Posts com a Tag ‘Migrações’
Migraciones y museos. Una aproximación global | González Bernaldo de Pilar, Marianne Amar e Marie-Claire Lavabre
Detalhe de capa de Migraciones y museos. Una aproximación global
En noviembre de 2014 se realizó en Buenos Aires el coloquio internacional “Migraciones en el Museo”, que reunió a especialistas de distintos países en torno a la temática de los museos. Este es un tópico que, de manera algo tardía con respecto a otros países latinoamericanos, comienza a resultar de interés en Argentina, lo que no deja de ser curioso si pensamos el peso que las luchas por la memoria, para tomar el concepto de Elizabeth Jelin, han desempeñado en la escena pública nacional. En efecto, las preocupaciones teóricas y metodológicas sobre los museos, esos sitios de cruces, encuentros y también conflictos, es relativamente reciente en nuestro país. Como resultado de ese encuentro, el libro Migraciones en el Museo. Una aproximación global retoma y profundiza las discusiones del coloquio de 2014, pero vale destacar que va mucho más allá: funciona como un excelente material introductorio, con trabajos de gran calidad académica y de una atractiva diversidad para entender la complejidad de los museos, quienes trabajan en ellos, y las políticas públicas que se pretende que sigan, así como las dificultades y limitaciones que estas encuentran.
Si esto es así es porque los museos de migraciones condensan buena parte de las tensiones que tales instituciones experimentan, así como en ellos son nítidos los mandatos sociales que el sentido común deposita en los museos. Por ejemplo, analíticamente es fácil señalar que las identidades son dinámicas y múltiples, y se conforman en la interacción, o que el pensamiento histórico debe ser situado espacial y temporalmente, pero lo cierto es que la idea de “museo” remite, para miles de sus visitantes, especialistas o no, a lo fijo. Entonces, ¿Cómo mantener ese dinamismo en una muestra aparentemente “estática”? ¿Qué hacer en aquellos museos que abordan temas conflictivos y complejos o controversiales? Leia Mais
El vuelo corto. Mujeres y migraciones en la Edad Moderna | Ofelia Rey Castelão
Ofelia Rey Castelão | Imagem: Unidade de Mulher e Ciencia – Xunta de Galicia
2Firstly, this study examines the relation of women with mobility as well as migration and work, beyond the classical approaches to the study of the topic that either portray women solely as dependent migrants in the context of family mobility and migration, or as victims of male migration and seasonal mobility. Rey Castelao does that in two different ways. On the one hand, the author looks at women as active historical agents in these processes of displacement, namely as migrant workers engaging in short- and long-distance migration with either a seasonal, temporary or permanent character. On the other hand, Rey Castelao reconstructs the trajectories and experiences of women as historical actors that not merely endured the consequences of male migration and temporary mobility but that had agency and actively looked for solutions and tried to take advantage of the new circumstances in which they found themselves in. Leia Mais
Migrações: identidades, culturas e trajetórias / Aedos / 2021
Migrações | Imagem: Fundação FHC |
Há pouco mais de um ano, nossos editores finalizavam o volume onze, número vinte e cinco, da Revista Aedos, já sob as recomendações sanitárias de isolamento social, fundamentais para o enfrentamento da pandemia de Covid-19. Este é o volume doze, vigésimo sétimo número desse periódico, e a terceira publicação finalizada, integralmente, sob tais circunstâncias. A crise sanitária persiste, acompanhada por uma dolorosa paisagem de mortes e destruição econômica e social. No Brasil, passado um ano dos primeiros alertas da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre a disseminação em massa do novo coronavírus, ainda há uma assombrosa carência de políticas efetivas e coordenadas pelo governo federal para mitigar esses efeitos – o que nos lançou tragicamente ao epicentro da crise mundial nas últimas semanas. Enquanto estas palavras são escritas, o país beira as três mil mortes diárias, sem contar subnotificações, de um total de mais de trezentas mil vidas perdidas. Os profissionais da saúde encontram-se exaustos; por toda parte, faltam leitos e medicamentos essenciais para o tratamento dos pacientes.
Embora o vírus não descrimine ninguém, demonstrando como a comunidade humana é igualmente frágil, a desigualdade, segundo Judith Butler (2020, p. 60-62), que inclui “o nacionalismo, a supremacia branca, a violência contra as mulheres, as pessoas queer e trans, e a exploração capitalista”, atribui-lhe esse componente de modo cada vez mais “radical”. Ora, pois não seria ao menos emblemático que a primeira vítima notificada no Brasil tenha sido uma empregada doméstica de 63 anos? E, já que falamos disso, como não recordar, conforme Achille Mbembe (2020, p. 4), de “todas as epidemias imagináveis e inimagináveis que, durante séculos, devastaram povos sem nome em terras remotas”? Como esquecer das guerras e ocupações predatórias que mutilam e lançam milhares de pessoas a uma vida errante?1 Ou ainda, que tem a saúde e a expectativa de vida comprometidas pela “ação de empresas poluidoras e destruidoras da biodiversidade.” A propósito, na medida em que o vírus quebrava as barreiras do espaço e dos alvéolos pulmonares, as florestas brasileiras (os pulmões da Terra), juntamente com a sua fauna, arderam em chamas, tal qual qualquer imagem arquetípica do juízo final. A fumaça liberada daquele “inferno” transformou dia em noite.
Ainda que muitas vezes queiramos nos livrar do fato, é no mínimo lamentável tamanha destruição para “olharmos para a história humana como parte da história da vida nesse planeta”, como tanto insistiu Dipesh Chakrabarty (2013, p. 15). Nessa perspectiva, nos voltamos ao “corpo”, com seus medos, desejos e sensibilidades – e, agora, isolado; nos voltamos à experiência do “frágil e minúsculo corpo humano”, a que Walter Benjamin (1987, p. 114) tanto se esforçou para evidenciar no século passado. Diante de tamanha catástrofe, esperamos que os trabalhos reunidos em mais uma edição “pandêmica”, com um dossiê temático dedicado às migrações, identidades, culturas e trajetórias, possa talvez servir como um “sopro”. Não como aquele que vem da “tempestade do paraíso”, impedindo o “anjo da história” de Benjamin (1987, p. 226) de “acordar os mortos e juntar os fragmentos”; mas como o “(co)movedor”, no “jogo de palavras” de Alistair Thomson (2002, p. 359), toque da cítara dos aedos
Notas
1. Com a pandemia, segundo o último relatório de Tendências Globais (2020) do Alto-comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), “o número de pedidos de asilo registrados na União Europeia em março de 2020 caiu 43% em comparação com fevereiro, à medida que os sistemas de asilo diminuíram ou pararam com países fechando fronteiras”.
Referências
BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas. Magia e técnica, arte e política. Ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1987. v. 1.
BUTLER, Judith. El capitalismo tiene sus limites. In: AGAMBEN, Giorgio et. al. Sopa de Wuhan. Pensamiento contemporáneo en tiempos de Pandemias. [S.l.]: ASPO (Aislamiento Social Preventivo y Obligatorio), 2020.
CHAKRABARTY, Dipesh. O clima da História: quatro teses. Sopro, São Paulo, n. 91, jul. 2013.
MBEMBE, Achille. O direito universal à respiração. N-1 Edições, São Paulo, 2020.
THOMSON, Alistair. Histórias (co)movedoras: História Oral e estudos de migração. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 22, n. 44, p. 341-364, 2002.
UNCHR. Global Trends. Forced Displacement in 2019. The UN Refugee Agency, Genebra, 18 jun. 2020
Lúcio Geller Junior – Mestrando do Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ). E-mail: lucio.geller@gmail.com
GELLER JUNIOR, Lúcio. Editorial. Aedos, Porto Alegre, v. 12, n. 27, março, 2021. Acessar publicação original [DR]
Migrações Contemporâneas: Reflexões e práticas profissionais | José Sterza Justo e Mary Yoko Okamoto
Movimentos coletivos e deslocamentos individuais voluntários e forçados fazem parte da constituição da humanidade, entretanto, a intensificação do ir e vir no mundo atual tem se ampliado dado as condições sociais possibilitadas pela globalização e pelo avanço tecnológico dos meios de transporte e comunicação. Compreender essas dinâmicas, assim como os fluxos e refluxos, além das mobilidades geográficas e psicossociais, os trânsitos e as formações identitárias, são os objetivos centrais da obra Migrações contemporâneas: reflexões e práticas profissionais organizada pelos psicólogos José Justo e Mary Okamoto. O caráter interdisciplinar desse empreendimento, entretanto, justifica-se pela variedade de temas, enfoques, métodos e profissionais que fazem desta obra que veio à baila em 2019.
