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Protestantismos e História: a propósito dos 500 anos da Reforma Protestante / Fronteiras – Revista de História / 2017
No mês de outubro de 2017 foram realizadas, em diversas partes do mundo, celebrações alusivas aos 500 anos da Reforma Luterana, comumente chamada de Reforma Protestante. O centro das comemorações foi a pequena cidade alemã de Wittenberg, atualmente com pouco mais de 50 mil habitantes e que abriga a Igreja do Castelo de Wittenberg, local onde em 31 de outubro de 1517 o monge Martinho Lutero afixou suas 95 teses com críticas à Igreja Católica. Esse ato foi considerado como o desencadeador dos movimentos que provocaram a maior divisão institucional no interior do cristianismo romano.
Os movimentos contestadores e reformistas subsequentes a Lutero, tais como: o calvinista, o anglicano, os anabatistas, entre outros, provocaram profundas mudanças na vida religiosa na Europa e, posteriormente, em outras partes do mundo. Mais do que a crítica institucional, burocrática, clerical, os tempos posteriores a Lutero apontaram para uma nova posição religiosa do cristão para com o sagrado, o divino. Sem as intermediações dos agentes cultos e letrados, os fiéis passaram a ter acesso direto ao divino por meio da leitura devocional dos textos bíblicos. A tradução da Bíblia para o alemão pode ser considerado o ápice da quebra do monopólio do sagrado por parte da Igreja romana. E essa necessidade, esse imperativo para a leitura da Bíblia, marcou profundamente a identidade desses grupos religiosos e também direcionou a fundação e atuação das novas confissões eclesiásticas que investiam na alfabetização de seus novos membros. No Brasil, a partir do século XIX, algumas igrejas protestantes que por aqui chegaram por meio das missões adotaram a máxima “em cada igreja, uma escola”. Leia Mais
Protestantismo e regime militar no Brasil: Perspectias / Mnemosine Revista / 2014
Com este Número Especial a Mnemosine Revista inaugura um novo estágio em sua trajetória e sua linha editorial. Por decisão do seu Conselho Editorial e do Programa de Pós-Graduação em História, além dos seus dois números regulares anuais, serão publicados números especiais a cada ano.
Também a um fato distintivo neste número considerando, sobretudo, que a Revista prioriza textos inéditos em suas edições. Este Número Especial variou este escopo, admitindo a inserção de textos já trazidos a comunidade científica. Este fato decorreu de uma intenção específica que foi reunir em um único lugar discussões sobre o tema das relações entre o protestantismo e o Regime Militar no Brasil, com vistas a indicar a trajetória das discussões sobre tal objeto nos últimos dez anos, e acompanhar sua evolução ou eventual involução. Na verdade, o volume seria maior incluindo trabalhos pioneiros e textos publicados no exterior, mas não foi possível este intento.
Os estudos sobre a inserção do protestantismo brasileiro têm ganhado maior intensidade a partir dos anos 80. Mas a questão política não ganhou um espetro satisfatório, sobretudo, pelo fato que aas instituições religiosas tendem a restringir o acesso a documentos que, a seu juízo, possa comprometê-la. Neste particular, foram rarefeitos os estudos sobre as obscuras relações do protestantismo com o regime militar, que somente em anos mais recentes têm sido objeto de análises mais substantivas.
Assim, quase todos os textos apresentados tratam das expressões e relações do protestantismo com o Golpe Militar a partir das principais denominações religiosas, as mais antigas no Brasil, que são, em geral, reunidas sobre a tipologia de protestantismo de missão, ou, equivocadamente, protestantismo histórico, equivocadamente uma vez que todos os grupos são históricos. A exceção deste tratamento, aparece no texto trincheiras da verdade: o fundamentalismo evangélico e a ditadura militar brasileira, de Lyndon de Araújo Santos e Adroaldo José Silva Almeida, que discutem as relações protestantismo-golpe da perspectiva do fundamentalismo religioso.
O professor Vasni de Almeida, trata do ambiente metodista, e analisando “o silêncio, a defesa da ordem, a denúncia das injustiças sociais e a defesa da democracia”, demonstra como a problemática que levou a crise política e a instituição do estado militar, esteve na ordem do dia das discussões naquele grupo religioso.
Três trabalhos versam sobre a Igreja presbiteriana do Brasil IPB apoia a gloriosa revolução, de Silas Luiz de Souza, Poder e memória: o autoritarismo na igreja presbiteriana do Brasil no período da ditadura civil-militar pós 1964, de Valdir Gonzalez Paixão Junior, e Diálogos entre religião e política: discursos e práticas da Igreja Presbiteriana do Brasil (1962-1969), de Márcio Ananias Ferreira Vilela. De perspectivas diferenciadas os trabalhos tratam do apoio político material e simbólico oferecido pelos presbiterianos ao estado de autoritário, e o reflexo do modelo de autoritarismo militar instituído como modelo de gestão institucional na Igreja Presbiteriana do Brasil.
Outros três trabalhos remetem a tradição batista, Na antecâmara do Golpe. O Manifesto dos Ministros Batistas do Brasil, 1963, de João Marcos Leitão Santos, Os batistas e o governo militar: Deus salve a pátria, da professora Elizete da Silva e “O comunismo é o ópio do povo”: representações dos batistas sobre o comunismo, o ecumenismo e o governo militar na Bahia (1963 – 1975) de Luciane Silva de Almeida.
O primeiro trabalho é uma análise do Manifesto da Ordem dos Ministros Batistas do Brasil, demonstrando como, apesar de retoricamente infenso a militância política, os batistas, pelos seus ministros, apresentaram um texto destoante com o tradicionalismo político que marca o protestantismo no Brasil, surpreendendo a comunidade evangélica, e conseguindo ampla repercussão.
Os dois outros textos analisam o compromisso político que caracterizou a relação majoritária dos batistas com o novo regime, primeiro Elizete da Silva, toma o slogan “Deus Salve a Pátria” adotado pelos batistas, sugerindo que o regime deposto se caracterizava como uma ameaça a sobrevivência da pátria. Em perspectiva similar Luciane Almeida, tomando a região de Feira de Santana como referência para a experiência nacional, mostra que este agente ameaçador da pátria era o “comunismo ateu”, expondo a retórica que se estabelecia contra o comunismo nos periódicos batistas.
Nos dois trabalhos que completam este Número, estão A ASTE e a ditadura militar, de Manoel Bernardino de Santana Filho e o referido Trincheiras da verdade: o fundamentalismo evangélico e a ditadura militar brasileira, de Lyndon Santos e Adroaldo Almeida. A ASTE, instituição organizada para congregar os seminários teológicos protestantes no Brasil, possuía por isso em seus quadros agentes intelectuais privilegiados. Com a instituição do estado militar a ASTE foi atingida diretamente em seus quadros, pelas mesmas práticas que se manifestaram em outros setores, da “traição, delação, e perseguição”, esvaziando seu potencial de fórum de reflexão teológica e político-social.
Na análise de Santos e Almeida, fica esclarecida como a lógica que permeia o fundamentalismo religioso esteve na base das opções políticas do protestantismo brasileiro, que se traduziu como “movimento difuso conquistou, então, espaços e posições de poder e de controle de instituições”, “acirrando a oposição e a crítica ao comunismo, ao modernismo, ao ecumenismo, ao liberalismo moral e ao catolicismo”, discurso que se manifestou em todas as tradições religiosas protestantes majoritárias no Brasil.
João Marcos Leitão Santos – Editor
SANTOS, João Marcos Leitão. Apresentação. Mnemosine Revista. Campina Grande, v.5, n. especial, 2014. Acessar publicação original [DR]