La invención de España. Leyendas e ilusiones que han construido la realidad española | Henry Kamen

La narrativa histórica de cualquier país, vista desde el prisma del nacionalismo, siempre suele tener una gran cantidad de interpretaciones erróneas, prejuicios culturales, mitificaciones populares y condicionantes políticos. El caso de España es especial, pues no existe en Europa un país con una visión histórica más distorsionada de sí mismo. Desde mucho antes de la Edad Contemporánea, los libros de historia estuvieron llenos de mitos y leyendas, que coadyuvaron a la formación de la identidad nacional, pero que, al mismo tiempo, han contribuido a conformar un potente imaginario colectivo sobre el surgimiento de España como nación.

Henry Kamen, 1 celebérrimo hispanista, considera que España es el resultado de milenios de flujos migratorios, conquistas militares, fusiones de pueblos, aculturaciones cíclicas y confrontaciones religiosas. En varias entrevistas, el autor ha confesado que le resultó muy difícil crear una estructura uniforme y equilibrada para La invención de España. Leyendas e ilusiones que han construido la realidad española. El libro se compone del apartado introductorio, diecinueve capítulos, 2 la bibliografía y el índice onomástico. El cuerpo del texto establece un arco temporal que va desde la romanización peninsular hasta la descomposición del Antiguo Régimen y el surgimiento del Estado liberal. Leia Mais

Dinheiro, Deuses e Poder. 2.500 anos de lendas, mitos, símbolos, fatos e História Política das moedas – SPINOLA (RMA)

SPINOLA, Noenio. Dinheiro, Deuses e Poder. 2.500 anos de lendas, mitos, símbolos, fatos e História Política das moedas. São Paulo: Civilização Brasileira, 2011. Resenha de: CARLAN, Claudio Umpierre. Revista Mundo Antigo, ano III, v. 3, n 05, jul., 2014.

Termo bárbaro, de uma maneira em geral foi utilizado para definir os povos germânicos, eslavos e tártaros-mongóis, que invadiram Mundo Romano, a partir do século III da era Cristã. A tradução tradicional, idealizada por gregos e, mais tarde, romanos, eram povos que não falavam latim ou grego, usavam calças compridas.

Essa construção, do século XIX, contou com apoio do historiador alemão Leopold Von Ranke (1795 – 1886), quando afirmou que a História não nasceu ciência, mas foi transformada em uma disciplina científica. Ranke defendia o uso apenas de fontes escritas, baseadas no rigor científico newtoniano. Arqueologia, cultura material, iconografia não eram consideradas documentos ou fontes históricas. Leia Mais

Contos e lendas da mitologia celta – LÉOURIER (S-RH)

LÉOURIER, Christian. Contos e lendas da mitologia celta. Tradução de Monica Stahel. São Paulo: Editora WMF/ Martins Fontes, 2008, 224 p. Resenha de: CAMPOSI, Luciana de.  Entre a História e a Memória dos  mitos e lendas celtas. sÆculum REVISTA DE HISTÓRIA, João Pessoa, [23] jul./ dez. 2010.

Mitos, lendas e contos folclóricos sempre foram guardiões da memória e, para algumas culturas que valorizavam sobremaneira a oralidade, essas narrativas também eram as responsáveis por transmitir a história. As narrativas mitológicas celtas2, que, na sua maioria vão apresentar as batalhas travadas entre deuses e monstros, homens e criaturas fantásticas, são narrativas fundamentais para se entender a dinâmica da sociedade celta na Irlanda. Todos esses contos que hoje lemos refletem, por assim dizer, a reverência que os celtas nutriam pela oralidade: conferiam um caráter quase que sagrado às palavras atribuindo a elas um aspecto mágico como é possível constatar em algumas narrativas como, por exemplo, em “A busca dos filhos de Tuireann” em que três jovens empreendem uma viagem pelos mares do mundo em busca de tesouros fantásticos e para se locomoverem apenas dizem: “– Barco de Mananann, já que estás sob nossos pés, leva-nos à Pérsia!” (p.45). São as palavras as responsáveis por conduzir os jovens a incontáveis aventuras, da mesma maneira que as palavras são usadas para transmitir o conhecimento, as tradições e, desta feita, perpetuar pela oralidade as tradições, a história e a memória. Leia Mais

A lenda de diamante: Sete lendas do mundo celta | Edmond Baily

A tradução de obras celtológicas, tanto de estudos acadêmicos quanto de fontes históricas e literárias, sempre são bem-vindas, pois infelizmente os pesquisadores brasileiros deparam-se com a dificuldade de encontrar tais obras em língua materna nas estantes das bibliotecas e livrarias. Mas o que percebemos é que há um interesse do mercado editorial em publicar obras antigas que, na maioria das vezes, trazem representações equivocadas a respeito dos Celtas, mas que podem fazer grande sucesso apelativo com o público. A tradução de A lenda de diamante, do francês Edmond Bailly, vem justamente de encontro a esse propósito.