O primeiro capítulo, batizado Migrações, multiculturalismo e identidades: revisitando conceitos, produzido pelos psicólogos Marcelo Naputano e José Justo busca a partir de uma abordagem conceitual explicar as transformações e abrangências das concepções de cultura, fronteira e identidade. Leia Mais
300 años: Masonerías y Masones (1717-2017) – ESQUIVEL et. al. (Topoi)
ESQUIVEL, Ricardo Martínez; ANDRÉS, Yvan Ponzuelo; ARAGÓN, Rogelio. 300 años: Masonerías y Masones (1717-2017). Tomo I: Migraciones, Ciudad de México: Palabra de Clío, 2017. 194pp. Resenha de: CAMARGO, Felipe Corte Real. Migrações sob o esquadro e o compasso: 300 anos de histórias da maçonaria. Topoi v.19 n.38 Rio de Janeiro May/Aug. 2018.
Escrever uma antologia é sempre uma tarefa complexa. Mais do que a reunião de textos diversos sobre um determinado assunto, é necessário ritmo, coerência e coesão; além de unidade temática e estilística, mesmo para textos contraditórios entre si. Tal necessidade aumenta ao se produzir uma antologia em cinco volumes, da qual o primeiro volume é o tema aqui (Esquivel, 2017).
A coleção 300 Años de Masonería (Esquivel, 2017) busca organizar as ideias e os ideais, que bem poderíamos chamar de pós-coloniais, que vêm sendo produzidos em torno da Revista de Estudios Historicos de la Masonería Latinoamericana y Caribeña (REHMLAC). Com dez anos de existência, o periódico ascendeu de um difusor dos trabalhos latinos sobre história da maçonaria para um coletivo de ideias que, por exemplo, organizou sua própria (e maior) mesa no último Congresso Mundial sobre Fraternalismo, Maçonaria e História, em Paris.1 Mesa esta que avivou o debate sobre a pluralidade da maçonaria em suas práticas e seus pensamentos reafirmando que não deve haver maçonaria no singular para quem pesquisa este fenômeno.
Os editores da coleção, Ricardo Martínez Esquivel, Yvan Ponzuelo Andrés e Rogelio Aragón – respectivamente diretor, editor e contribuidor regular da REHMLAC -, segundo suas falas nos congressos de Paris (maio de 2017) e Havana2 (julho de 2017), querem demonstrar o caráter plural do fenômeno maçônico, ou seja, das maçonarias. Por meio dessa multiplicidade querem também dar visibilidade à miríade de pesquisas e pesquisadores que a Ordem3 abarca.
O primeiro volume tem o abrangente título Migraciones, desta maneira busca evidenciar os usos, as recepções e as apropriações não somente do fenômeno estruturante que é a maçonaria, como os impactos produzidos pelo que poderíamos chamar de “ideário maçônico”, que se confunde – mesmo por ser produtor e produto – com a própria modernidade.
Na primeira parte do livro, tal como na tradição universitária, temos a fala do decano. O professor dr. José Ferrer Benimeli, com mais de 40 anos de pesquisas em torno do tema, revisa as fontes e a historiografia produzida entre Espanha e México no oitocentos. Assim, demonstra os usos feitos da história da maçonaria, tanto nas vertentes laudatórias quanto nas detratórias. Desta maneira põe em xeque meias-verdades e mitos perpetuados por historiadores profissionais e amadores, com as intenções mais diversas. Apresentando erudição não somente da história da maçonaria como da história do mundo ibérico, Benimeli demonstra a relevência dos estudos maçônicos e suas ligações não somente aos temas mais variados da historiografia tradicional, mas também sua utilidade para problematizar questões propostas e por vezes tidas por resolvidas. Porém, o desfile erudito de autores, fatos, fontes e datas se apresenta pouco convidativo para o “abre-alas” de uma antologia. No afã de clarificar uma discussão nebulosa, Benimeli demonstra de maneira crua que para desvendar o hermetismo da história da maçonaria é necessário adentrar dois outros: o da historiografia e o da diplomática.
O capítulo seguinte segue uma metodologia semelhante, a divisão da argumentação em três tempos, e fica a cargo de um dos mais renomados professores da Universidade de La Habana (Cuba), Eduardo Torres-Cuevas. O historiador nos leva pela fragmentada história da maçonaria cubana por meio de suas divisões e influências. Ao ler o segundo capítulo, o leitor percebe que há um certo padrão fragmentário nas maçonarias latinoamericanas e que tais cisões acontecem por dois motivos principais: as variadas influências recebidas (Espanha, França, Inglaterra e Estados Unidos) e o papel central que as organizações maçônicas ou criadas nos moldes da maçonaria irão execer nas nascentes repúblicas. Tal atuação se deve ao fato de que as lojas maçônicas se apresentam como os primeiros corpos de auto-organização político-partidária nos séculos XVIII e XIX na América Latina.
Torres-Cuevas coloca em suspenso questões sobre as origens da maçonaria na ilha. Seguindo também a tradição mais clássica, tal como Benimeli, prende suas conclusões a provas documentais. Porém, insinua bastante livremente sobre possibilidades, chegando inclusive a apontar uma possível presença de “maçons operativos” (pedreiros que teriam sido a origem da maçonaria moderna, dita “especulativa”) na construção da Catedral de Havana. Das primeiras lojas fundadas no final do século XVIII por maçons fugidos da Revolução Haitiana, passando pela profusão de lojas e Grandes Orientes por quase 30 anos até o período final do século XIX, no qual se estabelecem as potências maçônicas que formariam o panorama da Ordem em Cuba no século XX, o autor oferece uma história bem costurada com pausas para análises bastante sintéticas, auxiliando o entendimento de uma história com muitas nuances e recheada de jargões.
O capítulo de Éric Saunier, professor da Universidade do Havre (França) demonstra, por meio de uma escrita fluida e precisa, como a história da maçonaria compõe um mosaico com a história política. Por meio de uma problemática que muito bem poderia se resumir a questiúnculas relativas a lojas maçônicas periféricas e suas relações com a sua obedicência central, Saunier apresenta de que modo se deram costuras políticas que permitiram lojas maçônicas antilhanas e lojas maçônicas francesas em cidades portuárias a continuarem fiéis às políticas poligenistas, impedindo a iniciação de negros em suas lojas, contrariando assim a política liberal parisiense do Grande Oriente da França. O capítulo de Saunier reflete a teoria que mesmo dentro de uma mesma obediência maçônica há variados entendimentos sobre sua práxis, cessando, uma vez mais, o entendimento ingênuo da maçonaria como homogênea e unívoca.
Ricardo Martinez Esquivel assina o capítulo que trata da origem da maçonaria centro-americana, nascida em seu país, Costa Rica. O autor discorre com desenvoltura sobre o tema, sobre o qual pesquisa há quase dez anos, principalmente quando foca na análise das redes de sociabilidade que a fraternidade teceu naquele país e nos seus vizinhos, ano após ano. O ponto forte do artigo se apresenta na relação que Esquivel estabelece entre os dados de suas pesquisas prévias com panoramas mais gerais da história da chamada América Latina. Mesmo o leitor neófito no tema poderá entender o peso que a francomaçonaria teve a partir da segunda metade do século XIX e os motivos para as rusgas entre a Igreja Católica e seus membros. Pretendendo apresentar um panorama muito completo, o artigo de Esquivel tende, a partir da metade do texto, para uma narrativa mais tradicional da história política, o que contrasta fortemente com a primeira parte, mais analítica e arrojada.
Na sequência, os primeiros anos da maçonaria mexicana são passados em revista pela experiente historiadora Maria Eugênia Vazques Samenedi. Com consistente trajetória acadêmica no campo da história da maçonaria, a autora revisa as obras que (por antiguidade ou merecimento) são tidas como indispensáveis para contar a história da Fraternidade em território mexicano. Mesclando análise, crítica e novas fontes, a historiadora desmonta mitos maçônicos mexicanos, como a “lenda” de que a primeira loja maçônica no México dataria de 1806 e que se localizaria na Calle de las Ratas. Além deste, desmonta o argumento, bastante comum, entre os historiadores mais tradicionais, de que a fundação das lojas maçônicas teria um caráter eminentemente político. Somente por esses dois feitos, o capítulo já se torna indispensável para qualquer pesquisador do tema na América Latina. Porém, mais do que isso, a historiadora aclara, de maneira sutil, nas últimas páginas, algumas questões de teoria e metodologia que tendem a ser negligenciadas em temas que não fazem parte do mainstream historiográfico, como a diferenciação entre a análise da história de uma instituição e a análise das narrativas que se fazem sobre ela.
Dévrig Mollès, historiador e diretor científico do Arquivo da Grande Loja da Argentina, traz um olhar desde aquele país sobre a chegada do feminismo na América Latina. Com esse tema demonstra o papel central que a maçonaria teve ao servir como base, dada sua capilaridade, aos movimentos vanguardistas do começo do século (feminismo, anticlericalismo, livre-pensamento) que configuraram o moderno sistema-mundo. Tal fenômeno teria ocorrido dado que as redes maçônicas formaram uma “plataforma de transferências culturais e um espaço de lutas culturais”. A escrita de Mollès flui de maneira singular, sua clareza conceitual e suas escolhas bibliográficas, enxutas e certeiras, fazem de seu capítulo um ótimo panorama sobre os movimentos de emancipação feminina na América Latina, suas relações com os movimentos socialistas e com a maçonaria.
