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Questões indígenas contemporâneas: História e Antropologia em fronteiras / História Unisinos / 2011
Os textos reunidos no dossiê Questões indígenas contemporâneas: História e Antropologia em fronteiras resultam das pesquisas de sete historiadores de diferentes pontos do país que tem procurado estudar a História Indígena da perspectiva do presente, em fronteiras disciplinares, tarefa ao mesmo tempo difícil e fascinante. Assim, os temas abordados refletem os diálogos travados por cada um deles com outras áreas do conhecimento, tais como a Psicologia, o Direito, a Educação e, notadamente, a Antropologia. O que aproxima os textos é a tentativa de compreensão, por parte dos autores, de uma trama histórica complexa e que durante muito tempo foi negligenciada pela historiografia tradicional. Já vai longe, portanto, o tempo em que para os índios não haveria história, mas apenas etnografia, como anunciara Varnhagen, no século XIX.
Anna Maria Ribeiro Fernandes Moreira da Costa apresenta a simbologia que envolve o espaço fluvial dos grupos indígenas Nambiquara do Cerrado, localizados a Oeste do Estado de Mato Grosso. O espaço Nambiquara é, dessa forma, apreendido em suas representações, imagens e concepções, sendo construído em função de seus sistemas de pensamento e de suas necessidades.
Por sua vez, Carlos Alberto dos Santos Dutra instiga o leitor a rever a história da ocupação do território sul-mato-grossense, lançando um olhar sobre os conceitos de poder e violência e buscando revelar que muitas terras indígenas demonstram ter sido bem mais que simples áreas de migração de grupos autóctones isolados. Os conceitos de nação, identidade, território / territorialização / desterritorialização, dominação, poder e cultura são analisados pelo autor a partir da história dos Ofayé.
Giovani José da Silva apresenta informações a respeito da construção da Estrada de Ferro Brasil-Bolívia, bem como dos impactos que esta construção provocou sobre a vida das populações indígenas, especialmente sobre os Chiquitano (e os estigmas a estes impingidos). No caso dos Kamba, descendentes dos Chiquitano, esse impacto se traduziu na saída de uma determinada parcela das proximidades de Roboré, Tapera e San Jose de Chiquitos e de sua entrada no Brasil, em meados do século passado. A construção da ferrocarril (1939-1954) provocou o engajamento de grande número de indígenas bolivianos, muitos dos quais penetraram em território brasileiro de forma clandestina aos olhos oficiais.
Já Rosely Aparecida Stephanes Pacheco mostra que uma análise mais ampla dos desafios que os povos indígenas têm enfrentado em relação a seus direitos territoriais na América Latina, passa por um desvelar histórico sobre a forma como a questão territorial foi tratada nestes países, tanto administrativa quanto juridicamente. Para o estudo do tema, cujo foco são as lutas e reivindicações dos Guarani (Kaiowá e Ñandeva), a autora buscou referenciais teóricos em diversas áreas do conhecimento: a História, a Antropologia e o Direito.
Edson Hely Silva percebe, por meio dos relatos orais dos índios Xukuru do Ororubá, de Pernambuco, acontecimentos que expressaram o cotidiano, os espaços e os momentos de sociabilidade vivenciados na Serra do Ororubá, além do significado de Cimbres como um espaço de referência da memória mítico-religiosa para a afirmação da identidade daquele grupo indígena.
Léia Teixeira Lacerda apresenta reflexões realizadas desde o final da década de 1990, no campo da Educação e da Saúde Preventiva das DST (Doenças Sexualmente Transmissíveis) e da Aids com professores indígenas que habitam e atuam em escolas no Pantanal Sul-mato-grossense. A autora realiza uma breve análise pedagógica, psicológica e histórica dos Programas de Prevenção das DST e da Aids desenvolvidos com professores indígenas daquela região.
Finalmente, Vanderléia Paes Leite Mussi discute como os Terena no contexto urbano de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, constroem sua etnicidade, nos “entre lugares” das relações fronteiriças, mantendo os laços de continuidade com seus antepassados, isto é, com sua tradição. A partir dessa abordagem, a autora mostra como esse grupo indígena foi construindo diferentes estratégias de inserção e negociação no entorno da sociedade não indígena para garantir a sua sobrevivência, tendo como principal impulsionador o trabalho.
Em comum, os historiadores participantes do dossiê utilizaram fontes orais em suas pesquisas, mas sem a pretensão de “dar voz” a quem quer que seja, muito menos aos indígenas. Antes, cada um deles procurou “dar ouvidos” às narrativas contadas pelos Nambiquara, Chiquitano, Guarani, Terena, Ofayé, Xukuru do Ororubá, Kadiwéu e Kinikinau. Convidam-se, então, os leitores a também “ouvirem” essas vozes, ainda não inscritas nos cânones oficias, porém repletas de significados e simbologias. Boa leitura!
Giovani José da Silva – Organizador
SILVA, Giovani José da. Apresentação. História Unisinos, São Leopoldo, v.15, n.2., maio / agosto, 2011. Acessar publicação original [DR]