Circulação de saberes no Mundo Atlântico: escrita da história, cultura letrada e cultura científica / Clio – Revista de Pesquisa Histórica / 2014

A chegada dos europeus ao Novo Mundo promoveu, desde os primeiros contatos que se estabeleceram com as populações nativas, a produção de uma extensa e diversificada gama de documentos oficiais, relatos de viagens, crônicas, tratados, desenhos, mapas, inventários de história natural e coleções de espécimes. Mais do que meras percepções da Europa acerca do mundo que a expansão marítima, a conquista e a colonização criaram, esta produção escrita, iconográfica e cartográfica evidencia tanto a circulação de ideias, pessoas, objetos, saberes e práticas, quanto as configurações étnicas e identitárias resultantes do intenso contato intercultural. Uma produção que aponta, portanto, para a intensa circulação de ideias e de conhecimentos entre a América, a África e a Europa ocorrida durante a Idade Moderna.

Este dossiê foi organizado, justamente, para divulgar os trabalhos de pesquisadores que, à luz das contribuições da História Social, Cultural e das Ciências, vêm refletindo sobre este intenso processo de circulação de ideias, saberes e práticas que se estendeu do século XVI ao XIX. Como o leitor poderá acompanhar nas páginas seguintes, os artigos que compõem este dossiê se debruçam sobre essa temática a partir de diferentes abordagens e refletem sobre sujeitos, espaços e tempos distintos, não descuidando de discutir sobre as diversas maneiras de se escrever a história destas incontáveis e intensas situações de interculturalidade. Situações que alimentaram um movimento contínuo de cruzamento e reposição de fronteiras territoriais, étnicas e políticas, que articularam diferentes estratégias individuais, coletivas e institucionais, e favoreceram diferentes fluxos de informações e de apropriações materiais ou simbólicas.

No primeiro artigo, intitulado Entre homens de saber, de letras e de ciências, médicos e outros agentes da cura no Brasil Colonial, Ana Carolina de Carvalho Viotti nos oferece uma ampla caracterização do período que antecedeu o estabelecimento da Corte portuguesa, evento que acabaria por introduzir e difundir o ensino e a prática essencialmente médica no Brasil do início do século XIX. De acordo com a autora, o período colonial foi marcado pela pluralidade de agentes e saberes curativos e pelo intenso intercâmbio entre as ideias advindas do Velho Mundo e as necessidades – e possibilidades – que os trópicos criavam aos que neles viviam.

O pão das Índias: o milho nos relatos de Diego Durán e José de Acosta é o título do artigo de Luís Guilherme Assis Kalil e Renato Denadai da Silva. Nele, os autores analisam textos produzidos pelo dominicano Diego Durán e pelo jesuíta José de Acosta, enfocando a compreensão que tiveram do universo indígena, em especial da relação estabelecida entre a alimentação e as crenças indígenas, tema ainda pouco explorado pela historiografia sobre as Américas. Kalil e Denadai da Silva não apenas identificam diversas representações do milho, como destacam seu papel de mediador na incorporação intelectual de um universo natural e moral distinto do dos europeus.

No terceiro artigo, intitulado Mediações culturais no além-mar: O padre Mamiani e os usos da Língua Kariri nas brenhas dos sertões, Ane Luíse Mecenas Santos aborda o papel de mediador cultural desempenhado pelo padre jesuíta Mamiani que, encarregado da conversão de indígenas Kiriri, grupo que não falava a língua geral e vivia nos sertões da Capitania de Sergipe Del Rey, escreveu, ao final do século XVII, uma gramática e um catecismo, através dos quais é possível reconstituir aspectos da cultura Kiriri, em especial, de suas manifestações de religiosidade.

Clio no Ultramar: elementos da historiografia portuguesa nas narrativas seiscentistas da “guerra holandesa” é o título do artigo de Kleber Clementino, para quem a historiografia portuguesa reverbera nas narrativas sobre a presença holandesa no Atlântico Sul (1630-1654), indicando que, embora as obras devam ser lidas em diálogo com seus contextos históricos específicos, as concepções de história e os elementos retóricos que as caracterizam se inspiram em um paradigma historiográfico enraizado na Península Ibérica.

No artigo seguinte, A escrita e o envio de cartas do governador-geral Francisco Barreto (1657-1663), Caroline Garcia Mendes destaca a importância da correspondência para a comunicação e para a administração portuguesa no além-mar no século XVII. A autora analisa, especificamente, as cartas enviadas pelo governador-geral Francisco Barreto a oficiais no interior do Estado do Brasil e para o Reino, entre os anos de 1657 e 1663, discorrendo sobre as redes de informação que se formaram entre a Europa e a América portuguesa no período.

