Quaternário do Brasil – SOUZA et al (Ge)

SOUZA, C. R. G. et al. (Ed.). Quaternário do Brasil. Ribeirão Preto: Holos, 2005. 378p. Resenha de: VALADÃO, Roberto Célio. Geografias, Belo Horizonte, v.2, n.2, p.123-126, jul./dez., 2006.

A segunda metade do século XX assistiu ao recrudescimento de esforços da ciência na sistematização de seus saberes com vistas à sua aplicação na prevenção e mitigação de problemas de ordem ambiental. As décadas de 198 0 e 199 0 foram especialmente profícuas nesse contexto, inclusive no Brasil. Os diversos ramos da ciência despertaram, de forma consciente, para as crises ambientais em suas mais diversas perspectivas escalares e temporais. Esse despertar revelou-se, de início, por meio do engajamento e do compromisso social de diferentes saberes científicos ainda hermeticamente fechados em si mesmos para, mais tarde – particularmente ao final dos anos de 199 0 –, dar-se conta da urgência na adoção de procedimentos metodológicos e na aquisição de conhecimentos advindos de outros campos do saber. As abordagens inter- e transdisciplinares, até então meramente filosóficas, ganharam terreno na prática de uma multiplicidade de especialistas, que passaram a se unir em torno de interesses comuns de forte demanda social.

Iniciava-se a materialização da sonhada integração de saberes e abordagens, em grande parte até então suprimida mediante especialização extrema, embora necessária, da ciência.

A obra intitulada Quaternário do Brasil, publicada sob os auspícios da Associação Brasileira de Estudos do Quaternário (ABEQUA), tem por mérito a iniciativa de congregar grande número de especialidades em torno de objeto comum: nossa própria casa, a Terra. As obras até então publicadas no país a respeito do Quaternário vinculam-se, em sua maioria, com abordagens e bases referenciais teóricas oriundas de leque bastante reduzido de disciplinas. Na obra em perspectiva, somam-se esforços não só de geocientistas – geólogos e geógrafos – como também de biólogos, engenheiros, agrônomos, antropólogos e oceanógrafos, dentre outros. Esses esforços resultaram na publicação de obra até então inédita no país, ao congregar reflexões e sínteses resultantes da intensa atividade dos principais e mais consolidados grupos de pesquisa quaternarista nacionais.

As temáticas abordadas na obra são apresentadas em 17 capítulos, cuja autoria é bastante diversificada e, mais ainda, plural no que se refere à especialidade de seus autores. O Capítulo 1 – a Introdução – apresenta as generalidades do arcabouço geológico no qual o território brasileiro está inserido: o continente sul-americano.

É de interesse desse capítulo apresentar as grandes linhas estruturais e as megaunidades morfológicas a elas associadas, com destaque para os depósitos e as formas do Quaternário. O Capítulo 2 apresenta elementos para discussão da variabilidade e das mudanças climáticas ocorridas durante o Quaternário no Brasil. Para tanto, enfatiza o papel da dinâmica atmosférica no contexto das mudanças climáticas, com recorte espacial que permite, inclusive, a discussão sobre aspectos dinâmicos do clima e seus impactos regionais no território brasileiro. Trata, em abordagem final, da simulação matemática do clima aplicada sob a perspectiva não só da espacialidade mas, sobretudo, da temporalidade.

Uma vez lançadas as bases para a compreensão da dinâmica climática e paleoclimática verificada no país – Capítulo 2 –, o Capítulo 3 aborda a paleovegetação e os paleoclimas do Quaternário do Brasil.

Seus autores discorrem a respeito dos resultados procedentes do desenvolvimento e da aplicação de técnicas palinológicas em materiais obtidos em registros sedimentares, bem como sobre seu significado e sua contribuição na compreensão do complexo padrão de alterações das diferentes formações vegetais brasileiras decorrentes das mudanças climáticas globais e do antropismo desencadeado no Quaternário Tardio. A reconstrução de paleoambientes quaternários no Brasil tem sua continuidade de análise no Capítulo 4, a partir de indicadores decorrentes da aplicação de estudos dos isótopos de carbono e de seu emprego simultâneo com a antracologia e a palinologia de sedimentos lacustres.

