Expressões das Religiões e Religiosidades no Mundo / Tempo Amazônico / 2019

Mesmo que a afirmação possa parecer, por um lado, um tanto presumida, e, por outro, um tanto limitada, cremos que o fenômeno religioso, ao longo da vida social, em momentos distintos e sob o domínio de paradigmas diversos, afirmou-se sempre como uma questão presente na história da humanidade. Como aprendemos, desde os primeiros contatos com a pesquisa, a sistemática incursão no universo mitológico durkleimiano na busca das formas elementares da vida religiosa, pelo qual emerge uma proposta de pensamento mágico, religioso e cientifico, já sinalizando para uma longa discussão sociológica a respeito das representações religiosas. De fato, a intensificação do fenômeno religioso tem influenciado os rumos dos países, organismos internacionais e na subjetividade humana. Intelectuais diziam que com o avanço da ciência e da racionalidade humana substituiriam o papel das religiões e religiosos tenderiam na humanidade. Notamos que não foi bem assim. As religiões e religiosidades possuem a capacidade de mutação e estão mais vivas do que nunca entre as pessoas.

O presente dossiê rotulado “Expressões das Religiões e Religiosidades no Mundo” reúne textos importantíssimo que refletem sobre a presença das manifestações religiosas na atualidade. A organização deste número coube aos docentes Dra. Maria da Conceição Cordeiro da Silva e Dr. Marcos Vinicius de Freitas Reis. Ambos membros do Centro de Estudos de Religião, Religiosidades e Políticas Públicas da Universidade Federal do Amapá.

O primeiro texto de autoria do docente da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul André Dioney Fonseca contribui com o texto “Lectio Divina: Práticas de Leitura e Catequese na Paróquia Cristo Libertador, da Cidade de Santarém – Pará (2011-2015)”. O autor debate as práticas religiosas oracionais da Igreja Católica em Santarém e suas estratégias de catequização.

O segundo texto escrito por José Augusto Oliveira Dias chamado “Pentecostalismo e Pessoas em Situação de Rua: Uma Narrativa Analítica Critica Desta Relação no Bairro do Jurunas – Belém do Pará”. Sabemos que os evangélicos é o grupo religioso que mais cresce no Brasil. Uma das estratégias para sua expansão são os trabalhos assistencialistas com as pessoas carentes. O autor discute as estratégias proselitistas por meio do trabalho social com moradores de rua desenvolvida por segmentos do universo evangélico em Belém – Paraá

A doutoranda Érika Vital Pedreira contribui neste número com resultados parciais da sua tese de doutoramento. O título do artigo é “O Triplismo nas Inscrições Epigráficas das Martres da Hispania Romana”. A referida autor tem por objetivo pensar a partir das inscrições epigráficas de devoção às divindades conhecidas como Deae Matres ali produzidas, o sentido religioso e social para esta sociedade.

O Professor do Curso de Administração da Universidade Federal do Amapá, o Dr. Alexandre Gomes Galindo contribui com o trabalho “Reflexões Sobre a Maçonaria Contemporânea e Alguns de seus Desafios: Mulher, o Uso das Redes Sociais, Laicidade e Ladmarks”. O trabalho tem o desafio de pensar o uso das redes sociais pela Maçonaria questões sobre as mulheres e a laicidade no tempo atual. O trabalho intitulado “Fronteiras Fluidas, Religiosidades e os Desafios Contemporâneos” de autoria da pesquisadora Geórgia Pereira Lima. A ideia é pensar as fronteiras simbólicas e culturais da religiosidade popular na Fronteira do Brasil – Peru e Bolívia.

Os historiadores Milena Maria de Sousa Silva e Ipojucan Dias Campos discutem a questão das curas e milagres ocorridos no catolicismo popular. Sabemos que muitos conhecimentos são mantidos a geração entre famílias e comunidades populares no interior do Brasil. Muitas pessoas recorrem a pessoas que detém estes conhecimentos com o objetivo de cuidar de suas saúde. O texto é denominado “Percepção Oriental e Medicina Popular: Paradigma na Promoção da Saúde em Práticas Católicas”

O estudioso João Everton da Cruz com o trabalho “Um Conselheiro de Nosso Tempo” discute os conselheiros que existem no catolicismo popular nordestino. Muitas pessoas procuram líderes comunitários em busca de respostas para seus problemas cotidianos.

A questão do ensino religioso está presente neste dossiê. Sabemos da importância do estudo das questões religiosas e das religiosidades no contexto escolar. O artigo defende a ideia de um ensino laico, plural e não confessional a partir dos referencias da Ciência da Religião. Os autores são: Maria José Torres Holmes, Harry Carvalho da Silveira Neto e Lusival Antônio Barcellos e o trabalho chamado “A Identidade Pedagógica do Ensino Religioso: No Currículo do Ensino Fundamental”.

Os pesquisadores Ruidnilson Pereira Cardoso e Rafael Parente Ferreira Dias contribuem com o texto “O Caminho Para a Felicidade Segundo Siddharta Gautama”. Texto de cunho filosófico que debate os ensinamentos do líder religioso citado no título do texto.