Já Antonio Astorgano, em La difícil circulación de los libros devocionales del jesuíta mexicano José Ignacio Vallejo (1772-1788) analisa a trajetória desse padre da Companhia de Jesus, destacando sua atuação em colégios da Guatemala e da Itália. O autor explora suas relações pouco amistosas com personagens como Ventura Figueroa e, também, com o conde de Floridablanca, com o duque de Grimaldi e com José Nicolás de Azara, embaixadores junto à Santa Sé, vinculando-as às dificuldades de introdução e circulação de seus livros de devoção na América.

Também Marcelo Cheche Galves e Romário Sampaio Basílio, no artigo intitulado Saberes em circulação na América portuguesa: os estudantes maranhenses na Universidade de Coimbra (1778-1823), se dedicam à análise da circulação de impressos em São Luís do Maranhão e em Lisboa, no período de 1778-1823, com base na documentação da Real Mesa Censória, preservada pelo Arquivo Nacional da Torre do Tombo. Além de apontar para as razões da circulação de homens e livros em um momento de importantes transformações na Capitania, os autores referem a prática das remessas de impressos por estudantes maranhenses formados em Coimbra, destacando algumas das obras enviadas ou trazidas em suas bagagens.

O artigo Viagem ao Brasil: produção e circulação entre o público europeu do século XIX de Igor de Lima e Silva encerra o dossiê. O autor aborda a produção e a circulação da narrativa Viagem ao Brasil, do naturalista prussiano Maximiliano de Wied-Neuwied, que percorreu regiões do Brasil entre os anos de 1815 a 1817. A infinidade de informações sobre a fauna, a flora e os povos indígenas que Wied-Neuwied recolheu foi – após seu retorno à Europa – reunida e divulgada sob a forma de livro. Os dois volumes de Viagem ao Brasil foram lançados em 1821-1822 alcançando grande repercussão, com várias edições e traduções para vários idiomas. Lima e Silva se detém na análise dessas diferentes edições e traduções que a obra teve ao longo do século XIX, identificando e refletindo sobre as significativas alterações e sobre os efeitos da “imagem difusa” – e até deturpada – que elas ajudaram a difundir.

Na seção de artigos livres, o leitor poderá travar contato com duas produções de temáticas distintas, mas que acabam por fornecer um quadro sobre aspectos da economia e da cultura religiosa na América portuguesa do Antigo Regime – conferindo, em termos de conjuntura, um valor complementar aos estudos do dossiê.

Breno Almeida Vaz Lisboa, em seu artigo Engenhos, açúcares e negócios na capitania de Pernambuco (c. 1655 – c. 1750), procura pensar a economia açucareira da capitania pernambucana entre o fim do século XVII e o início do XVIII. A despeito da crise economia seiscentista, o autor constata que novos engenhos foram levantados nessa capitania entre as décadas de 1650 e 1750. Tal dado, segundo ele, aponta para o desenvolvimento de práticas comerciais paralelas que, por sua vez, ajudariam à indústria açucareira a contornar os problemas econômicos pelos quais passava.

Já o artigo de André Cabral Honor intitulado Origem e expansão no mundo luso da observação de Rennes: a mística-militante dos carmelitas turônicos ou reformados no século XVII e XVIII discute as ressonâncias da formulação das Constituições Carmelitas da Estrita Observância no contexto da América portuguesa. Vulgarmente denominadas de “Reforma Turônica”, tais constituições forneceram aos carmelitas calçados uma legislação que buscava conciliar a experiência mística à catequese. Segundo o autor, ainda que os seguidores dessa nova observância não tenham formado uma nova ordem religiosa, ela acarretou na divisão dos frades carmelitas que daria origem à Província Reformada de Pernambuco, no ano de 1725.

Os trabalhos publicados nesta edição oferecem, direta ou indiretamente, uma radiografia da cultura escrita no Mundo Atlântico. Uma cultura que participou na formação de modelos explicativos coevos (historiográficos, científicos, etc.); enriqueceu-se pela circulação de homens de letras e de seus escritos; reafirmou, validou e traduziu – através de práticas discursivas – políticas administrativas, espaços de domínio e padrões de sociabilidade.