A geologia e a geomorfologia das regiões costeiras no Brasil são objeto de discussão nos capítulos 5, 6, 7, 8 e 9. No Capítulo 5 é apresentada síntese histórica e evolutiva dos conhecimentos a respeito das regiões costeiras de alguns estados brasileiros e dos fatores que condicionaram a sua evolução, ligados, de um lado, à geodinâmica global – tectônica de placas, clima e variações do nível do mar – e, de outro, à dinâmica costeira – ação de ondas, marés, correntes litorâneas e tempestades. A par dessa síntese os autores desse capítulo procuram demonstrar que as planícies costeiras, no Brasil, têm se comportado, nos últimos séculos, como costas de recuo afetadas por processos de submersão e/ou erosão.

O Capítulo 6, de modo complementar às abordagens introduzidas no capítulo anterior, trata dos paleoníveis do mar e das paleolinhas de costa verificadas na região costeira do Brasil. As reconstruções paleogeográficas apresentadas nesse capítulo são balizadas por numerosas datações de radiocarbono. A erosão costeira atual, particularmente aquela verificada em praias arenosas, é objeto de análise do Capítulo 7, no qual os autores buscam caracterizar o sistema praial, bem como reconhecer seus processos costeiros modeladores e sua morfodinâmica. Apresentam, ainda, síntese acerca dos indicadores de erosão costeira, contemplando suas causas e seus efeitos e os processos a ela associados, para, em seguida, discorrerem a respeito de métodos de proteção, contenção e recuperação de praias. O Capítulo 8, que encerra as discussões mais pormenorizadas das regiões costeiras brasileiras, aborda a oceanografia geológica e geofísica da Plataforma Continental Brasileira. Essa megafeição da margem continental é analisada com ênfase nos seus processos dinâmicos, no transporte sedimentar, no relevo e na composição do fundo marinho atual. Os principais métodos geológicos, geofísicos e oceanográficos utilizados na investigação da plataforma continental são apresentados e discutidos.

A microfauna recente das regiões costeiras é foco de análise do Capítulo 9, o qual traz significativa exposição e síntese dos resultados das principais contribuições sobre foraminíferos, tecamebas e ostracodes encontrados no Brasil – seus padrões de distribuição em diferentes ecossistemas e províncias biogeográficas e suas principais espécies bioindicadoras.

Os demais capítulos da obra – capítulos 10 a 17 – tratam de feições e fenômenos de interesse dos estudos do Quaternário que têm lugar, sobretudo, no interior continental do país. A neotectônica da Plataforma Brasileira é objeto de análise no Capítulo 10, no qual os autores abordam, de início, aspectos conceituais de relevante interesse para a temática – neotectônica, sismotectônica e morfotectônica –, como subsídio às discussões acerca da mobilidade litosférica recente verificada nas regiões Nordeste, Sudeste, Sul, Norte e Centro-Oeste do país.

A neotectônica da região costeira é também tratada, com destaque para a importância dos processos de sedimentação do Grupo Barreiras. O capítulo é finalizado com discussão acerca dos campos de tensões neotectônicos e do mapa da neotectônica do Brasil.

Aos campos de dunas livres e dunas vegetadas que ocorrem no Brasil é dedicado o Capítulo 11. Seus autores apresentam detalhada caracterização dos depósitos eólicos ativos brasileiros, sua classificação, distribuição espacial e, mais ainda, seu significado frente à evolução quaternária de algumas áreas litorâneas e interiores. A análise dos processos, produtos e agentes morfogenéticos continentais tem continuidade no Capítulo 12, o qual, referindo-se ao interior continental, enfatiza a relação entre as formas da paisagem e os depósitos quaternários, particularmente por meio do emprego de abordagens morfo- e aloestratigráficas que subsidiam a compreensão da evolução de encostas e vertentes. Técnicas e métodos empregados pela cartografia são discutidos como instrumentos da gestão ambiental, notadamente naqueles recortes espaciais em que os processos e os produtos morfogenéticos têm papel fundamental. A geologia, a geomorfologia e a paleo-hidrologia de grandes sistemas fluviais brasileiros são apresentadas e discutidas no Capítulo 13, cujo foco recai essencialmente sobre a evolução quaternária das mais importantes bacias hidrográficas brasileiras – Amazonas, Paraná, Paraguai, Tocantins-Araguaia, Uruguai e São Francisco –, seus depósitos sedimentares e as morfologias fluviais associadas às calhas de seus eixos de drenagem principais.