A obra apresenta sete narrativas – as sete lendas – e um capítulo intitulado “Notas e esclarecimentos”, onde são arroladas explicações tanto de termos que aparecem nas narrativas como “consciência”, “eternidade das almas”, “religião”, entre outras como também de termos diretamente ligados à cultura celta: “druidismo”, “Ogham” e “vates”. Muitas dessas definições estão permeadas de idéias esotéricas, espíritas e algumas advindas da celtomania francesa dos séculos XVIII e XIX.

Publicada pela primeira vez na França em 1909 (La légend de diamant), quando a Doutrina Espírita já estava consolidada, o livro apresenta a sociedade celta e, em particular os Druidas como monoteístas, preocupados com o “bem da humanidade” e em viverem única e exclusivamente para realizar a vontade do Pai Celestial. Essas construções são fictícias e não correspondem às descrições dos druidas feitas por autores clássicos como Júlio César, Cícero e Plínio, para citar alguns.[1] Essas idealizações, tanto dos celtas, como dos druidas presentes na obra, vinham de encontro às intenções de um determinado grupo que, procurava projetar no passado, suas concepções de mundo, de vida, de religião e de fé. A França por fazer uma exaltação ao seu passado gaulês e, por vezes, buscar ali inspiração para o seu forte nacionalismo, foi o cenário perfeito para que florescessem obras como A lenda de Diamante.

A primeira lenda “O encantamento da harpa” apresenta logo no terceiro parágrafo um equívoco quanto ao panteão celta. Há a menção da deusa do mundo inferior Hela, que pertence ao panteão escandinavo! Os celtas não possuíam divindades guardiãs dos mundos subterrâneos. Esse equívoco cometido pelo autor e por outros autores do mesmo período deve-se à ausência de conhecimentos e de uma pesquisa mais aprofundada sobre os mitos e o panteão celta que, infelizmente ainda não existia no final do século XIX e início do XX,[2]

e reflete parte das fantasias que, lamentavelmente ainda povoam o imaginário contemporâneo.

A terceira narrativa “O único amor” traz a estória de uma desilusão amorosa e dos transtornos ocasionados por ela. A jovem Gwennola, filha de uma grande “colar de ouro” – essa é denominação que os grandes chefes e guerreiros recebem nas narrativas de Bailly – tem o seu amor recusado por Yvor um exímio harpista. Com a recusa de Yvor em aceitar Gwennola como esposa, é desencadeada uma terrível guerra entre os demais pretendentes e a moça é obrigada a vagar sem rumo até encontrar Niod, que lhe mostra uma perspectiva: ela deve deixar o orgulho e o egoísmo e sair pelo mundo levando alento, conforto e cura a todos que necessitarem. Seguindo as ordens de Niod, Gwennola parte e, por onde passa, não deixa de oferecer ajuda a quem necessita. Passa então a ser conhecida como a “viúva virgem”. Todos esses elementos contidos na narrativa estão repletos de ensinamentos cristãos onde é preciso sofrer para conquistar as glórias eternas. Há uma passagem já no final da narrativa que reflete não só os preceitos cristãos, mas também a crença em uma reencarnação evolucionista como meio de purificação e elevação do espírito:

“- Levante-se, minha irmã bem-amada. E não perca a confiança, sua grandeza á superior à minha, pois lhe foi dado se humilhar e se arrepender. Doravante, você não estará mais sujeita à servidão dos sentidos, embora sua libertação ainda não seja completa, pois você recaiu no Abred de Necessidade e está exposta ao Mal e à Morte. Será preciso que você renasça ainda duas vezes, nesse mundo de dor, nessa mesma pátria da qual a faço protetora. Duas vezes ainda o artesão do orgulho estenderá para você os frutos envenenados de seu pomar. Duas vezes ainda você será a carne para o holocausto. Então, eu a levarei, finalmente liberta, para a luz da morada eterna de nossa perpétua felicidade!…” (Bailly 2006:52).