Fechando esta edição, contamos com uma resenha crítica que analisa a obra recém publicada de Antônio Jorge Siqueira, Labirintos da Modernidade: memória, narrativa e sociabilidades, de autoria de Márcio Ananias Ferreira Vilela.

Juntamente com o editor da Revista Clio e os autores dos artigos do presente número de 2014 – aos quais agradecemos pelas contribuições –, oferecemos este dossiê com a expectativa de que seus leitores dêem continuidade ao esforço de compreensão e de reflexão sobre as formas que a circulação de ideias e de conhecimentos entre América, África e Europa assumiu e sobre seus efeitos nas configurações sociais, culturais e políticas nas duas margens do Atlântico.

Eliane Cristina Deckmann Fleck – UNISINOS

Marília de Azambuja Ribeiro – UFPE


FLECK, Eliane Cristina Deckmann; RIBEIRO, Marília de Azambuja. Apresentação. CLIO – Revista de pesquisa histórica, Recife, v.32, n.1, jan / jun, 2014. Acessar publicação original [DR]

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Estudos Jesuíticos (II) / Clio – Revista de Pesquisa Histórica / 2009

É com grande satisfação que oferecemos ao nosso leitor o segundo volume do Dossiê “Estudos Jesuíticos”, por nós organizado para a Revista Clio – Série Histórica.

Neste segundo volume, estão reunidos nove novos artigos, frutos do trabalho de importantes pesquisadores que atualmente, sob diversos enfoques, tem se dedicado ao estudo da atuação e da presença jesuítica em Portugal e seu império.

No primeiro texto, a Professora Eliana Cristina Deckmann Fleck da Universidade do Vale dos Sinos (UNISINOS), propõe em Beato, sim. Santo, não! José de Anchieta, de Apóstolo e Taumaturgo do Brasil a construtor da nacionalidade, faz uma reflexão sobre a maneira como se deu o resgate da figura do Padre José de Anchieta, em meados da década de sessenta, por meio da exaltação de sua força moral, visando a difundir um projeto de defesa da integridade territorial e de luta contra as ameaças estrangeiras. Neste trabalho encontramos uma análise sobre como se criou uma memória histórica do Padre Anchieta que o fizesse integrar o panteão dos heróis nacionais e que permite compreender o apoio recebido pela causa de sua beatificação.

Debatendo importantes questões sobre a relação entre missionários e nativos, apresentamos também o artigo De gentis a defensores da missão: os Jeberos e as missões de Maynas, do Professor Fernando Torres-Londoño da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Aqui é proposta uma análise sobre a configuração e a aplicação das categorias de “gentio” e “cristão” na relação entre missionários e índios.

Em Rosário da Concórdia: Vieira e os fundamentos místicos da paz social, o professor Guilherme Amaral Luz da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) propõe um estudo dos sermões do Padre Antônio Vieira sobre a escravidão, devotados a Nossa Senhora do Rosário, no esforço de compreender os preceitos teológico-políticos dos inacianos com relação à escravidão africana.

Também analisando a obra de Padre Antônio Vieira, o artigo do professor Luís Felipe Silvério Lima, da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), As partes e gentes da África na obra de Padre Antônio Vieira: a construção da figura literária e a idéia de Quinto Império, busca apontar o debate em torno das categorias das partes e gentes do mundo na obra do Padre Vieira, tendo em vista o projeto do Quinto Império e qual seria o lugar ocupado pela África e pelos escravos negros no Brasil em tal projeto.

Trabalhando em parceria, a pesquisadora do Museu de Astronomia e Ciências Afins e professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) Heloísa Meireles Gesteira e a mestranda da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Alessandra dos Santos Teixeira procuraram mostrar como as práticas médicas empreendidas pelos jesuítas no Brasil Colonial não podem ser entendidas como mera apropriação de técnicas indígenas ou apenas fruto de necessidades circunstanciais, nem tampouco uma simples cópia do que se fazia na Europa, analisando como se deram a produção, a sistematização e circulação do conhecimento médico, sobretudo na América Portuguesa.

Mostrando um horizonte inusitado da atuação dos missionários jesuítas no Brasil, o último artigo deste dossiê é de autoria de Ronaldo Vainfas, professor titular da Universidade Federal Fluminense (UFF). O ‘Plano para o bom governo dos índios’: um jesuíta a serviço da evangelização calvinista no Brasil holandês analisa o projeto missionário adotado pelos calvinistas no Brasil holandês, que fora apresentado ao conselho diretor da Companhia das Índias Ocidentais pelo jesuíta convertido ao calvinismo Manoel de Moraes, que se tornara consultor dos holandeses para assuntos relacionados ao Brasil.

