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Leituras e Tratamentos de Fontes na História / Revista Eletrônica História em Reflexão / 2009
“Leituras e Tratamentos de Fontes na História” é o dossiê desta V Edição da Revista Eletrônica História em Reflexão. A idéia desta temática é inegavelmente oriunda das conhecidas insônias daqueles que se aventuram a escrever a História. Para estes as fontes são seu mais rentável e, é claro, seu mais problemático combustível. Assim, abrir a discussão sobre as fontes historiográficas – como já esperávamos – rendeu um alto número de artigos das mais diversas abordagens. Tivemos uma movimentação intensa em nossa caixa de e-mails com trabalhos provindos de quase todos os Estados brasileiros.
No lançamento da idéia deste dossiê, os editores estiveram reunidos para a montagem da capa desta edição. Criamos várias imagens com materiais do Centro de Documentação Regional da UFGD na tentativa de enquadrar visualmente aquilo que o historiador convive na sua labuta criativa diária. O resultado aqui exposto é tão satisfatório quanto contestatório e cumpre com nosso objetivo inicial. Se para o historiador tudo pode tornar-se fonte ou objeto, até mesmo nossa capa pode ser alvo de reflexões mais elaboradas.
Satisfeitos com as últimas edições da REHR, reafirmamos o compromisso deste ser um espaço de divulgação do conhecimento científico bastante democrático, que abre as portas e oferece as mesmas condições de publicação para autores de todos os níveis de graduação e pós-graduação. Salientamos ainda que o sucesso da REHR deve-se muito ao apoio inestimável de todos os envolvidos nas diferentes etapas da publicação e a divulgação feita por aqueles que têm contato com os artigos e resenhas de excelente qualidade que vêm sendo publicados.
Cumpriu-se aqui o objetivo de instigar o pesquisador ao mergulho no científico e de proporcionar um diálogo rentável entre eles. Sem mais delongas vamos dar licença ao leitor para que conheça os artigos que compõem mais uma Revista Eletrônica História em Reflexão.
No artigo “VOCÊ QUER VOLTAR À OCA?”: armadilhas, artimanhas e questões da pesquisa histórica sobre os povos indígenas, Francisco Cancela procurou evidenciar, através da utilização de fontes coloniais sobre os índios, o papel histórico dos povos indígenas na formação da sociedade brasileira. Para tanto, a proposta do autor foi manifestar os empecilhos da utilização deste tipo de fontes históricas, levando em consideração as reflexões teóricas e metodológicas presentes na pesquisa histórica sobre os povos indígenas no Brasil.
Leonardo Brandão, no instigante HISTÓRIA E ESPORTE: leituras do corpo no filme “Dogtown and z-boys”, propôs trabalhar com uma categoria de fontes que se baseia na análise de imagens, especificamente do vídeo-documentário Dogtown and Z-Boys. Busca refletir sobre questões ligadas à corporeidade e corpo comunicativo do surf para o skate, e como tais manifestações esportivas estão sendo inseridas na história contemporânea.
O autor de OS IMPRESSOS INSTITUCIONAIS COMO FONTE DE ESTUDO DO PENTECOSTALISMO: uma análise a partir do livro História da Convenção Geral das Assembléias de Deus no Brasil, André Dioney Fonseca, analisou a importância dos impressos institucionais publicados pelas igrejas pentecostais – livros de história escritos por memorialistas, manuais de doutrinas, diários de líderes, biografias, entre outros – para as pesquisas em História. Desse modo, buscou, apresentar as contribuições desse tipo de impresso para os pesquisadores interessado em historiar o movimento pentecostal no Brasil, bem como quais são os principais cuidados ao se trabalhar com este tipo de fonte. Assim, tomou como exemplo o livro História da Convenção Geral das Assembléias de Deus no Brasil, publicado em 2004 pela editora Casa Publicadora das Assembléias de Deus (CPAD), a fim de apresentar alguns exemplos dos limites e das possibilidades de análises, partindo do exemplo das resoluções convencionais sobre os usos e costumes da Igreja Assembléia de Deus.