Nesta mesma narrativa há a menção aos eubages que, são descritos como uma “espécie de adivinho da antiga Gália. Hierarquicamente abaixo dos Druidas, encarregava-se da parte externa dos cultos” (p. 46). Segundo autores clássicos latinos como Diodoro, explica que o vate realizaria os sacrifícios (humanos, por exemplo) e interpretaria os augúrios. Mas, essa função também é atribuída aos druidas. Na verdade, o vate poderia estar numa hierarquia inferior ao druida. Na antiga Irlanda, o ensino máximo era reservado à formação em druida, portanto, o vate/eubage seria responsável pelo ofício do sacrifício, enquanto o druida teria funções de cunho mais teológico/filosófico, e seria o responsável pela doutrina e interpretaria os sacrifícios. Na verdade, ambas as funções se confundem, pois druida não deixa de ser um termo geral. Essa nota da tradução merecia um cuidado maior na sua elaboração para elucidar com mais clareza o leitor que pode não estar familiarizado com as terminologias da religiosidade celta.

Na narrativa “Os do Carvalho” encontramos a descrição de uma legião romana tentando a golpes de machado derrubar um grande carvalho sagrado. Para tentar impedir tal ato os druidas permanecem nos galhos da árvore recitando as tríades e os demais ensinamentos. Os sacerdotes são apresentados ao leitor como homens benevolentes que estão sendo vítimas da intolerância romana que procura não só exterminar sua religião, mas também todo o seu conhecimento. O desfecho da narrativa mostra a redenção dos druidas em um sacrifício:

“Quando o sacrifício foi consumado, quando vítimas e algozes dormiam, quietos, na reconciliação do sono da morte, as almas dos Do Carvalho voaram, puras e santas, sobre as asas impetuosas da fogosa cotovia. E enquanto os eleitos de Gwynfyd saldavam a feliz libertação de seus irmãos bem-aventurados, aqui embaixo, maravilhosas rosas de cor púrpura desabrochavam sobre as brancas túnicas dos sacrificados, chamando os Da Terra para a comunhão de Sabedoria e de Amor!” (p. 118).

Essa representação dos druidas lembra em muito o martírio sofrido por muitos cristãos que, por defenderem a sua fé, morreram assim como os druidas nas mãos dos romanos. Percebe-se claramente um juízo de valor do autor onde apresenta os druidas como homens bons e puros e apresentados como os eleitos de Deus e, os romanos como vilões que, tinham como missão exterminar os escolhidos e, que por isso mesmo eram severamente punidos. Uma visão maniqueísta de celtas e de romanos.

A última narrativa “Os do Awen” traz uma personagem muito conhecida das estórias arturianas: Merlin. Este é apresentado como um sábio e talentoso bardo que, em companhia de mais outros dois igualmente geniais travam uma disputatio com o Demônio, o artesão de todos os males. Enquanto há o embate, o próprio Jesus Cristo assiste a tudo e, glorioso no final defende e acolhe os três bardos como novos emissários da boa nova. Ao colocar o Cristo como personagem de uma narrativa de suposta origem celta, o autor procura conceder aos druidas um perfil cristão. Essa construção anacrônica deste povo como precursor do cristianismo muito tempo antes deste surgir, faz com que alguns pesquisadores sejam adeptos do que convencionou-se denominar como “cristianismo druídico”.[3] Uma fantasia que procura conferir aos druidas uma imagem de pureza e benevolência, para tentar desconstruir a imagem descrita nas fontes clássicas como executores de sacrifícios humanos e incitadores de guerra. Infelizmente essa representação dos druidas é ainda apresentada em muitos cursos e livros esotéricos e, por mais que as pesquisas arqueológicas, históricas e literárias apresentem uma visão contrária, ainda há resistência em aceitá-la. E, essa resistência muitas vezes tem sido um grande entrave para uma divulgação de pesquisas sérias sobre os celtas. Além essas fantasias há outras como a das avós-druidas, que nada mais são do que invenções de ditos pesquisadores que baseiam suas investigações em uma visão distorcida e envolta em brumas das fontes clássicas, aliadas é claro, à sua relutância em admitir que seus argumentos, muitas vezes, nada mais são do que frutos de sua fértil imaginação.

Com relação ao pensamento de Bailly, esse tem fortes raízes na celtomania e no esoterismo francês. Durante o final do século XVIII, diversas publicações literárias popularizaram o interesse pela língua e religiosidade dos antigos habitantes da Gália. E, apesar do sucesso das coleções de antiquários pela Europa, a Arqueologia desta época ainda era muito insipiente em termos metodológicos, popularizando várias fantasias relacionadas aos Celtas: os grandes megálitos (como Carnac e Stonehenge) foram considerados de origem druídica. O sucesso destas hipóteses arqueológicas vão se somar a uma perspectiva nacionalista pela França, e regionalista na Grande Bretanha, especialmente no início do Oitocentos, onde a memória a respeito dos gauleses foi cristalizada sob a forma de culto do passado (Launay 1978: 11-18). Um dos mais emblemáticos livros desta tendência é Monuments celtiques, 1805, de Jacques Cambry (Cunliffe 1999: 12). Mas essa valorização extremada de um passado idealizado também teve diversos momentos anacrônicos, e um dos mais contundentes foi a idéia fantasiosa entre os escritores da primeira metade do século XIX de que os druidas e Celtas foram adoradores de uma única divindade (Ellis 2001: 132), nas palavras do próprio Bailly: “(…) Druidismo, nada esteve mais ausente dessa grande crença que o Politeísmo” (p. 144).

