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Público e Privado: políticas públicas no Brasil / Faces de Clio / 2016
A Revista Faces de Clio é uma publicação discente, criada pelos alunos de Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Juiz de Fora, destinada a divulgar pesquisas desenvolvidas no âmbito da pós-graduação, em universidades do Brasil e do exterior. Nessa terceira edição optamos por reunir todos os artigos sob o prisma do dossiê Público e Privado: políticas públicas no Brasil. Nossa intenção é lançar nosso olhar a um contexto vigente nos últimos anos e refletir sobre os prejuízos e as vantagens da interferência do mercado nos serviços públicos brasileiros. Para tanto, contamos com a colaboração de dez artigos escritos por 11 pesquisadores, divididos da seguinte forma: três textos de mestrandos, dois de doutorandos, e cinco de professores de universidades federais e estaduais, referências em suas temáticas.
Para a análise sobre a saúde pública, contamos com a participação especial de três pesquisadores que se destacam internacionalmente no meio acadêmico como referências na produção de conhecimento da área. Ligia Bahia (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e Mario Scheffer (Universidade de São Paulo) nos privilegiam com uma reflexão sobre as propostas feitas pelos presidenciáveis no ano de 2014. O texto é atual, uma vez que os dois autores não se limitam às questões que antecederam as eleições, expandem suas observações à legitimidade de cada proposta e projetam os desafios a serem adotados. Tão importante como esses dois autores para o prisma da saúde pública, o pesquisador Ignacio Delgado (Universidade Federal de Juiz de Fora) nos oferece uma análise sobre a articulação entre a indústria farmacêutica e a arquitetura dos sistemas de saúde, salientando as implicações que os formatos institucionais dos primeiros acarretam para as modalidades de apoio à pesquisa e à inovação na indústria.
O discente de mestrado Adebiano Rodriguez (Universidade Federal de Juiz de Fora), remete para a centralidade do debate a política de saúde no âmbito das políticas sociais. Completando o cenário da saúde pública, Tiago Siqueira Reis (Universidade Nova Lisboa) apresenta a trajetória da Fundação Oswaldo Cruz, ressaltando dois períodos da instituição: de 1970 a 1988, em que responde pelo direito privado; e de 1988, ano da promulgação da Constituição Brasileira, até 2003, período em que se enquadra no regime de direito público.
Ainda nos temas que versam sobre políticas públicas, mas ultrapassando a análise da saúde, a pesquisadora Katiuscia Vargas (Universidade Federal de Juiz de Fora) nos traz uma reflexão sobre o processo de inclusão escolar das pessoas com deficiência de forma a revelar as contradições e marcas presentes neste processo. A estudiosa pretende refletir sobre a (re)significação do que estamos entendendo por inclusão escolar e, principalmente, para repensarmos a maneira como historicamente a escola vem lidando com as pessoas com deficiências e outras necessidades especiais.
O mestrando em direito, Pedro Ribeiro Viscardi (Universidade Federal do Rio de Janeiro), contribui para a revista com uma reflexão sobre as mudanças institucionais das contrapartidas exigidas no Programa Bolsa Família. Argumenta-se que as condicionalidades da política surgiram por meio de alterações incrementais. Para comprovar essa hipótese, recorre a fontes do Legislativo brasileiro, notícias, artigos e livros.
O dossiê continua com o texto do professor João Assis Dulci (Universidade Estadual de Minas Gerais), no qual o pesquisador tem por objetivo demonstrar como as estratégias de desenvolvimento nacional (década de 1980) sofreram modificações, em consonância com as transformações no regime de acumulação do modo de produção capitalista.
Há três análises em escala mais reduzida, feitas por Lívia Freitas Pinto Silva Soares (Universidade do Rio de Janeiro), Cátia Franciele Sanfelice de Paula (Universidade Federal de Uberlândia) e Yuri Amaral Barbosa (Universidade Federal de Juiz de Fora). A doutoranda Lívia Soares avalia as ações de assistência aos pobres, aclamadas pelos poderes públicos e pela filantropia, no Distrito Federal, entre os anos de 1891 a 1910. Cátia de Paula, doutoranda em História, discute como o Estado vem intervindo no setor pesqueiro por meio de políticas púbicas, evidenciando um processo de mudanças causado por danos ambientais que provocaram novas relações de produção vividas por pescadores na cidade de Guaíra / PR. Por fim, o mestrando em geografia Yuri Barbosa, visa discutir o papel da esfera municipal como gestora ativa no planejamento e na constituição do espaço urbano no final do século XIX. Tendo a cidade de Juiz de Fora como pano de fundo, pretende analisar como se sucedeu a formulação e a execução do primeiro “plano diretor” da cidade, o Plano Howyan, em 1892.