O historiador chileno Felipe Santiago del Solar nos oferece um breve panorama dos primeiros anos da maçonaria no Chile. Para tal, faz uma análise das primeiras obras que dão conta das atividades maçônicas no país andino. Este recorrido, del Solar não o faz apenas por uma questão de crítica historiográfica, mas porque a grande maioria da documentação maçônica chilena se perdeu após um terremoto no começo do século XX. Apesar de bastante conciso, o capítulo é o relato de uma trajetória maçônica bastante tardia e singular se comparada aos outros países latinos.
O fechamento do livro fica nas mãos de Guillermo de los Reyes-Heredia, professor da Universidade de Houston (Estados Unidos), que escreve sobre um tema que pode não parecer “demasiado maçônico”, à primeira vista. A sociedade civil, seus elementos e constructos são analisados de maneira bastante didática pelo autor, que busca entender de que maneira as organizações voluntárias têm o poder de promover, criar e contribuir para a democracia (e se, de fato, contribuem). Analisando a maçonaria nesse espectro teórico mais amplo o autor clarifica uma das discussões mais recorrentes – porém pouco aprofundadas – no campo da história da maçonaria na contemporaneidade: aquela relativa à esfera pública. O debate, trazido atualmente por Habermas, é tema obrigatório em todo trabalho sobre a Franco-Maçonaria, e este capítulo é um bom guia para aqueles que desejam abordar o tema com maior propriedade. Além do cabedal teórico, em sua maioria oriundo da Ciência Política, apresentado pelo autor, somos também brindados com uma pequena análise da mitologia maçônica em sua expressão estadunidense, e de como a exacerbação, ou mero exagero, do papel da maçonaria na história política dos países se expressa em um aumento de importância real da Ordem.
A crítica a este volume é a mesma que se pode fazer a qualquer compilação de ensaios sobre a maçonaria, isto é, os autores estão separados por um tema comum. Explico: como a maçonaria foi, e continua sendo, um tema marginal na academia, há uma considerável defasagem teórica, muitas vezes causada pela necessidade dos autores acadêmicos de se comunicar com o seu público, mormente leigo, no que concerne às questões historiográficas. Outro traço dessa separação é a variedade de termos para definir as questões maçônicas que por vezes tais pesquisadores cunham e aplicam unilateralmente. Variedade esta causada pela falta de conhecimento dos termos usados pelos próprios maçons ou, quando há o conhecimento destes, devido a uma necessidade de se diferenciar dos “maçons historiadores”. A história da maçonaria tem sido produzida por maçons frequentemente sem formação acadêmica na área das humanidades, o que torna fundamental a crítica à produção “domingueira”. Seja qualquer um dos motivos, a falta de uniformidade conceitual pode inquietar quem conhece os termos maçônicos e confundir quem deseja conhecer.
De qualquer maneira, o primeiro volume desta coleção mostra que os estudos acerca da maçonaria evoluem para um debate mais público e qualificado. Longe de ser uma seita ou uma religião, ou ainda uma conspiração para dominar o mundo, conforme as crendices à direita e à esquerda, a maçonaria é um capítulo incontornável da história moderna e contemporânea. Como todos os mitos da modernidade, urge desativá-la na sua mística e analisá-la em sua historicidade. Para quem deseja dar os primeiros passos ou incrementar os que já foram dados, Migraciones será uma grata surpresa.
Referências
ESQUIVEL, Ricardo Martínez ; ANDRÉS, Yvan Ponzuelo ; ARAGÓN, Rogelio (Org.). 300 años: Masonerías y Masones (1717-2017). Tomo I: Migraciones. Ciudad de México: Palabra de Clío, 2017. 194p. [ Links ]
1 Painel: “Imperialism, Colonialism and Multiple Freemasonries”. World Conference on Fraternalism, Free Masonry and History. 2017, Paris.
2 V Simposio Internacional de la Masonería Latinoamericana y Caribeña. 2017, La Habana.
3São termos intercambiáveis: Maçonaria, Franco–Maçonaria, a Ordem, a Fraternidade, entre outros.
Como citar: ESQUIVEL, Ricardo Martínez ; ANDRÉS, Yvan Ponzuelo ; ARAGÓN, Rogelio (Org.). 300 años: masonerías y masones (1717-2017). Tomo I: Migraciones. Ciudad de México: Palabra de Clío, 2017. 194p. Resenha de CAMARGO, Felipe Corte Real de. Migrações sob o esquadro e o compasso: 300 anos de histórias da maçonaria. Topoi. Revista de História, Rio de Janeiro, v. 19, n. 38, p. 268-272, mai./ago. 2018. Disponível em: <www.revistatopoi.org>.
Felipe Corte Real de Camargo – Doutorando pela Universidade de Bristol, Inglaterra. E-mail: fc15629@bristol.ac.uk.
300 años: masonerías y masones, 1717-2017 – ESQUIVEL et al (REHM)
ESQUIVEL, Ricardo Martínez; POZUELO, Yván; ARAGÓN, Rogelio (Ed). 300 años: masonerías y masones, 1717-2017. Tomo I: Migraciones. Ciudad de México: Palabra de Clío, 2017. Resenha de: SÁNCHEZ, José-Leonardo Ruiz. Revista de Estudios Históricos de la Masonería. San Pedro, Montes de Oca, v.9 n.1 May./Dec. 2017.
Con el título de Migraciones sale a la luz el primero de los cinco volúmenes que, con ocasión del tercer centenario del nacimiento de la masonería especulativa, constituirán la colección sobre la historia de dicha institución en la que se insertan, además de este, otros volúmenes dedicados a los Silencios, las Artes, la Exclusión y el Cosmopolitismo. Su edición ha sido fruto de la actividad desplegada por la red de investigadores en su mayoría agrupados en torno a la Revista de Estudios Históricos de la Masonería Latinoamericana y Caribeña (REHMLAC+) y la han impulsado comprendiendo la necesidad de luchar contra los mitos y leyendas que se cernían sobre la historia de esta organización, provenientes tanto de quienes la aprecian y están interesados en ella como de sus detractores. En este primer volumen los autores de los distintos trabajos abordan no solo la realidad de la masonería en esa nueva Europa que surge alrededor de la revolución francesa y la nueva América que a partir de entonces se independiza, sino que también describe cómo las redes masónicas de entonces fueron un componente clave de sociabilidad, de migración de ideas, que cimentó los fundamentos de esta nueva realidad por ambos continentes y que permite reconstruir y explicar el devenir histórico posterior.
El primero de los ocho trabajos de que consta el volumen está realizado por el profesor Ferrer Benimeli, fundador del CEHME y en la actualidad su Presidente de Honor; como es bien sabido fue pionero en abordar la temática desde la perspectiva europea y americana, con una dilatadísima producción historiográfica a sus espaldas contribuyendo, con rigor académico, a desmontar en su obra los estereotipos antimasónicos existentes hasta la fecha. En esta ocasión ha centrado su trabajo cronológicamente en el período que va desde las Cortes de Cádiz hasta la independencia de México, en el tránsito del antiguo al nuevo régimen, mostrando la utopía y realidad del liberalismo masónico, cuyo protagonismo hoy se replantea y está en gran parte por demostrar. El autor, haciendo uso de un prolijo conocimiento de los textos del momento a uno y otro lado del Atlántico, muestra cómo y cuándo se prefabricó ese pretendido protagonismo de la masonería; o la importancia que se le atribuyó a ciertos personajes de los que no sabemos con certeza si realmente fueron masones, realidad que se constata en una literatura similar, tanto en la metrópoli como en México, donde también se asocian con los independentistas como Hidalgo. Todo ello no deja de sorprender cuando, lo que sí queda claro, es que las Cortes de Cádiz prohibieron la masonería en los dominios de la Corona española.