Em particular, um texto do escritor M. Édouard Fourmier obteve um certo êxito nos meios intelectuais franceses. Publicado originalmente na revista Siècle em 1847, e posteriormente num livro de 1859 (Le vieux neuf), o texto seria uma espécie de registro folclórico de antigas tradições dos bardos da Gália, mas na realidade possuía diversos anacronismos: monoteísmo, crença na reencarnação evolucionista, dogma dos druidas para com a caridade humana e divina, entre outros aspectos. O mesmo texto de Fourmier foi publicado no primeiro ano da Revista Espírita, de 1858, periódico editado por Allan Kardec, o codificador do Espiritismo. Kardec havia se interessado pelo fenômeno do mesmerismo e das mesas girantes a partir de 1854, e adotado esse nome que teria origem em uma suposta vida passada que teve como druida na Gália. Seu túmulo, datado de 1869, foi construído imitando um dólmen. As influências da celtomania no Espiritismo Kardecista ainda são objetos de poucos estudos, mas as conexões existiram.[4] O druida, neste caso, seria uma espécie de antecipador do modelo de pureza de conduta e dos valores morais idealizados para os religiosos do Oitocentos, transfigurados em um passado nacional de cunho heróico (a Gália). O fato é que a idéia de um monoteísmo druídico sobreviveu tanto no Espiritismo quanto no esoterismo francês. No primeiro caso, o exemplo mais famoso é o livro de Leon Denis, O gênio céltico e o mundo invisível, publicado em 1927.

Outra forte influência no livro de Bailly advém do esoterismo, a exemplo da citação: “herança dos antepassados, o Arquidruida que, ele próprio, havia recebido do grande sacerdote atlante” (p. 9). A imagem dos druidas como descendentes dos atlantes foi criada pela teosofista Helena Blavatsky, especialmente em A doutrina secreta, de 1888.[5] A obra de Bailly, desta maneira, foi influenciada diretamente pelas idéias existentes desde Fourmier, mas radicalizou ainda mais os elementos monoteístas, originando o que podemos considerar de druidismo cristão (ou cristianismo druídico), o ápice do anacronismo em escritores populares da França. Muitas obras esotéricas modernas ainda perpetuam fantasias e anacronismos advindos dos séculos passados,[6] prejudicando uma popularização de idéias corretas sobre os Celtas.

As editoras brasileiras, ao invés de publicarem qualquer material sem nenhum critério, poderiam traduzir obras clássicas ou de investigadores renomados, a exemplo das dezenas de livros de Miranda Green, ainda inéditos em nosso país. Apesar deste panorama editorial, os estudos acadêmicos sobre Celtas no Brasil estão aumentando qualitativa e quantitativamente, deixando cair por terra algumas afirmações preconceituosas daqueles que insistem em afirmar que os estudos celtas se constituem como mero apêndice dos estudos clássicos, germânicos e medievais. A busca por informações de maior qualidade pelo público leigo já é um sinal dessa transformação.

AGRADECIMENTOS: Ao professor Fillipo Olivieri, pelas informações preciosas sobre os Druidas e a Gália.

Notas

1. Para referenciais bibliográficos e acadêmicos sobre o druidismo, consultar: Lupi 2004: 70-79.

2. “Mas, pouco mais bem informados do que os antigos, os amantes do celtismo perpetuam as velhas confusões. É preciso citar esta frase de Malo Corret de La Tour d’Auvergne, nativo de Carhaix, extraída de seu ‘Origens Gaulesas’, aparecido no ano da ponte de Lodi, onde ele se mostra menos bom lingüista do que intrépido granadeiro: ‘Vários dos hinos gauleses… estão contidos num poema erse, chamo a Edda… Esse monumento rúnico… seria próprio para nos esclarecer sobre os Celtas…’ Ele visivelmente ignorava que a palavra ‘erse’ designa o dialeto gaélico da Escócia, que a Edda é uma coletânea de lendas escandinavas e que as runas constituem o antigo alfabeto germânico”. Launay 1978: 12.

