O Brasil descobre a pesquisa científica: os museus de ciências naturais no século XIX – LOPES (VH)

LOPES, Maria Margaret. O Brasil descobre a pesquisa científica: os museus de ciências naturais no século XIX. São Paulo, Hucitec, 1997. Resenha de: FIGUEIREDO, Betânia Gonçalves. Os Museus e a pesquisa.  Varia História, Belo Horizonte, v.18, n.27, p. 161-162, jul., 2002.

Os museus têm despertado interesse crescente enquanto objeto de pesquisa e intervenção de vários campos profissionais. Afinal, hoje, reconhece-se que estes espaços podem movimentar alguns milhões de dólares. Mas independente do fator econômico, os museus estão se tornando importantes enquanto objeto de pesquisa, mais especificamente os museus de ciência, criados no Brasil no século XIX, podem ser compreendidos como espaços privilegiados para analisar aspectos dos primórdios do desenvolvimento da pesquisa científica no País.

Podemos citar dois títulos que contemplam este objeto de estudo, respeitando as especificidades dos recortes temáticos e teóricos de cada um. São eles “O espetáculo das raças” de Lilia M. Schwarcz e “O Brasil descobre a pesquisa científica” de Maria Margaret Lopes, respectivamente publicados em 1993 e 1997. O primeiro recebeu ampla divulgação, mas o objetivo maior do texto não estava centrado nos museus e sim nas instituições e na questão racial no Brasil no século XIX. Mesmo assim, entre as instituições estudadas, os museus são contemplados. Ambas autoras escolheram como tema de análise para o entendimento do século XIX uma passagem pelo mundo dos museus brasileiros, especialmente os chamados museus de ciência.

De modo mais direto, este é o objeto de pesquisa de Maria Margaret Lopes em “O Brasil descobre a pesquisa científica”. A grande novidade do texto é a mescla entre a pesquisa histórica propriamente dita, especificamente no campo da história da ciência, com a literatura especializada em museologia. Mesmo tendo formação básica em geologia, a autora, ao desenvolver pesquisa histórica para fins do seu doutoramento, incorporou, não apenas o método histórico, ou parafraseando E. P. Thompson a “lógica da história”, como também dominou com destreza os meandros da discussão sobre museus nos tempos atuais. Desta forma foi possível realizar uma análise histórica, tendo como parâmetro um entendimento de museu extremamente contemporâneo. O pressuposto básico deste entendimento moderno de museus pressupõe que os objetos (exemplares da fauna, da flora, artefatos etc), ao serem recolhidos (retirados do contexto original) para tornarem-se objetos pertencentes ao acervo do museu, perdem seu valor primeiro, transformam o valor original, agregam novos valores. Esta metamorfose sofrida pelos objetos agregados aos acervos museológicos trata-se da formação/criação de novos semióforos, de acordo com Pomian1.

Outro ponto alto do texto em questão é ter privilegiado uma abordagem de história da ciência para se investigar as origens dos museus de ciência no Brasil. Se por um lado é possível identificar bons trabalhos de pesquisa sobre os primórdios da ciência no Brasil, por outro lado não havia uma preocupação em compreender os museus de ciência como espaços privilegiados de se produzir ciência. O texto em questão, O Brasil descobre a pesquisa científica, vem romper esta barreira e tabu, elegendo como tema central os próprios museus de história natural.

Os museus são espaços propícios às intervenções e análises interdisciplinares. Podem ser abordados do ponto de vista da comunicação com o público, da organização do acervo, da estrutura das exposições, das políticas de comunicação e intercâmbios com instituições afins para citarmos alguns exemplos. Mas os museus também podem ser estudados e analisados a partir da sua origem e das relações estabelecidas para viabilizar sua existência. Dentro deste ponto de vista o estudo dos museus insere-se no espaço da história da ciência.

No final do livro encontram-se algumas ilustrações que sem dúvida ganhariam se estivessem apresentadas ao longo do texto.

Nota

1 pomian, k. coleção. enciclopédia einaudi, 1. memória – história. porto: imprensa nacional/casa da moeda, 1984.

Betânia Gonçalves Figueiredo – Professora do Departamento de História – UFMG – Grupo Scientia & Technica.

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