Eduardo Torres-Cuevas, director de la Biblioteca Nacional de Cuba “José Martí”, impulsor en el ámbito latinoamericano y caribeño de los estudios sobre la masonería al poner en marcha en 2007 la primera red académica de investigadores sobre la temática, además de gran conocedor de la historia de Cuba, se extiende sobre la instalación de la orden en la Isla y el valor que tuvo para la formación y desarrollo del país. Tras establecer distintas etapas, de la primera de ellas -correspondiente al siglo XVIII- informa de los planes ingleses para fijar logias en la Isla dentro de un plan para el control de La Habana; durante su ocupación por los ingleses, algunos de ellos eran masones, pero nunca criollos. En realidad, los primeros talleres existentes en Cuba a partir de 1798 no lo fueron por influencia de la Gran Logia Unida de Inglaterra sino, paradójicamente, en relación con el Gran Oriente de Francia; el hecho está en relación con el traslado a la mayor de las Antillas de numerosos franceses tras el levantamiento de esclavos en Santo Domingo, incorporándose a los trabajos -ahora sí- algunos criollos y españoles; la primera logia creada en Cuba, en 1804, lo hizo con patente de la Gran Logia de Pensilvania, emigrando en su mayoría tras el movimiento anti galo con la guerra de la independencia. Algo más tarde se constituirían en la Isla los dos cuerpos masónicos, yorkinos y escoceses: los primeros, con connotaciones liberales, formado por criollos, pretendieron influir en el movimiento libertador de México y Cuba; y los segundos, vinculados al Gran Oriente de Francia, mayoritariamente oficiales y comerciantes españoles. Tras un periodo de inactividad, desde comienzos de la década de 1830 hasta 1857 (entonces los cubanos entraron en instituciones masónicas extranjeras, de Estados Unidos, México y Francia), nació la Gran Logia Colón (sin conexión con España, donde no existía masonería) y el Gran Oriente de Cuba y las Antillas (de escaso recorrido, aunque fue en ella donde se gestó el movimiento independentista de 1868) si bien la verdadera reconstitución de la masonería cubana comenzó a partir de esa última fecha, apoyada por los cuerpos masónicos tanto de Estados Unidos como de España, sin que hubiese interferencias en lo político. Esta última masonería influyó en el pensamiento cubano pues buena parte de la intelectualidad, tanto autonomista como independentista, eran masones; tras la primera guerra muchos marcharon del país para sostener desde fuera la lucha por la independencia y se instalaron en cuerpos masónicos extranjeros, entre ellos José Martí. No obstante, el autor indica cómo el movimiento independentista de 1895-1898 no estuvo asociado a cuerpo masónico alguno aunque sí lo fueran sus tres principales figuras (Martí, Gómez y Maceo). Concluye apuntando que la masonería de Cuba contribuyó al desarrollo de las conciencias nacionales y patrióticas así como la cívica individual.
Por su parte Éric Saunier, se extiende sobre el espacio caribeño al plantearlo como enclave estratégico para comprender la masonería francesa y la lucha por el poder entre París y las provincias. Su estudio está centrado en el período cronológico que va desde finales del siglo XVIII a los años de los movimientos independentistas en América latina. Pone en relación la constitución de la masonería caribeña en la lucha de poder entre los altos grados de la de Santo Domingo a finales del XVIII y el control de la vida masónica cubana a comienzos del XIX; sitúa esa masonería caribeña en el contexto del combate entre obediencias francesas y anglosajonas en la zona; insiste en la necesidad de impulsar los estudios sobre las personas y las redes sociales para reconstruir la vida de los iniciados; y los pone en relación con el comercio establecido entre el gran puerto colonial de la Bretaña francesa de El Havre y el área del Caribe, especialmente con Santo Domingo y Cuba, que considera vital para explicar la pronta irrupción de la masonería en el Caribe, que pudo influir en las revoluciones de Portugal y Brasil de los años veinte y treinta.
Interesante el trabajo de Ricardo Martínez Esquivel, profesor de la Universidad de Costa Rica, director de REHMLAC+ y por tanto miembro de una de las mejores revistas académicas sobre este fenómeno. Siguiendo la estela marcada por Miguel Guzmán-Stein añade una visión totalizadora de la cuestión al entender que hablar de la masonería es, también, hablar de toda la sociedad. Su trabajo se centra en el presbítero católico Francisco Calvo, organizador de la primera logia en Costa Rica y alma del Centro Masónico Centro Americano (1865-1876) quien estuvo inmerso -a pesar de su condición eclesiástica- en distintos proyectos civilistas, de promoción de las libertades e inmerso entre la intelectualidad costarricense del momento, buena parte iniciada en la masonería, a cuyo desarrollo no fue ajena la fundación de la Universidad de Santo Tomás. A partir de ahí el autor se centra tanto en la actividad masónica como antimasónica centroamericana, que en Costa Rica tuvo un desarrollo tardío, y que en su opinión tuvo que ver más con un carácter asociativo que propiamente masónico, en el que participaron los ordenados como él, posiblemente más en relación con lo que era la tradición anglosajona que la latina. Cuando esta última se hizo más preponderante, tuvo que abjurar de su condición con lo que se inició el declive y cierre de todas las logias en 1876. Su proyecto regional pudo darse por concluido en 1899 cuando comenzaron a surgir las grandes logias nacionales centroamericanas.
La masonería en la amplia geografía mexicana durante el período de su independencia es el objeto de análisis de María Eugenia Vázquez Semadeni, de la Universidad de California en Los Ángeles, especialista en la historia de su país. La autora comienza su trabajo cuestionando la credibilidad de la historia realizada por los propios masones, imposible de contrastar por las escasas fuentes primarias existentes, razón por la que deben ser utilizadas con espíritu crítico. Se extiende a continuación en el establecimiento de las logias del rito York en las costas del seno mexicano, con autorización de la Gran Logia de Luisiana entre 1816 y 1820, que al poco se incorporaron al rito escoces. Debieron ser estos los primeros talleres y fueron fruto de las relaciones comerciales entre Nueva Orleans y las colonias españolas y francesas de la Indias Occidentales en el Caribe. Su desarrollo en Luisiana debió tener lugar con ocasión de la revuelta de esclavos de Santo Domingo cuando el territorio, tras el breve dominio francés, fue adquirido por los norteamericanos. De ahí, partieron las iniciativas para su instalación en Nueva España, primero en Veracruz, luego en Campeche y otros lugares. Sus componentes estaban de una u otra manera forma vinculados a la marina siendo comerciantes o militares de la armada. Y aunque algunos actuaron en política, su nacimiento no fue necesariamente con ese fin si bien una investigación más profunda, con nuevos fondos documentales, pudiera arrojar más luz.
Por su parte Dévrig Mollès, doctorado en Francia y director científico del Archivo de la Gran Logia de Argentina, analiza las relaciones entre feminismo, librepensamiento y masonería entre Europa y América en el cambio de siglo del XIX al XX. Y para ello traza la implantación de las organizaciones masónicas nacionales en Argentina, Brasil, Uruguay y Chile, que brotaron de aluvión con la presencia de exiliados franceses, británicos, italianos, españoles y portugueses preguntándose, al mismo tiempo, si los talleres pudieron ser el espacio de lucha cultural para las primeras generaciones feministas argentinas. A su modo de ver, las primeras mujeres en logias bonaerenses estuvieron vinculadas desde mediados del siglo XIX al librepensamiento; hace alusión expresa al caso de Brasil, mucho más tardío que el argentino. Refiere en tal sentido la presencia de Belén de Sárraga, discípula de Odón de Buen, en el XIII Congreso Internacional de Librepensamiento celebrado en Buenos Aires en 1906, en representación de la logia Virtud de Málaga, quien participó en la difusión del feminismo por distintos países hispanoamericanos y se erigió en símbolo de la nueva mujer latinoamericana.
Los orígenes y primer desarrollo de la masonería en Chile durante el siglo XIX son planteados por Felipe Santiago del Solar, de la París Diderot-París 7. La ausencia de fuentes fiables, la destrucción de los archivos de la Gran Logia de Chile a comienzos del siglo XX, la dispersión de las fuentes y el carácter no académico de la producción masonológica constituyen en su opinión los principales problemas para su estudio. En este caso, la difusión de la masonería está marcada por su escaso intercambio intercultural con Europa, condicionado por su situación geográfica y la legalidad comercial impuesta desde la metrópoli en el siglo XVIII, situación que cambiaría en algo a comienzos del siglo XIX lo que se tradujo entonces en la presencia de algún masón extranjero en la zona y poco más. Como primer dato cierto de la existencia de un taller cita la logia Lautaro existente entre 1817 y 1820, que vendría a ser parte de un proyecto cuyo objetivo último pudiera ser el derrocamiento del Virreinato del Perú. Ya en los años veinte, pudo tener algún desarrollo mayor en relación con las élites militares de países emergentes como Venezuela y Colombia, siendo la presencia extranjera en ellos importante. En realidad, es desde mediados del XIX cuando se inició el establecimiento de talleres, en un momento de impulso asociativo y de movilización popular, promovido por comerciantes y artesanos extranjeros de origen europeo no hispano y norteamericanos, instalados en los centros comerciales nacionales e internacionales del Pacífico. Fue así el caso de Valparaíso, por franceses, vinculado al Gran Oriente de Francia, pero también de otros promovidos por norteamericanos, argentinos y otros. Así hasta la formación de la Gran Logia de Chile en 1862, al margen del Gran Oriente de Francia. Este proceso se desarrolló de una manera discontinua hasta el inicio del siglo XX cuando el número de talleres rondaba la treintena.