3. O termo é muito popular em textos espanhóis, para contextualizar o cristianismo praticado em povos germânicos e celtas logo após a conversão: http://www.nuevorden.net/r_204.html; http://www.elamigobuster.c.telefonica.net/aurelius.htm Acessados em 18 de junho de 2007. 4 Em termos sócio-históricos, o Espiritismo kardecista foi uma influência de idéias do mesmerismo, celtomania, esoterismo, cristianismo e ciência popular do século XIX. Para algumas reflexões sobre as origens do Espiritismo, especialmente as influências anglo-americanas na formação das novas idéias religiosas e funerárias da França, consultar Cuchet 2007: 74-90.

5. Blavatsky rompeu com algumas tradições do período, por exemplo, creditando os monumentos megalíticos diretamente aos atlantes e não aos druidas e Celtas (Blavatsky 1888: vol. 2: 756). Outra idéia inovadora da teósofa no imaginário da época foi a de que os atlantes possuíam uma tecnologia muito sofisticada, como o uso de aeroplanos e inventos motorizados, uma idéia muito utilizada depois por videntes e escritores. Mas uma imagem sobre os druidas permaneceu: a de sacerdotes com alto grau de moralidade e ética. Para considerações acadêmicas sobre as relações do atlantismo com o esoterismo oitocentista consultar: Vivante & Imbelloni 1939: 175-186.

6. A exemplo do escritor Cláudio Crow Quintino, que entre outras considerações, perpetua representações idílicas e moralistas da sociedade Celta e do druidismo, herdeiras do esoterismo oitocentista, mas com alguns novos elementos da literatura New Age pós-Brumas de Avalon: “(…) a sociedade celta (…) vivia em harmonia com o mundo à sua volta (…) Entrevê-se nesse procedimento a elevação de consciência ecológica dos celtas (…) uma sociedade em que tanto homens quanto mulheres desfrutavam dos mesmos direitos e prerrogativas (…) sem Roma, teriam os celtas formado um império e se corrompido da mesma forma? É provável (…) Os celtas (…) não eram bárbaros iletrados, tampouco apreciadores de sanguinários sacrifícios humanos”. Quintino 2002: 23, 239, 240, 241; “Ser celta é viver intensamente, é vencer desafios, é cantar quando um ente querido morre (…) Ser celta é, no fim das contas, ser humano”. http://druidismo.com.br/m_ensaios-secelta.htm Acessado em 21 de junho de 2007.

Referências

BLAVATSKY, Helena Petrovna. The secret doctrine, 6 vol., 1888. Edição completa online: http://www.theosociety.org/pasadena/sd/sd-hp.htm#pt23 Acessado em 25 de junho de 2007.

CUCHET, Guillaume. Le retour des esprits, ou la naissance du spiritisme sous le second empire. Revue d’histoire moderne et contemporaine 54 (2), 2007, pp. 74-90.

CUNLIFFE, Barry. Celtomania and Nationalism: c.1700-1870. In: ______. The Ancient Celts. London: Penguin Books, 1999, pp. 11-16.

ELLIS, Peter Berresford. Druidas: el espíritu del mundo Celta. Madrid: Oberon, 2001.

GREGÓRIO, Sérgio Biagi. Druidismo e espiritismo, 1998. http://www.ceismael.com.br/artigo/artigo001.htm Acessado em 20 de junho de 2007.

LAUNAY, Olivier. A civilização Celta. Rio de Janeiro: Otto Pierre Editores, 1978. Le spiritisme chez les druides, 1858. http://perso.orange.fr/charles.kempf/rs1858/18580402.htm Tradução impressa disponível em: A revista espírita: jornal de estudos psicológicos, 1858. São Paulo: Edicel, s.d.

LUPI, João. Os druidas. Brathair 4 (1), 2004, pp. 70-79. http://www.brathair.com/Revista/N7/druidas.pdf Acessado em 02 de maio de 2007.

QUINTINO, Claudio Crow. O livro da mitologia Celta: vivenciando os deuses e deusas ancestrais. São Paulo: Hi-Brasil, 2002.

VIVANTE, Armando & IMBELLONI, J. Libro de las Atlantidas. Buenos Aires: Jose Anesi, 1939.

