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Modernização e Religiosidade / Revista Mosaico / 2012
Os intercâmbios entre a religiosidade e a modernização são intermitentes. Entretanto, inspirados pela produção teórica europeia, os dois campos foram colocados muitas vezes em oposição. A religião, nesta perspectiva, precisaria decrescer para que a modernidade emergisse. A “lei” da secularização, ou do desencantamento do mundo, foi considerada inexorável em diversas áreas, como se fosse sinônimo de progresso. Em certo sentido, tal concepção tornou-se a filosofia da historia de muitos pesquisadores do campo religioso.
A observação dos movimentos religiosos na virada do século levou muitos a repensarem tal vertente interpretativa. Da oposição chegou-se à confluência e, até, à ideia de que, sim, a modernidade produz religiosidade. Claro, que os sujeitos que projetam culturalmente os sentidos sociais, classificados como religiosos ou não, modernos ou tradicionais, são integralmente os mesmos, inseridos em redes cada vez mais indeterminadas de trocas. O dossiê temático apresentado por este numero da Revista Mosaico reflete esta problemática de pesquisa.
O tema da secularização e da laicidade, tão central, é colocado como foco de discussão pelos dois artigos iniciais. O primeiro, escrito por João Miguel Teixeira de Godoy, aborda o tema a partir da historiografia eclesiástica e da concepção providencialista da história. Conclui que a sacralidade e o mítico estão presentes em diversos lugares considerados insuspeitos pelos teóricos da modernidade. Adentra, ainda, na análise da memória social, analisando algumas versões acerca da fundação da cidade de Campinas, em São Paulo.
Já o segundo artigo, se aproxima do tempo contemporâneo e se afasta em termos geográficos. Nele, Tarcísio Amorim Carvalho investiga o papel das confissões religiosas no espaço público europeu, comparando as decisões recentes dos governos francês e inglês acerca da laicidade política, bem como do pluralismo étnico-religioso. O tema da imigração, a noção de pertença, as identidade nacionais e, por conseguinte, os direitos humanos são analisados com erudição pelo autor, apontando como cada tradição político-filosófica embasa uma postura distinta quanto a convivência pacifica entre os grupos.
No terceiro artigo deste dossiê, a relação entre ciência e religião é abordada por Alfredo Bronzato da Costa Cruz a partir da relação pessoal entre dois pesquisadores: o jesuíta João Alfredo Rohr e o antropólogo Luiz de Castro Faria. A historia da arqueologia brasileira é ali tratada, bem como as politicas de preservação histórica, demostrando-se como ambas foram envolvidas por questões religiosas. O foco na atuação do Conselho Estadual de Cultura de Santa Catarina e na luta pela valorização patrimonial dos sambaquis em nada desmerece o escopo maior dos tópicos abordados pelo autor.
Os dois trabalhos seguintes nos levam a adentrar no mundo protestante. O primeiro deles, escrito por Ismael Fuckner analisa como a Igreja Adventista do Sétimo Dia no Brasil tem enfrentado as mudanças rápidas do mundo moderno. Esse grupo religioso é caracterizado socialmente por certos costumes tradicionais, como o cuidado com a alimentação e a guarda rigorosa do sábado enquanto dia santificado. Realizando o estudo de caso com uma comunidade em Belém do Pará, ele demonstra as adaptações que têm sido possíveis nas operações de manutenção identitária feitas pelo grupo.
O outro artigo, escrito por Bertone de Oliveira Souza, apresenta uma avaliação metodológica das principais tendências da historiografia protestante, exemplos do pluralismo religioso e científico em vigor na sociedade brasileira. A constituição de um campo de pesquisa, circundado por tantos debates e pré-conceitos, não é inocente. Neste artigo, a modernidade é um pressuposto do que os cientistas tem visto e escrito em suas produções.
Encerra o dossiê temático o trabalho de Eduardo Gusmão de Quadros acerca do tempo messiânico e do tempo secularizado que fora estabelecido pela historiografia. O autor analisa a noção de futuro em autores bem diferentes em termos de estilo e de época como Antonio Veira, Walter Benjamin e Enrique Dussel. Defende, por fim, que a noção de tempo aberto deve permanecer importante, tanto na hermenêutica do conhecimento histórico quanto na construção de uma teoria crítica.
O número inclui dois artigos livres, não relacionados com a temática central do dossiê. O primeiro, escrito por Deusa Maria Rodrigues Boaventura, trata da história de Goiás e demonstra como a politica indigenista foi central no processo de organização administrativa do território. A autora percorre o século XVIII desvelando a lógica dos aldeamentos indígenas e seus objetivos que estão muito além dos catequéticos e civilizatórios.
O segundo texto discute a questão da Linguagem e do Sentido, explorando as ideias deste pensador original que foi Henri Bergson. Rodrigo Tavares Godoi discute a teoria bergsoniana do conhecimento enquanto visão crítica da ciência, como era pensada nos finais do século XIX. Ele demonstra, inclusive, suas semelhanças e diferenças com o grande crítico da civilização científica que foi Nietzsche.
Por fim, apresentamos uma resenha do trabalho de doutoramento do professor Eduardo Sugizaki, da PUC Goiás, feita pelo professor Jean-Claude Dupont, da Universidade Julio Verne, na França, A temática da história de uma doença tropical é exigente quanto a formação transdisciplinar e a abordagem do autor merece o destaque pela inovação proposta nas páginas de seu trabalho.
O número encerra, como de praxe, divulgando as dissertações defendidas no Programa de Mestrado em História da PUC Goiás no segundo semestre de 2012.
Uma leitura proveitosa a todos!
A Comissão Editorial
Comissão Editorial. Editorial. Revista Mosaico. Goiânia, v.5, n.2, jul. / dez., 2012. Acessar publicação original [DR]