ENSINO DE CHUMBO: memórias, temores e silêncios na FAFIG (1970-1973), de Ernando Brito Gonçalves Junior, explorou os aspectos históricos da formação da primeira turma de licenciatura em História pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Guarapuava, no período compreendido pelos “Anos de Chumbo” da Ditadura Militar no Brasil. Valendo-se da utilização de fontes orais, o autor buscou reconstruir a memória dos entrevistados tendo como base as abordagens teóricas da história política, focando na observação de que, mesmo distante de grande centros urbanos, no contexto da realidade observada – a de uma cidade interiorana paranaense – era possível sentir a influência da repressão ideológica do período em questão.
O artigo de Vanda Fortuna Serafim e Solange Ramos de Andrade, intitulado PENSAR O INTELECTUAL E AS FONTES DE PESQUISA EM NINA RODRIGUES PARA O ESTUDO DAS RELIGIÕES E DAS RELIGIOSIDADES, versou sobre o pensamento de Raimundo Nina Rodrigues nas seguintes obras: O animismo fetichista dos negros bahianos (1900) e Os Africanos no Brasil (1932), tendo como enfoque a análise do discurso sobre as manifestações religiosas de tradição africana, em especial, a atuação de Nina Rodrigues enquanto intelectual de atuação médica do século XIX, que se dispôs a estudar as práticas religiosas afro-brasileiras.
Eduardo Rizzatti Salomão, autor do artigo O EXÉRCITO ENCANTADO DE SÃO SEBASTIÃO: as evidências da reelaboração da crença sebastianista na Guerra do Contestado (1912-1916), buscou analisar, através de um processo de reeelaboração dos símbolos e significados da religiosidade, as evidências do mito do “Exército de São Sebastião” presentes na Guerra do Contestado (1912-1916) com o mito sebastianista: a crença do retorno do rei D. Sebastião, desaparecido na batalha de Alcácer Quibir, em 1578. As análises versaram sobre o objetivo pretendido de restaurar a monarquia, e como entrou em cena no comando de um Exército encantado o mártir católico (São Sebastião) no lugar do rei Encoberto (D. Sebastião).
Na seqüência, apresentamos o artigo UMA ANÁLISE DA HISTORIOGRAFIA QUE ABORDA A VIDA DE PATRÍCIO: J. B. Bury (1905); R. P. C. Hanson (1968, 1978); E. A. Thompson (1986), de Dominique Viera Coelho dos Santos. O artigo orientou-se em uma perspectiva de análise do universo historiográfico sobre a vida de São Patrício. A abordagem focou-se em alguns problemas encontrados em obras sobre o assunto, principalmente no que concerne às mudanças de posicionamento que ocorreram durante o século XX sobre a vida e obra de São Patrício.
O artigo de Rodolfo Fiorucci, MEMÓRIA, ESFERA PÚBLICA E GLOBALIZAÇÃO: algumas considerações, visou discutir a questão da memória na sociedade global, trazendo a tona discussões sobre o papel das novas mídias e verticalização do território em escala mundial na desestruturação das formas tradicionais de conservação e transmissão de memória intragrupos. O autor ainda procurou discutir a formação do atual cenário globalizado a partir da problemática da esfera pública.
Arilson Silva de Oliveira em A ÍNDIA MUITO ALÉM DO INCENSO: um olhar sobre as origens, preceitos e práticas do vaishnavismo, discutiu em seu trabalho elementos do contexto sócio-histórico do vaishnavismo, suas principais fontes e idéias teológicas, além das práticas, divindades, origem, enfim, toda tradição literária contida nos textos védicos ancestrais e na parte integrante do que hoje se conhece como hinduísmo, dentro da tradição indiana. O autor também debateu como esta tradição religiosa está voltada para um deus multifacetado, com raízes na ortodoxia brahmânica, onde os brahmanas (mestres), a exemplo de Caitanya, considerado uma encarnação direta de deus, são os agentes sociais responsáveis por dirigir a sociedade para o além-mundo.
Encerrando o dossiê, passamos para o artigo IMPRESSÕES SOBRE O “JUDEU ERRANTE”: representações do cólera no jornal cratense O Araripe (1855 – 1864), de Jucieldo Ferreira Alexandre. O autor utilizou como fontes as reportagens do jornal O Araripe (Crato-CE), para, utilizando como embasamento os estudos sobre História das Doenças, analisar as práticas e representações que se relacionaram com a epidemia do cólera, que ameaçava invadir a cidade em 1855, fato ocorrido em 1855 e 1862.
