução. Na ii.vi, é afirmado que a maioria dos AVAs oferece recursos para que se efetive a avaliação formativa, sendo que essa contribui com uma melhor intervenção docente na aprendizagem do aluno, contribuindo para o estabelecimento de uma atitude discente reflexiva sobre seu próprio percurso.

No capítulo “Mediação partilhada e interação digital: tecendo a transformação do educador em ambientes de aprendizagem online, pela linguagem emocional”, o objetivo principal é refletir a respeito da mediação partilhada e da interação digital, tecida pela linguagem emocional em ambientes de aprendizagem online, como possibilidade transformar a prática pedagógica. Na iii.iii, a autora acentua a importância dos conceitos de interação, mediação pedagógica e interatividade, para focar a linguagem como um instrumento mediador no processo de mediação, uma vez que a mediação pedagógica é gerada na interação.

Na subdivisão seguinte, iii.iv, o foco é a construção de um ambiente que favoreça ao aluno ser um ser ativo no processo de aprendizagem, materializando, assim, a parceria entre formador-pesquisador e alunospesquisadores.

Na iii.v, é ressaltado que a intencionalidade nem sempre é suficiente para se atingirem os objetivos da mediação partilhada. Nessa subdivisão, iii.vi, é evidenciada a importância da linguagem emocional utilizada pelo mediador nos ambientes online, pois a linguagem emocional empregada pode ser uma ponte ou um abismo para o diálogo.

Por fim, na iii.vii, para haver mediação pedagógica em AVAs, o professor necessita estar envolvido com o tema a ser trabalhado para, assim, ter condições de contagiar o resto do grupo.

No capítulo “Planejamento em ação e sistemas sociais humanos: expressões do cuidado em educação on-line”, o objetivo principal é refletir e apresentar alguns questionamentos sobre o planejamento em ação e a formação de sistemas sociais em cursos a distância, apoiados nos pressupostos dos autores Maturana e Varela. O enfoque é a ideia do cuidado, sendo esse uma atitude que envolve preocupação com o outro, além de uma relação afetiva que remete à responsabilidade. Na iv.iii, a autora proporciona uma visão panorâmica da teoria autopoiética de Maturana e Varela. Na iv.iv, é explicitado o cuidado que deve ser tomado quando se é coordenador de um ambiente de aprendizagem e ao se planejar estratégias que permitam conhecer a estrutura de cada participante. Na subdivisão que segue, iv.v, há uma conceitualização de grupo voltada aos ambientes de aprendizagem, além de uma definição de sistemas sociais e implicações que daí decorrem, de acordo com Maturana. No seguimento capitular, na iv.vi, a autora traz os conceitos de intenção e atenção ao iniciar o planejamento de um curso de ambiente digital, correlacionando esses conceitos com a função dos participantes dos sistemas sociais. Na sequência do capítulo, na iv.vii, são evidenciadas as diferentes situações de participação em cursos a distância (visível, invisível e ausente), podendo, assim, através do cuidado e da atenção, identificar as emergências que acabam interferindo nas interações. Na subdivisão que encerra o corpo do capítulo, iv.viii, os AVAs apresentam vantagens e desvantagens em relação aos ambientes presenciais de aprendizagem e que, mesmo tendo os objetivos planejados de forma clara, não se pode traçar previamente todos os caminhos dos cursos a distância.

No capítulo “Ambientes Virtuais de Aprendizagem: os velhos problemas dos ambientes presenciais?”, o objetivo principal é apresentar alguns problemas que ocorrem nos ambientes de aprendizagem, virtuais ou presenciais, elencando algumas situações que demonstram como esses problemas surgem e como podem ser superados. Na subdivisão terceira desse capítulo, v.iii, o autor apresenta um panorama geral sobre os ambientes de aprendizagem, fazendo relações com a velocidade da produção do conhecimento na sociedade, entre o ensino presencial, o ensino virtual e a presença da tecnologia nas escolas. Afirma, ainda, que não basta ter tecnologia para uma aprendizagem satisfatória dos aprendizes, pois o que tem que mudar é a forma de mediação pedagógica do professor com base na emoção e no cuidado; esse é o papel principal do professor: mediador das situações de aprendizagens. Na v.iv, o autor salienta que há muitos problemas nos ambientes presenciais que ocorrem também nos ambientes virtuais, porém podem ser superados a partir das possibilidades oferecidas em literatura de acesso geral. A autora acrescenta, também, que os problemas específicos dos AVAs necessitam ser avaliados com maior profundidade, o que não implica evidentemente imobilizar os processos de uso de tecnologias em educação.