Luciana de Campos – Doutoranda em Letras UNESP/SJRP. E-mail: fadacelta@yahoo.com.br


BAILY, Edmond. A lenda de diamante: Sete lendas do mundo celta. São Paulo: Madras, 2006. Resenha de: CAMPOS Luciana de. Druidismo Cristão? Brathair – Revista de Estudos Celtas e Germânicos. São Luís, v.7, n.1, p. 96-100, 2007. Acessar publicação original [DR]

Aventuras da Távola Redonda: estórias medievais do Rei Artur e seus cavaleiros | Antonio L. Furtado

Com o convidativo título de Aventuras da Távola Redonda: estórias medievais do Rei Artur e seus cavaleiros, mais uma vez, Antonio Furtado apresenta ao público brasileiro outra tradução [1] das narrativas da “Matéria da Bretanha”. As estórias do Rei Artur e dos Cavaleiros da Távola Redonda que, nos séculos XII e XIII encantaram tanto a nobreza, pois naquelas narrativas estavam presentes os ideais mais elevados e os modos e maneiras que esta mesma nobreza vivenciava e, também enchia os ouvidos e o imaginário dos menos abastados que, talvez, almejassem serem súditos de um rei justo como Artur e protegidos por cavaleiros como Lancelot e Gawaine.

Essas “aventuras” empreendidas tanto próprio Artur como pelos seus cavaleiros estão impregnadas pelo maravilhoso que, não são estranhos às personagens, pois fazem parte do cotidiano, como nos explica Todorov no livro As Estruturas Narrativas, os elementos sobrenaturais não provocam qualquer reação particular nem nas personagens nem no leitor implícito” (TODOROV, 1979: 160). Muitas personagens das narrativas são conduzidas para situações onde se deparam com seres sobrenaturais, como gigantes, tema da primeira “aventura”, onde o próprio rei Artur enfrenta um gigante monstruosos na narrativa “O gigante do Monte Saint Michel”:

– Irei à frente, disse Artur, para combater o gigante. Vireis atrás de mim, e atentai para que nenhum de vós interfira enquanto eu mesmo puder valer, já que de outra ajuda não necessito. Pareceria covardia vir outro, além de mim, a combatê-lo. Socorrei-me, porém se perceberdes minha necessidade. (FURTADO, 2003: 70).

Artur parte sozinho para enfrentar o gigante e deixa claro os seus companheiros, que devem socorrê-lo só em caso de necessidade. Vemos aqui a representação do rei que está sempre à frente dos seus nas batalhas e faz questão de que a lei seja também aplicada a ele, como nos mostra John Boorman no seu filme Excalibur, de 1980, na cena em que a rainha Guinevere é acusada de adultério por um cavaleiro e implora ao seu marido e rei para que não seja julgada, mas Artur, responde que a lei deve ser aplicada também ao rei, caso isso não ocorra, não há justiça. Artur deve marchar à frente de seus cavaleiros na caça das aventuras.

Em “O juramento ambíguo de Isolda”, Artur e mais alguns cavaleiros, como seu sobrinho Gawaine (que nos apresentado como Galvão), “o mais cortês de todos os homens”, são chamados para julgarem Isolda esposa do rei Marcos, Duque da Cornualha e tio de Tristão, que foi acusada de adultério por três barões da Corte da Cornualha.

O rei Artur é convocado por Isolda por ser conhecido como o mais justo e nobre dos reis e por repudiar todo e qualquer ato de vilania. E, como Artur e seus cavaleiros representam os ideais da cortesia e da honra, vemos nas palavras de Galvão todo o asco que o ato dos barões contra Isolda lhe causa:

– Tio, se tenho permissão, a justificação que está combinada terminará mal para os três felões. O mais dissimulado é Ganelon: conheço-o bem e ele a mim. Já o derrubei em um lamaçal, durante uma justa forte e encarniçada. Se pego de novo, por São Richier, Tristão não precisará mais vir. Se puder agarrá-lo com as mãos, farei nele bastante estrago e o enforcarei no alto de um morro. (FURTADO, 2003: 160).

Os cavaleiros não hesitam em atender o apelo de uma donzela ou mesmo de uma rainha que esteja em perigo, pois são estas as oportunidades que esses homens de armas e de cortesia têm para fazerem valer seu juramento de defenderem as mulheres e os mais fracos, partirem em busca de aventuras e, talvez, conseguirem o amor da mulher que necessita de socorro.

As narrativas que têm como personagem principal Artur ou outro cavaleiro, fluem de maneira a cativar o leitor, com se este estivesse envolvido pela voz dos trovadores que, habilmente “encantavam” os homens e mulheres dos séculos XII e XIII quando apresentavam as aventuras e, mais ainda, os ideais que essas aventuras e as personagens representavam.

A leitura de Aventuras proporciona o resgate da ambientação, das falas das personagens e, principalmente, das suas atitudes, sejam elas de indignação perante a injustiça – como a de Galvão – ou de bravura e até de desolamento. As personagens arturianas estão vivas e, nas páginas do livro de Furtado é possível “viajar” ao lado de Galvão, Lancelot e Percival; seja na busca do Santo Graal ou no salvamento de uma donzela.