O Capítulo 14 realiza estudo geoquímico de sedimentos e solos ao propor uma análise multielementar na caracterização de uma região qualquer, realçando a compreensão da interação espaciotemporal entre sua herança natural e a interferência antrópica a ela imposta. São apresentados e discutidos alguns estudos de caso em que a geoquímica multielementar foi utilizada como ferramenta, com destaque para algumas áreas na Amazônia, no Rio Grande do Norte, no Distrito Federal, no Quadrilátero Ferrífero e na Bacia Hidrográfica do Paraná.

Uma vez que as feições superficiais e subterrâneas que integram os ambientes cársticos têm sua gênese e evolução associadas ao Quaternário, a obra reserva seu Capítulo 15 para discussão desses ambientes no Brasil.

São discutidos, a partir de estudos de caso diversos, o controle estrutural e tectônico da carstogênese, sua evolução morfopedológica e o contexto paleoambiental no qual estiveram inseridos.

O Capítulo 16 traz, de início, o debate e a aplicabilidade dos modelos paleoambientais comumente empregados pela arqueologia como subsídio à compreensão do processo de ocupação do território brasileiro desde o Pleistoceno terminal. Em seguida, os autores discutem o histórico da ocupação humana no Brasil durante o Holoceno, quando os sambaquis e os sambaquieiros passaram a desempenhar papel fundamental.

Os registros da ação geológica do homem têm continuidade de abordagem no último capítulo da obra – Capítulo 17 –, voltado para os estudos do Tecnógeno. São apresentados alguns estudos de caso sobre o Tecnógeno no Brasil, com destaque para o oeste do estado de São Paulo, a Região Metropolitana de São Paulo, o Vale do Paraíba do Sul, a zona urbana de Goiânia e a região da Chapada Diamantina (BA).

Ao final da leitura do livro em perspectiva, certamente se conclui por sua grande relevância, em razão de seu conteúdo e de sua abordagem interdisciplinar imprimirem a ele valor como obra de referência. Quaternário do Brasil é obra que devidamente preenche os requisitos necessários para figurar no acervo bibliográfico das principais instituições de pesquisa e ensino das geociências no país. É guia seguro para pesquisadores e, sem dúvida alguma, para discentes de graduação e pós-graduação, tendo em vista a clareza conceitual emitida por seus autores, a seqüência lógica na estruturação de suas temáticas, a seleção precisa de seus estudos de caso e a expressividade de suas ilustrações.

Roberto Célio Valadão – Professor do Departamento de Geografia do Instituto de Geociências, UFMG.

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Paleoclimatology, reconstructing climates of the quaternary – BRADLEY (C-RMAX)

BRADLEY, Raymond S. Paleoclimatology, reconstructing climates of the quaternary. International Geophysics Séries. Volume 64. Second Edition. Massachusetts: Amberst, 1996. Resenha de: PINTO, Josefa Eliane Santana de Siqueira. A importância da Paleoclimatologia para os estudos arqueológicos. Canindé – Revista do Museu de Arqueologia de Xingó, Xingó, n.1, dez. 2001.

A Paleoclimatologia é o estudo do clima no período anterior as medidas instrumentais. Os registros instrumentais dão uma cobertura apenas de uma pequena fração da história do clima da terra, promovendo uma perspectiva inadequada na evolução do clima atual. Uma longa perspectiva na variabilidade do clima pode ser obtida através do estudo de fenômenos naturais dependentes ou relacionados com o clima, por aproximação.

Na flutuação climática a possibilidade de identificar causas e mecanismos de variações do clima é aumentada. Assim os dados de Paleoclimatologia promovem a base para testes de hipóteses sobre as causas de mudanças do clima. Somente quando as causas da variação passada dos climas forem entendidas será possível prever antecipadamente o clima do futuro.