Por último Guillermo de los Reyes Heredia, historiador mexicano afincado en la Universidad de Houston, se introduce en el papel que juega el asociacionismo -también el masónico- en el seno de la sociedad civil estadounidense. En tal sentido y a pesar de su independencia, intenta monopolizar el poder, dirigir en todos órdenes la vida económica, política y cultural; y desde este territorio intentará de expandirse por otros lugares con el mismo fin. Más adelante se extiende sobre la importancia que tiene la orden en Estados Unidos como organización fraternal.
Nos encontramos pues ante una interesante obra colectiva en la que se nos muestra las interinfluencias, las migraciones, de todo tipo (de los mitos, de las obediencias de distintas nacionalidades, de las personas) que vino a caracterizar la puesta en marcha de la masonería en la América que se independiza de su metrópoli europea a comienzos del siglo XIX. La masonología, como ciencia, está de enhorabuena y es de justicia felicitar a los autores que han aportado sus trabajos para la ocasión.
José-Leonardo Ruiz Sánchez – Catedrático de Historia Contemporánea de la Universidad de Sevilla. Presidente del Centro de Estudios Históricos de la Masonería Española. E-mail: leonardo@us.es
História Ambiental e Migrações: diálogos – GERHARDT (RL)
Samira Moretto. Foto: Researchgate /
GERHARDT, Marcos; NODARI, Eunice Sueli; MORETTO, Samira Peruchi. (Orgs.). História Ambiental e Migrações: diálogos. São Leopoldo: Oikos; Chapecó: UFFS, 2017. 267 p. Resenha de: NUNES DE SÁ, Débora. Revista do LHISTE, Porto Alegre, v.4, n.6, p.268-272, jan./dez., 2017.
O livro “História Ambiental e Migrações: diálogos”, organizado pelos integrantes do Grupo de Pesquisa Laboratório de Imigração, Migração e História Ambiental (LABIMHA) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Marcos Gerhardt, Eunice Sueli Nodari e Samira Peruchi Moretto, traz um conjunto de catorze textos que analisam as interfaces entre a História Ambiental e as migrações humanas em diferentes espaços e períodos históricos. Os autores e autoras oriundos de diferentes universidades, interpretam e analisam as diferentes relações socioambientais e consequentes transformações nas paisagens estabelecendo também um diálogo que é interdisciplinar.
O primeiro capítulo “Colonização e desflorestamento: a expansão da fronteira agrícola em Goiás nas décadas de 1930 e 1940”, foi escrito por Sandro Dutra e Silva, José Luiz de Andrade Franco e José Augusto Drummond. Nele, os autores analisaram as devastações que ocorreram nas florestas de Goiás, inseridas no bioma do Cerrado, também chamadas de “Mato Grosso de Goiás” e classificadas como Floresta Estacional Decidual. Por meio de relatos, tais como o do advogado Carlos Pereira Magalhães (1881-1962) e da atriz e escritora norte-americana Joan Lowell (1902-1967) e de relatórios como o produzido por Speridião Faissul (que acompanhou Leo Waibel pelo interior de Goiás), entre outras fontes, os autores analisaram as transformações e os meios como o Mato Grosso de Goiás foi devastado pelas ações humana. O maior impacto foi a partir do início do século XX, quando ocorreu a expansão de ferrovias e rodoferrovias, a implantação da “A Marcha para o Oeste” colocada em prática pelo governo de Getúlio Vargas e a consequente criação da Colônia Agrícola Nacional de Goiás.
No segundo capítulo, escrito por Marcos Gerhardt, “O relato de Wilhelm Vallentin: meio ambiente e imigração”, o autor tomou como fonte de análise a obra In Brasilien, publicada em 1909 em Berlim, pelo viajante alemão Wilheln Vallentin. Esse viajante descreveu sua passagem pela América meridional, relatando paisagens e o descrições sobre o Sul do Brasil no relato de Vallentin, com relação às comunidades teuto-brasileiras. Interpretou também que, assim como para outros viajantes e cronistas do fim do século XIX e início do XX, Vallentin pensava que “havia uma rígida separação entre cultura e natureza” (GERHARDT, NODARI, MORETTO, 2017, p. 42), e reafirmou que atualmente há um esforço para se pensar cultura e natureza de forma menos dicotômica.
“Da Alemanha para a florestal subtropical brasileira: as propostas do Dr. Paul Aldinger para as colônias alemãs no sul do Brasil”, escrito por João Klug, analisa a ação do pastor alemão Paul Aldinger na colônia Hansa Hamônia, localizada no Vale do Itajaí entre 1901 e 1927. Aldinger foi o responsável pelas atividades escolares e religiosas desenvolvidas na colônia de Hamônia e foi o responsável pela fundação do jornal Der Hansabote que, em suas publicações, priorizou temáticas voltadas aos assuntos escolares e eclesiásticos, bem como a produção agrícola da colônia. Klug analisou como Paul Aldinger foi sujeito ativo na organização da Hansa Hamônia, e como eram contraditórias as impressões sobre sua personalidade.
No capítulo seguinte, “A construção do espaço rural nas colônias de imigrantes do sul do Brasil”, Manoel P. R. Teixeira dos Santos analisou como se deu a privatização das terras florestais cobertas pela Mata Pluvial Atlântica, em especial para a constituição da Colônia Blumenau em Santa Catarina a partir de 1850. Santos utilizou como fontes mapas e relatórios estatísticos do período de 1861 a 1880 que conjugados permitiram ao historiador identificar a distribuição dos lotes coloniais e as consequentes transformações ambientais, bem como a expansão das áreas de cultivos e pastagens na Colônia Blumenau.
Eunice Sueli Nodari, em “Entre florestas e parreiras: a vitivinicultura no Alto Vale do Rio do Peixe/SC”, explorou os diferentes valores atribuídos à produção de vinho, sejam eles simbólicos, culturais, estéticos ou econômicos, analisando, assim, como a produção de vinho no Brasil, tendo como um de seus financiadores os incentivos estaduais e federais, tornou-se uma commodity e transformou paisagens. Sua análise é parte do projeto de pesquisa “Dos vinhedos familiares às grandes empresas: a reconfiguração de paisagens no Brasil através da Vitivinicultura” em parceria com a Stanford University.
“Os pinhais da fazenda Quatro Irmãos/RS e a Jewish Colonization Association”, escrito por Isabel Rosa Gritti, analisa a ação da companhia colonizadora Jewish criada em 1891 “com o objetivo de propiciar a emigração dos judeus vítimas de discriminações no leste europeu” (GERHARDT, NODARI, MORETTO, 2017, p. 95). Essa companhia adquiriu em 1909 a Fazenda Quatro Irmãos com 93.985 hectares, em terras que no período pertenciam ao município de Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, e administrou-a até 1962. A autora, a partir da análise de diferentes fontes, afirmou que a Jewish tinha como principal preocupação a exploração florestal da fazenda e que sua preocupação com os imigrantes era secundária.
O capítulo “História Ambiental e as migrações no Reino Vegetal: a domesticação e a introdução de plantas”, de Samira Peruchi Moretto, produz um estado da arte sobre a introdução e a domesticação de espécies vegetais. A autora estuda e analisa as diferenças entre uma espécie considerada introduzida com relação àquela domesticada. Afirmou também que a “alimentação tem uma relação bastante direta com a escolha, a domesticação e a dispersão de plantas”. (GERHARDT, NODARI, MORETTO, 2017, p. 120).
“Paisagem e uso comum da Floresta Ombrófila Mista pela ocupação cabocla do Oeste de Santa Catarina”, de Marlon Brandt, analisa três períodos histórico-geográficos desde a metade do século XIX à primeira metade do XX, os quais o autor considerou fundamentais para compreender as práticas costumeiras da população cabocla e a sua interação com a Floresta com Araucária no Oeste de Santa Catarina. Seu estudo perpassa o uso da terra, a extração da erva-mate e a criação de animais, analisando também como se deu a ruptura desse sistema nas primeiras décadas do século XX, em consequência das práticas introduzidas pelos colonos.
Miguel M. X. de Carvalho, em “O aumento da população humana (colonização e crescimento vegetativo) e os impactos sobre a floresta com araucária – séculos XIX e XX”, por meio da interpretação de recenseamentos demográficos do período de 1872 a 1960, analisou como os fluxos migratórios possibilitaram o crescimento vegetativo da população na região de ocorrência endêmica da Floresta com Araucária no sul do Brasil e como, em decorrência disso, houve uma descontrolada exploração madeireira que levou ao “quase total desaparecimento das florestas primárias com araucária” (GERHARDT, NODARI, MORETTO, 2017, p. 141).