A tradução primorosa do francês antigo onde o estilo, a linguagem e o conteúdo mantiveram-se fiéis aos originais como o próprio autor afirma na Introdução da obra é um convite a mais – tanto aos estudiosos e pesquisadores da Idade Média, como aos leitores em geral – para que se descubra o mundo arturiano e da Matéria da Bretanha.

Aventurar-se pelas páginas dessa obra é como um mergulho no universo mágico do mito arturiano e um eterno encantar-se com as estórias do “rei que não morreu, apenas dorme e, em breve, retornará…”

Nota

1. Em 2001 foi publicada pela Editora Vozes a tradução dos Lais de Maria de França. Tradução de Antonio Furtado e prefácio de Marina Colassanti.

Luciana de Campos – Doutoranda em Letras UNESP/São José do Rio Preto. E-mail: fadacelta@yahoo.com.br


FURTADO, Antonio L. (Organização e tradução). Aventuras da Távola Redonda: estórias medievais do Rei Artur e seus cavaleiros. Prefácio de Gilberto Mendonça Teles. Petrópolis- Rio de Janeiro: Vozes, 2003. Resenha de: CAMPOS, Luciana de. Cavaleiros da Aventura. Brathair – Revista de Estudos Celtas e Germânicos. São Luís, v.3, n.2, p. 62-63, 2003. Acessar publicação original [DR]

Matéria de Bretanha em Portugal | Leonor Curado Neves

Uma iniciativa como esta das organizadoras é sempre bem-vinda: informa-se na Introdução que estas Atas representam a recolha de um Colóquio e, por sua vez, de vários seminários realizados por e em favor de alunos do mestrado em Literatura Portuguesa Medieval, não só do Departamento de Literaturas Românicas da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, como de outras universidades portuguesas, os quais, ao longo de 1999-2001, tiveram por tema de estudos a “matéria de Bretanha”. É, de fato, louvável oferecer tal oportunidade a futuros pesquisadores que, sob a orientação de nomes conhecidos como Irene Freire Nunes, Ivo Castro, José Carlos Ribeiro Miranda, Ana Sofia Laranjinha e outros, além de um convidado “estrangeiro”, Michelle Szkilnik, têm a chance de prosseguir na carreira tomando por base modelos de investigação rigorosos e cientificamente respeitados. Cumprimentos às organizadoras pela abertura, nem sempre usual nos meios acadêmicos.

Contudo, por isto mesmo, por seu caráter de sumário heterogêneo, a obra é qualitativamente desigual – risco, ao que parece, conscientemente abraçado, pois também referido na Introdução. Nem se poderia esperar o contrário: dificilmente um mestrando teria a experiência crítica de Irene Freire Nunes, a quem se deve a edição de A Demanda do Santo Graal (cópia portuguesa), de 1995, trabalho que, embora não substitua o de Magne, a ele se acrescenta como consulta obrigatória; ou de Ivo Castro, que há anos vem preparando a edição do José de Arimatéia, igualmente destinada a somar-se à de H. H. Carter, a mais conhecida; ou, ainda, de José Carlos Ribeiro Miranda, cujas teses, aliciantes e revolucionárias, acerca da organização cíclica da Vulgata e da Pós-Vulgata, em diálogo cerrado com as propostas até então indiscutíveis de Fanni Bogdanow, têm suscitado tanta polêmica. Por enquanto, pelo que se deduz da maioria das comunicações recolhidas, seus autores estão antes para aprender com eles que para ombreá-los em perspectivas analíticas. O que não desmerece, reitere-se, a participação do grupo, disposto a enfrentar as teias extremamente complexas da matière – para cujas profundezas míticas Ana Paiva Morais chamou a atenção (p.125).

Compreensíveis as discrepâncias, mas nem por isso livres de reparos, a começar pelos lugares-comuns, espécie de estigma do assunto desde que dele se apossou a mídia, o cinema americano e uma certa imaginação popular aficcionada por fadas, duendes e dragões. Aqui, nas Atas, não se extrapola, é evidente, para a banalização; porém, elas não se isentaram de retornar à repisada idéia de que o Amadis de Gaula propõe uma cavalaria humanizada, cortesã, em consonância com a “revolução” provençal do século XII e como contraponto à elevada espiritualização da Demanda e ao paradigma ascético representado por Galaaz (p. 105); ou também à desgastada constatação de que a carnalidade de Lancelote, plena de erotismo e de sensualidade, espelho às avessas do grandioso filho bastardo, está atrelada a sentimentos cristãos de culpa, castigo, remorsos, reincidências, contrição – empecilhos em muito responsáveis, no plano simbólico, pela decadência de Artur e pela destruição do reino de Logres (p. 267); ou, ainda, à intrigante concepção da figura feminina, ora vítima de um discurso misógino, tendo Eva como respaldo emblemático, ora heroína de um discurso enaltecedor, abrindo espaço para a Virgem Maria e para uma série de reformas por que passava a Igreja na Idade Média Central (p. 69). Conclusões como estas não podem mais ser pontos de chegada, mas de partida, são pertença daquela já extensa bibliografia de fundo que deve assessorar qualquer projeto de trabalhos na área. Conhecê-la bem evita não só a repetição indesejável, como as comparações esdrúxulas do tipo de “um artigo de jornal, Tristão e Isolda, duas novelas camilianas e sociologia de Luhmann” (p. 277) – único texto da obra que realmente não precisaria estar ali.