Contribuindo ainda mais com a diversidade de nosso dossiê, apresentamos o trabalho Estudos sobre a contribuição da Antiga Companhia de Jesus ao desenvolvimento dos saberes sobre o psiquismo humano no Brasil Colonial, da professora da Universidade de São Paulo Marina Massimi. Esse artigo busca destacar a contribuição dos jesuítas na criação de formas e métodos do conhecimento da subjetividade e do comportamento humanos.

Analisando a organização das instituições de ensino jesuíticas em Portugal e em seu império, Marília de Azambuja Ribeiro, professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em seu artigo Marquês de Pombal e o fim do projeto educacional jesuítico em Portugal e seu império (séculos XVI-XVIII), procura mostrar como os colégios de Portugal se constituíram no modelo das escolas na América Portuguesa.

Já os pesquisadores Pablo Iglesias Magalhães, doutorando em História pela Universidade Federal da Bahia, e Maria Hilda Paraíso, professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA), nos trazem em Cartas do Padre Fernão Cardim (1608-1618), transcrições e análise de duas importantes cartas do Provincial da Ordem no Brasil e reitor do Colégio da Bahia: a Carta Ânua, de 1607, e uma outra inédita, de 1618.

O Dossiê Estudos Jesuíticos inclui ainda a transcrição de um documento inédito: Auto de seqüestro e inventario que Dor João Cardozo de Azevedo Dezembargador dos Aggravos da Rellação do Rio de Janeiro mandou fazer em virtude da ordem abaixo copiada da fazenda de Macâe que tem os pes da Comp. do Collegio da mesma Cidade no caminho que vai para os lados denominados Campos dos Gaytacazes, que foi transcrito e comentado pela Professora Márcia Amantino, da Universidade Salgado de Oliveira.

O volume também consta de três artigos e uma resenha, externos ao Dossiê. O primeiro artigo é de autoria do professor José Bento Rosa da Silva, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), no qual ele investiga a importância da Serra da Barriga como referência de identidade para militantes do Movimento Negro Brasileiro; o segundo texto, em co-autoria da Doutora Clarissa Nunes Maia e do Mestre Flávio de Sá Cavalcanti de Albuquerque Neto, ambos titulados pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), analisa algumas dificuldades enfrentadas na administração da Casa de Detenção do Recife, na segunda metade do século XIX; por fim, a professora Kalina Vanderlei Silva, da Universidade de Pernambuco (UPE) estuda o processo de conquista do sertão empreendido pela Coroa portuguesa e pelas autoridades coloniais, observando o emprego da organização militar das vilas açucareiras sob jurisdição de Pernambuco e Bahia na segunda metade do século XVII. Este volume se encerra com uma resenha do livro A formação da elite colonial. Brasil (c. 1530 – c. 1630)¸de Rodrigo Ricúpero, feita pelo professor George Félix Cabral de Souza, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

Recife, agosto de 2009

Marília de Azambuja Ribeiro


RIBEIRO, Marília de Azambuja. Apresentação. Apresentação. CLIO – Revista de pesquisa histórica, Recife, v.27, n.2, jul / dez, 2009. Acessar publicação original [DR]

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Estudos Jesuíticos (I) / Clio – Revista de Pesquisa Histórica / 2009

É com grande satisfação que oferecemos ao nosso leitor mais um número da Revista Clio – Série Histórica, o qual contém o primeiro dos dois volumes do Dossiê “Estudos Jesuíticos” por nós organizado.

Tema tradicional e de enorme importância para nossa historiografia, os estudos jesuíticos, nos últimos anos, tem atraído novos pesquisadores e vem conhecendo uma profunda renovação de temáticas e abordagens.

A organização desse Dossiê, então, permitiu a reunião de uma amostra significativa da mais recente produção acadêmica sobre a atuação da Companhia de Jesus no mundo luso-americano.

Neste primeiro volume, estão reunidos os oito primeiros artigos, frutos do trabalho de importantes pesquisadores que atualmente, sob diversos enfoques, tem se dedicado ao estudo da atuação e da presença jesuítica em Portugal e seu império.