Nosso esforço maior nessa edição foi reunir textos que se preocupassem com a interação entre o setor público e privado, motivando a escrever sobre essa problematização que vem se tornando emergente em vários setores e precisa de um olhar mais atento do campo acadêmico sobre seu desenvolvimento. Embora tenhamos em mãos uma revista nova, na sua terceira edição, cumprimos com nosso objetivo de reunir pesquisadores de diferentes universidades, com produtividade e credibilidade asseguradas pelas agências de pesquisas. O que nos torna ainda mais satisfeitos com nosso trabalho.
Por fim, agradecemos a todos os discentes do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Juiz de Fora pelas suas valiosas contribuições na construção desta edição. Aos professores do Programa, nosso muito obrigado pela confiança e pela atenção nas sugestões e críticas, que sempre serão importantes para o crescimento da Revista Faces de Clio. Aos pesquisadores que se dispuseram a escrever, nosso intenso agradecimento.
Janeiro de 2016
Nittina Anna Araújo Bianchi Botaro
Antonio Gasparetto Júnior
BOTARO, Nittina Anna Araújo Bianchi; GASPARETTO JÚNIOR, Antonio. Editorial. Faces de Clio, Juiz de Fora, v.2, n.3, jan. / jun., 2016. Acessar publicação original [DR]
O Público e o Privado na Educação Brasileira / Revista Brasileira de História da Educação / 2003
A idéia de reunir artigos que tomam como objeto de investigação o público e o privado na educação brasileira justifica-se com base em dois argumentos principais. Em primeiro lugar, busca somar esforços de toda uma tradição de estudos que abordam essa temática, geralmente produzindo análises conjunturais em momentos de redefinição política e legislativa [1]. Em segundo lugar, pretende convidar o leitor a dar um mergulho na história com vistas a buscar, em diferentes temporalidades, elementos que permitam ampliar a compreensão de questões que afetam a educação brasileira no tempo presente. Em certa medida, o conjunto de textos aqui reunidos expressa a forma pela qual pesquisadores de diferentes instituições sediadas na cidade do Rio de Janeiro [2] desenvolveram suas análises sobre determinados aspectos da relação entre o público e o privado no âmbito da educação brasileira.
Acreditamos que o conhecimento da questão em uma perspectiva de longo prazo nos permitirá perceber com maior nitidez o fluxo estrutural de nossa história [3] , permitindo-nos articular as inflexões ocorridas no próprio processo de constituição das noções de público e privado em articulação com o movimento dinâmico que envolveu o debate de idéias em torno da educação das crianças e do povo brasileiro de uma maneira geral, assim como das disputas e dos consensos que acompanharam a estruturação e generalização das instituições escolares no Brasil.
Nessa perspectiva, o primeiro artigo, intitulado “A construção da escola pública no Rio de Janeiro imperial”, recompõe aspectos relevantes da trajetória de construção do sistema público de ensino brasileiro, abordando a sua gênese no Rio de Janeiro imperial, quando foram implantadas ao Aulas Régias ou Aulas Públicas, como eram chamadas. Segundo a autora, mesmo na fase final do Império, as instâncias do público e do privado confundiam-se ora em projetos comuns e em alianças, ora disputando interesses diferentes, observando-se, todavia, sua relação com as propostas que eram discutidas tanto no âmbito do governo imperial quanto no âmbito da sociedade, como, por exemplo, a obrigatoriedade do ensino primário, o desenvolvimento do ensino profissional e a alfabetização de adultos em cursos noturnos, entre outras.