O longo artigo de Irene Freire Nunes (20 páginas), “Merlin, o elo ausente” (p. 29), não traz grandes novidades enquanto “tese” – sabe-se, hoje, que o mito de Merlin veio se constituindo por etapas, das tradições orais às recriações literárias, e que a figura é “elo” indispensável na lógica estrutural de todo o ciclo – mas é utilíssimo, porque repassa várias vertentes que concorreram para a edificação do poderoso mago no imaginário coletivo, bem como resenha os principais estudos que foram, a pouco e pouco, montando o quebra-cabeças. O mesmo se pode dizer do ensaio de Ivo Castro, “Sobre a edição do Livro de José de Arimatéia” (p. 59) – uma defesa contundente, e justa, do minucioso labor filológico que exige a preparação de qualquer desses textos, a exigir não só o domínio de um vasto instrumental técnico, de teor comparativo, mas também boa dose de ousadia, de sensibilidade perceptiva e de criatividade. Embora bem provido das duas condições, como demonstra sua dissertação de doutorado apresentada à Universidade de Lisboa em 1984, o autor confessa dúvidas que, ao final do artigo, desnudam o quanto ainda se tem por avançar, por responder, por “demandar”: que lugar ocupa no estema da Estoire o manuscrito francês [do José de Arimatéia] que serviu de exemplar à tradição peninsular? Quem trouxe para Portugal os manuscritos da Estoire, da Queste e da Mort Artu, e possivelmente do Merlin, terá trazido outros (Lancelot, Tristan)? A “coesão” da “matéria de Bretanha”, cada vez mais documentada, será “retrato” da realidade ou “miragem”? (p. 68). Neste sentido – o das indagações que estimulam – José Carlos Roberto Miranda tem uma bela proposta sobre o papel de Elaim, o Branco, filho de Boorz, muito menos “estrela” que seu casto pai, na continuação da linhagem de Lancelote, depois que seu “duplo” Galaaz (nas palavras de Miranda) assume de vez a condição angélica. A pujante formulação, se suscitar interesses mais amplos, pode ser encontrada em Galaaz e a ideologia da linhagem (Lisboa: Granito, 1998), onde José Carlos relaciona a organicidade do universo arturiano e a questão sociológica linhagística própria de uma estrutura feudal como a da Baixa Idade Média. E para encerrar o rol de colaborações que movem à verticalização dos diálogos, continuam fundamentais as análises genológicas (p. 125, em que pese à opção por hermetismos de linguagem), as devassas do plano simbólico (p. 81, p. 145, p. 241) ou, como fez Michelle Szkilnik, de modo original, as localizações das chamadas “personagens secundárias”, cujo papel vai muito além de simples “mediadoras” na narrativa.

Como se percebe, comutados “prós” e “contras”, as Atas sobre A matéria de Bretanha em Portugal prestam à causa serviço de mérito. Quando menos por recolocar, no centro da arena, tema tão mais polissêmico quanto mais cindido entre a visão ligeira, incompatível com a realidade histórica de curta e longa duração em que todo o ciclo se insere, e a visão acadêmica, que muitas vezes peca por excesso oposto, em seu anseio de “precisão”, ao subestimar as diversas e quase sempre obscuras camadas culturais compactadas na matière. As coordenadoras estiveram atentas ao equilíbrio de linhas, o que já de si recomenda a obra.

Lênia Márcia Mongelli – Universidade de São Paulo / ABREM. E-mail: mongelli@dialdata.com.br


NEVES, Leonor Curado; MADUREIRA Margarida e AMADO, Teresa. (Coordenadoras). Matéria de Bretanha em Portugal. Lisboa: Colibri, 2001. Resenha de: MONGELLI, Lênia Márcia. Brathair – Revista de Estudos Celtas e Germânicos. São Luís, v.3, n.2, p. 64-65, 2003. Acessar publicação original [DR]