O primeiro artigo, intitulado As prisões e o destino dos jesuítas do Grão-Pará e Maranhão: narrativa apologética, paradigma de resistência ao anti-jesuitismo, do professor SJ Luiz Fernando Medeiros Rodrigues, da Universidade do Vale dos Sinos (UNISINOS), é um estudo dos meios de resistência adotados pelos os religiosos da Companhia de Jesus perante o anti-jesuitismo pombalino.

A professora Márcia Eliane Alves de Souza e Mello, da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), por sua vez, nos apresenta, em seu artigo O Regimento das Missões: poder e negociação na Amazônia Portuguesa, um novo estudo sobre a formação do Regimento das Missões no Maranhão e Grão-Pará, enfatizando as negociações entre o poder central e as elites locais na formulação da legislação.

Ocupando-se do mesmo contexto geográfico, o professor Rafael Chambouleyron, da Universidade Federal do Pará (UFPA), analisa as percepções dos jesuítas em torno dos problemas do uso da força de trabalho indígena na Amazônia, ao longo da segunda metade do século XVII.

Deixando o espaço do Estado do Grão-Pará e Maranhão pelo do Estado do Brasil, a professora Maria Emília Monteiro Porto, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), traz seus Estudos sobre as missões jesuíticas na Capitania do Rio Grande: arcaísmo e modernidade nas fronteiras coloniais.

Seguem-se as contribuições do professor Carlos Alberto M. R. Zeron, da Universidade de São Paulo (USP) e do professor Rafael Ruiz, da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Ambos os textos baseiam-se nos conteúdos jurídicos da Apologia pro paulistis, texto inédito, por eles transcrito e traduzido e que se encontra publicado ao fim deste volume.

O texto de Carlos Zeron, intitulado Interpretações das relações entre ‘cura animarum’ e ‘potestas indirecta’ no mundo luso-americano, debate elementos importantes sobre a orientação teórica da missionação jesuítica no Brasil, discutindo a maneira como certas noções dominantes em âmbito europeu foram incorporadas localmente pelos missionários da Província do Brasil e propondo uma reflexão sobre a dimensão política da missão jesuítica na América Portuguesa.

Já o artigo A Interpretação das leis reais: Ambigüidade e prudência no poder das autoridades locais na América do século XVII do professor Rafael Ruiz propõe um exame de como a interpretação de leis por juristas e teólogos residentes na América era usada pelas esferas de poder locais na consecução de seus interesses.

O sétimo, e mais longo artigo apresentado neste dossiê, nos foi gentilmente enviado pelo Professor Adone Agnolin, também da Universidade de São Paulo (USP), com o título: Religião e Política nos ritos de Malabar: Interpretações diferenciais da missionação jesuítica na Índia e no Oriente (séc. XVII); ele procura discutir a polêmica desencadeada a partir da tentativa do jesuíta italiano Roberto de’Nobili de conciliar hinduísmo e cristianismo na empresa evangelizadora em Madurai, que traria um conflito nas missões indianas quanto à concessão do direito aos neófitos de continuar a praticar alguns ritos ligados à tradição de seus país e, posteriormente, uma divergência na interpretação de tais ritos.

Por fim, o professor Luís Miguel Carolino, da Universidade de Lisboa, especialista em história da ciência, em O paraíso do astrônomo, analisa a teoria do céu empíreo, segundo o astrônomo Cristóforo Borri (1583-1632). Teoria essa amplamente defendida pela intelectualidade católica do período moderno, em particular pelos membros da Companhia de Jesus.

Sempre no contexto do Dossiê, podemos incluir a contribuição da doutoranda pela École des Hautes Études en Sciences Sociales: Camila Loureiro Dias, que nos enviou a resenha da obra Los jesuítas e la modernidad en Iberoamérica, organizada por Manuel Marzal e Luis Bacigalupo.

O volume também consta de dois artigos, externos ao Dossiê, um do professor Carlos Alberto Cunha Miranda, outro do professor Ricardo Pinto de Medeiros, ambos da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). O primeiro trata do interessante tema da repercussão do pensamento eugênico no Brasil durante os séculos XIX e XX; o segundo, por sua vez, aborda o papel dos povos indígenas nas guerras de conquista do sertão nordestino no período colonial.

Assim, satisfeitos com os resultados obtidos, agrademos a todos aqueles que de algum modo permitiram a realização deste volume.

Recife, junho de 2009

Marília de Azambuja Ribeiro


RIBEIRO, Marília de Azambuja. Apresentação. CLIO – Revista de pesquisa histórica, Recife, v.27, n.1, jan / jun, 2009. Acessar publicação original [DR]

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