No capítulo seguinte, Luís Fernando da Silva Laroque pesquisou as “Movimentações e relações com a natureza dos Kaingang em territórios da bacia hidrográfica Taquari-Antas e Caí, Rio Grande do Sul” no período dos séculos XIX ao XXI. Além do aporte teórico na história ambiental, também utilizou autores que estudam o conceito de territorialidade, isto é, as diferentes relações sociais, políticas e simbólicas. O autor constatou que, atualmente, “acionando a memória e a continuidade de suas movimentações” (GERHARDT, NODARI, MORETTO, 2017, p. 171), as comunidades Kaingangs, localizadas em Estrela, a Jamã tÿ Tãnh, a Foxá em Lajeado, a Pó Mág em Tabaí e em Farroupilha a Pó Nãnh Mág, no Rio Grande do Sul, vivem o processo de (re)territorialidade de suas comunidades.
Em “Entre decretos, disputas judiciais e conflitos armados: batalhas entre Estado, camponeses e indígenas pela posse da Reserva Florestal de Nonoai-RS” Sandor Fernando Bringmannn analisou a luta histórica do grupo étnico Kaingang pela Reserva Florestal de Nonoai e afirmou que a redemarcação da reserva como área indígena “[…] é fruto muito mais das pressões protagonizadas pelos índios, por meio de mobilizações políticas e ações armadas, do que por ações das agencias indigenistas que parecem ter abandonado as prerrogativas pelas quais foram criadas” (GERHARDT, NODARI, MORETTO, 2017, p. 190).
A historiadora argentina María Cecilia Gallero escreveu “La yerba mate en el prisma de la historia ambiental, Misiones (Argentina)”, no qual analisou transformações no ambiente de Misiones, no início do século XX, decorrentes da introdução do cultivo de erva-mate (Ilex paraguariensis), produto importante econômica e historicamente para a região misionera. Abordou as características da economia extrativa, a chegada dos profissionais suíços que iniciaram o cultivo em grande escala da Ilex e, por último, os impactos resultantes da introdução dos ervais cultivados. Dessa forma, elaborou um panorama da mudança de uma economia ervateira extrativa para uma produtiva, tomando como objeto de análise a Cooperativa de Productores de Yerba Mate de Santo Pipó, fundada por imigrantes suíços.
No capítulo “‘O tempo é minha testemunha’: só as pedras estavam aqui, todo o resto é imigrante”, os autores Haruf Espindola e Maria Vilarino historicizam o processo de ocupação da região do Vale do rio Doce. A primeira ocupação da região foi indígena, em especial, do tronco linguístico Macro-Jê, que ocupavam o leste de Minas Gerais, norte do Espírito Santo e centro-sul da Bahia. As primeiras tentativas de ocupação da região por parte de imigrantes europeus e seus descendentes ocorre com o processo de mineração, especialmente na porção mais a Oeste do rio Doce, na cidade de Mariana. Mesmo com esforços estatais, que criaram vários artifícios para fomentar a ocupação da região, os resultados foram pequenos. No final do século XIX, outra tentativa, dessa vez com colonos estrangeiros foi realizada, com destaque especial para a Colônia do Rio Doce, onde colonos estadunidenses confederados tentaram implantar sua ocupação. No entanto, estes não tiveram êxito, devido a problemas de saúde, como a malária. A ocupação efetiva da região só ocorreu no século XX, com a construção da ferrovia ligando Vitória a Minas, que tinha como objetivo a expansão da fronteira agrícola e a extração de recursos minerais, ao mesmo tempo em que implementou um plano de saneamento e controle de patógenos.
O último capítulo, “A imigração senegalesa: dimensões históricas, econômicas e socioambientais”, foi escrito por João Carlos Tedesco. O recorte temporal adotado se dá a partir do século XX, no qual o autor analisou os diversos aspectos históricos da emigração senegalesa, tanto para países da América do Sul como da Europa Ocidental. Tedesco afirmou que a emigração “revela um amplo tecido de causalidades, consequências e dimensões sociais”, e que os “[…] emigrantes revelam ser sujeitos ativos no mundo contemporâneo, ao mesmo tempo em que são vítimas de múltiplas mudanças ambientais, culturais e religiosas” (GERHARDT, NODARI, MORETTO, 2017, p. 253).
Em seu conjunto, História Ambiental e Migrações: diálogos permite compreender as diferentes transformações nas paisagens, sejam sociais ou ambientais, decorrentes das ações humanas, principalmente pelo viés das migrações de humanos e plantas. A multiplicidade de fontes utilizadas pelos autores e autoras proporcionam aos leitores e leitoras transitar pelos diferentes caminhos que integram o cultural e o natural. É uma importante contribuição historiográfica não só para a abordagem da História Ambiental, mas sim todas as áreas do conhecimento que têm interesse em compreender como se estabeleceu as interações entre humanos e não humanos ao longo do tempo.
Débora Nunes de Sá – Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Santa Catarina e integrante do Laboratório de Imigração, Migração e História Ambiental (www.labimha.ufsc.br), sob a orientação da professora Doutora Eunice Sueli Nodari. E-mail: nunesdesaa@gmail.com
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La sociedad del salitre. Protagonistas, migraciones, cultura urbana y espacios públicos | Sergio González Miranda
El desierto de Atacama ha sido caracterizado comúnmente como un espacio hostil, inhóspito, un anecúmene, donde las posibilidades de habitarlo quedan reducidas por sus agrestes características geográficas. Bajo este presupuesto La Sociedad del Salitre de Sergio González, es una compilación de una serie de artículos que buscan desmitificar la injusta visión de Atacama como la de un “descampado”, o como territorio despoblado.
Esta obra propone ampliar la problemática y las discusiones en torno al ciclo salitrero desde una perspectiva que rechaza observar este periodo como mero enclave económico. Mediante un diálogo interdisciplinario esta apuesta historiográfica apunta a explorar y profundizar aún más en las investigaciones sobre la explotación del nitrato de sodio, desde nuevos enfoques y perspectivas teóricas que amplían temporal y teóricamente el debate en torno al ciclo del salitre. Leia Mais
Community, Culture and the Makings of Identity: Portuguese-Americans along the Eastern Seaboard – HOLTON (LH)
HOLTON, Kimberly Da Costa; KLIMT, Andrea (Eds.). Community, Culture and the Makings of Identity: Portuguese-Americans along the Eastern Seaboard. North Dartmouth: University of Massachusetts Dartmouth, 2009. Resenha de: AZEVEDO, Joana. Ler História, n.61, p.196-200, 2011.
1 A coletânea Community, Culture and the Makings of Identity da emergente coleção «Portuguese in the Americas Series», editada pelo Center for Portuguese Studies and Culture da Universidade de Massachusetts Dartmouth, reúne um conjunto de estudos, sobre os contextos históricos, políticos e culturais que caracterizam a emigração portuguesa para os Estados Unidos da América e, em particular, o modo como os emigrantes se fixaram ao longo da costa leste. De forma menos aprofundada, integra ainda um pequeno conjunto de reflexões sobre outras populações imigrantes de língua portuguesa, como a brasileira e cabo-verdiana.
2 Os Estados Unidos da América são actualmente, e conjuntamente com o Canadá, um dos principais destinos das migrações internacionais. No caso português, o fluxo migratório transatlântico inscreve-se no primeiro grande ciclo migratório, iniciado em meados do século XIX até às primeiras décadas do século XX e, posteriormente, na vaga migratória dos anos 1960. Os emigrantes que chegaram aos EUA eram oriundos na sua maioria dos arquipélagos dos Açores e da Madeira e estabeleceram-se principalmente na área da Califórnia e de Massachusetts. Os EUA mantiveram-se, com oscilações, um importante destino da emigração portuguesa até ao início dos anos 1990. Atualmente estima-se que aí se estabeleceram cerca de 210 mil imigrantes nascidos em Portugal, número que ascende a 1,5 milhões de pessoas se considerarmos todos aqueles com origem portuguesa.
3 O fenómeno das migrações tem sido amplamente estudado pelas ciências sociais portuguesas, mas a produção científica sobre a emigração portuguesa, considerada uma característica estrutural da demografia nacional, diminuiu significativamente após os trabalhos de referência relativos às grandes vagas migratórias da década de 60 e só mais recentemente se tem vindo a renovar o interesse por este campo de estudos. Um dos fatores que contribuiu para relegar este âmbito de estudo para segundo plano foi o facto de Portugal se ter tornado, a partir dos anos 1980, um destino de imigração, acompanhando uma tendência observada noutros países do espaço europeu. É hoje reconhecido que no padrão migratório português coexistem duas dinâmicas, uma de imigração e outra de emigração, sendo, no balanço, esta última muito mais expressiva.
4 Os organizadores da obra, na sua nota introdutória, mostram precisamente como também nos Estados Unidos da América a imigração portuguesa foi objeto de reduzida produção científica, apesar dos fluxos substanciais e continuados. Neste sentido, a presente obra propõe-se antes de mais como um contributo para estruturar um campo de estudos sobre a experiência luso-americana. Caracteriza a vários níveis a presença dos portugueses nos EUA ao longo de dois séculos. Compila vinte contributos multidisciplinares situados no âmbito das ciências sociais, em parte inéditos, em parte já previamente publicados, mas com pouca visibilidade e difusão.