O estudioso Raylinn Barros da Silva com o texto “Escola, Catequese e Formação de Professores: Os Missionários Orionitas e a Catolicização do Antigo Extremo Norte de Goiás por Intermédio da Educação (1950-1960)”, debate como a formação dos professores em Goiás é influenciado pelas questões católicas locais.

As questões africanas estão representadas neste número pela discussão de como a dança africana deve e como pode ser ensinada nas escolas públicas e privadas a partir das diretrizes da LEI Nº 10.639 / 2003. Os autores deste trabalho são: Bianca Cristina Alencar de Azevedo e Rosangela Siqueira da Silva chamado “A Dança Afro e a Implementação da Lei Nº 10.639 / 2003.

Os pesquisadores Rodrigo Reis Lastra Cid, Afrânio Patrocínio e Marlon Viana de Almeida Junior contribuem com o texto “As Garrafadas Amazônicas de Santana – AP”. O trabalho realizou entrevistas com alguns curandeiros do município de Santana e catalogou as suas práticas de receitas de garrafadas.

Na sessão de artigos livres o trabalho dos intelectuais Isis Tatiane da Silva dos Santos e David Junior de Souza Silva intitulados “Políticas Públicas de Reconhecimento de Saberes Tradicionais no Amapá: o PDSA”. A ideia do artigo é pensar a formulação e a implementação das políticas públicas no Estado do Amapá dos Saberes Tradicionais das pessoas localmente.

A professora da Universidade Federal do Amapá Inajara Amanda Fonseca Viana com o texto denominado “Caminhos para o Desenvolvimento do Estado do Amapá, a partir da Percepção Cientifica: mapeamento das dissertações do Mestrado em Desenvolvimento Regional da UNIFAP, no período de 2010 a 2014”. A autora fez o levantamento das dissertações do referido programa para saber quais os temas estão sendo discutidos e qual perspectivas, e seus impactos na sociedade amapaense.

Os pesquisadores Maria Veramoni de Araújo Coutinho e Antônio Rafael Amaro com o texto “O Mau-Estar da Civilização: A Crise Social e Ambiental”, debatem de forma profunda as questões de crise social e ambiental no Brasil e no mundo.

E para finalizar este número a aluna do Curso de Mestrado Profissional em Ensino de História Wanda Maria de Sousa Borges Filha com o trabalho “Reflexões sobre as Teorias PósColoniais, Decoloniais e Epistemologias do Sul e suas Contribuições no Combate ao Pensamento Hegemônico Eurocentrista”, discute de forma teórica como o pensamento decolonial faz criticas ao projeto colonizador europeu.

Maria da Conceição Cordeiro da Silva (UNIFAP)

Marcos Vinicius de Freitas Reis (UNIFAP)


SILVA, Maria da Conceição Cordeiro da; REIS, Marcos Vinicius de Freitas. Apresentação. Tempo Amazônico, Macapá, v.7, n.1, 2019. Acessar publicação original [DR]

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Influência dos Estados Unidos: Mundo e Brasil / Tempo / 2008

O presente dossiê partiu do desconcerto diante de um evidente paradoxo: a inquestionável influência dos Estados Unidos no mundo, e no Brasil em particular, de um lado, e o desinteresse e o conseqüente lento desenvolvimento dos estudos de história dos Estados Unidos nas universidades brasileiras, de outro. Parte desse descompasso deve-se certamente ao acesso restrito à produção historiográfica estadunidense, ao desinteresse das editoras especializadas e ao alto custo das traduções. A escassez de material bibliográfico em português, por sua vez, dificulta o ensino de história dos Estados Unidos nos cursos de graduação e faz com que a história desse país não seja privilegiada nos programas de História das Américas, cuja ênfase, em geral, é posta na história da América Latina, concedendo-se, inclusive, pouca atenção à dinâmica das relações interamericanas.

Com o objetivo de estimular discussões sobre essa história tão desconhecida quanto estereotipada, reunimos nesse dossiê artigos de quatro autores norte-americanos e de uma brasileira, acompanhados por uma entrevista com a atual presidente da American Historical Association (AHA). No conjunto, eles ajudam a visualizar linhas de investigação e reflexão muito distantes tanto de uma historiografia nacionalista dominante até os anos 1950 e marcada pelas idéias do consenso interno e da excepcionalidade da experiência norte-americana, produzida por norte-americanos, quanto de uma historiografia brasileira sobre os Estados Unidos, que igualmente elide a diversidade e os conflitos sociais e políticos, ao valorizar a continuidade de traços negativos e perversos de suas políticas internas e externas. Já é hora de superar esses paradigmas que sustentam uma cultura histórica e um imaginário sobre os Estados Unidos que não convidam à reflexão e à pesquisa.