O segundo artigo intitulado “A quem cabe educar? Notas sobre as relações entre a esfera pública e a privada nos debates educacionais dos anos de 1920-1930” aborda a preocupação com a (re)construção na nação, no sentido já clássico de republicanização da república, que marcou o ambiente cultural brasileiro do início do século XX. A autora demonstra que a cruzada pela educação em curso na época, ao mesmo tempo em que mobilizou esforços em prol da expansão da escola pública a segmentos amplos da sociedade, também produziu um conjunto de ações educativas destinadas às famílias, sendo tais ações educativas entendidas como de responsabilidade do Estado, da escola ou da Igreja. Como se poderá verificar com a leitura do texto, se a preeminência da escola e do Estado diante da família aparece como um dos eixos norteadores do pensamento renovador, no pensamento católico a família ocupa lugar primordial como instituição educativa, atuando ao lado do Estado e da Igreja, porém, na visão do padre Leonel Franca, gozando de primazia ante essas duas instituições.
O artigo intitulado “Oscilações do público e do privado na história da educação brasileira”, apresenta uma interpretação acerca dos limites, da interação e dos conflitos estabelecidos entre o público e o privado, ao longo do processo de institucionalização da educação em nosso país. Se a perspectiva de longo prazo não permite um aprofundamento das questões ali esboçados, ela propicia, em contrapartida, uma visão global do tema.
O quarto e último artigo, intitulado “O público e o privado na educação brasileira: inovações e tendências a partir dos anos 1980”, inserese no debate sociológico sobre o papel do Estado e do setor privado na educação brasileira, buscando esclarecer o sentido que vem tomando a restruturação das relações entre essas instâncias. Ao levantar os problemas básicos presentes na tensão entre o público e o privado, a autora identifica alguns pontos-chave no redesenho operado nessas relações a partir dos anos 1980, recorrendo a exemplos selecionados entre as iniciativas educacionais recentes. Assim, apresenta uma visão geral dos mecanismos responsáveis pela definição de um novo padrão de política educacional, diferente daquele que se consolidou entre os anos de 1930 e 1970. Medidas associadas à descentralização político-administrativa e financeira dos sistemas educacionais, assim como a tendência à redução do volume, da capacidade e da qualidade dos serviços produzidos pelo Estado no âmbito da educação compõem o repertório da análise desenvolvida no referido estudo.
A soma desses artigos mescla abordagens características dos estudos históricos e dos estudos de caráter sociológico, entendendo que a interação entre essas duas áreas disciplinares permite a fertilização da reflexão em torno da relação presente e passado, assim como potencializa a interseção entre teoria e empiria, entre interpretação e descrição. Os quatro estudos procuraram compor, cada um com seu recorte específico, um conjunto no qual se buscou abordar a relação público e privado na educação brasileira, inventariando as suas formas históricas de manifestação, observando as imbricações, as aproximações e os afastamentos operados entre essas duas dimensões e procurando identificar os termos da oposição que marcou o conflito entre publicistas e privatistas no âmbito do debate e da participação nos rumos da política educacional. Fez parte de nossas preocupações verificar a emergência de novas formas de relacionamento entre o Estado, a sociedade e os setores privados no que tange à questão educacional, reafirmando, assim, a centralidade desse tema na educação brasileira contemporânea.
Notas
1. Em um levantamento preliminar, destacam-se os seguintes estudos: Buffa (1979), Ideologias em conflito: escola pública e escola privada, São Paulo, Cortez; Cunha (1981), “Escola particular x escola pública”, Revista ANDE, 1 (2); Cury (1988), Ideologia e educação brasileira: católicos e liberais, e Cury (1992), “O público e o privado na educação brasileira: posições e tendências”, Cadernos de Pesquisa, 81 (maio); Pinheiro (1996), “O público e o privado na educação: um conflito fora de moda, em Fávero (org.), A educação nas constituintes brasileiras, Campinas, Autores Associados; Vieira (1998), “O público e o privado nas tramas da LDB,” em Brzezinski (org.), LDB reinterpretada: diversos olhares se cruzam, São Paulo, Cortez.
2. A saber, UFRJ, CEFET-RJ, UERJ e PUC-Rio.
3. O termo foi tomado por empréstimo de Novais (1997) no Prefácio à obra História da vida privada no Brasil: cotidiano e vida privada na América portuguesa, São Paulo, Companhia das Letras.
Libânia Nacif Xavier
XAVIER, Libânia Nacif. Apresentação. Revista Brasileira de História da Educação. Maringá, v.3, n.1, jan. / jun., 2003. Acessar publicação original [DR]