5 As contribuições para esta coletânea estão organizadas em torno de cinco eixos de análise. O primeiro debruça-se sobre as questões da cidadania, da pertença e da comunidade. Parte-se de um estudo de Irene Bloemraad sobre a questão da «invisibilidade política» dos portugueses. Na literatura, a invisibilidade foi atribuída aos baixos níveis de escolarização dos portugueses, à experiência de uma ditadura que desincentivou formas de participação cívica e política e a traços culturais enraizados que teriam determinado historicamente o seu reduzido envolvimento político. A partir de uma comparação dos níveis de participação política dos portugueses em Boston e Toronto, Bloemraad vem mostrar que tais interpretações não tomaram suficientemente em consideração o efeito das instituições políticas e das políticas para a imigração no país de acolhimento. Explorando as diferenças entre os dois contextos, conclui que há entre os portugueses de Toronto maiores níveis de cidadania e uma maior visibilidade política, atribuíveis a políticas governamentais de apoio às comunidades locais, ao discurso multiculturalista e à relação do sistema político com as elites migrantes. Segue-se o texto de Bela Feldman-Bianco que aborda o debate sobre transnacionalismo a partir de investigação conduzida em Portugal e em New Bedford. Trata dois momentos distintos: o período da depressão económica dos anos 1920 e 1930, e no contexto da internacionalização da economia global, nos anos 1970 e 1980. Em análise, as (re)construções diferenciadas da classe, etnicidade e nacionalismo ao longo de diferentes gerações migrantes, no contexto da criação por parte do Estado português de uma nação portuguesa desterritorializada assente, segundo Feldman-Bianco, na reinvenção da memória coletiva e da saudade. Por fim, o texto de Andrea Klimt reconstitui o processo de formação de duas comunidades, nos EUA e na Alemanha, comparando trajetórias de vida de emigrantes portugueses, respetivamente, no sudeste de Massachusetts e em Hamburgo. Klimt identifica diferentes configurações relativamente aos modos de integração e aos projetos de vida: na Alemanha mais orientados para o retorno a Portugal e sem intenção de fixação, nos EUA, mais orientados para a fixação permanente no país de destino.
6 O segundo eixo de análise reflete sobre identidade, representações nos media e cultura expressiva. O primeiro contributo é o de João Leal, centrado na celebração das festas do Espírito Santo entre os imigrantes de origem açoriana em East Providence. No ritual dos «Impérios Marienses» coexistem duas dinâmicas: a recriação rigorosa das tradições e um processo de inovação cultural que foi incorporando diversas transformações que refletem o novo contexto sociocultural onde ocorrem. Por um lado, mantém e reforça a ligação dos imigrantes entre o local de origem e de destino, por outro, encerra uma função de tradução e de diálogo com a cultura americana. Já Kimberly DaCosta Holton dá conta de uma pesquisa etnográfica em torno do folclore português recriado no contexto de Newark. Os ranchos folclóricos dão expressão a específicas dinâmicas transnacionais de ligação económica, emocional e social a Portugal, criando «um só espaço de ação social». Entre outras implicações o folclore sustenta, segundo Holton, políticas migratórias na origem e no destino, reforçando o domínio da língua e valores portugueses, dos fluxos económicos entre os dois países, bem como a visibilidade política dos portugueses. Seguem-se os textos de Lori Batista e de Katherine Brucher nos quais se analisa o lugar da cultura expressiva e as políticas de negociação de identidades imigrantes a partir de dois casos ilustrativos: o primeiro, uma exposição sobre imagens da Virgem Maria na arte portuguesa, organizada nos anos 1990 pelo The Newark Museaum; o segundo, a digressão de uma banda portuguesa de Rhode Island a Portugal. A partir da análise de arquivos do jornal Diário de Notícias, no período entre 1919 e 1973, Rui Correia discute o papel da imprensa imigrante, em particular, enquanto espaço de pluralismo e dissenso durante o regime salazarista. O lugar dos media é objeto também do contributo de Onésimo Teotónio Almeida. Em análise o caso do Big Dan’s, um acontecimento media made dos anos 1980 na imprensa americana, a representação mediática produzida a este respeito e as implicações em termos da construção da imagem da comunidade portuguesa.
7 Na terceira parte, a obra aborda o tema da educação, mobilidade social e cultura política. No texto de M. Glória Sá e David Borges discute-se a ideia de que os menores níveis de mobilidade social dos portugueses são atribuíveis a uma herança cultural que subvaloriza a educação. Com base na análise de dados longitudinais relativos a educação, ocupação e rendimento por local de residência, os autores mostram que os baixos níveis educacionais dos portugueses de Massachusetts são resultado de estratégias racionais para fazer face aos constrangimentos do mercado laboral e das oportunidades educativas. Clyde Barrow procura desconstruir a ideia de que os portugueses apresentam menores níveis de participação cívica e política do que outros grupos étnicos nos EUA. Com base em três inquéritos realizados no sudeste de Massachusetts, em finais dos anos 1990, Barrow mostra que os níveis de participação, o comportamento e as preferências políticas dos portugueses se correlacionam em larga medida com os seus níveis educacionais e estatuto socioeconómico. Adeline Becker aborda o papel da escola e os efeitos das políticas educativas na identidade étnica de estudantes imigrantes portugueses na área urbana de New England.
8 Um quarto eixo de análise explora os temas do trabalho, do género e da família. A pesquisa de Penn Reeve debruça-se precisamente sobre a participação laboral dos portugueses do sudeste de Massachusetts, num período de grandes transformações do movimento laboral nos EUA, entre os anos 1920 a 1950. Reeve argumenta que apesar dos estereótipos dominantes, historicamente os portugueses foram parte ativa dos movimentos laborais da época, com uma participação moldada pelas lutas e tensões entre forças políticas conservadoras e radicais/de esquerda no seio dos sindicatos e da sociedade. Louise Lamphere, Filomena Silva e John Sousa restituem os resultados de um vasto projeto de investigação que analisa as estratégias mobilizadas por mulheres trabalhadoras na zona industrial de New England nos domínios do trabalho, das redes de parentesco e da organização dos papéis familiares. Ann Bookman aborda um estudo de caso na indústria elétrica procurando identificar os fatores que concorreram para a sindicalização feminina e reconstruir o processo de mudança social que engendrou formas de ativismo político entre trabalhadoras migrantes. Observando a interseção entre família, local de trabalho e comunidade, Bookman conclui que a sindicalização constitui uma forma de empowerment das mulheres imigrantes, que reforça a sua rede social no local de trabalho; há, no entanto, uma grande variabilidade nos padrões de empowerment entre diferentes grupos.
9 Por último, um quinto eixo analítico é dedicado à raça, pós-colonialismo e contextos diaspórios e integra etnografias sobre outros grupos imigrantes oriundos do espaço lusófono. O texto de Miguel Moniz traz a debate a questão controversa do reconhecimento legal das minorias migrantes nos EUA e reconstrói o processo etno-histórico de exclusão dos portugueses do estatuto legal de minoria étnica. Colocando em evidência a natureza política deste processo, Moniz mostra como as categorias de raça e etnia são estrategicamente convocadas, de forma fluida, ambivalente ou mesmo contraditória, pelo Estado e pelos atores sociais. Entre os imigrantes lusófonos e seus descendentes este processo teve como consequência a emergência de duas categorias inter-relacionadas que definem o ser white portuguese e o ser black portuguese. O único contributo relativo à imigração brasileira nos EUA surge no trabalho etnográfico de Ana Ramos-Zayas que analisa os modos como se produzem as interações quotidianas de mulheres brasileiras com a comunidade portuguesa de Newark, num contexto fortemente racializado e permeado por estereótipos de género. Na etnografia que nos apresenta, Gina Gibau explora as políticas da identidade de cabo-verdianos a residir em Boston, examinando a questão da relação dialética entre os processos de atribuição racial e de autoidentificação na construção das identidades individuais e coletivas deste grupo. Com um segundo contributo, Holton aborda agora os movimentos pós-coloniais e a experiência dos retornados portugueses em Newark. Seguindo as memórias de alguns retornados, reconstrói as dinâmicas sociais e políticas, os laços afetivos e os processos decisionais que informaram as trajetórias entre Portugal, Angola e os EUA. As narrativas falam de uma integração não conseguida em Portugal e de identidades que têm Angola como principal referência. Por último, Marilyn Halter examina as transformações que atravessaram os movimentos migratórios de cabo-verdianos em finais do século XIX e, posteriormente, na vaga pós-colonial, examinando em particular as questões da raça e do reconhecimento, etnicidade, formação da identidade cultural.