O artigo de Mae Ngai trata de imigração e controle de fronteiras, tema fundamental da história norte-americana e uma das questões mais candentes no debate político, posto que associada à discussão da identidade nacional desde a fundação da nação. O período recoberto pelo artigo é o dos anos 1921 a 1965, quando teve vigência uma legislação que estabelecia quotas para imigrantes segundo a nacionalidade. A autora demonstra o quanto essa política imigratória se fez acompanhar do reforço do controle das fronteiras terrestres, especialmente a do sul, e da deportação de imigrantes considerados ilegais, cujo número se elevou de modo extraordinário, justamente em função da importante mudança conceitual que se operou então. Atingindo indivíduos já inseridos na sociedade muitas vezes por longo tempo, a deportação e sua revisão, implementadas de modo diferenciado de acordo com a nacionalidade, envolvia avaliações sobre adequação social e aptidão para a cidadania, ou seja, critérios qualitativos supostamente superados pelo princípio numérico que regia a política em vigor. Ao recuperar o debate político sobre princípios e direitos que a revisão da lei suscitou, a autora nos dá acesso aos conflitos vividos pela sociedade norte-americana naquele contexto.

No segundo artigo, Gary Gerstle articula guerra e imaginário político norte-americano, ao analisar produções cinematográficas e o sucesso editorial de obras que se dedicaram a recuperar, nos anos 1990, as duas guerras mais populares da história norte-americana: a Guerra Civil e a Segunda Guerra Mundial. O autor percebe o investimento de figuras como o diretor Spielberg e o historiador Sthephan Ambrose em filmes e séries como “O resgate do soldado Ryan” e Band of Brothers como parte do movimento de reconciliação dos liberais com o nacionalismo, depois do trauma do Vietnã. Através da figura do soldado-cidadão, central nessas narrativas épicas, busca-se realçar sua disposição cívica e moral, valorizada em geral pelos conservadores, de modo a novamente associar a guerra ao sentido de missão e virtudes democráticas.

Os artigos de David Chappell e Jessica Graham relacionam ideologia, religião e relações raciais. O primeiro enfoca o pensamento de líderes do movimento pelos direitos civis, refutando a tese, muito difundida, de que Martin Luther King Jr. tenha adotado uma perspectiva gradualista nessa matéria, o que o colocaria num pólo oposto ao de outros líderes negros considerados radicais, que rejeitaram qualquer projeto de integração ou acomodação com a América branca. Chappell demonstra, valendo-se de grande erudição, que o evangelismo profético estava na base da desobediência civil pregada por King e outros líderes negros que, ao contrário dos liberais, tinham uma visão extremamente negativa da natureza humana e da ordem social. Não comungavam, portanto, da idéia de que a discriminação racial, por sua disfunção e irracionalidade, teria seus dias irremediavelmente contados, considerando que a redenção dessa ordem só poderia advir da ação dos próprios negros. A ênfase do autor no poder mobilizador do discurso profético parece irrefutável, dada a disciplina e a firmeza demonstradas pelas massas negras na luta pelos direitos civis que, por fim, obrigou o governo a agir, tornando ilegal a segregação racial.

Jessica Graham se vale do boxe, esporte muito popular e carregado de forte simbolismo relacionado à nação, para apontar mudanças nas sensibilidades coletivas nos Estados Unidos decorrentes da ascensão do nazismo. Analisando a clara mudança na disposição do público em relação ao boxeador negro Joe Louis por ocasião das duas lutas que travou contra o alemão Max Schmeling em 1936 e 1938, a autora percebe um desgaste do paradigma racialista e maior abertura para inclusão do negro na comunidade nacional imaginada na segunda metade da década de 1930.

Representando os estudos norte-americanos no Brasil, Mary Anne Junqueira retrocede ao século XIX para recuperar um episódio muito pouco conhecido: a primeira expedição de circunavegação de caráter científico lançada pela Marinha dos Estados Unidos em 1838. Mary Junqueira mostra-nos que a então jovem nação norte-americana, antes mesmo de consolidar suas fronteiras terrestres, já se lançava nos mares, revelando não só suas ambições no terreno econômico, militar e geopolítico, mas também a preocupação em construir sua hegemonia no campo científico e cultural. A expedição apresenta-se assim como um empreendimento de múltiplas faces. Além do grande feito de constatar que a Antártida era um continente separado, de mapear costas e inúmeras rotas marítimas, a expedição coletou um número elevadíssimo de artefatos culturais, espécimes da fauna, da flora, amostras de minerais e, o que é muito significativo, constituiu uma rede de contatos entre atores-chave neste intercâmbio internacional: oficiais, diplomatas, cientistas, missionários. Desse modo, a autora nos ensina que muito antes da virada do século XIX para o XX – momento costumeiramente assinalado como início da extroversão dos Estados Unidos –, esse país já procurava firmar seus interesses globais frente às potências européias.

Por fim, a entrevista com Barbara Weinstein, a primeira “brazilianista” a assumir a presidência da AHA, centenária associação de historiadores dos Estados Unidos, descortina o universo extremamente plural de interesses e tendências da historiografia estadunidense, valorizando o intercâmbio com historiadores de outros países, particularmente o Brasil.

Cecília da Silva Azevedo – Professora Adjunta do Departamento de História da Universidade Federal Fluminense. E-mail: ceciliasa@uol.com.br


AZEVEDO, Cecília da Silva Apresentação. Tempo. Niterói, v.13, n.25, 2008. Acessar publicação original [DR]

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