Prosseguimos com a relação de artigos livres desta publicação. O artigo de Daniel de Pinho Barreiros, intitulado A CRISE DO WELFARE STATE: intelectuais e novos projetos (década de 1970), teve o objetivo de analisar de modo comparativo as idéias sociais de intelectuais ligados na crítica do Welfare State e ao capitalismo em crescimento vertiginoso. Propôs também, ainda no debate político norte-americano, a discussão de um importante tema: o surgimento do conceito de sustentabilidade.
Bruno Torquato Silva Ferreira, no artigo NOTAS ACERCA DA VIDA ARREGIMENTADA DOS PRAÇAS NOS CORPOS DO EXÉRCITO NO ANTIGO MATO GROSSO (1909-1916), fez uma discussão sobre a situação do serviço militar no estado de Mato Grosso nos anos anteriores à Lei do Sorteio Militar, lei que instituiu o serviço militar obrigatório no início do século XX. Baseia-se em registros do cotidiano dos praças em diferentes guarnições do Estado, além da memória de militares e esporádicas informações em periódicos da região. Além disso, teceu algumas considerações sobre o relacionamento entre as camadas da hierarquia militar: a base e seus comandantes, os oficiais.
O artigo seguinte, chamado CONSELHO TÉCNICO: a proposta apresentada pela bancada paulista na Constituinte de 1933-4, de Alvaro Augusto de Borba Barreto trabalha a proposta de Conselho Técnico, apresentada na Constituinte de 1933 / 1934 pela “Chapa Única por São Paulo Unido”. A proposta defendia órgãos tripartites, compostos por representantes do Estado, do patronato e dos empregados, tendo como dever a análise dos projetos de lei apresentados ao Congresso Nacional. O autor discutiu ainda outros elementos da proposta, como o de ser um espaço privilegiado de influência para os interesses da FIESP e o de oferecer uma alternativa à representação das associações profissionais no parlamento, garantindo o direito de voz e voto, modelo refutado pela bancada paulista.
Encerrando, trazemos o artigo O MOVIMENTO OPERÁRIO E SINDICAL EM PASSO FUNDO (RS) – 1920-1964, de Alessandro Batistella, que discutiu o movimento operário e sindical na cidade de Passo Fundo (RS) entre 1920 e 1964, dando ênfase aos trabalhadores urbanos e suas organizações. Para tanto, o autor enfocou as características do processo nacional e o regional, principalmente no que concernem aspectos políticos, mas, também, levou em consideração as principais correntes político-ideológicas presentes nos sindicatos locais, as greves e principais movimentos populares do período no local. Além disso, o artigo expôs acerca da relação entre acontecimentos sócio-políticos nacionais e sua repercussão no movimento operário e sindical de Passo Fundo (RS).
Apresentamos também nesta edição da REHR a Entrevista concedida pelo deputado federal Dr. Rosinha (PT-PR), no momento presidente do Parlamento do Mercosul, cargo que ocupou até fevereiro de 2009. Na entrevista, que se coloca como uma fonte primária, o deputado Dr. Rosinha abordou questões acerca do Mercosul, como a participação do Brasil, avanços e entraves, além da questão da proporcionalidade no Parlamento, que vêm acalorando as discussões.
Fechando a edição, contamos com as seguintes resenhas: Reconstrução do Passado – Teoria da História II: os princípios da pesquisa histórica, de Rusen Jörn, obra resenhada por Rogério Chaves da Silva; Fabrício Sant’Anna de Andrade nos apresentou a resenha de Ciro Flamarion Cardoso: Um historiador fala de teoria e metodologia; e, por fim, a resenha do livro As cidades no tempo, de Margarida Maria Carvalho, Maria Aparecida de S. Lopes e Suzani Silveira Lemos França (orgs), feita por Maria Aparecida de Oliveira Silva. Estimamos leituras proveitosas e instigantes!
Abraços!
Camila Cremonese
Daniele Reiter
(Editoras).
CREMONESE, Camila; REITER, Daniele. Apresentação. Revista Eletrônica História em Reflexão. Dourados, v.3, n.5, jan. / jun., 2009. Acessar publicação original [DR]