10 Caroline Brettell encerra a obra com uma síntese das problemáticas aí exploradas, delineando propostas de investigação futuras que, somadas às questões deixadas em aberto por cada um dos autores, definem, num certo sentido, uma espécie de agenda de investigação científica atual nesta área.
11 Esta é uma obra marcada por uma enorme pluralidade de autores, abordagens conceptuais, períodos históricos de análise, metodologias, mas também quanto aos grupos tomados como objeto de investigação. O que a obra acrescenta em diversidade de conteúdos perde, no entanto, nalguns casos, em qualidade, representatividade dos grupos e rigor comparativo. Entre os seus objetivos propõe-se debater um conjunto de questões inovadoras e ainda pouco exploradas relativas à história, cultura e às dinâmicas sociais de portugueses e outros grupos étnicos lusófonos inter-relacionados, resgatando-os de uma certa invisibilidade social e académica.
Joana Azevedo – CIES – Instituto Universitário de Lisboa
Os Eurobrasileiros e o Espaço Colonial: migrações no Oeste do Paraná (1940/70) | Valdir Gregory
Resultado de tese de doutoramento defendida em 1997 na Universidade Federal Fluminense – UFF, o livro Os Eurobrasileiros e o Espaço Colonial é um estudo de fôlego a respeito da história social do Oeste Paranaense. Trata-se de uma abordagem que prioriza a experiência de comerciantes, caixeiros viajantes, colonos e colonas que por simples aventura, sonhos ou necessidades, migraram em busca de um novo espaço: a região Oeste do Paraná entre os anos 40 e 70 do século XX.
O argumento central de Valdir Gregory é de que os eurobrasileiros ligados à lide na terra moldaram o espaço colonial do Brasil Meridional ao mesmo tempo em que foram se moldando por ele. Resistindo às mudanças, se adaptando a elas, migraram para novas fronteiras agrícolas, onde preservaram e inovaram seus hábitos culturais. À época das inovações tecnológicas, estando sob a ameaça de deixarem de ser colonos, tiveram de reestruturar o modo-de-ser do colono.
Para sustentar essa tese, o autor apoiou-se em um considerável arcabouço documental e bibliográfico: relatórios e planos de ação de empresas colonizadoras, documentos oficiais (IBGE, INCRA e SUDESUL), documentos cartoriais, fontes jornalísticas (jornais e revistas), textos de época e depoimentos orais. A natureza variada das fontes, demonstra por si mesma, mérito do autor em conseguir “amarrá-las”, extraindo delas semelhanças e contradições, principalmente no que se refere à (re) organização espacial e social da região Oeste do Paraná em meados do século XX.
Para construir seu objeto de análise, Valdir Gregory começa o texto discorrendo sobre a colonização da região Sul do Brasil (Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná) por imigrantes europeus (alemães, italianos, ucranianos e poloneses), iniciada no décimo nono século. O contexto europeu da época, as migrações para a América e a dinâmica colonial implantada pelos imigrantes também são trabalhados, utilizando-se dos estudos de Leo Waibel, Emílio Wilhems, Maria Tereza Schörer Petrone, Lúcio Kreutz, Ruy Christovam Wachowicz, José Vicente Tavares dos Santos, entre outros. “Os eurobrasileiros puderam constituir uma sociedade colonial na qual a herança cultural, no seu sentido amplo, européia, mesclou-se com a realidade encontrada e constituída pelos colonos para formar o espaço colonial dinâmico e instável”. (p.53) Instável porque a estrutura fundiária das regiões coloniais gaúchas e catarinenses, em princípios do século XX, não mais suportava o crescente aumento populacional e a limitada disponibilidade de terras cultiváveis, fazendo com que os eurobrasileiros se deslocassem para as cidades ou para novas fronteiras agrícolas. “O Paraná foi o estado receptor por excelência”. (p.55)
A partir dos discursos dos governadores Moysés Lupion (1948/52; 1957/61) e Bento Munhoz da Rocha Neto (1953/57) sobre a colonização do território paranaense, bem como de relatórios e planos de ação de algumas empresas colonizadoras e madeireiras que atuaram no Oeste do Paraná entre as décadas de 1940 a 60, o autor percebe uma série de interesses comuns em torno da colonização das terras situadas próximas à fronteira internacional com outros países (Argentina e Paraguay). “A visão geopolítica federal via na colonização a consolidação territorial brasileria assegurada por colonos pequenos proprietários. Os empreendedores de empresas colonizadoras e madeireiras vislumbravam novas possibilidades de investimentos em negócios madeireiros e de mercantilização de terras. Os colonos se dispunham a migrar para reconstruírem espaços coloniais” (p. 70). Controle, direcionamento e presença constante e efetivas dos homens do Estado e das estratégias de atuação das colonizadoras fizeram com que se estabelecesse um novo espaço colonial aos moldes do antigo espaço colonial, isto é, uma estrutura baseada na pequena propriedade rural (em média 25 hectares) ocupada por colonos gaúchos ou catarinenses acostumados à lide na policultura.
Esses são alguns itens explorados por Valdir Gregory na documentação, por exemplo, da Industrial Madeireira e Colonizadora Rio Paraná – MARIPÁ, organizada em Porto Alegre no ano de 1946: “Na medida em que a colonização avançava, os administradores adotavam novas formas de atuação e de investimentos em atividades industriais, comerciais e de serviços, criando novas empresas e participando da estruturação das infra-estruturas necessárias para o desenvolvimento das atividades religiosas, educacionais, recreativas e outras” (pp.151-152).
Uma ênfase especial é dada pelo autor no que se refere às estratégias adotadas pelas empresas colonizadoras na seleção do colono “ideal”: divulgação restrita a grupos específicos de colonos, cuja preferência era dada àqueles descendentes de imigrantes alemães e italianos; a localidade de origem, a língua e a religião tiveram grande influência na escolha dos locais tanto para a escolha dos colonos como para o estabelecimento das famílias no novo espaço colonial: “Os teuto-brasileiros, os ítalo-brasileiros, os eurobrasileiros, enfim, já tinham, pois, acumulado experiências agrícola e de vida rural nas colônias do Sul do Brasil durante mais de um século. Estavam acostumados ao trabalho árduo em pequenos lotes de terra. Tinham a fama de serem econômicos, evitando gastos para alimentar seus espíritos de poupança e de provedores do futuro próprio, dos filhos e dos netos. Nessas colônias, os empreendedores buscaram o modelo de sua estruturação espacial e dessas colônias atraíram os colonos ideais para atingirem seus intentos” (p. 176).
Para os colonos, a mudança do antigo espaço colonial para a construção de um novo espaço se constituiu numa situação de crise, de incertezas, manifestando-se de formas variadas no cotidiano e na memória dos eurobrasileiros, afetando seu estilo de viver e de ser. A riqueza de detalhes apresentado por Valdir Gregory impressiona mesmo aqueles que pouco sabem ou leram sobre a relação homem-terra. Aliada à modernização das técnicas agrícolas, iniciada em fins da década de 1960, os eurobrasileiros foram obrigados a assumir novos papéis, se adaptar e resistir às mudanças.
Para analisar esse processo de mudança e resistência a ela, o autor fez uso de depoimentos orais, do relatório final de um projeto denominado PERSAGRI II, desenvolvido pelo Ministério da Agricultura e pela Fundação Getúlio Vargas e, de uma extensa bibliografia sobre a temática. Nesta documentação foi possível perceber o conflito entre a pressão pela mudança, provocada pela modernização, e a resistência para a manutenção da situação de colonos. “A migração continuou sendo uma forma de resistir à inovação […] Querer ter terra, querer reconstruir um espaço colonial conflitava com as exigências de um programa, de uma política de modernização do campo que potencializavam desejos de ascensão social, desejos de competição, enfim, desejos anti-coloniais” (p. 235).
Creio que Valdir Gregory poderia ter apresentado mais detalhes a respeito da atuação dos órgãos criados pelo Governo Paranaense para realizar e coordenar a colonização “oficial” ou “pública” de parte considerável do território paranaense. Os conflitos de terra, ocorridos de forma intensa na região Oeste do Paraná durante a colonização, é outro ponto que também merecia mais atenção. No mais, apreciei muito a maneira como Valdir Gregory escreve: sem floreios, rodeios e divagação teórica. A argumentação teórica quase passa despercebida, mas está lá, de forma coesa. As informações a respeito das fontes documentais e a forma como foram exploradas revelam, ainda mais, o faro deste historiador. Enfim, os méritos são diversos.
Antonio Marcos Myskiw – Professor de História do Paraná na UNIOESTE. Mestre em História Social pela UFF. E-mail: antoniocdf@bol.com.br
GREGORY, Valdir. Os Eurobrasileiros e o Espaço Colonial: migrações no Oeste do Paraná (1940/70). Cascavel: EDUNIOESTE, 2002. Resenha de: MYSKIW, Antonio Marcos. Cantareira. Niterói, n.2, 2002. Acessar publicação original [DR]