No último capítulo: “Sentipensar, tecnologia e mídia digitais: possíveis interfaces do pensamento transdisciplinar no trabalho docente em Ambiente Virtual de Aprendizagem”, o objetivo é analisar as possíveis interfaces do pensamento transdisciplinar na ação docente, no contexto da formação de professores desenvolvida com AVAs. Nas subdivisões seguintes do capítulo, a autora descreve as partes do projeto “Sentipensar, tecnologias e mídias digitais: educando desde e para a vida”, destinado a professores das escolas públicas do Estado de Sergipe. Além disso, a autora também buscou examinar as possibilidades de criação de cenários e redes de aprendizagem integrada na formação docente e refletir sobre o papel docente, observando a necessidade de construção de uma nova prática diante das emergências, especialmente em atividades de formação de professor. Na vi.iv, é descrita a ambientação, a abordagem e os procedimentos do projeto. Na vi.v, consta a base teórica do projeto, embasada, fundamentalmente, na transdisciplinaridade, complexidade, no pensamento ecossistêmico, na mediação pedagógica e formação docente. Na vi.vi, os dados coletados indicaram a presença de categorias que se mesclaram e se revezaram ao mesmo tempo. Ainda: evidenciou que a atividade docente se desenvolveu sobre três eixos: a espera vigiada, o rigor científico, e a amorosidade. Encerrando o capítulo, no vi.vii, a autora afirma que os cursos de formação de professores devem erguer sua metodologia focada na ecologia dos saberes, sendo que as mudanças que se pretende nos cursos de formação de professores implicam um processo de transformação do educador.

Os aspectos gerais e específicos, que seguem abaixo, sobre o livro resenhado, ratificam a recomendação dessa leitura para profissionais e/ ou estudantes envolvidos com a linha tecnologias e educação.

  • Aspectos gerais: 1. as autoras organizadoras da obra são autoridades reconhecidas nacional e internacionalmente, quando se trata da temática educação e tecnologia, o que potencializa a tendência de indicação do livro; 2. na obra é ampliada a visão sobre os fundamentos e conceitos que rodeiam o tema educação online, favorecendo um panorama geral aos interessados pela área em que se enquadra o livro; 3. os textos (capítulos) apresentam uma característica de clareza e padronização de escrita, o que certamente favorece o entendimento das abordagens teóricas e metodológicas apresentadas como essenciais, visando a discussões sobre educação online; e a montagem do livro, em relação à ordem dos capítulos apresentada aos leitores, demonstra uma preocupação com uma leitura que introduza de forma gradual o leitor na área da educação mediada pela tecnologia, pois o livro inicia com fundamentos teóricos e epistemológicos e finaliza com a aplicação de um projeto baseado em um AVA.
  • Aspectos específicos: Capítulo 1: traz uma análise pontual e esclarecedora da autora sobre as recomendações estabelecidas no documento que contém a política e as diretrizes para uso da EAD nos cursos de graduação (ForGRAD); Capítulo 2: apresenta, de forma concisa e dentro de uma cronologia, as perspectivas ideológicas das quais se originam diferentes concepções de avaliação de aprendizagem, além de trazer, da mesma maneira que o Capítulo 1, os paradigmas educacionais existentes e seus reflexos nas práticas de avaliação; Capítulo 3: Explicita os conceitos de mediação e interação digital, de modo a dar o “tom” da compreensão que a autora espera que o leitor venha a ter dentro do contexto que ela estabelece; Capítulo 4: aborda predominantemente o cuidado necessário com o planejamento e a formação de sistemas sociais em EAD, sob a lente das formas de participação que os AVAs propiciam, fazendo com que seja despertada a atenção para as intenções dos partícipes dos ambientes de aprendizagem; Capítulo 5: o autor traça um paralelo comparativo entre os problemas que se apresentam nos ambientes de aprendizagem, presenciais e virtuais, alertando para o risco de que a tecnologia venha a ser apenas uma “nova roupagem” metodológica, e não, um modo privilegiado de mediar a aprendizagem dos aprendizes; e Capítulo 6: a autora apresenta o projeto “Sentipensar, tecnologias e mídias digitais: educando desde e para a vida”, indo da sua elaboração até algumas considerações sobre o potencial deste e alguns resultados obtidos. Esse capítulo fornece subsídios preciosos para a avaliação de projetos que incluam o uso de tecnologias na educação.

Referências

MORAES, M. C.; PESCE, L.; BRUNO, A. R. (Org.). Pesquisando fundamentos para novas práticas na educação online. São Paulo: RG, 2008. 149 p.

Marcelo Prado Amaral Rosa – Licenciado em Química pela Universidade Regional Integrada e do Alto Uruguai (URI), campus de Frederico Westphalen/RS. Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Caxias do Sul (UCS). E-mail: marcelo.pradorosa@yahoo.com.br

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