É nesta perspectiva que a obra Paleoclimatologia, Reconstruindo Climas do Quaternário, de Raymond S. Bradley, em sua segunda edição, se propõe a discutir as inferências da pesquisa paleoclimatológica, em doze capítulos, explorados em 613 páginas, volume 64 da Série Internacional de Geofísica Bradley prefacia sua obra justificando a ampliação da segunda edição, pela explosão de interesses pela matéria e o avanço das pesquisas. É interessante acreditar que no início dos anos oitenta, a datação de carbono era usada com dificuldade e pouco se conhecia sobre a circulação atmosférica do Atlântico Norte. As primeiras medidas do dióxido de carbono e gelo foram formadas e depois não permaneceram mais da mesma forma. Os modelos de circulação geral eram primários e a simulação paleoclimática era rara. Em contrapartida, hoje é um campo de grande pesquisa sobre o sistema da terra e de vital importância para permitir esta possibilidade de mudanças futuras globais. Como resultado, a literatura sobre o assunto tem crescido imensamente e tem se tornado abundante. Isso é muito difícil no topo de todo o tempo no campo de pesquisa.

Nesta edição, o autor promove uma visão geral e contemporânea do campo, mas reconhece que, inevitavelmente haverão tópicos que ele possa não ter revisado adequadamente. Afirma que certamente existem tópicos que não foram debatidos e representados devidamente. Alguns outros tópicos foram omitidos ou tratados de forma superficial, apenas numa introdução, tais são os perigos de tentar cobrir sobre este enorme campo. Contudo, acredita que existem vantagens em ter uma lente através da qual envolva o campo que está sendo visto.

Inicia a Reconstrução Paleoclimática, com uma introdução, informações sobre a origem do Paleoclima; análises sobre os níveis paleoclimáticos; pesquisa de modelos em paleoclimas. O capítulo dois aborda o clima e as variações climáticas e trata da natureza do clima e suas variações, sistema climático, mecanismos de trocas, balanço de energia entre a superfície e atmosfera, variação climática e variações dos parâmetros orbitais da Terra.

Nos capítulos três e quatro, são discutidos os princípios, as aplicações, alguns problemas e erros dos métodos de datação. Em seguida, dedica um capítulo à contribuição das análises da criosfera para a reconstrução da Paleoclimatologia. Informações paleoclimáticas sobre os sedimentos marinhos e corais mereceram um capítulo, incluindo um levantamento a respeito de estudos sobre materiais biológicos nos oceanos, com referências ao Atlântico Norte, Pacífico e Índico. Aborda outrossim as informações sobre os materiais inorgânicos dos oceanos, importantes registros dos climas passados.

Os capítulos sete e oito exploram as evidências geológicas não marinhas, pelos solos, espeleologia, distribuição e formas de vegetação, fósseis.

Estudos dos pólens também foram contemplados com um capítulo, introduzindo as bases de análise e os métodos, reconduzindo à Paleoclimatologia de registros longos de pólens no quaternário na Europa, nas Savanas de Bogotá, na Colômbia, Amazônia, na África Equatorial e na Flórida.

O décimo capítulo introduz os fundamentos da Dendroclimatologia, evoluindo, no capítulo seguinte, para o registro histórico e sua interpretação. Conclui com modelos climáticos, tipos, simulações e experimentos, relações oceano-atmosfera.

Deve-se considerar que o autor, Raymond S. Bradley, ao apresentar discussão de métodos e técnicas propícias para a Paleoclimatologia, tenta desvendar os segredos da previsão eficaz dos climas atuais e futuros, contemplando uma expressiva gama de tópicos, incluindo novas referências que deve inspirar obras similares de interesse específico ao sul dos Equador. Espera-se que os especialistas saibam como trabalhar e também o que fazer com os objetivos gerados pelo livro em mente, sem substitutos originais.

Josefa Eliane Santana de Siqueira Pinto – – 1 Professora do NPGEO/UFS.

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Geologia do Quaternário e mudanças ambientais. Passado + Presente = Futuro – SUGUIO (RBG)

SUGUIO, K. Geologia do Quaternário e mudanças ambientais. Passado + Presente = Futuro. São Paulo: Paulo’s Editora, 1999. 366p. Resenha de: MAGALHÃES, Luiz Fernando.  Revista Brasileira de Geociências, v.31, n.2, p.241-244, jun., 2001.

Luiz Fernando Magalhães – Diretor de Operações – Metais de Giás S.A.

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